Ana Luz Velásquez, ou apenas Analú como gostava de ser chamada, era uma jovem que morava com sua mãe, Rosa Velásquez, em uma pequena cidade do interior. Seu lar era acima de uma modesta papelaria, onde sua mãe trabalhava arduamente para sustentá-las. A relação entre mãe e filha era marcada por uma ligação forte, mas também por segredos e silêncios. Sempre que Analú perguntava sobre seu pai, sua mãe respondia com voz firme: "Ele está morto e enterrado! Sua mãe é tudo o que você precisa, então pare de se queixar!" Analú aceitava essa resposta resignadamente, pois sabia que arrancar algo mais de Dona Rosa Velásquez seria mais difícil do que encontrar água em Marte.
Apesar da ausência paterna, Analú era uma jovem feliz e querida pelos moradores da pequena cidade. Sua personalidade alegre e educada a tornava popular, e seu sorriso era como um raio de sol, iluminando até os dias mais sombrios. Corpo esguio, e longos cabelos encaracolados até o meio das costas que dançavam ao vento enquanto ela corria pelas ruas, como se o mundo fosse acabar a qualquer momento. Os traços de sua origem latina eram evidentes em sua pele morena e em seus olhos escuros, profundos como a noite.
Sempre apressada, Analú entrou correndo pela casa, arrepiando os cabelos da mãe, que andava muito assustada ultimamente. — ¡Luz, hija mía! ¡Comportarse no eres más una niñita! — sua mãe repreendeu, com um tom de preocupação.
— Ah! ¿Mamácita si no es tu niñita seré de quién entonces? — Analú respondeu, agarrando a mãe e distribuindo beijos e cócegas, deixando-a ainda mais brava.
A mãe de Analú sempre a proibira de falar espanhol fora de casa, mesmo que Analú nunca tenha entendido o motivo, ela sempre se esforçou para obedecer. — Vê se não fica na rua após escurecer minha filha, lembre-se…
— "Filha obediente, fica segura e deixa a mamãe tranquila!" — Analú completou, lançando um sorriso travesso para a mãe.
— Você não tem jeito, menina. Agora vá e deixe de palhaçada — tentou soar brava, mas já estava rindo junto com a filha.
— De onde você tirou isso mãe? A senhora repete isso para mim desde que eu era um bebê.
— Porque é verdade, menina. Agora vá comprar o seu vestido e volte antes de escurecer, entendido?
Analú jogou um beijo para mãe e saiu correndo ao encontro das amigas que a acompanhariam até a próxima cidade, onde escolheria o vestido perfeito para a tão esperada festa de quinze anos. Entre os jovens da cidade, não se falava em outra coisa. Distraída entre provas de vestidos e maquiagens, Analú não viu o tempo passar. Ela olhou preocupada para o relógio, sabendo que sua mãe ficaria muito brava.
— O que poderia dar errado? Realmente não entendo do que sua mãe tem tanto medo? — perguntou Sophia a melhor amiga de Analú.
— Talvez pense que você será levada por um homem mal, — disse a outra rindo. — ou ela tenha medo de que você encontre um príncipe encantado e fuja com ele em seu cavalo branco e nunca mais volte.
Analú retornou para casa, sentindo-se apreensiva por saber que sua demora provavelmente afligiria sua mãe. Ao se aproximar da residência, já era tarde e a escuridão envolvia a vizinhança. A visão de dois veículos desconhecidos estacionados à porta aumentou sua curiosidade. Sua mãe jamais mencionara parentes ou amigos além dos habitantes locais, e esses carros certamente não pertenciam à comunidade.
Subindo rapidamente as escadas, Analú sentiu um arrepio de medo percorrer sua espinha. Ao chegar à porta, uma onda de pavor a dominou ao testemunhar sua mãe ferida, sob a mira de uma arma.
— Quem são vocês? Nós não temos nada de valor. O que querem aqui? — Analú correu para sua mãe, mas foi interceptada por mãos fortes. — Quem são essas pessoas, mamãe? De onde a senhora os conhece? — Analú perguntou assustada, fixando o olhar na mãe.
— Levem a garota e vamos sair desse lugar horroroso! — um homem grande, com voz grossa e rouca de tanto fumar, ordenou do meio da sala.
— Deixa ela em paz. Mariano, ela não te fez nenhum mal! — a mãe gritou em seu impecável espanhol.
— Ela está muito bela. Você fez um bom trabalho, Rosa, mas não devia ter fugido. Como pode acreditar que eu não teria conhecimento do paradeiro de minha pequena filha? — disse o homem com desprezo na voz. Ele era imponente, com uma estatura impressionante e músculos volumosos que denotavam sua força. Um anel enorme adornava seu dedo mindinho, reluzindo com um brilho sinistro. Sua expressão era malévola, e seus olhos irradiavam um brilho verdadeiramente tenebroso.
— Filha? — Analú olhava estática, alternando o olhar entre a mãe e o homem estranho na sala. O desespero tomava conta de Analú enquanto ela observava a cena diante de seus olhos, incrédula e horrorizada. Sua mãe, em meio às lágrimas, implorava por perdão e proteção para sua querida filha, prometendo cuidar dela mesmo após sua partida. No entanto, suas súplicas caíam em ouvidos surdos, perdidas no riso cruel do homem que trazia o caos à sua casa.
Um único disparo ecoou pelo ambiente, e o mundo de Analú desabou junto com o corpo inerte de sua mãe. O choque e a dor a paralisaram, enquanto ela gritava em agonia, tentando despertar sua mãe para a realidade. Mas já era tarde demais, o destino cruel havia levado sua única família. Carregada por mãos firmes, Analú viu-se sem forças para lutar, a dor insuportável dominando cada fibra de seu ser. Ela gritava por respostas, por conforto, mas apenas o vazio e o silêncio respondiam. À medida que era conduzida para fora de casa, viu as chamas consumirem tudo o que conhecia e amava. Sua casa, sua mãe, sua vida... tudo desaparecendo em meio às chamas que devoravam sua existência.
Um grito de desespero ecoou pela noite, mas antes que pudesse perceber, algo atingiu seu pescoço, um súbito torpor tomando conta de seus sentidos. Entre pensamentos confusos e lágrimas amargas, Analú desvaneceu-se na escuridão, ansiando por se reunir com sua mãe no além.
Marcus Siegro era uma figura temida e respeitada, conhecida por sua frieza implacável e força inabalável, ocupando o posto mais alto sob o comando de Mariano Pedra Santa. Ao desembarcar do pequeno avião, sua presença imponente abria caminho entre os demais, e as portas pareciam ceder automaticamente à sua passagem, como se reconhecessem a autoridade que ele carregava. No entanto, esse status não lhe foi concedido facilmente; Marcus conquistara a confiança do chefe colombiano com sua lealdade inabalável e habilidades inigualáveis. Desde que salvou a vida de Mariano Pedra Santa em um momento crítico, ele ascendeu rapidamente na hierarquia do cartel, tornando-se a peça mais importante abaixo do próprio líder. Seu comprometimento com a causa e sua capacidade de realizar tarefas difíceis e perigosas o elevaram a esse posto de destaque, onde sua influência se estendia por todas as áreas operacionais da organização criminosa.Apesar de sua reputação de homem desconfiado, Mariano confiava em
Marcus ordenou que a garota fosse mantida no quarto, recebendo apenas as refeições necessárias. Ela precisava de seu tempo para o luto, e ele estava determinado a protegê-la desse momento tão delicado. Era o mínimo que podia fazer por ela naquele momento difícil. — Três anos. Três anos ainda nessa tortura. — pensou Marcus com tristeza. Nunca antes ele havia enfrentado uma missão tão longa, e a saudade de casa, dos pais, era o aspecto mais difícil de lidar.Ele dirigiu-se à academia, um lugar que sempre lhe oferecia refúgio. Marcus tinha o costume de treinar intensamente; era sua forma de manter-se concentrado na missão. No entanto, notava que conseguir voluntários para os treinos de luta estava se tornando cada vez mais complicado, pois alguém sempre acabava gravemente ferido. Marcus não era conhecido por pegar leve com bandidos, e ali, com certeza não havia mocinhos. — bando de inúteis! — resmungou optando por sair para uma corrida.Ao chegar ao final da trilha, ele olhou ao redor, t
Analú observava atentamente a movimentação tanto dentro quanto fora da casa. Ainda que confinada ao quarto, encontrava consolo na pequena sacada que lhe proporcionava vistas do sol poente e das estrelas despontando no céu noturno. Com um propósito determinado para aquela noite, ela fixou o olhar no carro que transportava seu guarda-costas e aquele homem que se recusava a chamar de pai. Notou que estavam de saída, acompanhados por pelo menos três veículos.Analú calculou que, talvez, poucos homens permanecessem na propriedade naquele momento. Reunindo toda a coragem que tinha, ela saiu do quarto improvisando uma corda resistente com os lençóis da cama, amarrando-a firmemente na grade da sacada. Sentindo-se sortuda, quando ninguém apareceu quando se se desequilibrou e caiu, como uma fruta madura, no chão abaixo. O som das vozes masculinas vindas de dentro da casa, acompanhadas por risadas altas, denunciou que um jogo de pôquer estava em pleno andamento. Analú sabia que precisava agir ra
Desde que chegara ao Vale Del Calca, Marcus tornou-se a sombra de Pedra Santa, nunca deixando o chefe desprotegido. Quando foi convocado para acompanhá-lo em uma reunião de negócios em Cali, sabia que seria uma ausência prolongada. Deixou a jovem aos cuidados dos homens encarregados da segurança da fazenda e da governanta da casa.— Como vai o progresso com a garota, Marcus — Pedra Santa perguntou, entre baforadas de seu charuto.— Teimosa e desafiadora, chefe. Mas está progredindo nos estudos e em breve a introduzirei aos negócios da família — respondeu Marcus.— Ótimo. Faça o que for necessário, apenas certifique-se de que ela não me cause problemas. Ela será fundamental para nossa aliança com o russo nos negócios — concluiu Pedra Santa.Marcus optou por não pressionar o assunto, sabendo que sua influência poderia impedir a união com o velho russo, algo que ele trabalhava arduamente para evitar. Ao chegarem ao local onde Pedra Santa era aguardado, ele se viu no centro das atenções.
Analú foi arrastada em direção ao escritório de Pedra Santa, ela entrou de cabeça erguida. Estaria pela segunda vez diante do responsável por todas as desgraças da sua vida, o homem que puxou o gatilho, o responsável pela morte de sua mãe. Ela não tinha medo dele, e se ele a matasse ainda assim seria um favor.— Sente-se! — ordenou com voz rouca.— Estou bem de pé! — declarou erguendo o queixo e olhando em seus olhos frios.— Sente-se! — repetiu mais uma vez, seu pai não estava disposto a ser ignorado desta vez.— Ou o quê? Você vai atirar em mim como fez com minha mãe? Faça isso, não temo menos a morte do que temo ter que olhar para você novamente. — Analú gritou lançando-se contra ele, mas seu pai a parou com a força de seu punho.— Quem você pensa ser para ousar me desafiar? Você é apenas uma criança bastarda. Ensinar-te-ei a nunca, jamais ousar a faltar com respeito a mim novamente. Rosa só saiu porque eu permiti, acha mesmo que eu não sabia o tempo todo onde vocês estavam?— Não
El Cairo, um município no Valle del Cauca, Colômbia, exibia-se modestamente com pouco mais de 9 mil habitantes. Seu encanto residia na arquitetura espanhola meticulosamente preservada, nas cores vibrantes que adornavam suas casas e estabelecimentos, e na natureza exuberante que abraçava suas fronteiras. Este cenário idílico atraía anualmente turistas e amantes do ecoturismo, seduzidos pela promessa de uma experiência única em meio a paisagens deslumbrantes. A principal atração cultural era a Festa do Retorno, um evento que atraía uma enxurrada de turistas para o vilarejo, inundando as ruas com uma energia efervescente. Nessas ocasiões, as casas de jogos de Mariano Pedra Santa transbordavam de visitantes em busca de diversão e entretenimento. Além disso, os clubes de jogos e os estabelecimentos de prostituição se apresentavam como opções para todos os gostos, garantindo uma variedade de experiências para os visitantes mais ávidos por diversão. Marcus dirigiu-se determinado em direção a
Ao voltar para a fazenda, Marcus foi chamado para jantar na residência do chefe, Mariano Pedra Santa. Ele era um dos poucos a quem o líder permitia tão grande proximidade, o que fazia parte do disfarce de Marcus como o homem de confiança do bandido. No entanto, ao entrar na casa, Marcus se surpreendeu ao ver Pedra Santa visivelmente abatido. Aquela imagem contrastava com a habitual aura de poder e controle que o mafioso emanava, deixando Marcus inquieto sobre o que poderia estar acontecendo nos bastidores do império criminoso. O homem olhava fixamente para o copo à sua frente, balançando o líquido de cor âmbar. — Entre filho, você é bem-vindo à minha mesa! — Obrigado chefe, mandou me chamar? — perguntou, Marcus queria ver como estava a garota, no entanto, ali estava ele agindo como puxa-saco. — Desejei matá-la, sabe? Mas ela não me pertence mais. Em breve ela irá para longe de mim. — Pedra Santa parecia estar perdido em seus pensamentos, a bebida ainda não havia sido sorvida, como
Marcus retornou à fazenda, determinado. Dirigiu-se diretamente ao quarto de Analú, sem dar atenção a quem cruzasse seu caminho. Nos olhos experientes da governanta, ele vislumbrava um conhecimento oculto, adquirido por anos de observação dos acontecimentos naquela propriedade. Consuelo sabia mais do que deixava transparecer; a velha governanta parecia ser a resposta para as muitas perguntas de Marcus. — Como ela está? — perguntou apontando para a garota dormia encolhida em sua cama. — Ela estaria bem se você não a tivesse entregado ao demônio — a mulher retrucou empurrando Marcus com o dedo, suas palavras estavam carregadas de fúria desafiando-o a contestá-la. — Já chega, Consuelo. Venha ao meu escritório agora! — interrompeu, ríspido, e a mulher saltou assustada. Ela o seguiu, tentando manter-se longe dele, e ficou ao lado da porta, recusando-se a entrar até que ele a ordenou. Suas mãos trêmulas dançavam ao redor de seu rosário; Marcus teria rido se a situação não fosse tão caótic