Capítulo 3

Ana Luz Velásquez, ou apenas Analú como gostava de ser chamada, era uma jovem que morava com sua mãe, Rosa Velásquez, em uma pequena cidade do interior. Seu lar era acima de uma modesta papelaria, onde sua mãe trabalhava arduamente para sustentá-las. A relação entre mãe e filha era marcada por uma ligação forte, mas também por segredos e silêncios. Sempre que Analú perguntava sobre seu pai, sua mãe respondia com voz firme: "Ele está morto e enterrado! Sua mãe é tudo o que você precisa, então pare de se queixar!" Analú aceitava essa resposta resignadamente, pois sabia que arrancar algo mais de Dona Rosa Velásquez seria mais difícil do que encontrar água em Marte.

Apesar da ausência paterna, Analú era uma jovem feliz e querida pelos moradores da pequena cidade. Sua personalidade alegre e educada a tornava popular, e seu sorriso era como um raio de sol, iluminando até os dias mais sombrios. Corpo esguio, e longos cabelos encaracolados até o meio das costas que dançavam ao vento enquanto ela corria pelas ruas, como se o mundo fosse acabar a qualquer momento. Os traços de sua origem latina eram evidentes em sua pele morena e em seus olhos escuros, profundos como a noite.

Sempre apressada, Analú entrou correndo pela casa, arrepiando os cabelos da mãe, que andava muito assustada ultimamente. — ¡Luz, hija mía! ¡Comportarse no eres más una niñita! — sua mãe repreendeu, com um tom de preocupação.

Ah! ¿Mamácita si no es tu niñita seré de quién entonces? — Analú respondeu, agarrando a mãe e distribuindo beijos e cócegas, deixando-a ainda mais brava.

A mãe de Analú sempre a proibira de falar espanhol fora de casa, mesmo que Analú nunca tenha entendido o motivo, ela sempre se esforçou para obedecer. — Vê se não fica na rua após escurecer minha filha, lembre-se…

— "Filha obediente, fica segura e deixa a mamãe tranquila!" — Analú completou, lançando um sorriso travesso para a mãe.

— Você não tem jeito, menina. Agora vá e deixe de palhaçada — tentou soar brava, mas já estava rindo junto com a filha.

— De onde você tirou isso mãe? A senhora repete isso para mim desde que eu era um bebê.

— Porque é verdade, menina. Agora vá comprar o seu vestido e volte antes de escurecer, entendido?

Analú jogou um beijo para mãe e saiu correndo ao encontro das amigas que a acompanhariam até a próxima cidade, onde escolheria o vestido perfeito para a tão esperada festa de quinze anos. Entre os jovens da cidade, não se falava em outra coisa. Distraída entre provas de vestidos e maquiagens, Analú não viu o tempo passar. Ela olhou preocupada para o relógio, sabendo que sua mãe ficaria muito brava.  

— O que poderia dar errado? Realmente não entendo do que sua mãe tem tanto medo?  —   perguntou Sophia a melhor amiga de Analú.

  — Talvez pense que você será levada por um homem mal, — disse a outra rindo. — ou ela tenha medo de que você encontre um príncipe encantado e fuja com ele em seu cavalo branco e nunca mais volte.

Analú retornou para casa, sentindo-se apreensiva por saber que sua demora provavelmente afligiria sua mãe. Ao se aproximar da residência, já era tarde e a escuridão envolvia a vizinhança. A visão de dois veículos desconhecidos estacionados à porta aumentou sua curiosidade. Sua mãe jamais mencionara parentes ou amigos além dos habitantes locais, e esses carros certamente não pertenciam à comunidade.

Subindo rapidamente as escadas, Analú sentiu um arrepio de medo percorrer sua espinha. Ao chegar à porta, uma onda de pavor a dominou ao testemunhar sua mãe ferida, sob a mira de uma arma.

— Quem são vocês? Nós não temos nada de valor. O que querem aqui? — Analú correu para sua mãe, mas foi interceptada por mãos fortes. — Quem são essas pessoas, mamãe? De onde a senhora os conhece? — Analú perguntou assustada, fixando o olhar na mãe.

— Levem a garota e vamos sair desse lugar horroroso! — um homem grande, com voz grossa e rouca de tanto fumar, ordenou do meio da sala.

— Deixa ela em paz. Mariano, ela não te fez nenhum mal! — a mãe gritou em seu impecável espanhol.

— Ela está muito bela. Você fez um bom trabalho, Rosa, mas não devia ter fugido. Como pode acreditar que eu não teria conhecimento do paradeiro de minha pequena filha? — disse o homem com desprezo na voz. Ele era imponente, com uma estatura impressionante e músculos volumosos que denotavam sua força. Um anel enorme adornava seu dedo mindinho, reluzindo com um brilho sinistro. Sua expressão era malévola, e seus olhos irradiavam um brilho verdadeiramente tenebroso.

— Filha? — Analú olhava estática, alternando o olhar entre a mãe e o homem estranho na sala. O desespero tomava conta de Analú enquanto ela observava a cena diante de seus olhos, incrédula e horrorizada. Sua mãe, em meio às lágrimas, implorava por perdão e proteção para sua querida filha, prometendo cuidar dela mesmo após sua partida. No entanto, suas súplicas caíam em ouvidos surdos, perdidas no riso cruel do homem que trazia o caos à sua casa.

Um único disparo ecoou pelo ambiente, e o mundo de Analú desabou junto com o corpo inerte de sua mãe. O choque e a dor a paralisaram, enquanto ela gritava em agonia, tentando despertar sua mãe para a realidade. Mas já era tarde demais, o destino cruel havia levado sua única família. Carregada por mãos firmes, Analú viu-se sem forças para lutar, a dor insuportável dominando cada fibra de seu ser. Ela gritava por respostas, por conforto, mas apenas o vazio e o silêncio respondiam. À medida que era conduzida para fora de casa, viu as chamas consumirem tudo o que conhecia e amava. Sua casa, sua mãe, sua vida... tudo desaparecendo em meio às chamas que devoravam sua existência.

Um grito de desespero ecoou pela noite, mas antes que pudesse perceber, algo atingiu seu pescoço, um súbito torpor tomando conta de seus sentidos. Entre pensamentos confusos e lágrimas amargas, Analú desvaneceu-se na escuridão, ansiando por se reunir com sua mãe no além.

Leia este capítulo gratuitamente no aplicativo >

Capítulos relacionados

Último capítulo