ANGELIC...Meu coração quase saiu pela boca quando deixei o carro na garagem de Elliot e vi a marcação nos pneus. Eu pensei que não poderia ficar mais nervosa, então entrei no carro de LeBlanc, e fiquei.Tudo bem que ele seja bonito, e isso é indiscutível. Mas sua postura alinhada, seu mistério em revelar quem é, de onde vem, o que quer. Seu perfume forte, mas não do tipo exagerado, e sim do tipo marcante. Tudo isso, colocado ao meu lado dentro de um carro, me deixou inquieta.Chegamos a um edifício no coração de Nova Iorque, próximo à Times Square. Aqui estão localizados os prédios mais altos e caros da cidade. LeBlanc para em uma das vagas do estacionamento, que curiosamente está lotado. Ele desce, dá a volta no carro a abre a porta para mim.- Obrigada.Eu poderia fazer uma brincadeira sobre como não pensei que ele fosse cavalheiro, mas reconsidero. Hoje não.LeBlanc apoia uma mão da base da minha coluna, e embora haja um grosso tecido entre sua palma e minha pele, meu corpo automa
- Sim - ela gagueja - Perfeitamente.- Isso vale para todos- Todos serão avisadosLeBlanc acena, em seguida, seus olhos voltam para mim. Neste momento, sei exatamente porque pensei nele durante sete semanas. Sei porque passei o dia agoniada com a possibilidade de vê-lo. Sei porque me rendi naquele armazém.- O que você veio buscar, encrenca?- Ah... - penso - Água.- Leve água para o andar de cima - ele ordena para a mulher.Antes de sua resposta, LeBlanc passa um braço pela minha cintura e me guia em direção às escadas. Subimos. Há várias brincadeiras que quero fazer com o que acabou de acontecer, mas as guardo. Estou cansada demais para fazer qualquer coisa, se não continuar sentindo sua mão em mim, e imaginando-a em outras partes do meu corpo.Ele aproxima os lábios do meu ouvido, para superar a música, que é ainda mais alta no segundo andar, e sussurra:- Pensei que fosse se manter longe de problema.- O problema veio até mim - ergo a cabeça, apenas para que ele possa me escutar
ANGELIC...Hoje o motorista de Margot foi demitido. Isso não me surpreende, já que a campanha de Elliot está levando todo o dinheiro da família. O que me surpreende é que ela não surtou. Me lembro de um dia, há cinco anos, quando Margot quis trocar seu carro apenas porque encontrou um com a cor mais bonita. Elliot se recusou e ela surtou, pediu o divórcio e passou vinte dias fora de casa. É claro que ele foi atrás dela, como um cachorrinho, e comprou o bendito carro.Eu já me importei com a família Donneli. Era o sobrenome de minha mãe, e eu queria que fosse cuidado. Agora sei que tudo de bom neste sobrenome morreu com ela.Entro no carro, jogo meu casaco e celular no banco passageiro e dirijo para fora da mansão. Marcos está por conta de Margot hoje. Claro, é melhor que eu fique sem segurança do que a primeira dama. Minha cabeça ainda está latejando após a noite de ontem, mas eu me recuso a acreditar nas memórias. Eu mal reconheço as atitudes que tive, como uma prostituta barata. Me
Paro ao lado dele. Não sinto seu perfume de imediato, então sei que não estou suficientemente perto. Olho para a mesa. Há mais algumas armas a serem limpas, e por mais idiota que pareça, eu não sinto medo. Ele poderia me machucar hoje tanto quanto poderia em outras ocasiões.LeBlanc limpa o cano do revólver com uma flanela macia. Suas mãos são hábeis e suaves, como as de alguém que faz isso há muitos anos. Ele coloca a peça acinzentada sobre a mesa, pega outra arma e começa a limpá-la.Observo, um tanto quanto admirada. Não é sobre o poder que uma arma lhe dá, mas sim sobre o que faz com ele. LeBlanc age como se esse poder fosse simplesmente nada.Quase naturalmente, minha mão vai até a arma que ele acabou de deixar sobre a mesa. Espero uma repreensão, mas ela não vem. Pego o revólver. É mais leve do que eu supus. Enquanto observo os detalhes da peça, meu cérebro processa uma informação. LeBlanc nunca me impede de fazer o que eu quero, ou me repreende por fazer errado. Ele apenas fica
LEBLANC...Certa vez, eu conheci um homem em um bar no interior da Holanda. Ele havia perdido o olho esquerdo em uma briga de rua contra outro homem. Eu me lembro de ter pensado no quão corajoso ele era. Não por ter brigado, mas por ter brigado até perder seu olho. Por não reconhecer os limites. Por não recuar.Agora, vejo Angelic descer as escadas, olhando ao redor do primeiro andar do armazém. Desço logo atrás dela, absorvendo seus movimentos. Ela é tão corajosa quanto o homem que conheci no bar, e tem metade da altura e do peso dele. Ela não tem medo de vir até mim quando quer, onde quer. Ela também não enxerga os limites.E então sou obrigado a pensar. O que diferencia a estupidez da coragem? Até onde Angelic, ou o homem do bar, foram simplesmente irracionais?A resposta é simples. Pessoas corajosas não pensam muito.- Eu vou levar você para casa - anuncio.Ela se vira para mim. Sua expressão está séria, porque ela não gosta de receber ordens. No entanto, seus olhos não encontram
ANGELIC...- Estamos fazendo o possível, senhor. Assim que tiver mais notícias, entrarei em contato - ouço a voz do detetive Pierce soar no primeiro andar.Desço os degraus receosamente. Desde que vi o corpo de Antony ontem, pendurado em seu próprio teto, não consegui pensar em outra coisa. Eu sonhei com seu sangue manchando o carpete. Fiz uma denúncia anônima para relatar o acontecido, e já esperava que o detetive viesse nos visitar.- Bom dia - saúdo. Paro no meio da escada.Três pares de olhos de voltam para mim. Elliot Donneli, vestindo roupas casuais porque acabou de voltar do hospital, Margot, ainda usando seu robe de cetim - o que indica que ela não estava preparada para a visita - e o detetive Pierce.- Antony está morto - Margot anuncia, sem o menor indício de tristeza em sua fala - Foi encontrado pendurado no teto da própria casa.Tomo uma longa respiração. Encaro o detetive, esperando que ele tenha algo a dizer, porém ele apenas balança a cabeça, confirmando.- Eu gostaria
- Não mesmo. Eu não sou uma propriedade - retiro sua mão da minha coxa e a coloco em sua própria perna.- Não foi uma pergunta - afirma.Eu o encaro pela primeira vez. Estou irritada com sua territorialidade. Em que momento nosso jogo se tornou uma conquista sobre o outro? Ele pensou que, ao me beijar, estaria me passando para seu próprio nome? Nem mesmo Elliot seria tão babaca!Me preparo para lhe dizer isso, mas então o coral termina de cantar. A igreja fica em absoluto silêncio enquanto as crianças devolvem os microfones e o Padre Bee se levanta. Engulo minhas palavras, e meu orgulho, como se fossem espinhos.Os olhos verdes de LeBlanc estão fixos nos meus, me desafiando a dizer o que quero.- Filhos - o padre murmura - Façamos a oração final. Todos de pé.Toda a igreja se levanta, inclusive eu e o homem ao meu lado.- Eu vou me preparar para me confessar - aviso.Me preparo para sair pela direita, para não ter que passar entre LeBlanc e o banco da frente. No entanto, paro ao ouvir
ANGELIC...Jogo o copo cheio de café na lixeira mais próxima enquanto caminho pelo corredor da faculdade. Definitivamente, o pior café que já comprei.É engraçado voltar para minha vida normal e perceber que nada está realmente normal. No verão passado, eu caminhava por este mesmo corredor, mas era uma pessoa diferente. Tudo era diferente, e agora... e agora LeBlanc existe.Eu não gosto dele, no entanto, gosto da pessoa que sou com ele.Meu celular vibra, e eu o pesco na bolsa. Quando vejo que é uma ligação de Margot, sinto uma enorme vontade de reusar a chamada. Mas, levando em consideração a doença de Elliot, a fama da família na mídia e o detetive no nosso encalço, decido atender.- Margot?- Você leu as notícias esta manhã? - ela ralha, sem ao menos me cumprimentar.Ouço ruídos ao fundo, e isso me faz lembrar que faltam apenas alguns dias para o aniversário de Elliot. Não seria Margot Donneli se não fizesse uma festa de arromba.- Ainda não. O que houve? - pergunto.Saio do prédio