ANGELIC...Jogo o copo cheio de café na lixeira mais próxima enquanto caminho pelo corredor da faculdade. Definitivamente, o pior café que já comprei.É engraçado voltar para minha vida normal e perceber que nada está realmente normal. No verão passado, eu caminhava por este mesmo corredor, mas era uma pessoa diferente. Tudo era diferente, e agora... e agora LeBlanc existe.Eu não gosto dele, no entanto, gosto da pessoa que sou com ele.Meu celular vibra, e eu o pesco na bolsa. Quando vejo que é uma ligação de Margot, sinto uma enorme vontade de reusar a chamada. Mas, levando em consideração a doença de Elliot, a fama da família na mídia e o detetive no nosso encalço, decido atender.- Margot?- Você leu as notícias esta manhã? - ela ralha, sem ao menos me cumprimentar.Ouço ruídos ao fundo, e isso me faz lembrar que faltam apenas alguns dias para o aniversário de Elliot. Não seria Margot Donneli se não fizesse uma festa de arromba.- Ainda não. O que houve? - pergunto.Saio do prédio
LEBLANC...Quando chegamos à mansão Donneli, é como se toda energia vital de Angelic fosse drenada. Ela desce do carro quando abro a porta, entra na casa e olha ao redor. E, neste momento, não passa de uma garota assustada, incerta sobre o futuro. Angelic caminha na minha frente, e enquanto eu planejo ir até o escritório de Elliot, ela começa a subir os degraus da escada.- Você sabe que meu pai não tem salvação, não é? - Angelic diz, de repente, ainda de costas para mim.Salvação...Não. Ele não tem salvação. Mas ela ainda está aqui, não está? Vivendo dia após dia como se o sobrenome de sua família valesse mais do que sua própria vida.- Eu não estou aqui por ele - respondo.Angelic olha para mim por cima do ombro, e quando ela faz isso, quase posso ver mais do que o exterior. Eu não acredito nessa merda de alma, no entanto... se alguém tem uma, essa pessoa é Angelic.No instante em ela se vira para frente e termina de subir os degraus, me dou conta de que estou aqui por um motivo: c
Respiro fundo. Sei do que sua pergunta se trata.Não é óbvio?Por algum acaso ela estaria aqui se soubesse que fui contratado para causar seu funeral?Encaro Victoria, erguendo uma sobrancelha, tanto para sua pergunta retórica quanto para a ingenuidade em pensar que eu a responderia.- Está bem - ela ergue as mãos - Pela forma como você olha para ela, eu apenas pensei que estivesse juntos.- A forma como eu olho para ela?Como alguém que acabou de compra-la e não quer vê-la arrumando encrenca?- Sim, coração - ela se inclina para frente - Como se ela fosse quebrar se você desviasse a atenção pela porra de um segundo.Quase retruco. Angelic é uma das mulheres mais fortes que eu já conheci. Sequer por um segundo eu pensei que ela poderia quebrar. E não se trata de força física, se trata do emocional. Se trata de uma garota que abdicou a vida para ser leal à família. Por isso, quase retruco. Quase.- Mas eu me sinto na obrigação de dizer - Victoria murmura - Se descobrirem que você tem u
ANGELIC...Quando me afasto minimamente, encaro seus olhos verdes. Agora, a cor está tão intensa que seus olhos chegam a parecer pretos. Posso ver a raiva flutuar em seu rosto, pela expressão fechada, maxilar tencionado e respiração forte.Eu nunca tive medo dele. Talvez porque nunca soube do que ele é realmente capaz. No entanto, quando sua mão fecha ao redor do meu cabelo acima da nuca, e ele puxa levemente, mantendo minha cabeça imóvel enquanto aproxima os lábios dos meus, eu me pergunto: o que LeBlanc faria se estivéssemos sozinhos?Sua boca paira sobre a minha, próxima o suficiente para que eu sinta seu hálito quente.A bebida que eu tomei há alguns minutos começa a fazer efeito. Meu sangue aquece. De repente, a música alta não importa. As pessoas ao nosso redor não importam.- Nós não íamos dançar? - sussurro.- Não - ele balança a cabeça - Nós vamos para minha casa.LeBlanc agarra meu pulso e me puxa em direção ao elevador. Quase me desequilibro sobre os saltos, mas a necessida
LEBLANC...Dirijo em direção ao meu prédio. E quando digo isso, não quero dizer que estou indo para meu apartamento. De fato, o prédio é meu.Ao meu lado, Angelic dorme com a cabeça encostado no vidro. O cabelo levemente bagunçado cobre seu rosto, mas posso notar o corpo tranquilo. Seu sono é inocente, como o de uma pessoa que nunca viu algo tão perturbador a ponto de ter pesadelos todas as noites.Pressiono o volante com mais força quando sinto vontade de tocá-la. Entretanto, ao mesmo tempo, sinto raiva. Sinto raiva de sua inocência. Angelic não sabe quem eu sou, mas decidiu entrar no meu carro e conseguiu dormir. Ela confiou em mim. Ela acredita que não vou lhe machucar.Ah, a doce e cruel ironia do destino.Me inclino e retiro a mecha de cabelo do seu rosto. Quando meus dedos, casualmente, tocam sua pele, me sinto satisfeito. É o suficiente.Eu decidi por mim mesmo que não irei machucar esta garota. E se eu não vou, ninguém vai. Eu vou protegê-la, vou cuidar dela, vou garantir que
Dou um passo à frente, e ela dá um passo para trás.Eu poderia dizer que posso explicar, mas, porra, eu não posso. É exatamente isso, e não há meias palavras para dizer a verdade. Seu pai a vendeu. O que eu poderia fazer? Deixá-la naquela casa com seu digníssimo pai e exemplar madrasta?– Ange... – ela me interrompe.– Me responda! – ela exige. As lágrimas fogem de seus olhos e deslizam pela pele do rosto, inchada por causa do sono.Permaneço em silêncio. Verbalizar será ainda mais doloroso para ela.Angelic balança a cabeça, compreendo. Ela desliza a mão pelas bochechas, de uma forma brusca, depois se vira e caminha em direção à sala.– Angelic – chamo.Não espero que ela seja racional. Na verdade, penso em lhe dar espaço para entender que eu fiz o melhor, considerando a situação. No entanto, quando ouço o barulho do elevador sendo acionado, sei que ela não tem os mesmos planos que eu.Saio do escritório em passos largos, praticamente correndo até a sala. Quando chego, as portas do e
– Elliot não expulsaria você – Skyla, de imediato, conclui.Sorrio novamente, desta vez achando graça de sua inocência.Ele não me expulsaria? Oh, claro. Me vender parece menos ruim.Penso em uma forma de lhe contar a verdade. Não quero dizer que LeBlanc simplesmente tirou o talão de cheques do bolso e me adquiriu, como se estivesse na concessionária da Ferrari. Também não quero dizer que Elliot desistiu de ser meu pai e me trocou por dígitos em sua conta. Não quero passar pela humilhação de ter que contar o que houve nesta noite.– É difícil explicar.– Bem – Skyla se levanta, estendendo as mãos para mim – Sobre familiares que não dão a porra da mínima para seus filhotes, eu entendo. Agora você pode tomar banho, vestir uma de minhas camisolas e dormir.Seguro suas mãos e me levanto.– Quando acordar, podemos fazer algo para distrair sua cabeça – ela continua.Me distrair do fato de que valho menos do que os carros na garagem de Elliot? Eu acho que não.– Simples assim?– Claro, docin
LEBLANC...Camisa branca perfeitamente alinhada, gravata simétrica, todos os botões do colete fechados, paletó bem passado e sapatos lustrosos. Eu não precisava me preparar para este evento, mas fiz questão.Olho para o outro lado da rua, onde a mansão Parker foi construída. Meus pés formigam, ansiando pelo momento em que entrarei na casa. No entanto, preciso aguardar. A festa ainda não acabou.O sol já se pôs há alguns minutos, e uma fina garoa – prelúdio da chuva – começa a cair. Seguro o guarda-chuva acima de mim, porque não quero molhar o terno. Hoje, de fato, o diabo veste Prada.Quando estou trabalhando, normalmente, consigo congelar minhas emoções. Não me sinto bem, porque não sou um psicopata. No entanto, também não me sinto mal. Apenas não sinto. O resultado do meu trabalho é problema dos meus clientes, não meu.Contudo, excepcionalmente hoje, sinto alguma emoção enquanto aguardo pelo fim da pequena festa que Skyla deu. Porque hoje não estou fazendo um serviço, estou fazendo