Ainda no quarto, ao lado da porta, ouço a conversa tensa que se iniciava.
- Quem é essa aí?
- Minha...minha namorada - Rodrigo gagueja.
- Desde quando?
- Um ano. Eu acho - murmura - A mãe sabia.
Breve pausa.
- Então era dela que a sua mãe estava falando - diz sério - Ela tinha razão em dizer que não havia gostado dela - Ele diminui o tom de voz - Manda ela ir embora antes que ela chegue.
O silêncio de Rodrigo, foi o suficiente para tirar minhas próprias conclusões.
Não era bem vinda ali e Rodrigo não fazia muita questão em mudar isso.
Pego minha bolsa ao lado do guarda-roupa, saindo do quarto antes de ser pedida para me retirar. No meio do caminho, no final do corredor, encontro Rodrigo e o pai que, automaticamente dão um passo para trás para que eu passasse.
- Já tô indo - murmuro.
Rodrigo desvia o olhar de mim para o pai rapidamente, antes de me olhar novamente e me seguir.
- Levo você, Bruna.
- Não precisa - Continuo a andar, ouvindo-o logo atrás.
- A gente se fala depois então - diz ele, quando já estávamos na garagem e eu prestes a passar pelo portão.
Não respondo.
Não me sentia bem suficiente para responder. Naquele momento, só queria sair dali o mais rápido que eu pudesse.
Ainda no ônibus, minutos mais tarde, Rodrigo me mandou mensagens de texto, perguntando se estava tudo bem e dizendo o quanto que o pai era ignorando com pessoas que não conhecia.
As palavras dele ainda ecoavam em minha cabeça e isto me fez me questionar o tipo de mulher que deveria ser a certa para Rodrigo. E sem pensar muito, o estereótipo que havia criado para Rodrigo, surgiu em minha mente e novamente o fato de eu ser o contrário disso, me fez acreditar que aquele relacionamento, não iria muito longe.
Em pé no ônibus, após dar sinal para descer no próximo ponto, vejo André não muito longe, conversando com dois homens.
Desço do ônibus, andando em sua direção, arrumando a alça da bolsa no ombro.
André continua conversando com os dois rapazes que dava entre 17 e 20 anos de idade. Ambos o escutavam atentamente, enquanto o mesmo gesticulava, apontando em algumas direções.
Continuo me aproximando, atraindo o olhar de um e só depois o do outro, por último André que me olha voltando a olhar para eles, me olhando novamente ao se dar conta que era eu.
Paro alguns passos deles, esperando que ele terminasse a conversa e quando termina, caminha até mim despreocupadamente, com os olhos fixos nos meus.
- Rita disse que brotou lá em casa ontem.
- Não tinha pra onde ir.
- O que tá pegando, Bruna?
André havia tido mudança significativa. Não era mais o menino alto, magro, que estava prestes a ser corcunda.
Em seu corpo tinha músculos por toda parte, tatuagens e um cavanhaque que não tinha antes.
Mas ele não havia mudado apenas fisicamente, seu olhar estava frio, como se não tivesse mais uma alma dentro dele.
Era difícil reconhecer o homem me minha frente, ver o menino que brincava de boneca comigo e que fazia tranças no meu cabelo.
- Provavelmente uma hora dessas ele já saiu.
Ele olha ao redor, antes de estreitar os olhos.
- Quem falou isso?
- Tati.
Os olhos dele vagam por cima da minha cabeça, pensativo.
- Se eu não puder ficar na sua casa, arrumo outro lugar - continuo - Na verdade, vou arrumar, só estou esperando minha folga.
- Você é bem vinda lá. Não precisa de convite.
- Só que você não parece muito feliz em me ter em sua casa.
- Não é isso.
- E o que é então? - Cruzo os braços, já completamente sem entender o comportamento dele.
- Meu único problema já não é mais saber se vou apanhar quando ver ele - murmura, desbloqueando automaticamente uma lembrança.
Costumávamos passar o dia bem, íamos para a escola pela manhã, a tarde brincávamos e quando a noite começava a se aproximar, o medo vinha junto. Pois sabíamos que quando ele chegasse, qualquer coisa o faria perder a paciência e descontar a raiva toda que teve durante o dia em nós.
Dessa forma, a noite quando ele estava em casa no telefone ou recebendo pessoas, fazíamos o mínimo barulho possível e mesmo assim, até o fato de respirarmos pelo dele, já era um motivo para usar o que estivesse por perto para nos bater.
Engulo em seco, sentindo a tensão pelo meu corpo.
Antes que dissesse alguma coisa, um carro se aproximou, parando ao nosso lado. Dou um passo para trás, enquanto André simplesmente encara o vidro fechado.
O vidro desce um pouco e metade do rosto do homem misterioso aparece, inicialmente os olhos se fixando em mim, antes de sustentar o olhar dele.
- Resolveu o problema dos ratos?
- Já espalhei as ratoeiras.
Ele apenas assenti, fechando novamente o vidro, colocando novamente o carro em movimento.
- Conhece ele? - pergunto com as sobrancelhas erguidas.
André me olha como se não entendesse exatamente o motivo da pergunta.
- Mais fácil você perguntar quem não conhece.
Dou de ombros.
- Eu.
Ele balança a cabeça de um lado para o outro, antes de andar em direção a um carro cinza do outro lado da rua.
- Estou falando sério - digo seguindo ele - Não tenho vida social. Então...
Ele não diz mais nada, mesmo eu querendo saber quem era aquele cara e como ele conhecia o meu irmão.
O trajeto até a casa de André, é feita em completo silêncio ou quase, já que tocava uma música do pen drive. O silêncio dele, só me deixava ainda mais encucada. Rita veio ao nosso encontro quando nos ouviu entrar na casa, secando a mão num pano de prato, enquanto em frente ao seu corpo havia um avental com o corpo de uma mulher de biquíni estampado.- Mulher, onde você se meteu? Tava preocupada com você - diz me olhando.- Passei num lugar depois que sai do trabalho - André sobe os degraus da escada, mantendo seu silêncio - Ele é sempre assim agora? Rita continua a olhar para a escada, mesmo depois de André ter sumido de vista.- Se tornou um homem de poucas palavras - Ela me olha - Mas ainda tem um bom coração. Tinha minhas dúvidas se ainda havia um coração dentro de André. Ele me parecia tão distante. Rita volta para a cozinha, se movendo com agilidade, dividindo sua atenção em ver as panelas e cortar temperos.- Quer ajuda?- E desde quando você sabe
Sem dúvida dormir 6 horas por dia, havia deixado de ser suficiente a bastante tempo, já que com o tempo percebi que era uma pessoa noturna, trocando facilmente o dia pela noite. Mas isto não aconteceu por opção, mas sim por necessidade. Desligo o despertador do celular que toca pontualmente todos os dias às 7 da noite, com os olhos semicerrados. Afundando meu rosto no travesseiro, respiro fundo, lutando contra a vontade de voltar a dormir, saindo aos poucos da cama. Ainda sonolenta, pego minha toalha e vou para o banheiro no corredor, ouvindo o som da televisão vindo da sala. O banho sempre era responsável em me acordar parcialmente, depois café. Sentada no sofá velho que tinha na sala, Tati prestava atenção em uma novela.- Tem café pronto - diz quando passo pela sala, entrando na cozinha. Em cima da mesa redonda, estava a garrafa de café bege. Pegando um copo no armário pequeno, me sirvo um pouco de café, pegando bolach
Sorrio sem mostrar os dentes, os acompanhando até o lado de fora da lanchonete, não ficando para observá-los entrar no HB20 preto. Rodrigo nunca havia me levado em casa, mesmo com os pedidos dele. O máximo que já o deixei fazer, foi me levar até um determinado ponto no qual dizia ser perto, mas que na verdade, estava mais do que longe. No ponto de ônibus, espero impaciente o ônibus que precisava para ir para o terminal. Quando finalmente chega meia hora depois, me sento no fundo, colocando meus fones. Aquela parte da manhã, não era muito movimentada, o que fazia com que o percurso fosse mais calmo. No terminal, o segundo ônibus já estava parado, o que me poupou tempo de espera. Quando entrei no condomínio em que morava, o sono já começava a se intensificar e pelo horário, já sabia que estaria sozinha em casa. Então depois de um banho e vestir meu pijama, finalmente teria o sono dos justos. Que naquele dia, não durou muito.- Bruna! Bruna - A voz
Na cozinha, Rita se move de um lado para o outro, terminando de preparar a janta.- Pensei que nunca mais ele iria sair da cadeia - murmura, lavando alguns utensílios que havia usado.- Parece que não tinham motivos o suficiente para manter ele lá - Suspiro.- Por mim, você pode ficar.- E o André? - Ela se vira para mim.- Ele nem passa muito tempo em casa. Além do mais, você é irmã dele. Contudo já fazia algum tempo que não tínhamos uma certa aproximação. E eu até sentia falta disso. Acabou que Rita cedeu o quarto de hóspedes, que ainda estava sem cama e guarda-roupa. Mas para uma pessoa que só precisava de um lugar para dormir, o colchão de solteiro que ela pegou emprestado com a vizinha até o dia seguinte, ajudou bastante. Depois de jantar com ela, saio da casa em direção ao ponto de ônibus, recalculando mentalmente o tempo que gastaria para chegar na boate. E para meu azar, chegaria atrasada. A maioria dos funcionários já haviam chegado,
De volta para o bar, em meio a todas as pessoas que estavam ali, meu olhar se cruza coincidentemente com o homem misterioso. Fingindo toda a naturalidade do mundo, continuo meu trabalho. Até que ao terminar de fazer um drink e me virar, me deparo com o homem misterioso, sentado de frente para mim.- Quer alguma bebida? - pergunto me aproximando do balcão. Ele ergue o copo ainda pela metade. Assinto, voltando minha atenção para a mulher ao lado.- Trabalha há muito tempo aqui? - Ele pergunta de repente.- Três anos - digo sem parar o que estava fazendo.- E como nunca vi você? Dou de ombros.- Não faço ideia. Ele olha ao redor.- É sempre assim?- Na maioria das vezes - Se ele costumava frequentar a boate, com certeza já sabia disso, mas preferia puxar assunto da forma mais aleatória possível.- Mora por aqui por perto? - Ergo um dos cantos da boca, já tendo uma noção do rumo que aquela conversa estava tendo. Franzo os lábios, os movendo de um lad