Não fale daquele monstro

Elizabeth não sabia o que vestir naquela manhã, mas não importava. Assim que chegasse ao hospital, teria de tirar o lindo vestido. Ela suspirou vagando os olhos sobre os vestidos da Gucci jogados sobre a cama e passou a mão no tecido azul-celeste que marcava a cintura esguia. O vestido evasê sem decote tinha um cinto da mesma cor que acentuou a forma de triângulo invertido de seu corpo. 

Ao descer para o café da manhã, beijou o rosto da mãe e passou direto pelo pai. Ainda estava aborrecida com Gabriel.

— Onde está a sua educação? — A voz firme e profunda replicou. 

— Bom dia, pai! — Cumprimentou num murmúrio.

Gabriel não sabia que o tempo passaria tão rápido. A filha tinha crescido e se parecia cada dia mais com a mãe. A única diferença era que Liz ainda tinha o gênio do pai biológico.

— Quer uma carona? — Ele perguntou.

— Não! — Liz respondeu com veemência. — Eu preferia ir no meu próprio carro, mas não tenho.

Emitindo o rosnado, Gabriel trincou a mandíbula, mas se controlou para não se aborrecer com a filha. Afinal, ele não podia negar que estava orgulhoso. Mesmo que fosse só um estágio, Liz estava dando um passo importante para a sua independência financeira. Queria que Mellanie seguisse o caminho da irmã, mas a garota tinha se habituado a obter o que desejava com a avó.

— Posso te levar depois de deixar os seus irmãos na escola.

Liz fitou os três irmãos adolescentes que pareciam estar tão chateados quanto ela. Gabriel havia proibido que usassem aparelhos celulares e livros durante as refeições. 

— Não, mãe! Obrigada. Vou chamar um táxi.

— Você vai com o motorista e um dos seguranças, — Gabriel interveio.

— A maioria das pessoas vão para o trabalho de ônibus ou metrô, — a jovem Elizabeth contestou, exasperada.

Gabriel deixou os talheres caírem ao lado do prato.

— Ah, então você quer subir num ônibus com esse vestido da Gucci, — a voz imponente falou debochadamente.

Arrastando a cadeira para trás com o peso do próprio, Liz se levantou enquanto o pai a mandava voltar.

— Vou falar com ela… — Viviane alisou as costas do marido. — Pode levá-los para a escola? 

— Claro! — Fitou os adolescentes trigêmeos.

No andar superior da casa, Liz estava no quarto com paredes e móveis brancos. Pisou no chão com enorme carpete rosa felpudo e se enfiou no closet para caçar uma roupa que não chamasse tanta atenção.

— Liz, posso entrar?

— Estou ocupada, mamãe.

— Quer ajuda? — Vivian adentrou em passos cautelosos.

— Não sei o que vestir, — confidenciou ao ver a mãe entrando no closet.

— Que tal esse suéter rosa com aquela calça jeans? — Vivian apontou para o cabide pendurado no lado oposto.

— Não é muito simples?

— Pelo menos esse look não chamará tanta atenção.

Elizabeth abraçou a mãe e logo depois, ela correu para se vestir. Estava feliz pelo destino ter colocado Viviane em seu caminho quando era muito pequena e por Gabriel trazer de volta a sua verdadeira mãe.

— Filha, o seu pai só está preocupado, — falou andando tensa até o toalete onde Liz se trocava.

— O papai é paranoico, — a jovem passou a manga do suéter pelos ombros e puxou o tecido, ajustando-o na cintura. — Mellanie anda por aí sem nenhum guarda-costas e nunca aconteceu nada com ela.

Viviane sabia que, por ordens do senhor Welsch, havia dois seguranças à paisana seguindo Mellanie no intuito de protegê-la, mas era uma questão de tempo até que a jovem problemática descobrisse.

Apertando os olhos, Viviane observou a garota um pouco mais alta do que ela no espelho. Liz estava ajeitando os óculos sobre o nariz.

— Por que está usando isso? Você não tem problema de vista.

— Não tem grau mãe, é só para ninguém me reconhecer.

— Sério?

— Deu certo para a Supergirl.

Comprimindo os lábios para evitar o riso, Vivian girou os calcanhares na direção da janela e abriu as cortinas, permitindo que a luz do sol entrasse.

— Mãe, não quero ir com segurança.

— Eu te levo.

— Não, eu sou adulta e posso andar sozinha.

— Você quer aborrecer ainda mais o seu pai?

— Ele tem que entender que não sou mais uma garotinha — sentou-se na cama para calçar o tênis.

— Como vai chegar ao hospital?

— A Mellanie vai me dar uma carona.

Respirando profundamente, a mãe aflita ponderou antes de intervir. Reparou na filha que pegou a bolsa e correu para a porta.

— Não se preocupe! Tem dois seguranças seguindo a Mellanie, — piscou ao repetir o que Vivian tinha lhe contado minutos atrás.

— Filha, não conte nada para a sua irmã.

— O K.

Liz agarrou a bolsa e saiu correndo para a porta depois de visualizar a mensagem na tela brilhante do celular.

Da janela, Viviane viu o mustang vermelho na frente da propriedade. Sacudiu a cabeça para afastar os pensamentos que estavam lhe perturbando. 

...

De frente para a entrada da casa, Mellanie virou para o lado oposto quando avistou Vivian na janela do segundo andar. Depois de visitar Pietro na cadeira, ela sentiu ainda mais raiva de sua mãe adotiva. Abriu a porta e se acomodou no banco do motorista.

— Onde pensa que vai, nerd? — disse Mellanie ao ver a garota de óculos entrando no carro. — Dê um fora! Estou esperando a minha irmã, — o tom era brincalhão.

— Não seja boba! — Pôs a bolsa no colo. — Vamos logo, estou atrasada.

Ao dar a partida no motor, Mellanie conduziu o carro para fora da propriedade dos Welsch. Acendeu o cigarro e soprou a fumaça para o lado da irmã que abanava com as mãos.

— Isso ainda vai te matar.

— Que cringe!

A jovem de cabelos negros colocou o cigarro entre os lábios e ajeitou o espelho do retrovisor. 

— Fui ver o papai, — ela disse de supetão.

— Você foi a empresa?

— Não, idiota… o nosso pai biológico.

As canelas de Liz começaram a sacudir, não se lembrava muito do homem que a pendurou e ameaçou jogá-la do segundo andar do shopping quando era apenas uma criança. Nunca viu Pietro como "pai".

— Por favor, não fale daquele monstro.

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