No dia seguinte, acordei bem cedo apesar do cansaço e comecei as fazer as malas do David. Queria me livrar de tudo que pudesse me lembrar aquele homem, mas ao separar algumas peças, não consegui segurar as lágrimas, haviam muitas memórias boas, destruídas num único segundo.
Eu acreditava naquele relacionamento, acreditei na promessa de "até que a morte nos separe". David me fez feliz por muito tempo, vivemos boas aventuras juntos e ao invés de ser honesto, ele preferiu me trair. Sequei as lágrimas, separei as fotos dos porta-retratos e os presentes, os coloquei numa caixa e levei ao banheiro, onde eu teria acesso rápido a água caso o fogo saísse do controle.Assisti a tudo queimar enquanto meu rosto era molhado pelas lágrimas, mas a lembrança da noite passada, que deveria ter sido feliz, me fez mais uma vez secar as lágrimas, erguer a cabeça e afirmar que eu iria superar isso. Apaguei o fogo e juntei tudo que restou numa sacola, olhei as horas e percebi que estava atrasada.Me olhei no espelho para me arrumar, minha aparência estava péssima, meu cabelo era um emaranhado de ondas sem definição, embaixo dos meus olhos se formaram bolsas fundas e pretas pela péssima noite de sono e minha pele parecia pedir socorro. Eu podia dizer que já fui uma mulher bonita, puxei alguns traços da minha mãe, uma linda mulher preta de pele não muito retinta, com um sorriso espetacular e belos olhos; e outros do meu pai, branco de olhos azuis e nariz fino. Quando mais jovem, diziam que eu poderia ser modelo, mas logo precisei de óculos de grau e mais para frente a rotina me deixou desleixada. Mas isso ia mudar, com certeza ia.Prendi o cabelo num coque, passei um pouco de corretivo abaixo dos olhos, um batom nude, coloquei os óculos e saí em disparada atrás da minha bolsa. Por sorte encontrei o elevador vazio, mas ele fez inúmeras paradas até chegar ao térreo. Meu carro estava há duas quadras, então precisei correr em cima de um salto alto para diminuir os minutos que eu chegaria atrasada.O carro não estava lá.Não dava para esperar até o horário de almoço para dar queixa na polícia, então o trabalho teria que esperar. Liguei para a polícia, me fizeram perguntar para os vizinhos, conferir se não deixei em outro lugar, até que finalmente vieram e pediram para acessar a câmera de um estabelecimento. Levaram meu carro às 3 da manhã, eu sabia que não devia ter deixado para mais tarde, mas a preguiça falou mais alto.Fui para a delegacia, abri um boletim dando todas as informações do carro, não era nenhum modelo de luxo, mas também não foi barato e eu estava pagando as parcelas finais com muito custo, por isso quando o delegado disse que provavelmente roubaram para tirar peças, meu mundo desabou mais uma vez. Tudo que eu vinha lutando para consquistar, simplesmente estava se esvaindo entre meus dedos.Saí de lá arrasada, peguei um táxi e fui para a Prime duas horas atrasada. Todos me conheciam e eu não queria ser a fofoca do momento, então coloquei um sorriso no rosto e abri a porta.— Bom dia Jade, achei que não viria hoje. — disse a recepcionista Cleo.— Bom dia Cleo. Tive um pequeno imprevisto. — respondi enquanto usava o crachá para liberar minha passagem.No caminho cumprimentei dois seguranças, três estagiários, duas secretárias e todos que estavam no elevador. Cinco anos na empresa e aumentos de cargo me levaram a conhecer quase todos. Comecei como estagiária, me tornei assistente de marketing, surgiu uma vaga como secretária e me candidatei, foi quando comecei a trabalhar com o senhor Chevalier, há três anos.— Bom dia Re. — falei atraindo sua atenção dos papéis para mim. Regina era a secretária do dono da empresa, que mesmo aposentado fazia questão de manter as coisas em ordem. Ela era a funcionária mais velha da empresa, trabalhava para o senhor Rutenford há mais de quinze anos.— Que susto Jade. — disse levando a mão ao coração. — Bom dia, pensei que não viria hoje.— E eu já faltei algum dia, Re? Minha vida virou de pernas para o ar, literalmente de um dia para o outro e acabei atrasando.— Está tudo sob controle por aqui, caso precise de mais tempo. — sorri, grata por ter uma amiga que se preocupa comigo.— Obrigada, mas não há muito o que fazer.Encerrando o assunto, fui para a minha sala. Liguei meu notebook, arrumei minhas coisas e fui me servir uma boa dose de café para suportar o dia. Olhei a agenda de Filipe, nada marcado, achei estranho e decidi conferir, mas me lembrei que ele desmarcou tudo porque teria um jantar com a noiva. Não entendi bem os motivos de cancelar os compromissos do dia, por causa de um compromisso a noite, mas isso não era problema meu.Depois de um tempo, imprimi um documento que precisava da assinatura do Filipe e fui até a sala dele. Sem muita conversa, entreguei o papel e ele assinou.— Jade. — me virei, procurando saber se esqueci alguma coisa. — Como você está? Com toda aquela situação.Eu e Filipe sempre tivemos uma relação muito profissional, era novidade ele perguntar sobre minha vida pessoal, mas na verdade eu dei essa abertura.— Vou ficar bem, o errado nessa história é ele e estou em paz. — respondi, pronta para sair da sala dele.— Se precisar de mais alguma coisa, não hesite em me ligar. — estranhei essa bondade toda, não era do feitio dele.— Obrigada.Saí da sala confusa e voltei ao meu trabalho. Por mais que meu coração ainda estivesse ferido e a dor da traição ainda martelasse em meu peito, estava confiante que foi algo bom. Talvez eu realmente precisasse de uma mudança. Voltar a ser a Jade cheia de vida que um dia fui, aproveitar novas paixões e me permitir ser feliz, sem me preocupar em agradar um homem ingrato e sem futuro.Regina estava de saída no mesmo momento que eu, então a chamei para tomar um café. Ela era o mais próximo de amiga que eu tinha e seria bom desabafar, a vantagem é que ela não era fofoqueira e eu podia confiar que essa história não iria se espalhar por toda a empresa.No café, ela ouviu todas as minhas queixas e desabafo atentamente, sendo literalmente uma mão amiga naquele momento tão delicado. Ela garantiu que tudo ficaria bem e eu também acreditava nisso, não era o fim do mundo e quem saía perdendo era o David.Peguei um táxi para voltar para casa, mas a rua do meu prédio estava bloqueada por equipes dos bombeiros, polícia e todos os carros com giroflex possíveis. Desci correndo do carro, pensando que o pior teria acontecido, estava numa maré de azar e a chance de ser o meu apartamento era enorme.Eu queria ultrapassar a faixa amarela, mas um policial me impediu e começamos a discutir, foi quando porteiro e o síndico me viram e correram até mim, seus semblantes preocupados eram a resposta que eu precisava.— Senhora Smith, sentimos muito, mas seu marido ficou louco e incendiou o apartamento. Os bombeiros conseguiram impedir que as chamas se espalhassem para outros apartamentos, mas no seu infelizmente nada pode ser salvo. — avisou o síndico.Em choque, me sentei na calçada. Estava tudo perdido. Tudo.Por Filipe ChevalierO trânsito estava caótico e eu estava atrasado, não que fosse um grande problema, afinal tudo que eu menos queria era ter que encontrar Ashley, mas seria muito mais fácil se ela não estivesse irritada. Quando finalmente consegui sair do congestionamento, descobri o motivo do problema, um incêndio num prédio fechou duas ruas e causou o caos. Demorei perceber que aquele era o prédio da Jade, pensei em parar e ver se estava tudo bem com ela, mas não podia esquecer o jantar com Ashley, já estava adiando a tempo demais e faltar poderia me dar muito mais dor de cabeça. Segui meu caminho para o renomado restaurante francês no centro da cidade. O restaurante ficava no último andar de um prédio e era necessário apresentar o nome na entrada, para que verificassem a reserva. No meu caso não era necessário, todos já me conheciam. Gostava daquele restaurante principalmente pela discrição, ninguém sairia falando por aí que levo minha noiva e minhas amantes no mesmo restaurante
Jade Smith Regina me abrigou em seu apartamento no dia do incêndio. Sendo divorciada, ela e o filho dividiam o lugar e tinham um quarto sobrando, eu não pretendia ficar por muito tempo, apenas o suficiente para me restabelecer e eu esperava não demorar muito. Quando meu pai se opôs ao meu casamento com David, eu jurava que ele estava errado e nós brigamos feio. Mesmo assim, ele me presenteou com uma boa quantia em dinheiro e pediu que eu guardasse para uma emergência. Bom, tive muitas emergências e já não tinha mais a mesma quantia, mas junto com o dinheiro do seguro do carro, em breve conseguiria alugar um apartamento novo e comprar o que precisasse.David foi preso em flagrante colocando fogo no apartamento. Por ter colocado a vida de outras pessoas em perigo, ele seguiria preso. Sinceramente, para mim era pouco. Ele merecia sofrer mais que alguns dias na prisão, mas eu acreditava que o carma o faria pagar todo o prejuízo que me causou, tanto monetário quanto emocional. No sábado
Segunda-feira, logo pela manhã fui ao tribunal resolver minhas pendências com a lei, por ter agredido a amante do meu ex marido. Expliquei a situação ao juíz, garanti que não era uma pessoa violenta, só estava chateada, e com razão, por descobrir uma traição. O juíz ouviu uma testemunha, que para minha sorte ficou do meu lado e contou que eu só estava batendo no David e a loira veio para cima de mim. A loira por sua vez, alegou ser tudo mentira, que eu fui bater nela e outras coisas, mas além da testemunha, tinham câmeras no bar e uma delas filmou a briga. Não havia dúvidas, eu só me defendi, não tive a intenção de machucá-la e não continuei com a briga. Caso encerrado. Perdi metade do dia por causa de dois indivíduos idiotas. Cheguei na empresa após o almoço, meu cabelo estava tão bonito que seria um crime prendê-lo, mas por não ser um costume, todos me olharam estranho. Mas também poderia ser minha escolha de roupa, coloquei a camisa branca de cetim, como tinha uma leve transparên
Entrei no apartamento da Regina ainda sem entender o que aconteceu ou o que ele queria dizer. Filipe nunca agiu daquela maneira antes e o pior, eu nunca me senti assim perto dele antes. No fundo não importava, o que quer que fosse não iria se repetir e eu não deveria me iludir com… nada! Não era nada! — Está tudo bem? Eu já estava preocupada, agora te vendo com essa cara fiquei ainda mais. — ela falou da cozinha, enquanto preparava o jantar. — Tudo bem Re, só estou cansada, o dia foi longo. — respondi tirando a bolsa dos ombros para pegar o celular e verificar as mensagens. — Tem certeza? Será que o chefe bonitão não está mexendo com você? — Re sugeriu acertando em cheio, mas eu não deixar ela saber disso. — Não faz uma semana que me separei, Re. Que tipo de mulher acha que eu sou? — Até onde eu sei, seu casamento já tinha acabado, o que você sentia era apenas medo de ficar sozinha ou uma necessidade de manter o casamento por algum motivo, mas amor já não existia. — ela picava ce
Filipe ChevalierQuando pensei que teria um pouco de paz com a viagem da Ashley, me aparece outro problema. Oliver Rutenford, o filho mimado do dono da empresa, que se importava tão pouco com a Prime que seu pai me nomeou o CEO, claro que eu já era dono de parte da empresa para isso, mas enquanto Oliver se mantesse longe, nunca teríamos problemas.Meu humor já não estava nada bom, Jade conseguiu piorar, mas ela estava certa, não seria louco de demiti-la, era uma peça fundamental na empresa, mas eu me preocupava com ela, estava passando por um momento delicado demais para ter que conviver com um babaca no escritório. Ela estava diferente e não digo somente por suas roupas, parecia mais leve, livre e não era difícil constatar que a separação fez bem a ela. Jade sempre foi bonita, agora estava ainda mais linda e o fato de estar solteira complicava as coisas para mim, ela era proibida por ser casada e já não é mais, porém, depois de quatro anos, não parecia ser fácil convencê-la a ter al
Jade SmithCom a cirurgia de correção de grau, eu me sentia livre, era maravilhoso poder enxergar bem a qualquer momento, sem ajuda de nada e nem ninguém. Parecia que nada podia estragar meu dia, até eu encontrar um babaca no elevador. Oliver Rutenford tinha um charme, olhos azuis cintilantes que contrastava com a pele bronzeada e o cabelo escuro, ele dispensou a gravata e usava uma camisa social com dois botões abertos exibindo a pele bronzeada e os músculos. Não parecia alguém que chegou para trabalhar.Ele me encarou todo o tempo que ficamos no elevador, antes de chegar no último andar, me irritei com seu olhar abusado e o encarei de volta.— Qual o seu problema?! — perguntei irritada, ele abriu um sorriso de lado, gostando da minha atenção.— Problema nenhum, não posso te olhar? — a porta do elevador se abriu e eu sai. — Quer saber? Pode! Admire muito o que você não pode tocar! — respondi sem olhar para trás. — Babaca. — Você sabe quem eu sou?! — sei, um idiota júnior, ainda não
Todos os meus neurônios paralisaram, esse homem seria capaz de arrancar tudo de mim se quisesse, com um apenas um toque. Seu polegar deslizou no tecido fino da minha camisa, usava a mesma de cetim de outro dia, meu coração disparou e meus olhos se encontraram com os dele. Minha mente logo fantasiou ele me puxando pela cintura para sentar em seu colo enquanto nos beijamos loucamente e minhas mãos deslizam por seu peitoral sarado e delicioso, mas… — Obrigado… pela ajuda. — sua voz me tirou do transe e chacoalhei a cabeça. — Não é nada, eu que agradeço por… me defender. — ele me lançou um sorriso e tirou a mão da minha cintura. Voltei para a minha sala tentando parecer calma, mas cada célula do meu corpo pedia mais um pouco dele. Aquilo era loucura, talvez fosse a carência da separação, apesar que eu e David já não fazíamos amor há tanto tempo que até a carência passou. O que ficou claro, é que como sempre desconfiei, Filipe não se sentia atraído por mim.Toda a confusão significava
O canalha sênior nem mesmo me beijou! Era só nisso que eu conseguia pensar enquanto andava de um lado para o outro no quarto de hóspedes da Regina. Outra coisa na minha vida que eu precisava resolver. Eu fui completamente imatura, irracional e inconsequente. Como eu iria olhar na cara dele no dia seguinte? Onde eu estava com a cabeça? Com certeza faltou sangue no cérebro após aquele aperto no meu pulso, só isso explicaria minha insanidade em transar com meu chefe no elevador do prédio. Regina bateu à porta, sabia que era ela pois também me chamou. Deixei ela entrar, mas não contaria a verdade, estava com muita vergonha de mim mesma pelo o que aconteceu e guardaria isso à sete chaves. — E então? Ficaram presos no elevador, não me diga que nada aconteceu. — Nada aconteceu. Filipe não me vê dessa maneira, trabalho para ele há quatro anos. — me levantei para não ter que olhar para ela enquanto mentia. — O que aconteceu hoje foi mera consideração. E eu realmente acreditava nisso. —