⊶ 04 ⊷

Brayan, olhando para o livro que tinha acabado de tirar da prateleira, virou a esquina entre as estantes e colidiu com uma pessoa que estivera esperando pela oportunidade de encontrá-lo sozinho. Ele olhou para cima, assustado, e então imediatamente revirou os olhos.

— Duarte! Eu já disse umas mil vezes para não ficar se escondendo entre as estantes.

— Brayan — sibilou o garoto um pouco mais alto e magro, tão pálido que era quase translúcido, a única cor nele estando em seus lábios (vermelhos do perpétuo morder nervoso) e o curto cabelo preto contrastando poderosamente com sua pele. Ele estava abraçando uma enorme enciclopédia com um pentagrama na capa. — Eu preciso falar com você!

— Eu achei que você estava proibido de entrar na biblioteca. — Brayan piscou. Ele imaginou que alguém jogando sal grosso nas estantes era o tipo de incidente que os funcionários da biblioteca não perdoavam.

Duarte acenou como se não fosse nada, irritado.

— Que seja, eu ainda preciso do meu material de pesquisa. Estou quase conseguindo exorcizar a torre do sino da igreja de uma vez por todas.

— Olhe, Duarte, por mais interessante que isso seja… — Brayan revirou os olhou e olhou para a bibliotecária que estava começando a se perguntar de onde o barulho vinha. — …

Eu preciso voltar para o meu trabalho de geografia.

— Eu preciso falar com você sobre o garoto novo.

— Klaus? — Brayan olhou para ele enquanto voltava para a mesa onde estava trabalhando. — O que tem ele?

— Ele vai morar em Bourbon, não é? Você não deveria me consultar antes disso? E se tiver algo maligno em um dos quartos vazios? Você se lembra daquela vez que Raul entrou em um dos armários em um quarto vazio e saiu correndo e gritando?

— Primeiro, Raul tem a tendência de exagerar em tudo por ser tão atraente para qualquer coisa perigosa — respondeu Brayan calmamente, anotando com extremo detalhe as áreas tropicais detalhados no livro. — E, segundo, Raul não entrou em um armário, ele entrou em um dos banheiros para pegar alguns materiais de limpeza que estavam lá, tropeçou e a cortina do chuveiro caiu em cima dele. É claro que ele ia sair correndo e gritando.

— Eu ainda estou convencido de que era um poltergeist — resmungou Duarte.

— Isso ainda não me explica o que você queria falar em relação ao Klaus.

— Ele é estranho… — disse Duarte finalmente. — É preocupante. Poderia ser perigoso. Quase suspeito.

Brayan o observou com atenção agora, apesar de erguer uma sobrancelha.

— Sério. Como? Você viu ele emitir uma aura magenta brilhante?

Duarte mexeu-se inquieto, arranhando a lombada do livro com suas longas unhas.

— … não, ele parecia terrivelmente infeliz.

Brayan finalmente parou de olhar o livro com isso.

— O que você quer dizer com "infeliz"?

— Tá, não completamente "infeliz". Mais… perdido. — Duarte pausou por um instante, e então arregalou seus grandes olhou negros que estavam preenchidos por terror. — Ele não está possuído, está? Nós não precisamos de nenhum outro espírito vagando por aqui!

Brayan desmentiu a acusação quase irritadamente, convocando paciência sobre-humana.

— O que faz você dizer que ele está perdido?

— Eu estava na aula de Estudo de Ecologia e Ambiente com ele. Ele ficava olhando para as partículas de poeira flutuando. Ele nem estava prestando atenção ao sr. Narciso. E só um verdadeiro suicida não presta atenção ao sr. Narciso quando ele está falando sobre o que cai na prova!

— Garotos!

Os dois pularam quando a bibliotecária apareceu ao lado dos seus cotovelos, com uma careta de desaprovação.

— Se vocês precisam continuar assim, vocês vão ter que sair e parar de perturbar os outros estudantes!

Brayan decidiu não dizer para ela que os outros dois alunos na biblioteca estavam solidamente adormecidos nos seus cubículos.

— Desculpe, sr. Anthony.

— E sr. Hazel, o que você está fazendo aqui? E com esse livro de novo!

De olhos arregalados, Duarte fugiu instantaneamente, correndo como um antílope, seu blazer aberto flutuando atrás dele como uma capa e ainda levando o livro consigo. Brayan pegou sua própria mochila e partiu mais lentamente, pegando seu Blackberry. Uma pequena reunião de emergência era necessária.

— Brayan, ele está aqui há um dia — disse Dimitri quase desesperado sobre o grande copo de café que ele estava tomando. — É natural que ele esteja… confuso.

— E depois de ser atacado por aqueles dois mais cedo… — Wen indicou o polegar na direção dos gêmeos, que estavam sentados na mesma mesa. Eles agiram como se Wen os tivesse mortalmente atacado com a acusação. — E por que, oh por que você escutaria o Duarte? Esse é o cara que carrega um spray de água benta para qualquer lugar que ele vá "só de garantia".

— Mas o Duarte é observador — protestou Brayan. — Porque até ele realmente ter se ajeitado, ele pode cancelar a transferência, então eu não quero Klaus repensando sua decisão de se mudar para cá depois de apenas vinte e quadro horas.

— Ele vai fazer isso hoje e amanhã, até que se acostume com tudo — disse Dimitri sensivelmente, pegando alguns guardanapos para limpar sua parte da mesa. — Quando você se transferiu…

— Shh! — Corando um vermelho profundo, Brayan jogou seu café nele, evitando que o assunto fosse abordado novamente.

Wen afastou ele de Dimitri.

— Eu considerei um momento decisivo quando finalmente conseguimos que você falasse. Só para descobrir que você era completamente apaixonado pelo Tom Felton. — Ele soltou um suspiro profundo e sofrido, como um veterano sobrevivendo de uma guerra. — É como se tivéssemos aberto uma barreira e não conseguíssemos fechar ela de novo…

Os gêmeos já estavam se engasgando nos seus cafés frappés, rindo demais para ser coerentes, precisando se segurar um no outro para não caírem. Brayan fuzilou-os com o olhar com toda a força que podia dominar na sua corrente avalanche de emoções (ansiedade, embaraço, e o profundo desejo de decapitar um dos seus ditos "amigos") e disse:

— Nós precisamos fazer algo para ele se sentir melhor.

— Que tal alguns jogos… — perguntou Wen, cedendo ao seu claramente encantado vocalista. — Podemos jogar RockBand de novo.

— A gente não pode mais jogar RockBand na sala comunal — Dimitri lembrou-o. — O incidente com o esfregão e o pato de estimação do sr. Teodoro? — Todos na mesa estremeceram.

— Que tal paintball? — disseram os gêmeos em coro.

— Não. Também não podemos mais jogar paintball dentro da casa. Charlie nem saiu do hospital ainda.

— Fazer um bolo?

— O teto da cozinha ainda está queimado.

— Tem que ter alguma coisa que a gente possa fazer que não vá causar dano de propriedade — resmungou Brayan em um daqueles momentos em que ele desejava morar um dormitório mais silencioso.

Todos estavam em silêncio por um momento, ou pensando sobre o que podiam fazer por Klaus ou sobre o que podiam fazer, já que a maioria dos seus passatempos estavam sendo banidos um por um. Foi então que os gêmeos sentaram-se retos, como se estivessem ganhando raios gêmeos sobre suas cabeças. Eles piscaram um para o outro e assentiram, e então olharam para Brayan.

— Nós temos uma ideia — disse Eliel.

Elói assentiu.

— Mas temos que começar agora, se a gente não quer se atrasar para o encontro dos Hall’s Babbler.

Klaus tinha recebido uma mensagem de um estudante mais cedo que um tal de sr. Gael Hideki e uma tal de Stella Martini requeriam a presença dele mais cedo na segunda sala de música para que pudessem conhecê-lo formalmente pela primeira fez. Sua garganta ficando seca, ele reconheceu os nomes como o diretor do coral e a professora de música orientadores dos Hall’s Babbler, e que a segunda sala de música era também, quase oficialmente, "o Saguão dos Hall’s Babbler".

Como se isso não fosse o bastante, uma mensagem apareceu no seu iPhone durante a última aula:

Klaus, algo importante surgiu nos dormitórios. Mas eu definitivamente vou estar na reunião dos Hall’s Babbler com você. Te encontro lá. — Brayan

Isso deixou Klaus no corredor sentindo-se um pouco ansioso e olhando para seu celular como se quisesse que ele transmitisse a falta de Brayan para que ele aparecesse o mais cedo que fosse humanamente possível. Ele nunca tinha sido daqueles que ficavam ansiosos ou nervosos em relação a algo do tipo (ele tinha certeza que podia derrotar aqueles garotos com a sua "divanisse" se precisasse), mas ele tinha visto os Hall’s Babbler se apresentarem e eles pareciam como uma unidade sólida que funcionavam entre si sem barreiras.

E com as Seccionais chegando em uma semana, se ele não conseguisse se provar capaz de se adaptar ao estilo deles, eles poderiam pensar que ele não estava pronto para o desafio. O estilo deles era definitivamente diferente do das Alvorada.

E se ele não podia ao menos estar no coral…

Ele olhou ao redor dos imponentes, enormes corredores e suspirou. Ele poderia ter se sentido deslocado em Hill City, mas ele também não se encaixava aqui ainda. Não pela primeira fez, ele sentiu aquele doloroso aperto de dúvida, e então de culpa. Todos acreditavam nele, e ainda assim aqui ele estava, reclamando. Ridículo. Isso era completamente nãofabuloso.

Seu telefone começou a vibrar no seu bolso, e ele o pegou para ver que era uma ligação.

De Rute Barbieri.

Bom, isso era… surpreendente.

Klaus olhou ao redor e se escondeu num corredor próximo as colunas que saiam para os jardins. Ele atendeu à chamada, levando o celular para o ouvido, incerto do que realmente esperar.

— Rute?

— A-hem — pigarreou Rute, parecendo estar a uma distância significativa. Quando ela falou, ela não estava falando com ele. Ele a ouviu dizer: — Tudo bem, ele atendeu! Todos vocês, pareçam vivos! Vamos lá!

Era o tom mandatório de sempre, e ele ouviu, no fundo, o som de um resmungo secundário — "Ele não consegue nos ver de verdade, Rute" — dos garotos, e risadinhas das garotas, e o som de passos. O coração de Klaus pulou para a sua garganta. A chamada era no viva-voz do celular de Rute e todo o coral de Meliano estava lá.

— Klaus! — chamou Rute de onde estava, soando imensamente satisfeita consigo mesmo. — Eu… — Filipe tossiu para isso, e Rute fez um som impaciente — Quer dizer, nós temos algo para você.

— O quê? — Klaus quase riu, incapaz de confiar em seus ouvidos.

— Esperamos que você goste! — disse Tauane alegremente, e ele podia ouvir a risada na voz dela.

Ele mal conseguia acreditar no que estava acontecendo.

— O que vocês…

A música começou a tocar, lenta e gentil. Klaus escutou, apertando o celular contra seu ouvido. Uma luz de reconhecimento veio quando ele reconheceu as notas, e então o coral começou a cantar.

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