Sophie Narrando
Eu posso dizer que esse primeiro dia foi um verdadeiro teste. E, sinceramente? Acho que passei. Meu Deus, que homem difícil! Não que ele seja péssimo, longe disso. É educado, cortês até, mas é fechado, sério, sem expressão nenhuma. Quando abre a boca, parece que cada palavra é medida, e dita como se fosse um chicote estalando no ar. Apesar disso, preciso reconhecer: ele é extremamente profissional. Exigente, sim. Mas também justo. Durante a visita à obra, estávamos naquele container que funciona como escritório, apertado, abafado e com cheiro de café velho, quando algo inesperado aconteceu. O engenheiro responsável pela obra, um tal de Rafael Mendonça, me olhou de um jeito estranho. Daqueles olhares que fazem a gente querer sair correndo pra tomar banho e se livrar da sensação ruim. Arrepiei inteira. Tentei disfarçar, focar nos papéis, fingir que não percebi. Mas acho que o senhor Ferraz percebeu. Sem dizer uma palavra, ele se levantou da cadeira, veio até onde eu estava e, de forma completamente estratégica, ou talvez instintiva, se posicionou bem na minha frente, de costas para mim, praticamente colocando a bunda na minha cara. Por um segundo, eu congelei. O engenheiro arregalou os olhos, perdeu a cor do rosto e baixou imediatamente o olhar. Sério, se eu fosse ele, teria enfiado a cabeça debaixo da terra. Que vergonha! Depois disso, o homem não teve coragem nem de respirar perto de mim, quem dirá encarar o meu rosto de novo. E o pior é que, por dentro, eu queria rir. Mas mantive meu profissionalismo. Respirei fundo, ajeitei a prancheta na mão e fingi que nada tinha acontecido. No caminho de volta, dentro da caminhonete, o silêncio predominou. Como sempre. Mas dessa vez, havia um certo ar satisfeito? Ao chegar em frente ao condomínio onde moro, ele parou o carro e falou, sem nem olhar pra mim: — Seu dia acabou por hoje, senhorita Sophie. — Obrigada, senhor Ferraz. Até amanhã. Desci do carro com a sensação de que, mesmo sem palavras, ele tinha se colocado no meu lado. Talvez ele não seja tão frio assim. Ou talvez seja só o jeito dele. Mas uma coisa é certa: eu posso ter tido um dia tenso, mas já entendi que, nesse lugar, ninguém vai me intimidar. E enquanto eu tiver esse CEO carrancudo me dando cobertura, que venha o próximo teste. Depois de toda aquela situação estranha com o senhor Ferraz, eu precisava contar pra alguém. E claro, quem melhor do que Elizandra? Assim que chegamos em casa, ainda rindo da minha cara de boba, me joguei no sofá e comecei a falar cada detalhe. Ela me ouvia com atenção, até que começamos a rir juntas. Era inevitável. A cena, por mais constrangedora que tenha sido, se tornou engraçada na minha cabeça conforme eu contava. Elizandra sempre teve esse dom de transformar qualquer tensão em algo leve, fizemos macarrão cremoso, jantamos juntas. Depois de muito riso e comentários maliciosos da parte dela, me despedi e fui dormir. Ou pelo menos tentei. No meio da madrugada, despertei assustada. Meu peito estava apertado, a respiração acelerada e um frio inexplicável percorreu minha espinha. Outro pesadelo. Isso me acompanha desde criança, não toda noite, mas quando vem, é sempre intenso. Eu me sentei na cama, respirei fundo e, como uma menina pequena em busca de segurança, caminhei até o quarto da Elizandra. Ela estava deitada de lado, mas assim que me viu na porta, levantou o lençol pra eu entrar. Não disse nada. Ela sabia. Sempre sabe. Me aninhei ao lado dela, sentindo aquele conforto silencioso de quem entende mais com um gesto do que com palavras. Logo peguei no sono novamente. Fui acordada pelo toque estridente do despertador da Elizandra. Abri os olhos devagar, piscando contra a luz fraca que entrava pela fresta da cortina. — Bom dia, dorminhoca — ela disse, com a voz ainda rouca de sono. — Bom dia — respondi, me espreguiçando. Voltei para o meu quarto e comecei minha rotina matinal. Tomei um banho morno para espantar os últimos vestígios do pesadelo, lavei o rosto com meu sabonete de chá verde, escovei os dentes e fui para frente do guarda-roupa escolher meu look. Hoje eu queria algo confortável, mas que ainda transmitisse profissionalismo e elegância. Optei por uma calça de alfaiataria preta, de corte reto e cintura alta. Combinei com uma blusa de seda branca, de mangas longas e decote em V discreto. Por cima, um blazer cinza-claro, ajustado na cintura. Nos pés, um salto agulha preto também, Prendi meu cabelo em um coque baixo, deixando alguns fios soltos para dar um ar mais leve. Finalizei com brincos pequenos de pérola e um leve toque de perfume. Meu horário era às 8:00, mas às 7:40 eu já estava entrando na empresa. Ontem tinha sido ainda mais cedo, a ansiedade me empurrou porta afora. E por incrível que pareça, hoje, mesmo com a madrugada mal dormida, estava mais calma. Logo que entrei, cumprimentei a secretária com um sorriso. — O senhor Ferraz já chegou? Ela apenas balançou a cabeça, afirmando, e sorriu. — Ele é um dos primeiros a chegar, todos os dias — comentou. Respirei fundo. Isso quer dizer que eu terei que me habituar a chegar ainda mais cedo. Se eu queria ser uma boa secretária, preciso me destacar, e acompanhar o ritmo dele seria um bom começo. — Certo... — murmurei para mim mesma, ajeitando a alça da bolsa no ombro. Caminhei em direção à minha mesa, observando o movimento do andar. Ainda estava tudo silencioso, poucas pessoas haviam chegado. Mas ele já estava ali, como um fantasma que habita o próprio império. Me Sentei, organizei meus materiais e já fui conferir a agenda dele, todos os compromissos são internos, só que hoje tem bastante reuniões. Me levantei com o tablet e a agenda na mão, assim que levantei a mão para bater na porta, ele abriu e nos encaramos, o Olhar dele parecia querer atravessar a minha alma. Sim, esse emprego vai ser mais desafiador do que imaginei...Ethan Narrando O relógio marcava 5h30 quando o alarme tocou. Me levantei sem hesitar. Uma rotina rígida me acompanhava há anos, e hoje não seria diferente. Após uma corrida leve de trinta minutos na esteira, tomei um banho gelado, uma prática que mantinha minha mente alerta. O espelho embaçado do banheiro refletia meu semblante inexpressivo. Sequei o rosto, ajeitei o cabelo com precisão e vesti um terno cinza escuro alinhado, camisa branca impecável e gravata azul-marinho. No closet, ajustei o Rolex no pulso, calcei os sapatos italianos e conferi os documentos na pasta de couro. Um último olhar para o espelho. Postura reta. Olhar firme. Estava pronto. O carro me esperava na garagem. Durante o trajeto revisei relatórios no tablet, enquanto o motorista seguia em silêncio. Ao chegar à sede da Ferraz Engenharia, subi direto para o andar da presidência. Hoje o Jhon chega de suas férias, ele fez uma viagem internacional para descansar, mas conseguiu fechar um negócio milionário. Vamos c
Ethan Narrando O dia foi um verdadeiro pandemônio. Não parei nem por dez minutos. Entre reuniões, ligações e visitas inesperadas, a agenda parecia cada vez mais fora de controle. No meio do caos, liberei a Sophie na hora do almoço, mas pedi que, assim que terminasse de comer, voltasse direto para a empresa. Sua hora de almoço seria devidamente recompensada como hora extra. Ela não reclamou, como sempre, eficiente e profissional.Jhon, que andava por perto, se ofereceu para almoçar com ela, provavelmente numa tentativa de escapar da sala quente de reuniões, mas mandei ele entrar comigo no escritório. Pedi para a Sophie, antes de sair, solicitar dois pratos executivos e mandar entregar na empresa. Ela fez isso com a agilidade de sempre e, em poucos minutos, já estava fora.Fechei a porta, puxei a cadeira e encarei Jhon, que já tinha um caderno de anotações aberto na mesa.— Vamos direto ao ponto — comecei, soltando um suspiro cansado. — O projeto da filial em Salvador está travado. O e
Sophie Narrando Nunca imaginei que fosse fazer uma mala tão rápido. Mal tive tempo de entender que realmente ia viajar com o Sr. Wilker e outro engenheiro, e já estava com a cabeça a mil, segundo dia de trabalho, e já recebo essa missão tão importante. O Senhor Ferraz havia me mandado uma mensagem dizendo que o motorista estava a caminho da minha casa para me levar direto ao aeroporto. Não sabia se essa viagem seria rápida ou não, então joguei umas roupas básicas, documentos, meu tablet, o carregador, alguns itens de higiene e finalizei com um blazer, por precaução. Tomei um banho correndo, me arrumei com uma roupa confortável, porém apresentável, e desci com a mala de rodinhas na mão.Ainda deu tempo de mandar uma mensagem para Elizandra:— Liz, vou viajar a trabalho, o Sr. Ferraz me avisou de última hora. Te explico depois, beijo!Na portaria, fiquei esperando o motorista que chegou em menos de dez minutos. Entrei no carro e seguimos em direção ao aeroporto, em completo silêncio.
Ethan Narrando Trabalhei a tarde inteira, mas minha mente insistia em me trair. Por mais que tentasse focar nos relatórios, contratos e projeções, os rostos de Jhon, Pedro e Sophie me invadiam a cada minuto. Eles estavam a caminho de Salvador para resolver o impasse da obra embargada, e eu odiava depender de terceiros, mesmo quando esses terceiros eram minha melhor equipe.Já era começo da noite quando Clara entrou na minha sala.— Doutor Ethan, estou indo. Já deu meu horário.Levantei os olhos por um segundo e apenas assenti com a cabeça. Clara já estava acostumada com minhas respostas curtas. Às vezes, um gesto meu valia mais do que mil palavras. Ela saiu sem esperar mais nada.Olhei para o relógio. Oito da noite e nenhuma posição concreta. Peguei o celular e enviei uma mensagem para Sophie.— Alguma novidade?A resposta veio quase instantaneamente.— Ainda estamos em reunião.Isso só aumentou minha inquietação. Reunião às oito da noite. Algo estava mais complicado do que previmos.
Sophie Narrando Saímos da reunião sem avanço algum. Nenhuma novidade, nenhuma definição, nenhum acordo. O clima era pesado, e mesmo o Pedro, que geralmente tenta suavizar o ambiente, parecia desanimado. Sr. Wilker já foi direto:— Ethan, não vai gostar nada de saber disso.Dei um passo à frente, mantendo a postura profissional, mas já um pouco incomodada com aquele clima de tensão.— O Sr. Ferraz me mandou mensagem durante a reunião, e eu preciso dar um posicionamento para ele.Sr. Wilker apenas me olhou com expressão cansada e disse:— Só diga que mais tarde eu ligo pra ele.Assenti. Assim que saímos do prédio, mandei a mensagem. Curta, objetiva, clara. E como de costume, a resposta dele veio do mesmo jeito: seca.“OK.”Sem pontuação, sem emoji, sem nenhuma pista de humor ou reação. Apenas aquilo. OK. Tão Ethan Ferraz.Seguimos para o hotel. Eu já estava subindo no elevador quando Sr. Wilker nos chamou.— Ei, vocês dois! Que tal jantar comigo? Tem um restaurante aqui perto, culinári
Ethan Narrando O som do despertador cortou o silêncio do quarto às 5:30 em ponto. Me levantei sem hesitar. Nunca gostei de perder tempo. Fiz minha rotina matinal com precisão: banho gelado, barba feita, terno impecável. Às 7h em ponto, desci para o café. A reunião estava marcada para as 9h, e eu precisava revisar, pela última vez, a proposta que elaborei na madrugada.Pedro e John chegaram quase juntos. Automaticamente procurei Sophie com os olhos, mas ela não estava ali.— Cadê a Sophie? — John perguntou enquanto se servia de café.Pedro deu de ombros.— Ainda não a vi. Posso mandar uma mensagem pra ela, se quiser.Balancei a cabeça.— Deixe ela descansar. Ela cumpriu muito bem o papel dela ontem à noite.Nos sentamos e começamos a comer. Conversávamos sobre os ajustes finais da proposta quando senti uma presença se aproximando. Levantei o olhar, e lá estava ela.Sophie entrou no restaurante com a postura impecável de uma secretária executiva, do tipo que faz homens perderem o foco
Sophie Narrando Aquele foi, sem dúvida, um dos cafés da manhã mais difíceis da minha vida. Eu sentia os olhos frios do Sr. Ferraz em cima de mim, analisando cada movimento meu como se eu fosse mais um relatório técnico a ser revisado. Ainda assim, comi em silêncio, enquanto eles conversavam sobre a obra, propostas, termos técnicos, conversa de engenheiro. Como não entendo muito do assunto, achei melhor ficar calada e apenas observar.Assim que terminamos de comer, o Sr. Ferraz abriu o notebook e já começou a mostrar a proposta para o Sr. Wilker e o Pedro. Fiz anotações dos pontos que considerei importantes, com base nas experiências que já tive. Grifei onde achei que deveríamos prestar mais atenção e até refiz um gráfico, destacando os itens que, na minha opinião, pareciam mais críticos naquele momento.Fomos para a sala de reuniões do hotel, a que havia sido reservada exclusivamente para esse encontro. O fiscal da prefeitura já estava lá. Era tão gentil e educado quanto o Sr. Ferraz
Ethan Narrando Passei a manhã inteira em minha suíte, concentrado nos relatórios do último trimestre dessa Obra, antes do embargo. O silêncio era necessário. Não suporto interrupções, especialmente quando estou imerso em números e decisões que movimentam milhões. Só desci para o almoço porque seria grosseiro demais faltar. Almoçamos eu, John, Sophie e Pedro. Conversas superficiais. Pedro falando de investimentos, John fazendo piadas, e Sophie, apenas observando. Ela tem esse jeito silencioso de analisar tudo ao redor, mas seus olhos entregam mais do que ela imagina.Assim que terminamos, voltei para minha suíte. Não pretendia ser interrompido novamente, mas, claro, John não entende limites.Ele apareceu como sempre, batendo até que eu abrisse.— Você tá pegando pesado com a Sophie — ele disse, cruzando os braços como se fosse meu juiz.— Isso é coisa da sua cabeça — respondi, seco. E voltei para a mesinha, onelde meu notebook estava aberto.— Não, Ethan. Eu te conheço. E você tá mex