Capítulo 64 Don Alexei Kim Caminhei pela casa até encontrar Hélio no escritório principal, sentado à frente do computador com os óculos levemente tortos no rosto. Combinei com ele de fazer um jantar, pedi para que convidasse apenas quem Malu gosta, e o resto eu cuidaria. — Nazar! — chamei, e ele apareceu na porta segundos depois, a postura rígida e os olhos atentos. — Sim, Don. — Hoje à noite teremos um jantar. Quero que coordene a segurança e avise aos responsáveis para organizarem a casa. Nada pode sair do lugar. Entendido? — Sim, senhor. Algo mais? — Sim, Neide. Ela vai te ajudar, hoje. Nazar assentiu e saiu sem questionar, como sempre. Ele era eficiente, ainda que sua personalidade às vezes irritasse Malu. Depois de passar as instruções, fui até a cozinha. Neide estava organizando o café da manhã. — Neide, leve essa bandeja para o quarto da minha mãe. Maria disse que ela estava sonolenta mais cedo. Certifique-se de que tomou os re
Capítulo 65 Don Alexei Kim Acordei com uma estranha sensação de vazio ao meu lado. Estiquei a mão, ainda sonolento, mas Malu não estava na cama. Franzi o cenho, levantando-me de imediato. Apesar do cansaço acumulado pela noite, algo parecia errado. Malu não costumava sair do quarto sem avisar, especialmente àquela hora. Calcei os chinelos e fui direto procurá-la. Desci o corredor em direção ao quarto da Sofia, mas a pequena dormia e Neide também. Fui na direção ao quarto que a minha mãe estava. Ao abrir a porta, a cena que encontrei me deixou surpreso. Malu estava de pé ao lado da cama da minha mãe, enquanto um homem estranho mexia em alguns papéis sobre a mesinha. A postura dele era descontraída, mas firme, como alguém que sabia o que fazia. Zaia estava mais ao fundo, escorada na parede, visivelmente tensa. O rosto dela estava tão pálido que parecia uma folha de papel. — Quem é ele? — questionei. Malu se virou, segurando um copo vazio na mão. Ela parecia tr
Capítulo 66 Don Alexei Kim A sala estava mergulhada em um silêncio, quebrado apenas pelo som das teclas sendo pressionadas por Fred, enquanto ele e Malu analisavam as imagens das câmeras. Meu pai estava ao lado dela, com os braços cruzados e a expressão severa. Ele não era um homem de demonstrar nervosismo, mas a tensão no ar era impossível de ignorar. Eu me recostei na porta, tentando acalmar a raiva que fervilhava em meu peito. Minha mente estava fixa em Anton, no quanto ele nos manipulou, no quanto ele quase destruiu tudo o que construí. Eu não conseguiria descansar até ver aquele traidor diante de mim. — Aqui — disse Malu, sua voz firme enquanto apontava para a tela. — Ele esteve nesse prédio ontem à noite. As câmeras externas captaram sua saída por volta das 22h, e pela ligação tem uma mulher lá. Estranho é que puxando as imagens que temos, ele não saiu. E seu pai disse que o viu de manhã... Fred ampliou a imagem, ajustando o ângulo para mostrar um estacionamen
Capítulo 67 Don Alexei Kim Malu mantinha os olhos no tablet, analisando cada detalhe com precisão cirúrgica. Não parecia hesitante, mas sim completamente segura. Isso me deixou inquieto e, ao mesmo tempo, mais confiante na decisão. — Se estivermos certos, ele estará lá com pelo menos dois homens — ela falou, ainda olhando o mapa. — Não subestimem o Anton. Ele é astuto, não estará sozinho, com certeza. — Não se preocupe, ele não vai escapar dessa vez — respondi, seco, enquanto destravava a pistola no meu colo. O trajeto até o depósito levou cerca de dez minutos. O local era típico de alguém que queria desaparecer: isolado, pouco movimentado e estrategicamente próximo ao porto. Assim que nos aproximamos, dei a ordem para apagar os faróis. Paramos cerca de 200 metros antes da entrada. — Nazar, leve três homens para a lateral. Quero cobertura. Eu e Malu entraremos pela frente com o restante. Quero ele vivo, mas não hesitem se for preciso derrubar algum soldado.
Capítulo 68 Don Alexei Kim Malu estava ao meu lado, concentrada, enquanto os soldados limpavam o caminho. O depósito era um labirinto de sombras e ecos, mas minha mente estava focada em apenas uma coisa: Anton. Ele já estava algemado, não ia escapar de novo. De repente, percebi um movimento rápido atrás de algumas caixas. Fiz sinal para que Malu e os outros parassem, mas antes que eu pudesse dar a ordem, senti alguém puxando minha manga. Era Ivete, claro, quem mais? De onde surgiu, caralho? — Tem outro ali! Tá se achando ninja, o safado! — sussurrou ela, apontando para o canto onde o homem tentava se esconder. Fechei os olhos por um segundo, tentando manter a calma. — Ivete, não é o momento pra... — Me deixa atirar, Don!? — ela me interrompeu com aquela confiança cômica que Malu contou que ela tinha. Já ajeitava a arma nas mãos como se fosse uma atiradora de elite. — Minha senhora me ensinou a mirar no peito pra acertar o pé, mas posso mirar no pé e acert
Capítulo 69 Don Alexei Kim Ainda sentia o cheiro metálico do sangue impregnado nas minhas mãos, mesmo depois de tê-las limpado. No carro, Malu estava ao meu lado, quieta. Ela segurava as próprias mãos com força, os dedos entrelaçados em uma tentativa desesperada de conter o tremor. Sua respiração era curta, quase imperceptível, mas eu via o esforço que fazia para manter a cabeça erguida. Minha mente estava uma merda. O que fiz com Anton... era necessário, mas aquilo não apagava o peso no meu peito. Ele era meu irmão, por mais que fosse um traidor. Só que Malu... Malu era tudo para mim, e ele ousou falar o que não devia, tocar em memórias que nunca deveriam ser revisadas, além de me trair de tantas maneiras, inclusive com... Selena. — Você está tremendo, Malu. — Quebrei o silêncio, sem tirar os olhos da estrada. Ela balançou a cabeça, como se quisesse negar, mas suas mãos a traíam. Estendi a minha sobre as dela, tentando transmitir alguma segurança, mesmo ainda suj
Capítulo 70 Maria Luíza Duarte As cicatrizes da noite passada ainda estavam ali, não apenas nas marcas invisíveis que Alexei carregava, mas também na tensão no ar. Eu podia ver a fúria latente em cada movimento dele, o jeito como os ombros permaneciam rígidos e como o maxilar se apertava. Ele não precisava dizer nada; eu conhecia cada nuance daquele homem. E naquele momento, ele estava à beira de explodir. Peguei sua mão enquanto caminhávamos de volta para os corredores. — Vamos buscar a Sofia. Ela deve estar acordada agora. — Minha voz saiu leve, tentando suavizar o peso que parecia esmagar Alexei. Ele olhou para mim de relance, ainda preso nos próprios pensamentos, mas assentiu. Chegamos ao quarto onde Sofia dormia sob os cuidados de sua babá, a Neide. A pequena estava deitada no berço, com as bochechas rosadas e o sono tranquilo que só os bebês parecem ter. Por um momento, o mundo pareceu parar. Peguei-a nos braços com cuidado, e aquele cheirinho de bebê me t
Capítulo 71 Maria Luíza Duarte Com Sofia no colo, acompanhei dona Olga em direção ao meu quarto. Ela caminhava devagar, apoiando-se levemente na parede, enquanto eu mantinha o passo ajustado ao dela. Esse silêncio profundo entre nós me incomoda, que pena a dona Olga não poder falar. Eu sentia que, de alguma forma, ela estava mais presente, mais conectada ao momento do que em qualquer outra ocasião. Quando chegamos, ajudei-a a sentar na poltrona próxima à janela. A luz suave do sol iluminava seu rosto pálido, e ela fechou os olhos por um instante, respirando fundo. Era como se, por breves segundos, ela estivesse se reconectando com o mundo ao seu redor. Ajeitei Sofia no carrinho ao lado e me sentei diante de dona Olga, segurando uma caderneta e um lápis que peguei na cômoda. Meu coração batia acelerado. Precisava entender o que havia despertado nela aquele estado de alerta momentâneo no café da manhã. — Dona Olga, a senhora consegue escrever? — perguntei com cuidado,