Capítulo 2

Ele era um homem de hábitos matutinos. Gostava de acordar às primeiras luzes da manhã, quando o sol, ainda preguiçoso, começava a despontar lentamente no horizonte. Apreciava imensamente sentar-se à varanda da casa, observando os homens trabalhando, sabendo que em breve estaria com eles, nas tarefas diárias, mas, logo assim que despertava, precisava passar um tempo com uma caneca de café forte e sem açúcar na mão. Sentia que havia algo de muito tranquilizante naqueles momentos, pois tinha a oportunidade de pensar na vida.

            E a verdade era que ultimamente sua mente não parava um segundo.       

            Tinha muito no que pensar. Sentia falta do irmão, precisava proteger a sobrinha e agora ainda havia mais um pensamento em sua cabeça: a tia da criança.

            Meredith Hart era uma mulher difícil. Nunca pensara que seria simples, mas ao menos imaginava que a mulher lhe daria uma chance para conversarem e resolverem como cuidariam do bebê... juntos. Sim, porque ele estava disposto a negociar, a encontrar uma forma de os dois poderem participar do crescimento da criança. Contudo, apesar de compreender que ela também tinha direitos como tia, Gavin precisava começar a se munir de informações, caso tivesse que tomar atitudes mais drásticas. Não podia permitir que a pequena Madeline sofresse pelo orgulho de uma pessoa teimosa.

            Madeline... era um nome bem bonitinho. Pensar nisso fez com que seu coração se enchesse de carinho. Estava ansioso para conhecer a sobrinha. Não a via como um erro; pensava nela como uma esperança... uma perpetuação da lembrança de seu irmão.

            ― Querido, ele chegou...

            Gavin nem ouviu sua mãe se aproximando, mas sua voz o resgatou de seus pensamentos.

            Ouviu-a dizendo que a visita que esperava já tinha chegado, por isso, checou seu relógio de pulso. Já eram nove horas da manhã. Seria possível que tinha passado mais de quatro horas ali sentado?

            Levantando-se e esticando-se depois de tanto tempo sentado, do alto de seus um metro e noventa de altura, Gavin preparou-se para a conversa. Sua mãe ainda o esperava na soleira da porta, pronta para acompanhá-lo. Ele sabia que ela iria querer estar presente para ouvir o que o homem tinha a dizer.

            ― Tem certeza disso, querido? ― ela perguntou quando ele se aproximou dela e colocou o braço ao redor de seus ombros. Ela era bem menor do que ele, o que lhe inspirava um imenso senso de proteção. E era por causa dela também que estava disposto a lutar por uma participação mais ativa na vida da sobrinha. O rosto que ele tanto amava andava muito abatido desde a morte de Steve, e ele queria poder lhe proporcionar ao menos um pouco de alegria, mesmo que não compensasse a perda.

            ― Tenho. Não vou fazer nada precipitado... também não quero brigar com Meredith Hart. Quero apenas estar informado para o caso de ela dificultar as coisas.

            ― A menina não precisaria estar passando por tudo isso. Por que Steve mentiu que ela não era filha dele?

            Lá estava Winnifred Randall lutando contra as lágrimas novamente. Eram muitas emoções conflitantes açoitando sua alma. Gavin odiava aqueles momentos onde via sua mãe sofrer e não podia fazer nada a respeito. Sentia-se impotente.

            ― Não sei, mãe, mas vamos consertar tudo, ok? Eu prometo ― como se selasse a promessa, Gavin beijou a testa de sua mãe com ternura, e eles continuaram a caminhar pela casa enorme, até chegarem no escritório, onde um homem de meia idade já o aguardava.

            Todos os dois o cumprimentaram e sentaram-se. Havia certa formalidade na forma como se comportavam, afinal, o assunto era sério.

            ― O que trouxe para nós, Dr. Lee? ― Gavin iniciou a conversa. Não tinha tempo a perder.

            O advogado colocou sua pasta de couro sobre a mesa de madeira e abriu-a. Lá dentro havia alguns papéis e algumas fotos. Algumas delas eram de Meredith segurando uma criança no colo, outras de Meredith nos dois empregos e algumas da neném sendo cuidada por outra pessoa.

            Winnifred praticamente arrancou uma das fotos da mão do homem; uma onde o rosto da criança aparecia com mais clareza por causa de um zoom da câmera.

            ― Ah, meu Deus! Mas ela é tão linda! ― a mulher exclamou, cheia de emoção, referindo-se à netinha.

            Ignorando a mulher, os outros dois continuaram a conversa.

            ― Pelo que me disse, Sr. Randall, há muitas possibilidades de conseguir tomar a guarda da menina de Meredith Hart. Apesar de parecer gostar muito da criança, ela não tem condições financeiras para sustentá-la.

            ― E isso já seria suficiente em um tribunal? Por que até onde eu sei mulheres sempre levam vantagem nesses momentos... ― Gavin indagou.

            ― Sim, mas neste caso a Sra. Randall, como avó, seria uma possibilidade ainda mais plausível como tutora. É uma parente de sangue próxima e tem condições, não apenas financeiras, mas também toda uma estrutura muito mais favorável para a criação de Madeline.

            ― E como ficaria Meredith Hart nessa situação? Ela teria acesso à criança?

            ― Sim, como qualquer outra tia. A não ser que achem que ela possa ser uma ameaça, o que não me pareceu de acordo com a pequena investigação que fiz. Caso achem que ela maltrata a menina, podem recorrer a uma ordem de restrição.

            ― Não. De forma alguma. Não é o caso ― Gavin se apressou em responder. Com certeza Meredith não era uma ameaça à criança. ― Mas e se ela se recusar a um acordo? Se dificultar as coisas?

            ― Não há necessidade de acordo. Se entrarem na justiça, a causa é de vocês.

            "A causa"... como se Madeline fosse um produto com defeito ou um problema a ser resolvido. Era um ser humano, parte de sua família. Apesar de não gostar da forma como o advogado se referiu à sua sobrinha, Gavin continuou ouvindo-o com atenção.

            ― Se quiserem dar entrada no processo imediatamente, eu posso preparar a papelada... ― o homem falou.

            Por um momento, Gavin sentiu-se hesitante. Poderia simplesmente adiantar aquilo e minimizar as dores de cabeça, além de trazer Maddy para perto deles o mais rápido possível, o que faria sua mãe muito feliz. Contudo, havia mais uma pessoa nessa história toda e, apesar de ser ela a responsável pelas dores de cabeça, por estar prestes a dificultar tudo, ele compreendia que não poderia arrancar a menina dos braços dela como se não se importasse. Ele realmente se importava e não pretendia ser o vilão da história.

            Antes de responder qualquer coisa, porém, olhou para sua mãe, tentando, em silêncio, buscar sua opinião. A mulher logo balançou a cabeça negativamente, e ele chegou a sorrir. Não era a toa que eram mãe e filho; sempre foram muito parecidos, tanto fisicamente, com os mesmos cabelos negros, pele morena e olhos amendoados, quando nos gestos, na forma de falar e pensar. Por mais que estivesse ansiosa para conhecer a neta, Winnifred sabia que a paciência era um dom divino. Colocava-se no lugar de Meredith e não iria aceitar, de forma alguma, que tomassem atitudes drásticas antes de conversarem com a moça e tentarem um acordo.

            ― Não. Vamos esperar um pouco mais. Acreditamos que com uma boa conversa a Srta. Hart vai acabar cedendo.

            A expressão do advogado foi de puro cinismo. Ele visivelmente não acreditava que o que Gavin esperava fosse possível. Mas o cliente sempre tinha razão, não é mesmo? Por isso, ele aceitou o pedido dos Randall e retirou-se da casa assim que eles informaram que não tinham mais nenhuma dúvida.

            Logo que ficaram sozinhos, Gavin e Winnifred voltaram a discutir.

            ― Acha mesmo que essa é a coisa certa a se fazer? Será que não estamos piorando a situação? Quanto mais demorarmos a resolver tudo, mais tempo Madeline vai passar por dificuldades.

            ― Não acho que vamos conseguir nada à força. Não conheço essa moça, mas entendo o lado dela.

            ― Claro que entende. É tão teimosa quanto Meredith Hart ― Gavin falou com um sorriso no rosto e cruzando os braços, em uma atitude divertida.

            ― Sim, acho que somos parecidas ― Winnifred afirmou, olhando para a foto da moça à qual se referia. ― E ela é bem bonita, não?

            Poderia ser uma pergunta inocente, caso ele não conhecesse quem estava perguntando. E, claro, caso ele não sentisse o tom de malícia na voz de sua mãe.

            ― É... ela é bonita, mas há muitas mulheres bonitas no mundo...

            E, em uma atitude de pirraça, Gavin arrancou a foto da mão da mãe e saiu do escritório, deixando-a sozinha com um sorriso no rosto, que ele não reparou.

            A mente de Winnifred Randall também estava trabalhando a mil por hora.

Leia este capítulo gratuitamente no aplicativo >

Capítulos relacionados

Último capítulo