Sugestão única de trilha sonora para esse capítulo: "Try, Pink" Boa leitura e até o próximo capítulo, meus amores! ♥
84 Lisa Mary ⤝⥈⤞ —Desce do carro, anda logo. A gente tá sendo vista, cuida. Ela bateu a porta do carro e acendeu um cigarro entre os dedos. Espremendo os olhos, Charlotte se distanciava pouco a pouco do veículo. Parei. Alisei as mãos pelas coxas e expirei. Talvez não fosse tão ruim fugir com ela, mas eu a entregaria ao final dessa fuga e me entregaria para a corte da França. Percebendo meu atraso, Charlotte abandonou a conversa com o rapaz em sua frente e me olhou por cima dos ombros, expirando uma fumaça cinza. —Ôh, caralho! Tá esperando um convite? Desce logo do carro, Lisa Mary. —Ela parece ágil. —Disse o rapaz com tatuagens de aranha no pescoço. —Sim, ela é ótima. —Informou com seu sarcasmo. —Se você gosta de capachos que se fantasiam de espantalhos magricelos e cometem burrices durante seu trabalho. O sorriso que ela sustentou nos lábios foi o impulso para que eu descesse do carro com ódio. —Bom, de qualquer forma e droga da lancha tá aí. Aí, o dinheiro tá na maleta,
85 Lisa Mary ⤝⥈⤞ A lancha velejou por mais algumas horas até que finalmente chegássemos a uma ilha. Com a lancha ancorada, descemos da mesma carregando algumas malas com tamanho e traços padrões. Dentro havia munições, granadas de mão e algumas pistolas. Charlotte conhecia todo tipo de gente e, naquele dia, eu pude confirmar isso. —Okay, o que nós faremos agora, Charlotte? Joguei as malas no chão empoeirado e uma nuvem mínima de fumaça subiu na altura das minhas botas, escondendo o preto em manchas de cor cinza. —Nós esperamos o meu irmãozinho. Ficaremos apenas nós três aqui, porque faltou verba pra contratar homens que nos ajudassem nessa droga de ilha. —Ela jogou o corpo lento sobre uma poltrona mal-acabada e jogou os pés para cima. —Consegue sentir? Eu lhe lancei um olhar, confusa, e embiquei. —Não consegue sentir como é se sentir livre? Nós finalmente nos livraremos de Vicente e daremos um fim às suas ameaças. Viveremos como rainhas, longe de todos. Nós conseguiremos nova
86 Lisa Mary ⤝⥈⤞ Ele abriu os olhos, chamando por mim. Seu tom de voz me dizia tudo. Eu não era querida. —Filha da puta… Lisa Mary. Expirei. Quando me virei para ele, o percebi espremendo os olhos para acordar. —Irmãozinho! Finalmente, você acordou para a festa. Vamos lá! Se levanta, a gente precisa conversar bastante durante um tempo. Sabe, talvez ficar escondida não seja tão ruim, visto que estamos todos em família. —Charlotte. Agora não. —A olhei de relance. —Vicente, eu não tenho nada a ver com o seu sequestro- —Não fala comigo. —Ele se sentou e ergueu o dedo ofensivo para mim. —Ouviu? Assenti, encostando o queixo no peito. —Ah, qual é!? Vocês vão querer fazer briga de casal uma hora dessas? —Charlotte, você está muito encrencada e eu não falo por mim. —Ele pôs a mão no abdome, se queixando de dores, mas se mantinha rígido. —O sorriso no seu rosto vai sumir quando eu te disser o que está acontecendo com Estevan. E, a propósito, eu desconsiderei o acordo que fiz com você.
87 Lisa Mary ⤝⥈⤞ Ali deitada sobre a areia, sentindo as ondas quebrarem-se sobre os meus pés, eu me sentia confortável até com a luz do sol em meu rosto. A pele brilhava num amarelo intenso que parecia me trazer glitter, enquanto meus olhos de pálpebras trêmulas tentavam resistir ao calor. Ah, Vicente… Você é a única pessoa que me desperta, todos os dias, a vontade intensa de me redimir… Uma voz ao fundo, nas reflexões dos meus pensamentos, acabou me arrancando daquele transe, o que me forçou a me levantar e virar para trás. Era uma Charlotte acenando com o braço esticado pro alta chamando por mim. Nem tive tempo de pensar em recusar quando ela veio caminhando em minha direção, deixando passos de seus pés pequenos na areia fina. Ela se aproximou e apoiou as mãos na cintura, olhando-me de cima. Nem me incomodei em levantar. —Bom dia, piranha. Cadê o meu irmãozinho? —Olha pra minha cara. —Apontei o dedo para minhas faces. —Tá olhando? —Sim, o que tem de novo aí? —Eu tô com cara
88 Lisa Mary ⤝⥈⤞ “Não quero lágrimas caindo em meu rosto…” Ao chegar em meu quarto, tranquei a porta por dentro e respirei fundo, tomando coragem para assumir a minha decisão para mim mesma. Era loucura e eu precisava. Apoiei a mão no peito ouvindo o mar revolto lá fora. Fechei os olhos. Não tem volta. As janelas se abriram com o vento sem açoite. No interior das minhas pálpebras eu via a imagem dele me sacudindo pelos ombros e sua expressão desacreditada. Sentirei saudades de você, Vicente, até a própria saudade desbotar. ⤝⥈⤞ Minha última hora de liberdade. Tirei as botas, tirei tudo do que eu não precisava e saí do quarto descalça. Meus cabelos vermelhos e volumosos estavam esvoaçantes porque as janelas estavam abertas. Descendo as escadas, encontrei Vicente correndo em direção á cozinha. Mas que porra… Ele então retornou quando alcancei o chão da sala. Parou no corredor e controlou a respiração ofegante. —Não vai pra cozinha agora. Franzi o cenho e recuei a cabeça
89 Lisa Mary ⤝⥈⤞ Presa. A minha “chegada” à Metz foi algo de outro mundo. Vários repórteres queriam se aproximar e eu tive que ser escoltada até o presídio para aguardar julgamento lá mesmo. Não conseguiram me deixar na cadeia convencional. Charlotte ficou na cela ao lado e eu não tinha notícias sobre Vicente. Ele foi levado para o hospital e isso era tudo o que eu sabia sobre ele. O meu rosto e o de Charlotte estavam estampados em todos os jornais e mídias sociais. Nós éramos, finalmente, um assunto que explodiu. —Eu odeio você. —Seu tom de voz era embargado pelo desânimo. Ela recostou-se nas grades de sua cela e pôs as mãos sobre os joelhos dobrados. Sentada no chão, suas costas se afundavam entre uma barra de ferro e outra. —Eu sei. Eu também- —Nem vem. —Expirou. —Isso é tudo culpa sua e agora o meu irmão tá lá num hospital. Eu nem sei como ele está, eu nem soube nada sobre Estevan também. Lisa Mary, eu queria muito cortar o seu pescoço com uma faca, agora. —Você nunca se im
90Vicente François⤝⥈⤞Recuperação lenta. Eu não pensei que pudesse, tanto, querer ficar na cama de um hospital. Porém, por muitos meses eu fiquei, demonstrando zero vontade em me recuperar. Certo dia, meu pai me visitou sem minha mãe, ela estava esperando do lado de fora.—Pare de xavecar minhas enfermeiras, É uma perda de tempo e pensei que você fosse casado com minha mãe. —Brinquei, abrindo apenas um olho para meu pai. Ele me deu um sorriso de canto de boca que pareceu restaurar as minhas configurações, e então arfou.—É bom saber que não perdeu o senso de humor, apesar de ter perdido a vontade de se levantar daí. —Ele esfregou as mãos e foi em direção à poltrona ao lado da minha cama. —Sabe, meu filho, sua mãe e eu estamos preocupados com você. O que aconteceu? Porque não quer se recuperar e insiste em dar trabalho às suas enfermeiras e médicos?—Eu não me importo com a porcaria do ferimento, só queria que não fosse real.—O quê?—A minha história. —Arfei. —Eu sei, eu estou paga
91Vicente François⤝⥈⤞Mal pude controlar o celular me minha mão, quem dera pudesse controlar o que eu estava sentindo naquele momento. Acordei com o meu pai segurando minha cabeça sobre suas pernas. Nós estávamos no chão. Sentia o cheiro de canela se espalhando pela sala e meus olhos foram se abrindo. A luz solar no ambiente reluziu entre os cabelos grisalhos de meu pai, enquanto eu o olhava numa visão inferior.—Eu… —Gemia. Confuso, tentava assimilar a realidade com a notícia que havia recebido, e minhas configurações foram se restaurando aos poucos.—Precisa descansar, o que houve? O que lhe disseram ao telefone, filho? —Perguntou, com a mão em meu rosto.—Pai… Eu preciso ir até o presídio. —Arqueei as sobrancelhas e me esforcei para me sentar. Sentia a dormência percorrendo toda a minha panturrilha, mas me esforcei para parecer um pouco mais forte. —Tem algo que eu preciso saber e ver de perto.—Do que está falando?—Eu falo com você quando… Quando eu voltar. —Pus as mãos no chão