(Sophia)
O último sinal havia tocado e não demorei a sair da sala, Charlie me acompanhou até mesmo no caminho para casa. Vez ou outra o garoto fazia alguma idiotice apenas para que eu desse risada, e dava muito certo.
—Então, o que acha de a gente sair a tarde? Dar uma volta ou algo assim. – perguntou assim que chegamos em frente a minha casa.
—Desculpa, mas não vou poder. Tenho que ir trabalhar daqui a pouco. – o sorriso que tinha no rosto se tornou triste em segundos e engoli em seco me sentindo mal por aquilo.
—Tudo bem, uma próxima vez quem sabe. – ele acenou e me deu as costas.
—Charlie. – no mesmo instante ganhei sua atenção e tive a impressão de ter visto uma ponta de esperança em seus olhos —Meus amigos e eu vamos passar o fim de semana fora, quer ir com a gente?
—Com certeza.
E lá estava ele, o sorriso que havia me encantado. Foi difícil não retribuir o ato e um tanto estranho me sentir envergonhada com sua resposta.
(Charlie)
Com certeza.
O que diabos acabou de acontecer? O que eu estava fazendo afinal de contas?
Isso é coisa de gente apaixonada e eu não podia me apaixonar por ela assim do nada, ou será que podia? Se bem que Sophia era uma garota apaixonante, sua beleza ia muito além do que a gente via externamente e isso percebi em meio a nossas conversas.
Inteligente, talentosa e tinha o sorriso mais encantador que já vi na vida.
—Estou fodido mesmo. – me joguei no sofá pondo as mãos no rosto.
—Tudo bem, querido? – minha mãe perguntou parada ao meu lado e tinha um o olhar preocupado.
—Sim, não precisa se preocupar. – sorri para a mais velha que retribuiu —Se por um acaso uma menina de cabelo roxo chamada Sophia vier me procurar, é amiga minha. Ok?
—Amiga? Sei. – ela riu baixo indo para a cozinha.
Maneei a cabeça me levantando e fui para o quarto.
As cortinas estavam abertas dando visão para o quarto de Sophia, essa que estava em frente ao guarda-roupa terminando de se vestir. Ainda consegui ver algumas tatuagens bem distribuídas por suas belas curvas.
—Belas curvas. – sussurrei.
Balancei a cabeça me afastando dali e tentando me concentrar em qualquer coisa que não fosse na garota. Não foi fácil, nem mesmo um banho frio facilitou as coisas.
—Estou fodido mesmo.
(21:30 p.m)
A música que fluía alta nos fones acalmava tanto a mente quanto a alma.
Estava distraído com os olhos fechados e sem me importar com o que acontecia a minha volta, então senti um beijo em meu rosto e foi tão bom que sorri.
—Ah que bonitinho, ele gosta de beijinho. – Sophia falou em meio a uma risada depois de tirar meu fone.
—Gosto mais quando são seus. – sorri de lado e notei seu rosto ficar levemente rosado pela vergonha.
—Está pronto? A van tá pronta e só falta a gente. – ela ficou de pé mexendo nos cabelos e me sentei rindo baixo.
—Só vou pegar mais alguma coisas, não demoro.
Sophia assentiu sorrindo e saiu do quarto.
Me levantei rapidamente pegando minha mochila e vendo se não faltava nada, com tudo pronto e arrumado pus a bolsa no ombro, optei por levar meu violão apenas para distração. Deixei minha mãe avisada que me desejou um bom fim de semana e passando pela porta avistei a minivan, o pessoal que estava próximo a ela me observavam enquanto me aproximava.
—Charlie? – o garoto mais alto dentre eles veio até mim e assenti —Sou o Scoth. Bom te conhecer.
—Prazer. – ditei meio sem graça.
Enquanto ele arrumava minhas coisas em meio a outras bagagens fui apresentado ao restante do grupo, todos em casais e entre irmãos.
Ficamos apenas esperando Sophia, essa que conversava na porta de casa com uma senhora que não aparentava ter mais de cinquenta anos. Ambas pareciam nervosas, mas falavam baixo para ninguém mais ouvisse.
—Problemas com os pais, eu acho. – olhei para Jane, a melhor amiga de Sophia, e ela tinha o olhar nas duas da casa ao lado —Você poderia tentar falar com ela, conversar pode ajudar.
—Não sei se é uma boa ideia. – toquei a nuca.
—E também não custa nada tentar.
Ela sorriu e seguiu para perto de Scoth, enquanto isso ainda olhava na direção de Sophia. Notei que passou as mãos pelo rosto como se estivesse chorando e aquilo apertou meu coração, como uma menina como ela poderia sofrer tanto assim?
Dei um passo para ir até ela, mas Jack me impediu meneando a cabeça para que não fosse e olhando para sua irmã e cunhado, ambos concordaram com o garoto. Algo ali estava muito errado, com ela e sobre o motivo que a levou as lágrimas, eles sabiam e talvez estivessem apenas me impedindo de fazer uma besteira.
Não demorou muito e vi a senhora deixar um beijo na testa da garota de cabelo roxo, a mesma então caminhava em nossa direção. Os passos firmes e pesados mostravam quão irritada estava.
—Tudo bem? – questionei preocupado.
—Melhor impossível.
Foi a única resposta que recebi antes que ela entrasse na van e se isolasse no banco dos fundos, colocou os fones e cobriu o rosto com o capuz do moletom que usava.
(Sophia)
Durante todo o trajeto da viagem as palavras de minha avó se repetiam em minha mente e já havia perdido a conta de quantas vezes havia suspirado de raiva.
Eu não tinha nada a ver se meu pai estava no hospital e menos ainda que minha mãe resolveu lembrar que tem filhos. Não ia ter dó deles apenas por isso.
Quando a minivan parou na garagem fui a primeira a sair carregando uma mochila comigo, Scoth e Jane ainda tentaram chamar minha atenção, mas os ignorei. Precisava ficar sozinha e pensar em tudo.
Parei a caminhada quando cheguei perto de um lago que tinha por perto, o mesmo que eu sempre ia quando viajávamos para até ali, e me sentei de frente para o mesmo abrindo a mochila. De dentro dela tirei meu maço de cigarro e no fundo vi o canivete que sempre carregava comigo.
Engoli em seco deixando a bolsa de lado e acendendo aquilo que me matava aos poucos.
—Acho que isso não vai resolver seus problemas. – a voz de Charlie chegou aos meus ouvidos e vinha de trás de mim, mas não me dei ao trabalho de olhá-lo —Não acha que com isso as coisas só vão piorar? Ou quem sabe criar um novo problema? – e mais uma vez o ignorei.
O garoto apenas se sentou ao meu lado pegando algumas pedrinhas próximas e começou a jogá-las na direção do lago, com um suspiro pesado o olhei e notei certa tristeza misturada a preocupação em suas feições.
Apaguei o cigarro no solado do calçado e abracei minhas pernas junto ao peito, o queixo apoiado nos joelhos e o olhar no lago a frente.
—As vezes penso em desistir de tudo, na verdade já tentei. – senti o olhar de Charlie sobre mim —Jogar tudo pro alto e acabar de vez com a porcaria de vida que levo. – o olhei sentindo o nó na garganta.
—E por que não tenta mais uma vez? Por que não passa a tentar com mais frequência até conseguir? – mesmo surpresa com suas palavras notei um certo deboche em sua voz —Se sua vida é tão ruim como diz, por que ainda está viva? Por que não se mata agora?
—Porque eu tenho meus irmãos.
—Claro, você tem seus irmãos que precisam muito de você, não é? – ele riu baixo ainda debochado e franzi o cenho.
Apesar do deboche, Charlie estava sério e até mesmo... magoado.
—Eles não precisam de você, mas você por outro lado parece que precisa deles, porque os usa como motivo para não se matar de uma vez. O que por um lado é muito bom, mas ao mesmo tempo é egoísta com os outros. – o garoto respirou fundo passando as mãos pelos cabelos —Eu não posso dizer muita coisa, não sei muita coisa sobre você e nem o que passou, mas dá pra saber que você só não desistiu ainda porque tem esperança. Ainda quer ser feliz e tem fé nisso, tem fé que vai ser feliz e eu sei que vai, não sei como, mas você vai ser muito feliz.
De certa forma Charlie tinha razão, eu queria ser feliz de verdade e sabia que em algum momento posso alcançar essa felicidade, só doía que não fosse logo. Enquanto isso usava meus irmãos como desculpa para continuar passando por tudo que passo.
Por outro lado, tinha a reação que meu coração teve diante suas palavras. Meu coração parecia gritar dizendo que aquela era a declaração que precisava para enfim ser feliz com alguém, para conseguir acreditar em alguém de novo, mas o medo insistia em dizer que era apenas palavras de consolo.
No fim apenas me deixei levar pelo choro e Charlie se aproximou me envolvendo um abraço, sem saber ter outra reação devolvi o carinho deixando meu rosto na curva de seu pescoço. Ele apenas apertou um pouco mais o abraço, como se quisesse tomar a dor para si.
Alguns minutos depois nos afastamos alguns centímetros, os rostos próximos o bastante para que olhássemos nos olhos do outro. Os lábios dele se tornaram atrativos demais e como se soubesse, e quisesse, o mesmo que eu, Charlie acabou com o espaço que tinha entre nós.
O beijo era calmo até o momento em que levei meus dedos até seus cabelos o puxando cada vez mais para perto, as mãos dele invadiram minha blusa tocando levemente meu tronco. As cicatrizes que eu tinha não pareciam o intimidar ou qualquer coisa.
Queria acreditar que aquele garoto me desejava da mesma forma que eu o desejava, e mais uma vez ele me surpreendeu, como se estivéssemos mentalmente conectados, Charlie investiu o corpo no meu e nos fez deitar no gramado.
Nos separamos para buscar ar e nos olhamos nos olhos novamente.
Então era aquilo que eles chamavam de amor à primeira vista?
(Charlie)Meu corpo queimava em desejo por ela e pelo olhar dela sabia que a garota sentia o mesmo, os olhos castanhos fixos nos meus diziam muita coisa e principalmente que ela me queria tanto quanto eu a queria.—Charlie. – sua voz interrompeu meus pensamentos e notei vergonha em suas feições —Acho melhor a gente voltar.—Ah, tudo bem. – me levantei a ajudando e arrumei minhas roupas —Desculpa.—Pelo quê?—Não sei, só achei que deveria me desculpar.—Tá tudo bem. – seu sorriso era pequeno e tímido, mas ainda era lindo.Sorri de volta pegando sua mochila e seguimos para a casa lado a lado, não ousei chegar tão perto dela, mesmo querendo. Tinha que respeitar o espaço dela.Encontrando os outros dentro da casa, as meninas arrumando a sala e os meninos na cozinha, e passamos o resto da noite e parte da madrugada assistindo filmes enquanto comíamos. Na hora de dividir os quartos acabei no mesmo cômodo que Scoth, enquanto isso Sophia ficou com Jane.Nada mais justo, mas o silêncio naquele
(Sophia)Eu não poderia ter começado o dia pior do que já estava.Depois de todo o choro do dia anterior acordei com uma insuportável dor de cabeça, mas não poderia fugir da escola. Diferente do trabalho que havia conseguido alguns dias de folga.Passando pelo portão principal avistei Charlie conversando com Gabrielle e meu sangue ferveu de raiva no mesmo instante, mas decidi respirar fundo e seguir caminho pelo corredor.Notei o garoto com certa esperança no olhar quando passei por eles, escolhi não fazer nada e continuar caminhando como se ambos não existissem, mas acabei parando no meio do caminho notando meus amigos virem em minha direção.Cada um mais apreensivo que o outro e Scoth com expressões sérias, o que era raro.—O diretor liberou a gente, vamos embora. – o garoto falou colocando as mãos nos meus ombros enquanto me levava para fora.A voz tão séria quanto suas feições.—Mas por quê? O que aconteceu? – perguntei confusa com a situação.Ao nosso lado, ainda perto dos armári
(Sophia)Qualquer um que a olhasse naquele momento se perguntaria; como uma mulher como ela não ajudou os filhos quando eles mais precisaram? Por muito tempo ouvi as pessoas cochichando e se perguntando como ela pode nos abandonar daquela forma.Pois bem, essa é Cordelia Mason, agora muito mais cuidada que antes, os cabelos escuros estavam loiros e muito bem-vestida.—Que isso minha linda, pode me chamar de mãe. – a mulher tentou se aproximar, mas recuei no mesmo instante.—Sei disso, mas por que será que não chamo? – sorri de forma debochada a olhando —Será que é por que você passou anos maltratando seus filhos e depois decidiu os trocar para viver com um homem rico?—Não foi bem assim. – ri baixo de sua fala e desviei o olhar dela por alguns segundos.—Não? Engraçado dizer isso porque ainda sei como é o peso da sua mão e tenho algumas marcas dos cintos que usou. – cruzei os braços a encarando e a vi engolir em seco —Mas não foi pra isso que vim, quero saber o que quer com a gente. P
(Sophia)Depois de passar o resto da tarde e parte da noite na companhia de Charlie o garoto teve de ir embora, a sensação de solidão durou apenas até ele me ligar. Passamos horas ao telefone, tantas que ele adormeceu e não tive coragem de desligar, fiquei ali ouvindo sua respiração e sorrindo como uma boba.Na manhã seguinte minha rotina foi a mesma; me arrumar e ir a escola.E lá estava, sentada no banco em frente ao prédio fumando meu cigarro, distraída com algumas composições. Ouvi passos se aproximando, mas não me atrevi a olhar, poderia ser qualquer pessoa da banda, Charlie ou até mesmo alguém que eu não queria ver. E caso fosse ele não teria mais como fugir.—Bom dia. – finalmente me virei para ver quem era e me deparei com um homem de cabelos escuros em roupas sociais —Você é Sophia Mason, certo?—Quem quer saber? – o olhei com desconfiança e esperando que não estivesse encrencada.—Me chamo Michael, sou produtor e empresário no ramo musical. – o homem apenas sorriu enquanto e
(Sophia)Assim que as aulas acabaram cada um seguiu caminho para sua casa enquanto Scoth e eu fomos direto para o trabalho.Passamos todo o expediente atendendo entre uma música e outra que cantávamos, o que agradava muito ao chefe por chamar atenção dos clientes e animar todo o local.—Vou conferir o estoque e você arruma as coisas por aqui, depois a gente vai embora. – o maior falou pegando a prancheta sobre o balcão.—Tudo bem. – e ele saiu, no mesmo instante comecei a arrumar a loja e o som do sininho da porta chamou minha atenção, mas ao me virar encontrei quem não queria —Só pode ser brincadeira.—Oi princesa. – sua voz ainda me causava arrepios, só que não mais como antes.—Já faz alguns anos que perdeu o direito de me chamar assim, não acha? – falei com seriedade o olhando da mesma forma, mas foi algo que ele não se importou.Na verdade, ele nunca se importou com nada.—Você é minha filha, Sophia, e a chamo da maneira que quiser. – soltei uma risada de suas palavras e as feiçõ
(Charlie)Dormir bem à noite foi quase impossível com o que havia acontecido, mas o que tornou tudo pior foi Sophia ter me visto com Gabrielle.De manhã senti tanta raiva quanto na noite anterior ao ver a garota de madeixas roxas ao lado do ex-namorado, meu sangue ferveu ao ver Sophia e Andrew aos risos enquanto fumavam. Muita coisa começou a rodar minha cabeça, mas preferi não fazer nada e segui para a sala mesmo sem ela. Pouco depois a garota entrou se sentando ao meu lado.—Arrumou um amigo novo? – perguntei ganhando a atenção de Sophia.—Desde quando você se preocupa com as amizades que eu faço? – seu cenho franziu e as feições ganharam seriedade.—A questão não é essa, só é estranho você o tratar tão mal em um dia e no outro agir como se fosse seu melhor amigo.—Conhece o significado de desculpa? – a olhei confuso e a garota deu de ombros —Andrew se mostrou arrependido e eu só o desculpei. Não me sinto mal com isso.—Claro, e já começa agir como se nada tivesse acontecido? – ante
(Sophia)Meus braços ardiam enquanto o sangue descia junto com a água do banho, minha cabeça doía de tanto ter chorado.Depois do ocorrido com Charlie fui ao velho parque para tentar organizar meus pensamentos, mas minha solidão não durou muito e Andrew apareceu com meus amigos em seu encalço. Todos se juntaram para discutir e gritar, tanto comigo quanto com o garoto, e não aguentando aquela situação apenas me levantei pegando a mochila. Scoth gritava meu nome enquanto eu caminhava para casa.Não tinha pressa e qualquer um poderia até dizer que estava me arrastando.Passei o resto do dia trancada no quarto com o mínimo de iluminação e as músicas sempre baixas, tudo apenas contribuía para que meu estado piorasse.E piorou.Quando dei por mim estava em meio a um surto de choro que me levou a mais um dia de feridas abertas, de todos os tipos.Pela manhã ainda me sentia péssima, mas levantei arrumando tudo e fiz meus curativos antes de seguir para a escola. Ao chegar avistei Andrew logo n
(Charlie)Eu lia em voz alta cada palavra daquela porcaria de livro tentando fazer com que meu cérebro se lembrasse delas mais tarde, a professora de literatura cobraria aquilo, mas todos os meus esforços pareciam inúteis.Então a voz de Sophia chamou minha atenção. A garota estava sentada ao meu lado olhando os próprios pés enquanto recitava com facilidade o trecho que eu tentava decorar.—Tem como você ser um pouquinho menos nerd? – a garota riu baixo comigo.—Perdi a conta de quantas vezes já li esse livro. – maneei a cabeça guardando o livro na mochila e voltei a olhar a menina.Parecia estar com o pensamento distante, a expressão deixava claro isso, mas só fiquei preocupado quando notei seu cenho franzir e os olhos ganharem um brilho diferente do habitual. Seguindo seu olhar notei o alvo de tal mudança.Andrew Baker estava encostado ao muro do colégio trocando o mesmo olhar com Sophia. Cheguei a pensar que a qualquer momento eles poderiam se matar apenas com aquilo.A garota entã