Capítulo 5

Owen

Consigo alcançar o corpo da garota antes de ele ir ao chão, a seguro e coloco sobre o sofá. Ares dá um latido, seguido de um choro.

— Oh, droga — murmuro ao perceber que seu corpo treme, como se estivesse congelando. — Meu Deus, ela está tremendo.

Evelyn se aproxima, tocando sua fronte com as costas das mãos, arregalando os olhos em seguida.

— Ela está ardendo em febre — constata. A garota desmaiou após uma crise de tosse, e viver na situação dela, em meio ao frio e às chuvas constantes, com certeza afetou sua saúde. — Que droga, Owen, não podemos deixá-la assim — diz, se levantando. — Ela precisa ser examinada por um médico.

— Evelyn, não posso correr o risco de aparecer com ela em um hospital — dizer isso é assumir minha covardia, estou mais preocupado com minha imagem do que com a saúde da menina.

— Você conhece algum médico que possa vê-la? — pergunta.

Me vem à memória a mulher que conheci em um evento de caridade, ela era uma médica recém-chegada do continente africano e me contou que, um tempo depois, se mudaria para São Francisco, para trabalhar em algum hospital que não me lembro o nome.

Na verdade, não estava interessado na vida da morena de olhos verdes, mas sim em levá-la para minha cama, só que o que ela tinha de bonita, tinha de arisca, e deixou bem claro que ficaria longe da minha cama naquela noite.

Peguei seu telefone, mas me esqueci complemente desse detalhe, até agora.

Lucinda parecia ser uma pessoa de confiança e, como não dormi com ela, não corria o risco de ela desligar na minha cara quando eu ligasse. Provavelmente teria que insistir, mas era melhor ela do que um hospital.

— Owen, encha sua banheira com água fria — Evelyn ordena, olhando para os sapatos da garota e fazendo uma careta ao se aproximar e desfazer os laços dos cadarços.

— O que está fazendo, Evelyn?

— Banho, a água fria vai ajudar a abaixar a temperatura. Algo me diz que ela não sabe o que é um banho há um bom tempo. — J**a o primeiro tênis em algum canto da sala.

— Você tem certeza de que quer fazer isso? — pergunto para ter certeza.

— Tenho. Você pode conseguir um médico para vir vê-la? — pergunta com o semblante fechado.

Tenho a leve impressão de que. depois de tudo isso. Evelyn vai arrancar meus órgãos.

— Podemos esperar até de manhã? — pergunto.

Não posso ligar de madrugada para uma pessoa que só vi uma vez e simplesmente pedir para ela vir até meu apartamento.

Evelyn me fuzila com o olhar.

— Vai encher a droga da banheira, seu imbecil — diz, cerrando os dentes.

Vou até o banheiro, abro as torneiras e separo algumas toalhas, quando retorno para a sala, noto que Evelyn tirou os casacos da garota, a deixando apenas com a calça larga e uma regata, que em algum dia foi branca.

Os braços finos, extremamente magros, me assustam e, pelo olhar de Evelyn, ela está tendo o mesmo sentimento que eu.

— Owen, ela está pele e osso — diz, engolindo em seco em seguida.

Eu deveria imaginar, pois quando a segurei no colo, seu corpo era tão leve como uma pluma, eu a carreguei sem qualquer dificuldade.

— Pobrezinha... Owen, me ajude a levá-la até o banheiro — pede, então Ares da alguns latidos.

— Nós só vamos ajudar sua dona, amigão, pode confiar na gente — falo e ele entorta a cabeça, me olhando como se estivesse entendendo.

Me aproximo, erguendo seu corpo pequeno e magro, então a levo para minha suíte, sendo seguido por Evelyn.

Assim que entramos, fico parado, esperando alguma ordem de Evelyn.

— Me ajude a terminar de tirar a roupa dela — Evelyn fala e eu arregalo os olhos.

— O quê?

— Ela não vai tomar banho vestida, me ajuda, mas eu te mato se olhar para ela como se estivesse olhando para um pedaço de carne. — Aperta os dentes.

A garota já estava em uma situação de vulnerabilidade, a última coisa que eu faria era agir como um babaca.

— Você está pensando que eu sou o quê, Evelyn? — pergunto sério e ela suspira, percebendo que não usou bem as palavras.

— Desculpa, Owen, é que estou nervosa — bufa, coçando a cabeça. — Coloco ela aqui, e firme o corpo dela ao seu — pede, apontando para beirada da banheira, que está quase cheia pela metade.

Faço o que ela pede e a vejo retirar a calça da garota, viro o rosto para o lado, a fim de não ver a garota sendo despida.

— Pronto, Owen, coloque-a na banheira — pede e eu a ergo, tentando não olhar para o seu corpo desnudo.

— E se ela acordar? — pergunto, temendo o escândalo que ela poderia fazer ao se ver nua em uma banheira.

Tudo o que está acontecendo é tão insano que não consigo pensar direito, muito menos agir. Já fiz muita merda, já me meti em muita encrenca, mas nenhuma delas acabava dessa maneira tão absurda.

Sou obrigado a olhar para a garota antes de imergi-la na água, e a imagem do seu corpo esquelético é um soco no estômago.

Ouço-a balbuciar algumas palavras desconexas, então olho para Evelyn alarmado.

— Ela está delirando por causa da febre, Owen, está fraca.  Meu Deus, como ela está magra. — Os olhos de Evelyn estão marejados.

Me pergunto por quanto tempo ela ficou sem se alimentar direito, ela está tão frágil que parece que vai quebrar se eu não a tocar com delicadeza.

A garota volta a murmurar algo e encaro Evelyn.

—  São delírios, Owen, mas se ela acordar, daremos um jeito — Evelyn fala, despejando sabonete líquido na mão.

— Ela vai ficar bem, não é? — pergunto, com uma sensação estranha no peito.

— Eu espero que sim, não quero nem pensar no que ela passou. — Volta a atenção para a garota.

Os murmúrios dela me deixam assustado, não quero que ela acorde e se sinta tão vulnerável.

— Só faça isso rápido, Evelyn — peço e ouço o latido alarmado de Apolo.

— Pode arrumar algo para o cachorrinho comer, acho que consigo dar banho nela sozinha — Evelyn diz, passando as mãos abaixo dos olhos.

— Vou separar uma cueca nova e uma camiseta minha para vesti-la — digo, vendo Evelyn apoiar o rosto da garota no colo e fechar a torneira.

— Ótimo, faça isso, vou limpá-la e deixá-la descansar, pelo menos até recuperar um pouco as forças. — Começa a limpar o pescoço da garota e eu me viro para a porta. — E, Owen, ela precisa de um médico.

 Não respondo, Evelyn, só saio e encontro o cachorro na porta do quarto, ele para de latir quando me vê, noto que Ares também parece um pouco abaixo do peso. Vou até a cozinha e sou seguido por ele.

Não tenho comida de cachorro, por isso esquento um pouco de leite no micro-ondas, coloco em uma tigela e deixo na frente do meu novo hóspede.

Ares não pensa duas vezes antes de atacar.

— Vai com calma, amigão — digo, vendo o leite desaparecer.

Passo a mão pelos cabelos, tentando me dar conta da enrascada aonde fui me meter, Evelyn está dando banho em uma garota desacordada no meu banheiro e tem um cachorro me encarando, como se quisesse enxergar minha alma, nesse exato momento.

Não, eu não me arrependo de ter trazido a garota, jamais a deixaria desacordada naquele lugar.

Ares se aproxima, cheirando meu joelho.

— Eu sou um dos mocinhos, bom, cara? Logo sua dona vai focar bem — digo, afagando sua cabeça e ganho uma lambida na mão.

Parece que tive algum progresso aqui.

Vou até a sala e vejo mochila da garota jogada no sofá, fico tentado a abri-la e ver se encontro algo que possa me ajudar a lidar com essa situação, mas decido não ser tão invasivo.

Os tênis e os casacos velhos deixam a sala com um odor desagradável, então vou até a cozinha, pego um saco de lixo e recolho as peças com a ponta dos dedos. Ares não parece gostar da minha atitude, pois me olha com desaprovação, mas eu não deixaria aquela garota vestir esses trapos novamente.

Jogo o saco de lixo na área de serviço, abro a geladeira e agradeço a Deus por eu ter comprado cerveja, abro uma longneck e dou um gole generoso, talvez whisky fosse mais interessante, mas minha cota de destilados da noite já tinha sido atingida e eu preciso estar sóbrio para sair da merda onde me enfiei.

Volto para o meu quarto, dessa vez Ares entra atrás de mim, não só entra, como pula sobre minha cama, deixando um rastro das sujeiras de suas patas no edredom branco. Ele se deita e olha para mim, fazendo com que eu ignore o fato de ele deixar o edredom marcado de sabe-se Deus o quê.

Acho que ele precisa de um banho também.

Respiro fundo, indo até o closet, então pego uma camiseta preta lisa e uma cueca nova.

— Owen, me ajude a tirá-la da banheira — ouço Evelyn pedir e deixo as peças de roupa sobre um móvel, seguindo para o banheiro. — Ela estava tão suja, pobrezinha. — Evelyn funga. — Espero que isso faça a temperatura dela abaixar. — Assinto, olhando ao redor, não quero olhar para a garota nesse estado. — Pegue a tolha para cobri-la — Evelyn pede e eu o faço rapidamente. — Pode erguê-la.

— Ok...

Faço o que minha amiga pede, tentando não olhar para o corpo da garota. Por sorte, Evelyn se apressa em cobri-la assim que a tiro da água.

— Coloque-a na cama — diz, pegando as roupas sobre o móvel. Ares pula, latindo e olhando para a garota em meus braços.

Inclino a cabeça, vendo seu rosto limpo agora, seus traços são tão delicados, não há outro adjetivo para defini-la, a não ser linda.

O rosto da garota é incrível.

— Calma, garoto, ela está bem e vai acordar logo — Evelyn fala, fazendo um carinho em Apolo.

A garota se mexe e murmura algo mais uma vez, quase a solto assustado, mas percebo que ela ainda mantém os olhos fechados.

— Frio — balbucia e volto a olhar para Evelyn, alarmado enquanto seu corpo treme.

— Coloque-a aqui — Puxa o edredom e afofa o travesseiro —, vou vesti-la. — Assinto, fazendo o que Evelyn pede e me virando de costas rapidamente. — A febre está abaixando, só espero que ela acorde logo — fala.

Um frio sobe pela minha espinha, junto de uma sensação ruim, algo que eu poderia nomear como medo.

Medo de que a garota não acorde, ou que acorde e fuja.

Não consigo entender essa necessidade absurda de ajudá-la.

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