As viagens de metrô em horário de pico são das coisas mais pitorescas que você pode imaginar. No final do corredor está aquele cantor recolhendo moedas e desafinando; no assento atrás de mim um bebê chorando alto e na minha frente dois idosos discutindo sobre política.Depois estou eu agarrada na barra, morta de cansaço e com outro grande incômodo à minha direita. Giana rindo como uma criança do jardim de infância. Sou a origem das suas risadas.— Já é quinta-feira. Faz três dias que você está zombando de mim. Não cansa não? — critico ajeitando a bolsa no ombro.— Você acha que isso são zombarias? Não são — mente tão agarrada na barra quanto eu — São gestos de apoio disfarçados de nervosismo. Que por acaso parecem risadas.Mordo minha língua diante de sua resposta pomposa. Ela está assim desde que resumi que Luciano me pediu em casamento, me deu esse anel de noivado e ela mesma viu como desrespeitamos seu sofá.— Segura seus "gestos de apoio" pra mais tarde, quando voltarmos pro escrit
— Desculpe, mas... nos conhecemos de outro lugar? — pergunto confusa.Sua resposta é se surpreender e rir. Isso faz com que algumas covinhas apareçam em suas bochechas.— Não se lembra de mim? Cursamos Direito Comercial juntos na faculdade — revela.— Cursamos? — volto a perguntar confusa. Ele ri mais envergonhado e divertido. Eu me sinto péssima — Tem certeza? Talvez você esteja confuso, não lembro de ter estudado em nenhum semestre com o filho do presidente de uma multinacional.Na negociação, Ernesto tinha explicado que Mateo era o primogênito do presidente desta empresa. Como sua saúde tinha se deteriorado, ele estava assumindo os negócios do pai. Minha impressão de que era um homem jovem não estava errada. Se estudou comigo devia ter menos de 30 ou não mais que 32 talvez.— Porque não me matriculei me apresentando como um. Fui incógnito, para começar do zero. Você sabe como são os pais, querem que a gente se endureça na faculdade sem usar nossos sobrenomes para ganhar favores. Voc
Sem o contexto do que acabamos de ouvir, tenho certeza que este escritório pareceria um jogo de estátua. Ninguém se mexe, ninguém respira. Isso inclui Maite e eu também. Mas não se aplica ao Luciano, claro.—Vocês são pagos para ficarem de fofoca? — pergunta ele de péssimo humor.Ninguém responde. Maite apenas dá de ombros e olha para o chão. Está tão parado quanto o deserto.—Mexam-se! — ele grita.Com isso, todo mundo dá um pulinho. Inclusive eu. Tom e Susana voltam correndo para suas mesas, Maite sai correndo para outro lugar longe da dela para se afastar do nosso chefe e o barulho volta ao andar. Ouvem-se inícios de ligações telefônicas e o som frenético de digitação ao longe. Eu também queria fugir do meu posto, mas Luciano foca em mim.—Venha à minha sala — exige e sai.Não me resta alternativa senão ir à sala dele. Estou perplexa com a atitude de Luciano. E continuo assim ao entrar em seu espaço e vê-lo se apoiar em sua mesa para me julgar com os braços cruzados. Me sinto analis
Meu coração se aperta. É dolorosamente óbvio que para Luciano sou um desafio e ele quer me levar pra cama de novo. Pra mim, infelizmente, ele é mais que isso. Mas mesmo assim, não vou ceder.—E daí? — dou de ombros com indiferença.—Como assim? — solta ofendido.—E o que me importa com quem você se diverte lá fora? Por acaso você tem uma coleira no pescoço e eu te amestrei? Isso não é real. Você é livre pra transar com quem quiser. Ou vai me dizer que se eu pedir exclusividade você vai respeitar?Meu atrevimento causa um efeito mais profundo do que eu esperava. Detecto um traço de confusão em Luciano. Um que faz nascer mil ideias neste coração ingênuo. Se chegássemos a um acordo de amantes, mas amantes exclusivos, quem sabe... poderia haver algo mais, né? Como sentimentos, e talvez outras coisas. Coisas reais.—Se sua intenção é que nosso relacionamento seja exclusivo, você poderia me contar pra eu saber no que me meter... — solto "desinteressada" — O que você quer dele?—Eu... queria
Dos muitos mistérios que Luciano representa pra mim, o da relação dele com América corrói minhas entranhas. Como não seria assim com os dois se olhando com tanta repulsa? O que tem a ver com as estranhas reações que minha madrasta teve com ele? Com esse ódio sem disfarce que meu falso noivo demonstra?—América, esse é um pedido meio fora de lugar. Luciano e eu vamos nos casar, ele será parte da "nossa família" — intervenho.—Marianne, o que faz aqui? Não sabia que estava aqui... — se recompõe alisando seu vestido e visivelmente desconfortável.—Ela trabalha aqui. Do que você está falando? Quem não deveria estar neste escritório é você. Quem deixou você entrar? — responde Luciano muito, muito sério.Esse era um detalhe do Luciano. Podia ser muito encantador, e muito odioso quando queria. Está sendo isso agora. Embora sempre tenha sido assim ao interagir com América.—Este era o escritório do meu marido. Você é quem não deveria ousar falar comigo desse jeito tão grosseiro — diz América o
— Eu te disse que América age estranho perto do Luciano e vice-versa. Eles estão conversando no escritório dela, deixei meu celular escondido gravando — relato orgulhosa.Giana não está tão feliz quanto eu com meu plano brilhante. Muito pelo contrário.— Eles continuam agindo estranho? Será que não tiveram um caso?Eu que estava bebendo meu café, quase cuspi. Olho para Giana com nojo, todo o nojo que estou sentindo. Luciano e América? Juntos?— Caso de que tipo? — pergunto como se não soubesse do que ela está falando.— Bom... sua madrasta é muito bonita, e se mantém muito bem pra idade dela. O Luciano é um mulherengo pelo que sabemos. Pode ser que tenham se reencontrado por acaso, e daí surgiu o conflito. Ou o que mais poderia estar acontecendo?— Não pode... isso não pode ser verdade.— Por quê? Você confia na ética de algum dos dois?A verdade é que não. Não seria estranho que América, sendo a bruxa que é, tenha traído meu pai. Também não a considero decente o suficiente pra não ter
— Estou te responsabilizando por uma falta da qual você sabe que é responsável. Você é uma garota inteligente. O que está fazendo ferindo o ego de um homem fraco como Andrew? Concentre suas forças em concretizar o casamento com o Brown — aconselha.Não sei o que é mais doloroso, meu pai falar da minha vida amorosa como se fosse o negócio do fim do mês ou ele estar me dando toda essa atenção por causa do Luciano. Antes dele, foi por causa do Andrew. É sempre por outro homem, não por mim, por sua filha.— É o que eu faço. Por isso vou pedir que você peça pra sua outra filha concentrar as forças dela em manter seu noivo na linha. Andrew deixou de ser meu problema — argumento.Meu pai faz uma careta de deboche, de um deboche extremamente cruel.— Você não está agradecida por isso? Deveria estar. Andrew é um recurso esgotado. A traição dele te levou a algo melhor. Jogue bem suas cartas.— Do que você está falando, pai? — pergunto confusa — O Andrew não é seu acionista de ouro? Seu aprendiz
O tempo parece correr mais rápido quando você tem muito pra fazer. Justamente nisso que eu estava como madrinha forçada do casamento do meu ex com minha irmã. O maior desafio atual com o qual estou me estapeando figurativamente, é conseguir uma igreja pra eles se casarem.Como era de se esperar, nada agrada a Amanda, mesmo faltando menos de um mês pro casamento, ela não consegue chegar a uma decisão. Não é fofoca da minha parte, estamos passeando pelo corredor da minha última opção, a catedral da cidade vizinha.América e Amanda andam na minha frente, eu escutando os absurdos que essas mulheres soltam.— Não está muito antiga, mãe? Quero algo mais moderno — reclama minha meia-irmã de braço dado com minha madrasta.— Não dá pra pedir pra uma catedral ser mais moderna. Embora vamos ter que fazer muito trabalho pra deixar no nosso nível. Como é o coral desta, Marianne? — América vira o rosto pra falar comigo.— Está disponível pra data do casamento. É muito respeitado na cidade — respondo