Dois dias se passaram.
Consegui perceber isto por causa da luminosidade no quarto e pela troca de plantões.
Toda vez que entrava um enfermeiro diferente e lia meu prontuário, perguntava se já havia decido fazer a cirurgia plástica e a resposta era o silêncio.
Não fazia ideia de quem eu era e sentia que ficaria sem saber se fizesse aquela cirurgia.
Impressão ou não, sentia que meu rosto estava desinchando, isto por quê não sentia mais meus olhos tão inchados e o restante ao redor dolorido. Isto para mim, foi um grande avanço e que poderia significar que não iria precisar daquela cirurgia.
Quando uma enfermeira tirou o cateter urinário, juro que acreditei que tinha ido no inferno e voltado, devido ao desconforto.
Pelo menos estava livre daquele troço e poderia usar o banheiro normalmente. O quê não foi uma tarefa fácil.
Minha visão ainda não havia voltado e precisei me garantir que não iria cair de cara no chão, ao tentar descer da cama e que no percurso do banheiro. Não arrancaria a agulha do soro com minha veia.
Uma tarefa difícil.
Primeiro coloquei um pé no chão, buscando firmeza para por o outro, enquanto me apoiava na cama. Feito isso, tateio o suporte do soro, o segurando com força, praticamente o usando como uma terceira perna, ao andar em direção do que seria uma porta ao lado da janela.
E graças aos Céus era. Com um pouco sem jeito é com as pernas rígidas, consigo sentar no vaso sanitário, esperando o xixi descer.
Alguns minutos se passaram, me deixando aflita pelo fato de estar com vontade de fazer xixi e não conseguir, quando noto um vulto parar em frente à porta, que não havia fechado.
- Quem é? – pergunto um pouco alto.
- Está precisando de ajuda? – Lucius pergunta com a maior naturalidade do mundo.
Abro e fecho minha boca, agradecida pela primeira vez por não estar enxergando direito, assim não veria a cara de surpresa dele ao me ver ali.
- Não – digo com um suspiro – Só estou...
- Ah. Entendi. Vou fechar a porta e...
- Está certo – Ele fecha a porta, me dando um pouco de “privacidade”, mesmo sentindo que não tinha nenhuma com ele do lado de fora, podendo ouvir eu fazendo xixi.
Mais alguns minutos se passaram, até que meu fui consegue sair e tento disfarçar o barulho.
Depois de lavar as mãos e dar descarga, tateio a maçaneta, abrindo a porta.
- Deixa eu ajudar você – Ouço ele dizer do meu lado direito, segurando gentilmente meu braço com sua mão grossa.
Encosto minhas costas ao subir na cama, suspirando longamente. Tomando coragem para o que iria dizer e temendo acabar com as expectativas dele.
- Veio saber se lembrei de alguma coisa?
- Não – Então por quê ele estava ali?, penso no mesmo instante – Vim saber como está.
Ah.
- Não mudou muita coisa – Tento não soar pessimista. Estava viva, o quê já era um milagre, dada as circunstâncias que me levaram até aquele hospital.
Lucius já havia perdido o filho, não precisava de pessimismo.
- Encontrei o Dr. Schultz no corredor – Ele inspira o ar – Disse que... precisa fazer uma cirurgia plástica – Olho para o vulto, acreditando estar olhando para os olhos de Lucius.
- Ele disse que posso ficar deformada, se não fizer – digo num tom baixo – Não achava que estava tão ruim assim – Respiro pela boca – Se eu...fizer... Se algum parente meu estiver me procurando, como vão me encontrar com outro rosto?
O vulto em frente da cama se mexe, parecendo mudar o peso do corpo de uma perna para outra.
- Entendo que esteja com medo. Também estaria no seu lugar – Algo no tom de voz dele, trouxe lágrimas em meus olhos – Já tentei inúmeras vezes imaginar o quê vocês passaram – A respiração dele se torna pesada – Mas não consigo chegar nem perto – Ele limpa a garganta, se recompondo rapidamente – A única coisa que vem à minha mente, é que Zack faria tudo que pudesse para ajudar você e será isto quer farei.
Ás palavras de Lucius me pega desprevenida, completamente.
Antes que eu pudesse responder, alguém entra no quarto, interrompendo a conversa.
- Como você está hoje? – Dr. Schultz pergunta num tom cordial – Já pensou melhor sobre a cirurgia plástica?
Não podia prolongar mais minha decisão. Precisava arriscar ou não.
- E então? – Ele insiste, quando já se passa alguns segundos.
Só então percebo que minha boca está seca. Umedeço meus lábios com a língua, engolindo em seco em seguida.
- Vai mexer muito no meu rosto? – Minha vos soa hesitante, quase trêmula.
- O cirurgião plástico irá fazer o necessário. Há muita coisa que precisa de atenção. Eu trouxe alguns retratos baseados na circunferência do seu rosto, para você escolher o qual acha que se encaixa melhor com você.
Se aproximando da cama, põe nas minhas mãos alguns papéis um pouco mais resistentes do que os comuns.
Semicerrando as pálpebras, consigo ver borrões de rostos, ao folhear os retratos.
- Quer que eu ajude você? – Lucius pergunta, tirando minha atenção dos borrões.
- Quando decidir qual é o melhor para você, m****r me chamar – diz Dr. Schultz, saindo do quarto.
Sinto Lucius se aproximar, seu perfume me envolvendo lentamente.
- Me deixe ver isto – diz pegando os retratos da minha mão. O ouço folhear um por um em silêncio, não me deixando imaginar qual era sua expressão ao ver cada retrato – Temos cinco opções – diz com a voz um pouco animada.
- Certo. Cinco opções.
- Elisabeth. Samantha. Kimberly. Joane e a Ivy.
- Tem nomes aí? – pergunto curiosa.
- Acabei de inventar – Ele estava criando um enredo para cada uma.
- E como elas são?
Ele limpa a garganta, sentando na beirada da cama.
- Elisabeth me parece muito séria, não parece gostar muito se se divertir. Samantha, aventureira demais. Kimberly, sarcástica. Joane, inteligência irritante e Ivy, um pouco de cada, com uma pitada de mistério – Ergo um dos cantos da boca num sorriso, gostando da “descrição” dada para cada personagem – Quem você quer ser?
Não fazia ideia de quem eu era e era estranho imaginar quem eu queria ser.
Minha vida literalmente é uma vida em branco e estava ali diante de cinco personagens.
- Com qual você acha que me pareço? – Às palavras pulam da minha boca, sem chance de deter a pergunta.
- Quer sinceridade?
- Por favor.
Lucius fica em silêncio por alguns segundos, folheando novamente os retratos.
- Ivy.
- Ivy – repito pensativa.
- Um pouco de cada coisa.
Um vestígio de um sorriso surge em meu rosto, já que não conseguia sorrir literalmente.
– Enquanto não descobrimos seu nome, este pode ser o seu – Ele sugere – Ivy – Precisava de um nome afinal de contas e aquele soou perfeito – O quê acha?– Ivy parece bom – Lucius fica em silêncio novamente – Quando será que devo fazer a cirurgia?– Acredito que o mais rápido possível – Movo meus lábios de um lado para o outro, tentando não demonstrar que estava nervosa – Vai ficar tudo bem – Meus olhos vagam pelo vulto à frente, tentando ficar em algum ponto – Quando acabar, já vai ter acabado – Assinto, esperando que fosse simples dessa maneira – Vou avisar o Dr. Schultz que já escolheu um rosto.– Lucius... – digo de repente, quando ele já está perto
Meio por fim, acabei sedada. Devido a dor que estava sentindo por causa da cirurgia plástica e porquêestavam me achando muito agitada.Flashes aparecem de repente em minha mente, como lampejos.Primeiro uma discussão acalorada. Eu andava de um lado para o outro, nervosa, dizendo alguma coisa, enquanto gesticulava; A poucos passos de mim, estava um homem, a expressão incrédula e os olhos vazios, absorvendo tudo que era dito por mim.A cena muda de repente. Dessa vez, ele lê algo em um papel, sorrindo por fim, erguendo os olhos na minha direção.Eu também sorrio, levando ás duas m&atild
Não consigo desviar os olhos do rosto do médico, olhando cada traço com atenção, enquanto minha mente assimilava suas palavras.- Eu saberia se estivesse grávida - digo. Ou não, como saberia, se havia acordado recentemente sem memória?- Mas está - Ele me entrega um amontoado de folhas, indicando com o dedo a palavra reagente - Para ser exato de três meses.Olho para Lucius no mesmo instante, entendo sua reação quando o médico o chamou para conversar.- É do Zack?! - pergunto num tom acima.- Só iremos ter certeza com um exame de DNA - diz Lucius, engolindo em seco - E para isso preciso da sua...- Autorização - Completo, sentindo minha boca seca, sustentando seu olhar - Tudo bem.Ele assenti, baixando a cabeça.- Em br
Lucius senta na poltrona perto da janela, fixando o olhar no vazio.- Diz alguma coisa, Lucius - digo impaciente, após alguns segundos.Seus olhos sustentam os meus.- O bebê é de Zack - diz baixo.Franzo o cenho, inclinando a cabeça para o lado.Então estava mesmo grávida e ainda por cima grávida de Zack, um herdeiro bilionário do petróleo. Abro e fecho a boca, procurando as palavras para rebater aquela afirmação. Desistindo quando não consigo pensar em nada coerente. Lucius pega seu celular de repente.- O que foi? - Consigo perguntar. Ele não
Algum tempo depois, deixamos a cidade para trás, literalmente. Acabando por sermos envolvidos por floresta nos dois lados da estrada.Uma floresta densa e num verde vivido.Suspiro, conseguindo sentir a paz que estava transmitindo.Por alguma razão, me senti bem e quase que em paz, se não fosse o fato de ter alguém querendo me matar e minha mente não colaborar para acabar com aquele inferno logo.Virando á direita, entramos em uma estrada de areia, continuando rodeados por todo aquele verde. Mais alguns metros e vejo quando um grande portão de ferro, se abre lentamente e dois seguranças param diante dele. Olhando com atenção quem
- Tenha uma boa noite, Ivy - Lucius murmura, quando passo por ele no corredor do segundo andar, após o delicioso e constragedor jantar.Lhe dou um leve sorriso por cima do ombro, ao deixá-lo na primeira porta do corredor do lado direito.Em meu quarto, parada perto da cama, encaro o silêncio, decidindo ligar a TV.Tirando meu short, me coloco em baixo da coberta, fixando meus olhos na tela do aparelho, até ser vencida pelo sono.Como ás outras vezes, não sonho, tenho um sono profundo, porém sem nenhum sono para enfeitar.No dia seguinte, o sol serve como despertador, já que esqueci de fechar ás cortinas pesadas.<
Depois de ser pega por Lucius em seu quarto, algo que iria demorar para esquecer, decido me trancar no quarto de hospedes.Nas horas seguintes, até o jantar, tentei parar de ruborizar toda vez que lembrava de ter sido pega por ele xeretando em seu quarto.Uma tarefa impossível, mesmo zapeando todos os canais da televisão em busca de algo que prendesse minha atenção. Perto da hora do jantar, saio da minha “toca”, voltando para o primeiro andar, que continuava sem nenhuma movimentação.A mesa do jantar já estava posta e não havia nenhum sinal de Lucius por perto. Deste modo, ainda permaneci
Parada em frente ao espelho embaçado do banheiro, após o banho, olhava a mulher ali refletida, ansiando para entendê-la.A forma como Lucius segurou minha mão e me conduziu em segurança para fora da floresta, de alguma forma, ascendeu alguma coisa em mim, que não sabia se já estava ali ou se estava crescendo gradativamente. Lucius era um homem atraente, apesar da idade que aparentava ter, próximo da casa dos quarenta e cinco anos. Eu perto dele, passava como sua filha facilmente, pois não me dava mais de vinte e cinco anos. Respiro fundo, me obrigo a sair da linha de pensamento que havia criado em minha cabeça, indo me vestir.