Capítulo 8
Camila narrando : A tarde passou arrastada. Tentei focar nos estudos, mas minha cabeça só conseguia voltar pra aquele momento na escola, pro jeito que Guilherme me olhou antes de me beijar. Eu sentia um frio na barriga só de lembrar. Peguei o notebook e abri os materiais pra estudar, mas a cada parágrafo lido, minha mente voltava pra ele. Só então me dei conta de um detalhe importante: eu não tinha pedido o número do celular dele. — Como eu fui esquecer isso? — murmurei, frustrada, me recostando na cadeira. Eu queria tanto falar com ele, saber como tinha sido o dia dele depois da escola, se ele tava pensando em mim também… Mas agora ia ter que esperar até amanhã. Suspirei e tentei voltar a estudar, mas as palavras na tela do notebook pareciam embaralhadas. Meu cérebro se recusava a prestar atenção. Foi quando ouvi batidas suaves na porta. — Minha menina, trouxe um lanchinho pra você — Dona Maria entrou com uma bandeja, um sorriso carinhoso no rosto. Olhei pra bandeja, mas minha fome era zero. — Não tô com vontade, Maria… Ela franziu a testa e veio até mim, colocando a bandeja na escrivaninha. — Desde que chegou da escola, não comeu nada direito. Tá acontecendo alguma coisa? — Não, só tô sem apetite — menti, desviando o olhar. Ela sentou na beirada da cama e me observou por alguns segundos. — Isso tem nome? — ela perguntou com um sorriso de canto. Olhei pra ela sem entender. — Nome? — Nome de rapaz, minha filha. Porque esse olhar aí eu conheço bem. Meu rosto esquentou na hora. — Maria! — protestei, mas ela só riu. — Sei quando alguém tá com a cabeça longe… e pelo jeito, longe não, né? Tá na escola. Soltei um suspiro, derrotada. — É… conheci um garoto. — Ahá! Eu sabia! — Ela bateu palminhas, animada. — E ele é bonzinho? Sorri sozinha, lembrando do jeito de Guilherme. — Ele é incrível, Maria. Diferente de todo mundo que eu conheço. Ela assentiu, satisfeita. — Então come esse lanche, minha menina. Coração cheio, barriga vazia, ninguém aguenta! Peguei um pedaço do pão e dei uma mordida pequena, só pra agradá-la. Mas enquanto mastigava, um pensamento me incomodou. Como meu pai reagiria se soubesse de Guilherme? A resposta era óbvia. E me dava medo. Terminei de comer só porque Dona Maria tava ali, me olhando como se pudesse ler todos os meus pensamentos. Ela sempre foi mais que uma babá, era minha amiga, minha mãe de coração desde que perdi a minha de verdade. Quando ela recolheu a bandeja e foi saindo do quarto, parou na porta e me olhou de lado. — Cuidado, minha menina… Não deixa ninguém apagar esse brilho bonito que tá nos seus olhos. Fiquei em silêncio, encarando ela, sem saber o que dizer. Era como se ela já soubesse de tudo, mesmo sem eu ter contado nada. Assim que a porta fechou, suspirei fundo e voltei pro notebook, tentando me concentrar de novo. Mas a verdade era que meu coração tava acelerado, inquieto. Eu gostava do Guilherme. Gostava do jeito que ele me olhava, do jeito que falava comigo, como se eu fosse só a Camila, e não "a filha do empresário mais conhecido do Rio". Mas eu sabia que meu pai nunca aceitaria isso. Ele já tinha decidido minha vida sem nem perguntar o que eu queria. Já tava planejando meu casamento com um rapaz que eu mal conhecia, só porque era filho de um empresário amigo dele. Como se eu fosse um negócio a ser fechado. Apertei os lábios, sentindo uma raiva amarga subir pela garganta. Peguei o celular por impulso, querendo ligar pra alguma amiga, desabafar. Mas quando abri a tela, só vi contatos de pessoas que provavelmente não entenderiam. Meninas que viviam no mesmo mundo que eu, mas que não saberiam o que era gostar de alguém que seu pai jamais aprovaria. E o pior… eu nem tinha o número do Guilherme. Fechei os olhos, frustrada. Amanhã eu ia ver ele. E precisava de coragem pra pedir o número antes que o destino resolvesse brincar comigo de novo. A noite chegou, e eu já tava me preparando pra dormir quando ouvi a voz firme do meu pai ecoando pelo corredor. — Camila, venha até o escritório. Meu estômago revirou na hora. Sempre que ele me chamava pra falar nesse tom, eu já sabia o assunto: o tal rapaz que ele queria que eu namorasse. Respirei fundo e fui até lá. O escritório do meu pai sempre teve um cheiro forte de madeira misturado com aquele perfume caro que ele usava. As paredes cobertas de prateleiras cheias de livros que eu duvidava que ele já tivesse lido, e uma mesa enorme onde ele passava horas lidando com os negócios da empresa. Ele tava sentado na cadeira de couro, os olhos fixos no computador, mas assim que entrei, ele desligou a tela e me encarou. — Senta — ordenou, apontando pra cadeira na frente da mesa. Obedeci em silêncio, já sentindo a tensão no ar. — Amanhã, no jantar, Alberto, e a família dele vêm aqui. Quero que esteja presente. Alberto. De novo. Apertei os lábios, sentindo a raiva crescer no peito. — Pai… — Camila, já conversamos sobre isso — ele me cortou antes que eu dissesse qualquer coisa. — O Alberto é um rapaz promissor, filho de um grande empresário, Saulo, pai dele é milionário, e essa aproximação é importante para a família. "Para a família". Como se eu fosse um contrato, um investimento. — E o que eu quero? Não importa? — minha voz saiu mais dura do que eu esperava. Meu pai me olhou sério, cruzando os dedos sobre a mesa. — O que você quer, Camila, é irrelevante quando se trata do futuro da nossa família. Você foi criada pra estar ao lado de alguém à sua altura. Mordi o lábio, segurando as lágrimas de frustração. Se eu falasse mais alguma coisa, ia acabar chorando, e eu me recusava a dar esse gosto pra ele. — Pode ir — ele disse, voltando a ligar o computador. Levantei da cadeira, com as mãos tremendo de raiva. — Eu não sou um negócio, pai — soltei antes de sair, batendo a porta atrás de mim. Fui direto pro meu quarto, prendi a respiração e só soltei quando me joguei na cama. O que eu ia fazer? Eu não queria esse jantar. Não queria Alberto. Não queria essa vida que meu pai escolheu pra mim. O que eu queria... era Guilherme. Continua ....Capítulo 9Guilherme narrando :O dia começou cedo, como sempre. Acordei antes do sol, o que já era rotina. O cheiro de café forte, que minha mãe fazia todos os dias, já estava no ar, mas eu ainda sentia aquele cansaço nas costas. Vida de quem mora longe, estuda em escola particular e tenta dar o melhor de si não é fácil, mas era o que eu tinha.Tomei um banho rápido, só pra acordar de vez, e me vesti com a roupa que eu tinha de melhor: uma camiseta que já tava meio velha e um jeans que não era dos melhores, mas servia. Eu não me importava muito com isso. O que eu queria mesmo era sair e conquistar minha vida, o resto… era só detalhe.Saí de casa, tentando não pensar muito no que estava por vir. Peguei o primeiro ônibus, depois o segundo, e como sempre, fiquei olhando pela janela, pensando em tudo e ao mesmo tempo em nada. Pensava na bolsa que me sustentava na escola, nos meus planos pro futuro, e também, por mais que eu tentasse esconder, nela. Na Camila.Cheguei na porta da escola,
Capítulo 10Guilherme narrando :O dia passou mais rápido do que eu esperava. Talvez fosse porque minha cabeça estava em outro lugar. A cada intervalo entre as aulas, eu me pegava olhando pra Camila. Ela estava algumas fileiras à frente, concentrada no caderno, mas vez ou outra, eu percebia que ela também me olhava. Era engraçado, porque parecia que a gente já tinha essa conexão, mesmo sem se conhecer direito.Quando a última aula terminou, meu coração acelerou. O combinado tava de pé: tomar um sorvete com ela antes de ir pro meu primeiro dia de trabalho.Saímos juntos pelo portão da escola, e ela me guiou até uma sorveteria ali perto. Eu nunca tinha entrado nesse tipo de lugar. Tudo era tão organizado, bonito e caro. Me senti meio deslocado, mas tentei não demonstrar.— Escolhe o que você quiser — ela disse, com um sorriso, enquanto pegava o cardápio.— Não precisa, Camila, sério. Qualquer coisa tá bom — respondi, tentando não me sentir um peso.Ela revirou os olhos, como se eu tives
Capítulo 11Camila narrando :Cheguei em casa e, como esperado, meu pai não estava. Ele sempre chegava tarde, ocupado demais com reuniões e jantares de negócios. Meu irmão, provavelmente, também estava fora, cuidando dos interesses da família. Isso significava que, pelo menos por algumas horas, eu teria paz.Subi direto pro meu quarto, joguei a bolsa na cama e soltei um suspiro longo. O dia tinha sido intenso. O beijo de Guilherme ainda não saía da minha cabeça, e o jeito que ele me olhava… Era diferente de tudo que eu já tinha sentido.Me joguei na cama e fiquei encarando o teto, um sorriso bobo escapando sem que eu percebesse. Eu queria mandar mensagem pra ele, falar qualquer coisa, mas me lembrei que ele não tinha celular. Isso me pegou de jeito. Eu nunca tinha parado pra pensar que alguém da nossa idade poderia não ter um telefone. Minha realidade sempre foi tão diferente…Fechei os olhos, lembrando da nossa conversa na porta da escola. O jeito que ele ficou sem graça ao dizer que
Capítulo 12Camila narrando :Continuação :Nos sentamos à mesa, e eu fiz o possível para fingir que aquele jantar não era uma sentença. Meu pai estava animado, conversava com Albert sobre negócios, investimentos, tudo aquilo que eu nunca me importei de verdade. Meu irmão, como sempre, fazia seu papel de herdeiro exemplar, apoiando cada palavra do nosso pai, rindo das piadas sem graça e mostrando interesse em cada detalhe da conversa.— E então, Camila, como estão seus estudos? — Albert perguntou, me olhando com um sorriso calculado.Engoli seco e ajeitei o guardanapo no colo antes de responder.— Vão bem — disse simplesmente, sem vontade de prolongar o assunto.— Seu pai me disse que você está pensando em administração. Ótima escolha. Quem sabe um dia podemos trabalhar juntos? — Ele sorriu, como se aquela ideia fosse maravilhosa.Meu pai lançou um olhar de aprovação, claramente satisfeito com o rumo da conversa.— Isso seria excelente — ele disse. — Camila precisa de um homem como vo
Capítulo 13Guilherme narrando :Cheguei em casa e a luz da sala ainda tava acesa. Suspirei, já imaginando minha mãe sentada no sofá, esperando eu entrar pela porta.Girei a chave na fechadura devagar, mas foi inútil. Assim que abri a porta, lá estava ela, de braços cruzados e um olhar que misturava alívio e bronca.— Achei que você ia dormir no café — ela soltou, levantando da poltrona.Dei um sorrisinho sem graça, largando a mochila num canto.— O movimento foi puxado hoje. Mas foi bom, mãe. Gostei do trampo.Ela me olhou de cima a baixo, como sempre fazia, conferindo se eu tava bem.— Cansado?— Um pouco — admiti, me jogando no sofá. — Mas valeu a pena.Ela suspirou, indo até a cozinha. Em segundos, voltou com um prato de comida e colocou na mesinha de centro.— Come. Fiz arroz e feijão fresquinho.Meu estômago roncou só de sentir o cheiro. Peguei o garfo e comecei a comer, enquanto minha mãe se sentava ao meu lado.— E a escola? Tudo certo?Assenti de boca cheia.— Tudo sim.Ela e
Capítulo 14Guilherme narrando:Um mês depois :O tempo passou depressa. Num piscar de olhos, já tava nos últimos dias de aula, e parecia que tudo tinha mudado num curto espaço de tempo.No café, me esforcei tanto que a Patrícia acabou me promovendo. Agora, além de atender, eu também trabalhava no caixa, e isso significava que eu ganhava um pouco mais. Não era muita coisa, mas já ajudava em casa. Minha mãe ficou orgulhosa quando contei, e aquilo me deu um gás a mais pra continuar dando o meu melhor.Mas o que mais tinha mudado nesse mês… era o que eu sentia pela Camila.A cada dia que passava, eu tava mais apaixonado por ela. No começo, achei que fosse só aquela empolgação de algo novo, mas não… Era mais que isso. Todo dia, depois da aula, a gente ficava junto. Às vezes, era só uma conversa na pracinha perto da escola, outras, ela me levava pra conhecer lugares que eu nunca teria ido sozinho.E o jeito que ela me olhava… como se eu fosse alguém especial. Isso me pegava de um jeito que
Capítulo 15Camila narrando :Já se passaram um mês e parece que o tempo tá passando rápido demais. Fui ficando cada vez mais enfiada em casa, tendo que aguentar meu pai e o peso de ter que fingir que tudo tá bem. Mas isso vai mudar assim que eu fizer dezoito anos. Vou exigir a herança que minha mãe deixou pra mim e vou sumir daqui, pra bem longe dele e do meu irmão.A verdade é que meu pai tá me obrigando a namorar o Albert. Ele vem aqui quase toda semana, fica pra jantar, me observa como se fosse uma peça de vitrine. Nunca aconteceu nada entre a gente, e eu já deixei claro que não gosto dele, que nunca vou gostar. Mas ele... ele insiste. Fica dizendo que é o melhor pras famílias, que ele gosta de mim, como se isso fosse algum tipo de justificativa.Eu só vou empurrando as coisas, fingindo que tô aceitando, mas a cada dia que passa, fico mais certa de que assim que puder, vou sumir. Eu não mereço essa vida. Eu não vou ser forçada a fazer nada que eu não queira. Então, vou esperar o t
Capítulo 16Camila narrando :Passei o resto da tarde agoniada, contando os minutos pra noite chegar logo e o outro dia amanhecer. A ansiedade tava me consumindo, e pra tentar me distrair, coloquei uma série coreana que eu tava acompanhando. E nossa, tava boa demais! Mas nem isso fazia minha mente parar de voltar pro Guilherme e pra tudo que ia acontecer amanhã.Quando percebi, já tinha escurecido lá fora. A luz do meu quarto tava fraquinha, e eu continuava jogada na cama, de pijama, abraçada no travesseiro, quando a dona Maria entrou sem nem bater.— Camila, minha filha, já tá de noite e você nem desceu pra comer nada… — Ela parou perto da cama e me olhou daquele jeito de mãe preocupada.Eu suspirei, largando o celular no colchão. — Eu não tô com muita fome, Maria.Ela franziu a testa e cruzou os braços. — Não vem com essa. Passou a tarde toda trancada aqui, vidrada nessa telinha… Nem parece aquela menina que eu conheço. Tá acontecendo alguma coisa?Tentei disfarçar, mas Maria semp