~BERNARDO~Eu já deveria ter saído para trabalhar, mas algo dentro de mim me impedia de deixar o apartamento naquela manhã. Então, pedi que Cláudia reorganizasse minha agenda e fiquei esperando por Alice. Devido ao seu plantão, ela ainda não tinha voltado para casa quando acordei, e o pensamento de ter que encarar mais um dia na Orsini, sabendo de tudo o que estava acontecendo, me deixou inquieto. Decidi que não podia esperar mais para conversar com ela. Precisávamos tirar todos os segredos do caminho, antes que eles nos consumissem por completo.Quando Alice finalmente chegou, parecia exausta. O cansaço estava estampado em seu rosto, seus movimentos eram lentos e pesados. Ela murmurou alguma coisa e me deu um beijinho enquanto se dirigia diretamente para o banheiro. Fiquei ali, sentado na cama, esperando, meu coração batendo mais rápido a cada segundo que passava. Tinha passado a noite remoendo o encontro com Lúcia, e a culpa por ter mantido isso em segredo estava me corroendo.Alice
Deitada na cama do hospital, eu encarava o teto, tentando processar a ironia cruel da situação. Eu amava aquele lugar como médica, o hospital era meu refúgio, meu campo de batalha, onde eu sentia que realmente fazia a diferença. Mas estar ali como paciente... era um pesadelo. Tudo o que eu queria era arrancar aqueles fios que me prendiam à cama, vestir meu jaleco e voltar ao trabalho. Precisava desesperadamente ocupar minha mente com algo útil, algo que me fizesse esquecer o medo crescente que apertava meu peito.Sem pensar muito, comecei a puxar os fios que monitoravam meus sinais vitais. Um de cada vez, sentindo a leve dorzinha dos adesivos se soltando da pele. Eu queria estar no controle de algo, qualquer coisa, mesmo que fosse apenas o ato de me desconectar daqueles aparelhos que me faziam sentir tão vulnerável.— Alice, pare com isso! — A voz de Bernardo ecoou pelo quarto, arrancando-me do meu devaneio.Eu virei a cabeça e o vi sentado em um sofá, a expressão alarmada. Ele pareci
~BERNARDO~O dia anterior havia sido um caos completo, e eu mal consegui dormir, preocupado com Alice e sua saúde. A imagem dela desmaiando em meus braços não saía da minha mente, e o medo de perdê-la me assombrava a cada segundo. Eu sabia que precisava estar ao seu lado, mas, ao mesmo tempo, a Orsini exigia minha atenção. A verdade é que eu não queria deixar Alice, mas, no fundo, sabia que precisava enfrentar o que estava acontecendo na empresa. A Orsini Tech estava em risco, e se eu não agisse rapidamente, todo o legado da minha família poderia cair nas mãos erradas. Valentina estava movendo suas peças com uma precisão cruel, motivada por vingança, e eu não fazia ideia do que ela seria capaz de fazer se assumisse o controle. A simples possibilidade de ver tudo o que construímos sendo distorcido e manipulado por ela era insuportável.Na manhã seguinte, cheguei à Orsini mais cedo do que de costume, tentando compensar o dia anterior perdido. Mas assim que entrei no prédio, senti uma at
Estava em casa há poucas horas, mas o tempo parecia se arrastar de uma maneira quase cruel. Três dias de atestado. Eu entendia a necessidade, mas isso não significava que eu gostasse da ideia. Trabalhar me fazia bem, me mantinha focada, dava sentido ao meu dia. E agora, ali estava eu, sem nada para fazer além de aguardar.Já havia esgotado todas as possibilidades de entretenimento: usei a academia de Bernardo, tomei um banho de piscina, fiz sauna para tentar aliviar o estresse acumulado e até brinquei com Ian, que decidira não levar para a creche, já que eu estava em casa. Mas nada parecia suficiente para preencher o vazio que o afastamento do trabalho deixava em mim. O relógio, implacável, ainda não marcava nem dez da manhã, e eu já me sentia à beira de um ataque de nervos.Suspirei, frustrada, e me joguei na cama, os braços estendidos ao lado do corpo, encarando o teto como se ele fosse o culpado pelo meu tédio. Era apenas o primeiro dia de três, e eu já estava assim. Como seria se
Eu não esperava encontrar Valentina logo de cara. O impacto da surpresa foi instantâneo, mas não demorou muito para que se transformasse em uma raiva visceral, difícil de conter. Ali estava ela, com aquele sorriso presunçoso e maldoso estampado no rosto, os olhos fixos em mim, afiados como lâminas prontas para cortar. Cada detalhe de sua postura, da maneira como me olhava de cima a baixo, parecia calculado para me provocar. Ian, inocente e alheio a tudo, estava tranquilo em seu carrinho, e a simples ideia de Valentina se aproximando dele fez meu sangue ferver, como se um alarme de perigo tivesse disparado dentro de mim. O instinto protetor explodiu, e tudo o que eu queria naquele momento era mantê-la o mais longe possível do meu filho. Não havia espaço para palavras gentis ou trocas de farpas disfarçadas — ao menos não da minha parte.— Alice, que surpresa te encontrar por aqui — disse Valentina, com aquele tom falso que sempre me irritava. Ela olhou para Ian, e depois de volta para m
~BERNARDO~O restaurante do Hotel Milani era o tipo de lugar sofisticado, com um ambiente acolhedor, perfeito para uma refeição tranquila. No entanto, minha atenção estava menos voltada para o ambiente e mais para Alice. Ela estava sentada à minha frente, cortando pequenos pedaços de sua refeição, e eu não conseguia evitar um sorriso enquanto a observava. Havia algo nela, algo na forma como ela se recuperava rapidamente dos choques que a vida lhe lançava, que me fascinava.Durante boa parte do almoço, fiquei ali, olhando para ela de um jeito que claramente a deixou curiosa, mas eu estava me divertindo demais para quebrar o silêncio primeiro. Foi só quando ela finalmente ergueu os olhos, encontrando os meus, e arqueou uma sobrancelha que eu decidi falar.— O que foi? — perguntou ela, com um sorriso nos lábios. — Por que você está me olhando assim?Inclinei-me um pouco sobre a mesa, ainda sorrindo.— Eu só... — comecei, escolhendo as palavras com cuidado. — Eu só não imaginava que você
~BERNARDO~Os dias se passaram em um borrão de problemas crescente e noites mal dormidas. Eu me dividia entre o trabalho na Orsini Tech, onde as pressões e os ataques de Valentina se intensificavam, e em casa, onde Alice lutava contra seus próprios demônios. Ela tinha voltado ao trabalho, mas ainda estava afastada das cirurgias, o que a deixava extremamente mal-humorada. As coisas não estavam nada fáceis para nenhum de nós. Foi em meio a essa tempestade que decidi que não poderia mais adiar a conversa com Lúcia. Precisava entender até onde ela estava disposta a ir e, se possível, colocar um ponto final nessa história antes que ela destruísse ainda mais nossas vidas.No entanto, encontrar tempo para ir até a casa dela não foi simples. Entre as reuniões da auditoria, as discussões com o conselho da empresa e a necessidade de cuidar de Alice e Ian, mal conseguia respirar. Mas finalmente, depois de uma semana exaustiva, consegui uma brecha. Usei meus contatos para descobrir o endereço de
Desde que fui diagnosticada com Síndrome do Túnel do Carpo, minha mente não parava de imaginar todos os cenários possíveis para o meu futuro. O que aconteceria com minha carreira se isso piorasse? E se eu nunca mais pudesse operar? Pensar nessas questões era uma tortura constante, e o tempo que passei em casa, longe do hospital, só fez a situação piorar. Bernardo estava sendo um grande apoio, mas ele também estava lidando com seus próprios problemas. Algo estava pesando sobre ele, e isso me incomodava profundamente.Naquela manhã, Bernardo saiu cedo para mais um dia na Orsini Tech. Eu sabia que as coisas na empresa estavam tensas, especialmente com Valentina tramando algo novo o tempo todo. Mas havia algo mais, uma sombra entre nós que eu não conseguia identificar completamente. Quando ele me beijou antes de sair, senti uma ponta de culpa em seu gesto, e isso acendeu um alarme dentro de mim.Depois que ele saiu, decidi tentar me distrair organizando o apartamento, já que eu só pegava