~BERNARDO~O sol de verão já estava alto no céu quando me dirigi para a praia, onde o bar ainda estava montado desde a noite anterior. O cenário era sereno, com as ondas suaves do mar beijando a areia branca e o céu se tingindo de cores quentes. Mas dentro de mim, uma tempestade se formava, ofuscando toda a beleza ao meu redor. Sabia que Valentina estaria lá, aproveitando o início do dia para tomar sol e, como sempre, cercada de futilidades e conversas vazias com Cíntia, Clarice e outras de nossas primas.Ao me aproximar, vi que minha suposição estava certa. Valentina estava reclinada em uma espreguiçadeira, com um drink na mão, rindo de algo que Cíntia havia dito. Clarice estava ao seu lado, sorrindo de forma condescendente. Não me aproximei muito, sabia que se o fizesse, acabaria perdendo a pouca paciência que ainda me restava. Em vez disso, fiz um sinal com a cabeça para Valentina, indicando que precisava falar com ela.Ela me viu e, após lançar um olhar de curiosidade, levantou-se
O som suave dos pneus deslizando pela estrada e a brisa que entrava pela janela do carro traziam uma sensação de paz que eu precisava desesperadamente. Depois de tudo o que aconteceu na casa dos Orsini, o retorno ao Rio de Janeiro parecia uma fuga necessária. O céu estava limpo, com poucas nuvens, e o sol brilhava, aquecendo levemente o interior do carro. Olhei para Bernardo, que dirigia com uma expressão séria, mas havia algo em seu olhar que me dizia que ele também estava tentando deixar para trás o caos dos últimos dias.Ian estava no banco de trás, entretido com um brinquedo de dinossauro colorido que emitia sons e luzes a cada toque. O som repetitivo e alegre do brinquedo trouxe um sorriso ao meu rosto, desviando meus pensamentos de tudo o que vinha me assombrando.— Parece que alguém está gostando de voltar para casa — comentei, olhando pelo retrovisor para Ian, que parecia completamente alheio aos problemas dos adultos.Bernardo sorriu, um sorriso leve, mas que me aqueceu por d
Enquanto a noite avançava, o silêncio acolhedor do apartamento era quebrado apenas pelo som baixo da televisão, onde um programa qualquer, bobo e despretensioso, passava em segundo plano. Bernardo e eu estávamos enroscados no sofá, abraçados de uma maneira que era ao mesmo tempo confortável e íntima, como se o mundo lá fora não pudesse nos alcançar ali. A luz suave das lâmpadas criava uma atmosfera tranquila, e Ian dormia serenamente no berço ao lado, o leve movimento de sua respiração quase imperceptível, mas reconfortante. Era como se o tempo tivesse desacelerado, permitindo-nos aproveitar cada segundo daquela paz que tanto precisávamos.Bernardo passou o braço ao redor dos meus ombros, me puxando para mais perto, e eu me aconcheguei nele, sentindo o calor de seu corpo e o ritmo estável de sua respiração. Era nesses momentos simples que eu percebia o quanto aqueles instantes cotidianos eram preciosos.— Sabe, acho que gosto mais desse apartamento do que imaginava — ele disse, rompen
Os dias se passaram de forma silenciosa, como se cada um carregasse consigo um peso de nostalgia e expectativa. Bernardo e eu começamos a arrumar as coisas do nosso apartamento, empacotando lembranças e memórias que, de alguma forma, pareciam estar se multiplicando. Cada objeto que eu colocava em uma caixa trazia consigo uma lembrança, uma história. O quadro que pendurei na sala logo depois de me mudar, as canecas que colecionei ao longo dos anos, até mesmo as pequenas imperfeições nas paredes, todas pareciam ter uma importância que eu não tinha percebido antes.Havia algo de melancólico em deixar para trás aquele espaço que, por tanto tempo, havia sido o meu refúgio. Mas eu sabia que essa mudança era necessária, que estava sendo feita por um bem maior. Ainda assim, o nó na minha garganta só apertava cada vez que eu olhava ao redor e via meu apartamento sendo esvaziado.— Tudo bem? — Bernardo perguntou uma noite, enquanto empilhava caixas no canto da sala.Eu sorri, embora a expressão
~BERNARDO~Ao contrário de Alice, que enfrentava seu primeiro dia no novo hospital com uma mistura de ansiedade e determinação, eu não estava nem um pouco ansioso para voltar ao trabalho na Orsini. Sentia um peso no peito, como se cada passo que eu desse em direção ao prédio da empresa estivesse me levando para dentro de uma tempestade que eu não poderia evitar. Havia uma tensão latente no ar, uma sensação de que algo estava prestes a explodir, e eu sabia que seria o alvo principal.Quando cheguei à Orsini, o ambiente me pareceu mais frio do que nunca. O prédio, com suas paredes de vidro e aço, refletia o céu cinzento daquela manhã. As pessoas que cruzavam comigo nos corredores pareciam estar à espreita, com olhares furtivos e cochichos que cessavam abruptamente assim que eu passava. Era como se todos soubessem de algo que eu não sabia, ou pior, que todos estivessem esperando pelo momento certo para me atacar.Entrei no meu escritório e fechei a porta, tentando criar uma barreira físi
~BERNARDO~Valentina estava se provando muito hábil em manipular situações a seu favor, transformando até o menor deslize em uma arma. Mas eu não estava disposto a ceder. Sentia a pressão, a expectativa de todos ao meu redor, mas precisava mostrar que ainda estava no controle. Não era o momento para hesitar, mas sim para demonstrar que eu ainda tinha total domínio sobre a situação, mesmo que por dentro o caos estivesse se instalando.— É exatamente isso que estou fazendo, estou cem por cento focada no sucesso da empresa — Valentina respondeu, com aquele tom de voz suave e quase inocente, que me dava nos nervos. — Mas você anda tão distraído ultimamente, Bernardo, que acabou cometendo um erro gravíssimo no final do ano. Um erro que resultou em um rombo financeiro significativo para a Orsini.Minha respiração ficou presa na garganta por um momento. Antes que eu pudesse processar completamente o que ela estava dizendo, Valentina estendeu um dossiê em minha direção, como se estivesse ofer
~BERNARDO~Quando finalmente cheguei em casa, o estresse acumulado do dia começou a se dissipar assim que abri a porta do apartamento. Fui imediatamente recebido pelo som inconfundível de "Don't Stop Me Now" do Queen, tocando em um volume que fazia as paredes vibrarem levemente. Um sorriso involuntário surgiu no meu rosto. Era praticamente impossível ficar indiferente a uma música como aquela. Sua energia contagiante tinha um jeito de fazer até os dias mais difíceis parecerem suportáveis.Fechei a porta atrás de mim e segui o som, sentindo meu corpo relaxar um pouco mais a cada passo. Enquanto caminhava pelo corredor, já podia imaginar a cena que me esperava. E não estava errado. Ao chegar à porta do quarto, parei e fiquei ali, apenas observando.Alice estava no meio do quarto, completamente imersa em sua própria festa particular. Ela cantava e dançava com uma animação que me fez esquecer, ainda que por um breve momento, todas as preocupações do dia. Em meio à arrumação das caixas da
~BERNARDO~Os dias se arrastaram em uma sequência monótona e desgastante. A rotina na Orsini Tech estava cada vez mais difícil de suportar. A pressão que antes era gerenciável, agora parecia sufocante. Eu estava sendo atacado de todos os lados de forma velada — pequenas sabotagens, rumores maliciosos, decisões importantes sendo tomadas sem o meu conhecimento. Valentina continuava a pressionar para que a auditoria fosse iniciada, tentando minar minha autoridade com o conselho, enquanto eu tentava, discretamente, descobrir mais sobre seus planos.Contratei um investigador particular para ver se conseguia descobrir algo antes de ser atingido novamente. Até agora, os resultados foram vagos, mas já era evidente que Valentina não estava agindo sozinha. Seus aliados estavam bem posicionados dentro da empresa, e suas jogadas eram cuidadosas, o que tornava difícil encontrar algo que pudesse derrubá-la.No entanto, esse não era meu único fardo. Alice também estava passando por um inferno partic