Um mês havia se passado. Durante esse tempo, minha relação com Olivia manteve-se limitada ao acordo. Diante dos outros, éramos o casal perfeito; longe dos olhares curiosos, éramos apenas dois estranhos. Desde o dia em que discutimos sobre o beijo, ela parece cada vez mais distante. Sua presença tornou-se um misto de silêncio calculado e ausência constante. Quando vinha à Orion para tratar do projeto da Future Minds, limitava-se ao essencial: falava apenas o necessário, mantinha-se profissional, educada, mas fria. Era uma barreira invisível que ela parecia empenhada em construir entre nós, e por mais que tentasse, eu não conseguia ignorar como aquilo me incomodava mesmo quando fui eu que gerei isso. Durante esse período, Ronan e Ana começaram a namorar, o que trouxe uma proximidade natural entre ele e Olivia. Era frequente vê-los juntos, saindo com Ana, rindo de algo que só eles entendiam. Essa amizade florescente era algo que eu não esperava. Não que houvesse algo errado, mas… Oliv
— Tentar acostumar-me a caminhar sem o gesso parece tão estranho. — Proferi, enquanto segurava a mão de Ana, caminhando pelas ruas movimentadas. As sacolas em nossas mãos eram carregadas pelos seguranças que nos acompanhavam discretamente. Não me lembrava da última vez que tinha feito tantas compras, mas, de alguma forma, aquilo me fazia sentir um pouco mais leve, como se estivesse começando a voltar à normalidade. — Deve ser o tempo que passaste com o gesso — Ana disse, observando-me com um sorriso brincalhão. — E, sinceramente, que bom que estás bem. Não aguentava mais ver-te com aquilo, só estragava o teu look. — Hey! — Eu a belisquei no braço, fingindo indignação, mas a verdade é que ela tinha razão. O gesso realmente havia me limitado, não apenas fisicamente, mas até no estilo. Eu sentia que não podia ser eu mesma enquanto o usava. — É verdade, Liv. — Ela riu, sem se importar com a minha reação. As palavras dela me fizeram sorrir. Já se passava um mês desde o leilão, desde qu
O relógio no painel do carro marcava 19h42. Não dava tempo de voltar para casa e me trocar. O dia havia sido um caos completo no escritório, com reuniões intermináveis e problemas que exigiam minha atenção. Mas, mesmo exausto e atrasado, eu sabia que não poderia aparecer de mãos vazias. Estacionei em uma floricultura no caminho. O lugar era pequeno e simples, mas tinha algo que me chamou atenção: tulipas brancas. Não eram perfeitas, mas eram delicadas, e isso era o suficiente. Além disso, Olivia era alérgica a rosas. Pagar pela compra foi rápido, mas o peso na minha pasta parecia dobrar a cada minuto. O contrato e o anel estavam lá, junto com o fardo de um acordo que, racionalmente, fazia sentido, mas que emocionalmente parecia cada vez mais errado. Cheguei ao restaurante às 20h15. O maître me guiou até a mesa que havia reservado — uma área isolada, longe de olhares curiosos. O ambiente era acolhedor, mas também íntimo demais, com velas acesas e uma luz suave. Por um momento, me per
Eu inclinei a cabeça e sorri diante da questão. Respirei fundo antes de responder, mantendo o tom firme: — Não estou chateada, mas claramente temos um problema, e eu não sou adepta de falta de comunicação. Damien arqueou uma sobrancelha, mas permaneceu em silêncio. Ele era um excelente ouvinte, mas não no sentido positivo. Esperava, calculava, analisava cada palavra dita antes de decidir como reagir, como se toda interação fosse uma negociação. — Sobre o que exatamente? — perguntou, sua voz neutra, impassível como sempre. — Sobre isso. — Girei o anel no meu dedo, apontando para ele. — Sobre nós. Eu observei enquanto ele cruzava os braços, um gesto quase automático que revelava o desconforto que sentia. Ele não estava acostumado a conversas como essa. — Achei que tivéssemos deixado tudo claro. Os limites foram definidos. Limites. Essa palavra ecoava na minha cabeça como uma barreira constante entre nós dois. Respirei fundo, tentando conter a frustração que crescia dentro de mim.
Eu nunca gostei de confrontos pessoais. Negociações de alto risco, acordos bilionários, fusões corporativas – tudo isso era simples. Havia lógica, números e regras claras. Mas com Olivia, nada parecia seguir um roteiro. Enquanto ela falava, senti meus ombros se tensionarem. Sua voz era firme, mas havia um calor ali, uma intensidade que tornava impossível ignorá-la. — Não estou chateada, mas claramente temos um problema, e eu não sou adepta de falta de comunicação. Falta de comunicação. Quase soltei uma risada amarga. Não era isso que eu estava fazendo? Mantendo tudo claro, objetivo, sem margem para interpretações? Mas Olivia tinha um talento único para desmontar minha lógica, como se enxergasse as fissuras nas paredes que eu construí. — Sobre o que exatamente? — Perguntei, mantendo o tom neutro. Eu já sabia a resposta, mas precisava ganhar tempo, organizar meus pensamentos. — Sobre isso. — Ela girou o anel no dedo, um gesto simples que parecia carregar mais significado do qu
Por mais que tentasse me concentrar na conversa casual que tínhamos decidido ter, algo nele sempre me fazia desviar os pensamentos. Damien era um enigma, um quebra-cabeça que, no fundo, eu não sabia se queria resolver. — Então, qual é a sua opinião sobre filmes de terror? — perguntei, com um sorriso que misturava provocação e curiosidade. Damien levantou o olhar do prato, surpreso. Depois, aquele sorriso discreto e característico apareceu. — Filmes de terror? — repetiu, inclinando ligeiramente a cabeça, como se estivesse considerando a ideia pela primeira vez. — Não é muito a minha praia. Eu ri, de verdade, pela primeira vez naquela noite. — Não me diga que o poderoso Damien Carter tem medo de sustos. — Não é isso. — Ele respondeu, cortando um pedaço de carne com precisão quase militar. — Só não vejo sentido em pagar para me sentir desconfortável. Já tenho o suficiente disso na vida real. Havia uma honestidade inesperada ali, algo que ele mantinha tão cuidadosamente guardado qu
Eu a observei correr para a chuva sem hesitar, seus movimentos tão naturais quanto a própria tempestade. O som das gotas batendo no asfalto parecia ecoar dentro de mim, em um ritmo que eu não conseguia controlar. Olivia era… diferente. Algo nela me fazia sentir que o controle que eu sempre prezara estava escapando por entre meus dedos. Ela girava sob a chuva como se fosse o lugar ao qual sempre pertencera, e eu a observava, imóvel, como se estivesse preso a algo que não entendia. Quando ela me chamou com aquele tom desafiador, minha garganta se apertou. — Vai ficar aí? — ela perguntou, rindo, enquanto os fios molhados de seu cabelo emolduravam seu rosto. Eu queria dizer que sim, que era melhor manter a distância. Mas, antes que pudesse me conter, saí do carro. A chuva me atingiu em cheio, fria, e cada gota parecia levar embora a segurança do que eu conhecia. — Isso é irracional — murmurei, mais para mim do que para ela. Ela riu de novo, como se minha resistência fosse um jogo. —
Acordei pela manhã com o corpo dolorido, resultado da posição nada confortável em que adormeci. Por alguns segundos, permaneci sentada na cama, encarando o nada, até que meu olhar pousou no anel no meu dedo. A confirmação de que, sim, eu estava noiva de Damien Carter. Em breve, seria sua esposa, ainda que por apenas um ano. Essa era a minha escolha, o contrato que decidi assinar. A porta do quarto se abriu, revelando Rosemary, a governanta da casa. Ela entrou com passos hesitantes, e algo em seu semblante me chamou atenção. Conheço Rosemary desde criança. Quando meus avós se mudaram para Villette, ela passou a cuidar da mansão. Após o falecimento deles, meu pai, Alex e eu decidimos mantê-la por perto. Ela era como parte da família. — Rose. — Chamei-a, percebendo sua expressão preocupada. — Aconteceu alguma coisa? Levantei-me e a conduzi até o divã. Ela suspirou antes de começar a falar. Sua filha mais velha estava presa em um relacionamento abusivo há anos. Apesar disso, agora quer