Logo pela manhã, Jean me ligou:— Você tem certeza de que não quer que eu te leve? Sua perna ainda está incomodando para andar.Na noite anterior, eu havia contado sobre o julgamento para ele. Não queria que ele fosse até minha casa e não me encontrasse, acabando por me culpar por não avisá-lo antes.— Não precisa. Esse tipo de ocasião é melhor você evitar. Chamei umas amigas para me ajudar, elas vão comigo. — Respondi.— Tudo bem, fico esperando notícias suas.— Certo.Assim que desliguei, a campainha tocou. Era Bela e Tatiana, que haviam chegado. As duas trouxeram uma cadeira de rodas, dizendo que seria mais prático para me locomover. Era a primeira vez que eu sentava em uma cadeira de rodas e era empurrada por alguém. A sensação era curiosa, para dizer o mínimo.No entanto, o que eu jamais poderia imaginar era que Davi também apareceria no tribunal... em uma cadeira de rodas! Ele parecia realmente debilitado.Quando nos encontramos, a cena era tão absurda que eu quase ri da ironia.
Essas questões, na verdade, já haviam sido completamente esclarecidas durante a primeira audiência. Na época, até mesmo o "júri de familiares e amigos" testemunhou contra Davi, confirmando que ele realmente havia traído, e de forma tão escandalosa que se tornou motivo de chacota na cidade inteira.Eu simplesmente não conseguia entender como ele teve a coragem de, mais uma vez, apelar para a segunda instância, trazendo para o tribunal todos os detalhes sórdidos das coisas horríveis que ele já havia feito. Mas, pensando bem, para ele, o importante era lutar pela própria sobrevivência, prender o "banco de sangue ambulante" que ele enxergava em mim. Ele claramente não se importava com sua dignidade.Enquanto eu listava, uma por uma, as acusações contra Davi, ele me encarava do outro lado da mesa com um olhar fixo, cheio de contenção. Sua raiva estava prestes a explodir.Eu sabia que, se não estivéssemos no tribunal e se ele não estivesse tão debilitado, já teria se levantado para gritar co
Era um sentimento de melancolia que eu sentia por ele.O que me deu um pouco de satisfação, no entanto, foi ver a juíza, após proferir a sentença, dar um recado direto para Davi:— Réu, esta é a decisão final de segunda instância. Não cabe mais recurso.Davi imediatamente retrucou:— Eu vou solicitar uma revisão!Meu coração deu um salto. Ele havia perdido completamente o bom senso!— Solicitação indeferida. Esta decisão entra em vigor imediatamente. O julgamento está encerrado. — A juíza respondeu, cortante, sem dar espaço para discussão.— Eu não aceito isso! Quero apelar! — Davi gritou, sua expressão distorcida e tomada por uma raiva quase insana, como se estivesse sob algum tipo de maldição.Mas a juíza simplesmente o ignorou. Levantou-se, organizou os documentos e saiu do tribunal sem nem olhar para trás.Enquanto meu advogado empurrava minha cadeira de rodas para fora, passamos pelo lugar onde Davi estava. De repente, ele virou sua própria cadeira de rodas e segurou firme no apoi
Eu não respondei a perguntas hipotéticas. Elas não tinham sentido. Além disso, mesmo que não houvesse Jean, entre mim e Davi jamais existiria uma segunda chance.O advogado me empurrou para fora do tribunal, e Bela e Tatiana vieram ao meu encontro imediatamente.— Parabéns! Finalmente você se livrou dele de vez! — As duas já sabiam o resultado do julgamento e me felicitaram com entusiasmo.Dei um leve sorriso:— Vamos almoçar juntas. Podemos celebrar um pouco.— Com certeza! Vamos ao Bom Sabor. Já pedi para reservarem uma mesa. — Bela disse, animada.Convidei o advogado para se juntar a nós, mas ele recusou educadamente, dizendo que tinha muito trabalho a fazer, e se despediu.Nós três seguimos para a saída do tribunal. Assim que começamos a descer os degraus, ouvimos um tumulto na entrada. Quando olhei à frente, franzi o cenho.Os parentes da família Castro estavam lá, acompanhando Eduarda. Não sei quanto tempo esperaram na frente do tribunal, mas claramente estavam ali para me encont
Jean caminhou em passos firmes, sua postura impecável e o semblante sério, embora sem demonstrar emoções claras. Seu rosto, com traços fortes e marcantes, parecia indiferente, mas a profundidade serena de sua expressão era intimidadora o suficiente para silenciar qualquer um.— Sra. Eduarda, ainda não respondeu à minha pergunta. — Jean a encarou diretamente, sua voz calma, mas carregada de autoridade.Eduarda hesitou, sua boca se movendo sem emitir som por alguns segundos. Finalmente, forçou um sorriso nervoso e tentou mudar de assunto, apelando para uma conexão:— Jean, nós já nos conhecemos bem! Na última vez, no aniversário de sua mãe, a família Castro foi cumprimentá-la, e eu conversei bastante com ela. Sua mãe até comentou que...— Parece que a senhora anda ocupada demais para lembrar bem dos fatos, Sra. Eduarda. Porque, se não me falha a memória, naquele dia vocês, mãe e filha, não fizeram nada além de passar vergonha. Quando foi que “conversaram bastante” com minha mãe? — Jean c
Olhei para a mudança repentina de atitude de Eduarda e, imediatamente, me lembrei da última vez em que Davi ficou doente. Naquela ocasião, ela também havia me ligado, falando com humildade, cheia de palavras doces, implorando para que eu fosse ao hospital doar sangue para ele.Quando recusei, sua verdadeira face emergiu rapidamente. Ela começou a me insultar, cuspindo palavras venenosas e cruéis.Agora, enquanto ela implorava novamente, eu a encarei em silêncio por alguns segundos antes de abrir um sorriso leve e frio:— Por que eu deveria concordar? Toda a família Castro me tratou como uma idiota, mentindo e me manipulando. Quando precisam de mim, vêm com palavras gentis; se eu me recuso, me atacam como se eu fosse o problema. Vocês ainda não pagaram nem metade do que me devem.Jean, sem dizer nada, esperou eu terminar de falar e continuou empurrando minha cadeira de rodas para longe.— Kiara! — Eduarda gritou atrás de mim, sua voz cada vez mais desesperada. — Dessa vez é diferente! N
Meu rosto permaneceu inexpressivo enquanto eu observava a cena. Por dentro, meu coração estava frio como gelo. Essa forma de "pedido de desculpas" de Eduarda não tinha um pingo de sinceridade. Pelo contrário, era mais uma tentativa de me jogar em um buraco ainda mais fundo, transformando-me na vilã da história.Para qualquer pessoa que não conhecesse os fatos, poderia parecer que eu estava maltratando uma senhora indefesa, ao ponto de forçá-la a se ajoelhar publicamente para me pedir perdão.Olhei para Davi e disse, com um tom deliberadamente indiferente:— Não há necessidade de ajoelharem. Não há ódio ou vingança entre nós. Quem vai punir sua irmã é a lei, não eu.Depois de terminar, fiz um pequeno gesto com a mão, e Jean imediatamente começou a empurrar minha cadeira de rodas para longe.Eduarda tentou correr atrás de nós novamente, mas Davi a segurou com força, mantendo-a no lugar. Não me virei para ver o que estava acontecendo, mas ouvi claramente a voz de Davi, cheia de raiva e re
Minhas pernas já estavam um pouco mais fortes, então consegui me sentar no carro por conta própria. Quando Jean entrou pelo outro lado e se acomodou, virei-me para ele. Finalmente tive a chance de perguntar:— Por que você veio? Não combinamos que você não se envolveria nisso? Se as coisas saírem do controle, pode acabar atrapalhando você.Jean pediu ao motorista que nos levasse ao Bom Sabor antes de responder:— Eu saí para resolver algumas coisas pela manhã. Quando terminei, olhei as horas e imaginei que seu caso no tribunal já estaria quase no fim. Então decidi passar lá para ver como você estava e, quem sabe, almoçar com você. Mas, assim que cheguei, vi a família Castro cercando você, e sua perna ainda não está boa. Se houvesse algum conflito e você se machucasse novamente, seria ainda pior. Fiquei preocupado e desci do carro para intervir.Ah, então foi isso. Meu coração se aqueceu com sua explicação. Eu estava verdadeiramente grata por ele ter aparecido na hora certa, mas, ao mes