Os olhos da floresta

  -Agora você pode beijar a minha filha - gracejou Katrina ao afastar-se de Soraia á Augusto que o fez com prazer e paixão.

Marcus riu junto com Amy e beijou-lhe o topo da cabeça e recebeu afagos nas costas.

2. Os olhos da floresta

O dia estava amanhecendo, os primeiros raios de sol se infiltravam na caverna, mas somente um brilho tênue chegava até Soraia e Augusto abraçados , de conchinha, em um canto;

Marcus com Amy em seu peito recebendo carinhos nas costas e Katrina em posição fetal bem pertinho das cinzas da fogueira que dava um calorzinho ao ambiente.

Havia o ‘porém’, Soraia não dormiu sem antes ligar para Malvina e a deixar falar com Katrina e o mesmo aconteceu com Amy e a mãe e Augusto com Sheila que contou o episódio com

Miranda que quis falar com Soraia.

Sonolentos foram abrindo os olhos, se espreguiçando e se levantando, menos Soraia que ao levantar-se, tonteou, mas por sorte, Augusto estava ao seu lado e a amparou e ajudou-a a

sentar-se no chão novamente.

-Eu estou tão tonta que nem consigo me manter em pé - admitiu.

-Você não vai conseguir sair daqui sem repor, ao menos, um

pouco do sangue que dera a sua mãe - disse Marcus ao vestir sua jaqueta de couro.

-Dessa vez, eu irei atrás de sangue –informou Augusto ao entregar Soraia aos cuidados da mãe.

Uma voz familiar, até agora sem rosto, surgiu e dissera - não será necessário- e quando todos olharam para a entrada da caverna – com exceção de Soraia – todos ficaram boquiabertos

ao verem Ezequiel com uma garrafinha de sangue junto com os protetores. Augusto cruzou os braços - evidenciando seus belos músculos - e chispou os olhos em direção a Ezequiel que limpou a garganta ao gracejar:

-Corro riscos se me aproximar de Soraia?

-Por que demoraram tanto para aparecerem? - perguntou Soraia assim que recebeu a garrafinha das mãos de Ezequiel e dera um gole que se deliciou.

-Você nos sentiu? - perguntou Lavínia encarando Soraia que lhes sorriu orgulhosa de tê-los descobertos.

-O tempo todo.

-E por que não nos disse nada? - inquiriu Augusto um pouquinho bravo.

-Porque – ela levantou-se já com mais equilíbrio -você os teria mandado embora e, eu temi, e ainda temo que algo nos ronda por entre as árvores. Augusto levou as mãos a cintura,

depois ao rosto, bufou, mas nada falou.

-Eu também sinto algo nos espreitando e, seja lá o que for é bem forte – emendou Ezequiel.     -Então eu sugiro irmos embora –concluiu Caio já saindo e Marcus ia ao seu lado com os demais seguindo-os com um grupo de elite.

Bruxelas, Bélgica

               6 anos atrás

                Floresta de Ardenas

A floresta estava em chamas, lobos de pelagens variadas corriam por todos os lados, uivando para a lua protetora que mandava seu brilho por entre os galhos consumidos ou sendo consumidos pelo fogo.

Risadas malignas ecoavam no ar ao verem o desespero dos lobos, muitos se arriscavam a tentar atravessar as chamas e acabavam sendo consumidos por elas, provocando ainda mais

risadas dos exterminadores. Só um entre todos permanecia rígido, impenetrável, em seu olhar de aço e se sentindo um Deus de olhoem seu traje de borracha reforçada com aço ao

fazer sinal de cruz e beijar seu crucifixo de ouro branco como se sentisse pena dos lobos em chamas e outros já mortos.

Seu nome: Todos o chamam de Isca, por que é sempre ele a armar as armadilhas e ficar de Isca, mas seu verdadeiro nome ninguém sabe e/ou ousa dizer.

Dias atuais

Um trailer cercado por rangers rovers e motos, ambos cromados e nas cores pretas a frente, atrás e de ambos os lados como se fosse o presidente em comitiva pelas ruas ou melhor, por uma estrada cercada por uma cadeia de montanhas de um lado e do outro um paredão de milharal.

Ao horizonte atrás da tempestade anterior fora deixada e uma cidade surgia á frente: Lacrimal city.

Sim, os exterminadores a pedido de uma voz ainda sem rosto, estão vindo a esta cidade.

Uma batalha está por vir e até a guerra final chegar muito sangue humano e sobrenatural irá rolar pelas ruas. Isso claro nos olhos negros de Isca que está no banco ao lado do motorista, cruel e impassível, de postura ereta.

Londres, Inglaterra

Depois de todo o clima tenso na casa dos pais de Joss, principalmente pelo jeito como o pai a tratara e a dispensara só restara a Joss juntar suas roupas e objetos pessoais, engolir a dor, despedir-se da mãe e do irmão que aceitaram seu abraço e sair de casa.Definitivamente.

Na janela do andar de cima, seu pai – um pai de coração duro, mas partido-olhava a filha ir embora, esfregava os olhos furiosamente para impedir que lágrimas tão teimosas quanto

ele rolassem por seu rosto.

Joss deixou as lágrimas caírem por suas bochechas livres como as da mãe que a abraçava como se nunca mais fosse vêla novamente. E talvez estivesse certa.

Leonel estava a duas esquinas da casa, escondido nas sombras de um beco e sentia a mágoa de Joss apertar seu coração, como outrora ocorrera consigo, e a vontade que tinha era de ir até seu pai, falar-lhe umas boas verdades e bater com sua cabeça contra uma parede para ver se ele enxergava a burrada que estava cometendo com a filha. Mas se conteve, pois sabia que ao fazer isso causaria mais mágoas em Joss e voltadas para si também.

-Será que algum dia nossa menininha vai voltar? -perguntou-se a mãe aflita e chorosa abraçada ao filho que lhe afagava os braços, ambos á porta – espero que sim, mãe - respondeu ele com lágrimas contidas em seus olhos – e viram Joss caminhar vagarosamente pela calçada até sumir na esquina.

Joss já estava passando pelo beco quando uma voz que ela ansiava ouvir, ainda que não admitisse, a chamou e, sem hesitar, ela largou as bolsas no chão e correu para os braços

da única pessoa que poderia entender a dor de deixar a família para trás e iniciar outra vida com outras pessoas. Leonel a abraçou e deixou ela chorar até esvaziar todo o pote de carga emocional sentido nas camadas mais profundas de seu coração. E depois que isso aconteceu, Leonel a largou, deu-lhe um beijo breve, pegou suas bolsas do chão e seguiram

para a casa. Sua nova casa. Na cama, Leonel estava com Joss sob seu peito, estendida

metade do corpo sob o seu, mas lembranças começaram a atormentar o sono de Leonel.

Lembranças a muito tempo enterradas nos recônditos de sua mente e que agora vieram á tona.

‘Leonel e Augusto ainda crianças correndo pelas florestas de Valência como se nada os pudesse deter. Ora seu irmão o ultrapassava e o empurrava, ora ele o fazia, e ambos riam’

‘Anos mais tarde, já adolescentes, os dois passariam pela primeira transformação natural- a transformação de sangue – algo que o pai os preparara desde os 10 anos.

Já que a primeira transformação ocorre aos 12 anos, na noite de lua cheia dos lobisomens conhecida como noite de lua vermelha. As 22:00 horas se aproximava era o ponto máximo da lu

Os irmãos já sentiam a tensão e a curiosidade, bem como os demais garotos que também passariam pela experiência. Um nó no estômago e suor nas mãos era o que antecedia o lobisomem. E quando o relógio da catedral badalou dez vezes e a lua atingiu seu auge percorrendo com seu brilho a floresta inteira a transformação começou.

Uma dor incomensurável percorreu os nervos dos garotos fazendo-os ficar de joelhos no chão, enquanto seus ossos e cartilagens começavam a se alongar bem como seus rostos; pelos e cabelos trocavam de cor.

Uma ‘coceira’ instalou-se em seus corpos e ao passarem a mão estas já estavam maiores e com dedos longos e garras, os pelos grossos começaram a nascer.

A lua fora coberta por nuvens e o pouco brilho que alcançava a floresta via- se o nascer dos lobisomens através de suas enormes sombras e, quando as nuvens sumiram, os seres uivaram prolongadamente e correram. Livres.

Leonel começou a suar frio e isso acabou por despertar Joss que sentiu seu coração acelerar num ritmo frenético. -Leonel?- chamou-o ao tocar seu rosto febril e assustada sacudiu-o

Leonel corria por uma floresta, estava tão irritado que uivava e rasgava as árvores com suas garras.

Augusto o seguia e uivava baixinho como se estivesse a lhe pedir desculpas por ter atraído a atenção da loba que o irmão desejava. Mas fora sem intenção, droga.

-Maldito! - esbravejou Leonel ao acordar num rompante e, sem perceber – Joss gritou- e ele a agarrou pelos braços e com raiva lhe mordeu o pescoço.

-Leonel, não! - pediu ela tentando se soltar e só quando Leonel sentiu o sangue de Joss quente em sua boca – e não o do irmão como sonhara - é que percebera o erro e a soltou de imediato.

Joss afastou-se – Leonel tentou aproximar-se, pedindo desculpas, mas quanto mais o fazia, mais Joss se afastava.

Leonel com os olhos cheios de lágrimas e a boca a escorrer sangue pedia desculpas a Joss, e sem pensar, jogou-se pela janela aberta tendo por última visão o olhar confuso e

amedrontado de Joss e na queda transformou-se em lobo para sumir na noite.

Joss escostada a parede com a mão no pescoço, mas já sem ferimento, apenas com o sangue seco, deixou-se escorregar ao chão chorando ´por ela e por Leonel.                                    Em uma das muitas florestas de Lacrimal city, sentados ao redor de um lago, jogando pedrinhas que quicavam na água antes de afundar, estão os lobos do novo bando de

Lucas e Lucian(mais cheios de segredos do que nunca), estes estão sentados sobre o tronco de uma árvore, distanciados dos outros, a conversar.

-E então, o que vamos fazer agora que conseguimos entrar de novo em Lacrimal city? perguntou Lucas com as mãos por trás da cabeça- a pose evidenciando seus músculos bem maiores e até o abdome sarado exposto por falta de uma camisa, á sua frente seu irmão com os braços descansando sobre os joelhos dobrados, que o olhou com o seu único olho- uma cortesia de Augusto.

-Vou fazer aquele lobo desgraçado pagar por isso – rosnou apontando para o tapa-olho que cobria o buraco sangrento onde outrora houvera um olho.

-Vai enfrentá-lo de peito aberto para perder o outro olho?                                                       -Claro que não. Assim não tem graça. Quero vê-lo desesperado, e quando o estiver, serei sua misericórdia - riu.

-Você será louco o suficiente para enfrentar Soraia?

-Não falo de Soraia, seu idiota. A mãe de Augusto servira mais do que aquela bruxa.

- E você se esquece de que vai ter de passar não só pela matilha dos lobisomens mas como também pelo clã dos vampiros – lembrou-o, mas ele riu.

-Armadilhas servem para isso, meu irmão. Armadilhas – e com isso a conversa encerrou.

O dia se passou ‘normal’ para os acontecimentos de uma cidade habitada por humanos, lobisomens e vampiros em guerras uns contra os outros e entre si mesmos.

Os exterminadores já estão instalados em uma sede do governo em Lacrimal city, mas até agora ninguém os viu, apenas ouviu falar de carros, motos e um trailer estranhos na

cidade. Afinal a pessoa que os chamou pediu sigilo, pois o momento de suas aparições já estava próximo de acontecer.

Os três lobos que a polícia prendera estão indignados, pois nos constantes interrogatórios são tratados como cães de rua e estão ficando cansados disso(e isso não é nada bom). Mas

se Lucas e Lucian não derem um jeito de tirarem-nos dali – pois qualquer movimento deles é monitorado e se tentarem algo, os jatos liberaram pó puro de prata. O que ainda não

sabiam é que Lucas e Lucian já planejavam o resgate e, assim mostrariam a todos a que vieram( e se transformaram).

No acampamento desde o episódio com Miranda que Sheila ligara para Augusto e contara tudo, ela exigiu que ele lhe ligasse ao menos três vezes ao dia lhe informando tudo. Nesse

momento, passado um pouco das três da tarde, eles se falavam, mas até agora nada acontecera. Mas estava para acontecer, pois assim que Sheila guardara o celular uma

Miranda muito eufórica trazia pela mão uma Leticia muito constrangida – por que essas caras? - perguntara.

-O que a senhora vê de diferente em Leticia? - questionou Miranda ao empurrar Leticia á frente para ser observada como um rato de laboratório.

-Fora o fato dela ser uma vampira agora? E muito constrangida por sinal.

-Sim.

-Normal, não?

Miranda suspirou.

-A senhora acha normal uma vampira recém-criada sair á luz do sol sem isso – e virou Leticia de costas para Sheila e afastar-lhe o cabelo da nuca.

-Menina, onde está sua partícula de ouro? - perguntou Sheila boquiaberta ao tocar-lhe a nuca –e como veio até mim sem se queimar?

-Eu não tenho nada de ouro –disse ao virar-se e arrancar seus cabelos das mãos de Miranda com indignação - e vim até a senhora puxada como um cavalo – olhou feio para Miranda que

cruzou os braços.

Sheila riu.

-Ao que vejo, Leticia tornou-se imune ao sol.

-Mas como? - perguntou Miranda cheia de curiosidade.

-Eu acho que conheço alguém que pode nos dar respostas á respeito disso- concluiu ao pegar novamente o celular, discar alguns números, levá-lo a sua orelha e esperar alguém atender.

Malvina mal havia guardado seu celular no bolso de sua jaqueta após uma conversa com Soraia e Katrina quando ele tocara novamente.

-Alô?

Ah, Dona Sheila a mãe de Augusto, quem diria?                                                              Uma pausa longa enquanto Sheila lhe relatava algo.

-Claro que posso ajudar, basta que me envie uma amostra do sangue dessa menina, pois eu sei de alguém que entende muito de sangue licantropo e vampiro..

-Me agradeça depois de tiver suas respostas. Até logo.

Duas garotas curiosas e preocupadas pelo que ouviram, encaravam Sheila que guardava o celular.

-E? -questionou Miranda tensa.

-Malvina para a nossa sorte conhece alguém que parece entender bastante de tudo relacionado a sangue humano e sobrenatural. Basta que eu envie uma amostra do sangue de

Leticia.

-E a senhora tem como fazer isso?

Sheila sorriu satisfeita e vendo sua expressão,Miranda também sorriu e debochou..

-Vai ser só uma picadinha.

Leticia fez um biquinho e estreitou os olhos para Miranda que riu, pois era o que os médicos diziam as crianças para acalmalas.

Desde que mordera Joss, sem intenção, refugiara-se na torre do relógio e ali permaneceu, olhando a cidade com olhos perdidos. Pois Joss era a única visão permanente em sua cabeça. E ele culpava as malditas lembranças que há muito tempo haviam morrido em sua vida e justo agora tinham de voltar para atormenta- lo e fazê-lo machucar a única pessoa que não queria que isso acontecesse. Seu celular no bolso da calça tocou e ao olhar viu que era Joss – depois

de 20 ligações e muitas mensagens, ambas sem retorno, ela continuava insistindo.

-Por que você deixou isso acontecer? - perguntou á lua linda no céu.

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