Virei-me e, claro, lá estava Sebastião. Ele olhou para mim, mas perguntou diretamente a Ana:— Para onde você vai?— A Carolina está com afta, vou comprar remédio para ela. — Ana respondeu, e Sebastião veio em minha direção com passos largos.— Você não está bebendo água suficiente? — Ele perguntou diretamente, como quem já me conhecia de cor.Eu sempre tive tendência a ter aftas quando ficava desidratada, então bebia muita água normalmente. Caso contrário, ou meu nariz começaria a sangrar ou minha boca ficaria cheia de feridas.Depois de dez anos ao meu lado, Sebastião sabia disso muito bem.Mas, naquele momento, suas palavras me soaram como uma provocação, e eu não pude deixar de me lembrar do que ele disse a Pedro — que estava tão acostumado comigo que já não sentia nenhum interesse.Ao contrário, ele parecia atraído por uma viúva.— Chefe Sebastião, veio aqui por algum motivo específico? — Não respondi à pergunta dele, adotando um tom frio e formal.Sebastião notou minha frieza e,
Parece que chegou a hora de deixar claro o que penso.— Sebastião, o que você chama de “pequeno erro” é algo que eu não posso perdoar. Você me conhece há anos e sabe muito bem que eu não tolero traição ou mentira. — Disse enquanto dava um passo para o lado, aumentando a distância entre nós.— Meu amor não precisa ser dramático, mas o meu homem tem que ser fiel. Não aceito nem um mínimo de ambiguidade com outra mulher. Eu exijo lealdade absoluta. — Ao falar isso, virei o rosto para tentar ver a reação de Sebastião.Mas, ao virar, meus olhos se encontraram com os de George, que estava a poucos passos de distância. Parecia que ele também tinha ouvido minhas palavras.Desviei o olhar rapidamente e voltei a encarar Sebastião, que me observava com uma expressão de irritação, como se eu estivesse sendo irracional.— Carolina, você sabe muito bem que, no mundo de hoje, isso de “só amar uma pessoa para sempre” não existe mais. Não viva num conto de fadas.Ele tinha razão sobre uma coisa. As ten
Depois de aplicar o spray, a dor na minha boca diminuiu consideravelmente. Na hora do almoço, beber água já não foi tão doloroso..Ainda assim, eu não me atrevia a comer nada. Qualquer alimento temperado com sal ou condimentos me causaria dor.— Carolina, vamos pedir uma salada de folhas verdes para o almoço. — Ana, para me ajudar, decidiu fazer uma refeição mais leve também.Sabendo que ela era uma verdadeira carnívora, tentei ser razoável.— Eu como salada, mas peça o que quiser para você.Ela estava prestes a protestar quando George se aproximou.— Posso almoçar com vocês? — Ele perguntou, de maneira surpreendentemente casual, considerando sua postura mais reservada.Achei a ideia estranha e estava prestes a recusar, ainda me sentindo um tanto desconfortável por causa de cena do spray. Mas antes que eu pudesse dizer qualquer coisa, Ana sorriu e concordou rapidamente.— Claro, George! O que você gostaria de comer?George olhou para mim.— Vou comer o mesmo que a sua gerente, salada d
Eu sabia que precisava ser firme, então soltei uma frase que não deixava dúvidas:— Eu sou assim mesmo, só penso em dinheiro. Se não tem dinheiro, pode ser o homem mais bonito do mundo, que não adianta.Assim que terminei, percebi que George estava olhando para mim. Pelo jeito, ele tinha escutado. Não me importei. Entre nós não havia nada, então até era bom que ele ouvisse e tirasse qualquer ideia da cabeça.Não sou boba. Os toques sutis, as aproximações, como o fato de ele ter insistido em aplicar o spray em mim mais cedo... Tudo indicava que ele tinha algum interesse.— Carolina, você é muito superficial! — Ana resmungou, visivelmente chateada.Eu permaneci em silêncio, sem olhar para George.Logo o celular de Ana tocou. Ela olhou o número e disse:— É o Daniel.— Oi, estou na área A do parque, na parte das crianças. Algum problema, Daniel?... Certo, pode vir aqui. — Ana desligou e me olhou. — Ele disse que precisa falar com você.Daniel me procurando? Será que tinha algo a ver com o
A crítica não era só para mim, mas também para Miguel.Eu não liguei muito, mas Miguel claramente ficou desconcertado.— Que exagero... — Murmurei, tentando aliviar o clima.George se aproximou, segurando um pacote de lenços umedecidos.Miguel estendeu a mão para pegar, mas George não soltou. No fim, fui eu quem pegou, tirando um lenço para mim e outro para Miguel.— Carol, quem é esse? — Miguel perguntou, curioso sobre a presença imponente e claramente hostil de George.— George, o técnico de iluminação. — Respondi, tentando manter a calma.George me olhou com aquele olhar intenso, quase pressionando, então senti que precisava continuar.— E esse é meu irmão, Miguel.— Prazer. — Miguel estendeu a mão para George.George apenas acenou com a cabeça, sem apertar a mão. Ana logo explicou:— Ele tem misofobia.Miguel sorriu, compreensivo, e recuou.— Vamos sentar e comer, então. — Miguel sugeriu.Ana passou a língua nos lábios, ansiosa.— Posso pegar um pedaço da mousse?— Claro. — Miguel
Eu apenas sorri, respondendo de maneira leve:— Na próxima vida, na próxima vida eu reencarno como filha deles. Então... seremos irmãos de sangue.O sorriso de Miguel ficou um pouco rígido, mas logo ele apontou para a mousse de maracujá e disse:— Come mais um pouco. Você tem emagrecido ultimamente.— Tá bom. — Comecei a me concentrar na mousse, tentando aliviar o clima.Miguel ficou me observando enquanto eu comia, e só parei quando realmente não consegui mais.— O Tião ainda cuida de você. Ele usou o nome da minha mãe para fazer o chá de hortelã. — Miguel comentou com um ar pensativo.Eu sorri de canto e respondi:— Amor tardio não vale nada.A dor na minha boca acabou afetando meu apetite. Guardei o resto da mousse e agradeci:— Mano, obrigada por ter vindo. Diga para a tia e o tio que assim que eu terminar aqui, vou visitá-los.Apontei para o parque de diversões.— Falta menos de um mês para entregarmos a obra, e a iluminação ainda nem foi bem testada. Estou bem ocupada.— O Tião
Quando George voltou da varanda, me encontrou dormindo na frente do computador. A luz suave da luminária iluminava meu rosto, e ele ficou parado, me observando.Eu podia sentir o olhar dele sobre mim, mas não conseguia acordar.Depois de um tempo, ouvi sua voz, suave e baixa:— Carina...Carina? Ele estava falando comigo?Sim, ele estava. Antes de entrar para a família Martins, esse era meu nome. Fazia tanto tempo que ninguém me chamava assim...De repente, uma imagem de infância surgiu na minha mente: uma menina pequena, com dois coques no cabelo e uma carinha de boneca, chamando por um menino.— Irmão... Meu nome é Carina...O menino era sério e falava pouco, mas a menina não se importava. Ela o seguia para todos os lados.Então, na minha mente, eu me tornei aquela menina, e George era o menino. Eu estava nas costas dele, rindo.— Irmão, você tem um cheirinho bom...— Irmão, tem uma pinta preta no seu pescoço. Deixa que eu tiro.— Carina, não belisca! Isso dói.— Carina, tô cansado.
Naquele momento, ela com certeza não ia me responder. Fechei o chat e abri o Instagram, e foi aí que vi uma nova postagem de Pedro — várias fotos dele se divertindo.Ele não estava sozinho. Em uma das fotos, várias pessoas brindavam, e entre elas, reconheci uma mão: a mão de Sebastião.Eu soube imediatamente que era ele por causa de um anel barato que estava usando, um anel que eu tinha dado a ele.Ver aquele anel me deixou com uma sensação estranha — de imaturidade e vergonha. Aquele anel fazia parte de um par. O outro estava comigo. Eu comprei esses anéis quando fiz dezoito anos, com o meu primeiro salário de um trabalho temporário. Custou 999 reais.Eu usava o anel feminino e dei o masculino para ele. Na época, ele até brincou, dizendo que eu queria “prendê-lo”. Mas, depois daquele dia, ele nunca mais o usou. Eu até perguntei por que, e ele respondeu que tinha vergonha, que as pessoas poderiam rir daquilo.Eu entendi o que ele quis dizer. Alguém como ele, com o status que tinha, j