Luana percebeu meus pensamentos.— Para onde vamos? Eu te acompanho, ou...— Vamos arrumar minha casa, — Eu interrompi Luana.Ela me olhou surpresa.— Você... isso... já estava preparada?— Não exatamente, foi algo de anteontem, — Eu disse, apontando para o banco traseiro, onde estavam os itens de cama que eu tinha comprado.— Comprei ontem com a Lídia. — Minhas palavras deixaram Luana surpresa e curiosa.No caminho para minha casa, contei tudo para Luana, que assentiu furiosamente muitas vezes.— Você fez bem em não pegar a certidão de casamento. Sebastião é um homem mau da nova época que não consegue ficar com só uma mulher.— Homem mau é homem mau, não importa a época, — Eu brinquei.Luana me olhou.— Carolinha, se você está triste, não precisa fingir um sorriso na minha frente.— Não estou tão triste assim, de verdade, — eu olhei para a estrada à frente. — Talvez meus sentimentos por ele sejam como os dele por mim, tão familiares que não sinto mais nada.Era assim que eu me sentia,
Cidade B.Eu havia viajado quatro horas de trem de alta velocidade para chegar aqui.Naquele momento, as luzes da noite começavam a brilhar. Embora não fosse tão próspera quanto a Cidade A, ainda havia um brilho encantador, com um toque de romantismo de uma cidade pequena.Luana ligou quase no horário exato.— Chegou? Já encontrou um lugar para ficar?Ela não esperava que eu fosse sair tão de repente. Quando me perguntou para onde eu estava indo, dei o endereço e o horário do meu trem. Naquele momento, ela perguntou se eu estava saindo com tanta pressa para evitar Sebastião, com medo de que ele me perseguisse.Respondi que ela estava errada, que Sebastião não faria isso. Ele provavelmente estava bravo, irritado por eu tê-lo dado o bolo, por eu não ter obedecido.Agora parecia que eu estava certa. Desde que ele me perguntou por que eu não fui pegar a certidão, ele não me mandou mais nenhuma mensagem ou ligou.Eu vim para cá com tanta pressa porque já queria vir há muito tempo e também p
Ele parecia bruto, rígido e até um pouco assustador. Nos últimos anos, os homens com quem tive contato eram todos de pele clara e bem cuidados, usavam camisas, gravatas e ternos. A imagem do homem à minha frente me fez pensar que ele tinha acabado de sair da prisão.Instintivamente, apertei a alça da minha mochila, lembrando do spray de pimenta e da faca de autodefesa que Luana tinha colocado na minha bolsa antes de eu sair. Mas antes que eu pudesse alcançá-los, o homem já tinha ligado o carro e não disse uma palavra. O que significava aquele olhar que ele me deu antes?Eu não entendi, mas meu coração, que tinha acabado de ser curado ao chegar nesta cidade, começou a bater descompassadamente de novo. Por causa da minha cautela, não consegui apreciar a paisagem da cidade. Só quando o carro parou, paguei e desci, vendo o carro se afastar, consegui respirar aliviada.Já eram dez da noite, e eu sabia que vir para cá a essa hora não era a melhor ideia. Eu poderia procurar o lugar onde
— Garotinha.A voz do outro lado da linha era profunda, familiar e ao mesmo tempo estranha. Uma imagem familiar passou pela minha mente, e eu respondi:— Irmão.Eu achava que, ao trocar de número, conseguiria evitar a família de Martins, mas não esperava que o irmão mais velho de Sebastião soubesse desse número e ainda me ligasse. — Parece que você guardou meu número e não me esqueceu. — Miguel disse com um tom de brincadeira.Ele era apenas dois anos mais velho que Sebastião. Antes de ir para o exterior, ele cuidava muito de mim e sempre gostava de me chamar de garotinha. Fiquei sem saber como responder, pois senti um tom de queixa na voz dele.Nos primeiros dois anos após sua partida, eu ainda mantinha contato ocasionalmente, perguntando sobre sua situação lá fora, mas depois paramos de nos falar. Miguel nunca foi de tomar a iniciativa, e ele tinha pouco contato até mesmo com a família, quanto mais comigo. Agora, ele me ligava de repente, e eu sabia que provavelmente tinha a ver c
— Seja honesto, você já fez amor com Carolina?A voz rouca do homem se espalhou pelo vão da porta, fazendo com que eu, prestes a entrar, parasse meus passos. Através do vão, observei os lábios finos de Sebastião pressionados de leve.— Ela tentou, mas eu não estava interessado.— Sebastião, não humilhe a Carolina dessa maneira. Ela é uma das mais belas do nosso círculo social; muitos caras estão interessados nela.Quem falou isso foi Pedro Santos, amigo íntimo de Sebastião e testemunha dos nossos dez anos de relacionamento.— Estamos muito familiarizados, você entende? — Sebastião franziu as sobrancelhas.Quando eu tinha quatorze anos, fui enviada para a casa dos Martins, onde conheci Sebastião pela primeira vez. Desde então, todos me disseram que ele seria meu futuro marido. E assim vivemos juntos por dez anos.— Isso mesmo, vocês trabalham na mesma empresa durante o dia, veem um ao outro o tempo todo, e à noite vocês comem na mesma mesa. Devem se conhecer tão bem que até sabem quanta
Sebastião levantou a cabeça ao ouvir o som da porta, e seu olhar parou no meu rosto. Ele deve ter notado minha expressão.— Está se sentindo mal? — Ele franziu ligeiramente a testa.Caminhei silenciosamente até sua mesa, engolindo o amargor que subia em minha garganta, e falei: — Se você não quer casar comigo, posso falar com sua mãe.As rugas entre as sobrancelhas de Sebastião aprofundaram; ele percebeu que eu tinha ouvido sua conversa com Pedro.A amargura voltou à minha garganta, e eu continuei: — Nunca pensei que me tornaria uma pessoa com quem você se sente desconfortável em estar, Sebastião...— Para todos, já somos marido e mulher. — Sebastião me interrompeu.E daí? Ele quer casar comigo por causa dos outros? Eu queria que ele case comigo por me amar, por querer passar o resto da sua vida comigo.Com um clique suave, Sebastião fechou a caneta que segurava, seu olhar caiu sobre o documento em minhas mãos, e disse: — Vamos pegar a certidão de casamento na próxima quarta-feira.
O dia todo, fiquei pensando sobre essa questão. Até à tarde, quando ele veio me chamar, eu ainda não tinha a resposta, mas o segui mesmo assim.O hábito era algo terrível. Em dez anos, me acostumei com ele e também a voltar para a casa dos Martins depois do trabalho.— Por que você não está falando? — No caminho de volta, Sebastião provavelmente percebeu que eu estava de mau humor e perguntou.Fiquei em silêncio por alguns segundos e, finalmente, comecei a falar: — Sebastião, e se nós...Antes que eu pudesse terminar a frase, o celular dele tocou. O viva-voz mostrou um número não identificado, mas eu vi claramente que Sebastião apertou o volante com força. Ele estava nervoso, algo raro.Instintivamente, olhei para o rosto dele, mas ele já tinha desligado o viva-voz e atendido com o Bluetooth: — Alô... Ok, estou indo agora.A ligação foi curta. Ele desligou o telefone e olhou para mim. — Lina, tenho uma urgência para resolver e não vou poder se levar para casa.Na verdade, antes mesm
Nunca imaginei que um dia na minha vida acabaria indo para a delegacia por uma acusação de assédio.Derrubei um adolescente, que tinha apenas 17 anos e ainda era menor de idade. Ele insistiu que eu tinha más intenções com ele. Mesmo que eu negasse, ele continuava a afirmar que eu o tinha tocado.— Onde ela te tocou? — O policial perguntou com bastante detalhamento.O nome do adolescente era Augusto Reis. Ele olhou para mim, apontou primeiro para o próprio peito e depois para baixo da cintura. — Aqui, aqui... Ela tocou em tudo.Besteira! Quase gritei. Sebastião, que é um homem tão bonito, eu nunca toquei, então por que tocaria nesse pirralho que nem barba tinha?O policial olhou de volta para mim, e antes que ele pudesse perguntar, eu já neguei: — Eu não o toquei, apenas esbarrei nele sem querer.— Você bebeu? — O policial me olhou com um semblante sugestivo.Nesta sociedade, é normal os homens se entregarem ao álcool, mas quando uma mulher bebe um pouco, geralmente é vista como desre