Marcela Andrade
Acordei sentindo dores pelo corpo inteiro, não pensei que perderia a consciência. Quanto tempo fiquei desacordada? Com dificuldade sentei na cama. Olhei para o soro do meu lado direito e fiquei incomodada, conseguia sentir a agulha enfiada no meu braço. Eu estava realmente em um hospital? Quer dizer, nunca antes havia estado em um leito sozinha e tão elegante como aquele. Os atendimentos pelo sus nunca foram dos melhores, com certeza, era um hospital caro e eu não tinha dinheiro para pagar.
— Merda! Preciso dá o fora desse lugar. — resmunguei, bastante preocupada. Mesmo sentindo muita dor levantei da cama e puxei o soro, tirando-o do gancho de suporte. Caminhei descalça pelo piso frio indo em direção à porta, faltava muito pouco para minha fuga desesperada.
Apenas um momento de distração foi suficiente para ser pega em flagrante. A porta abriu antes mesmo que eu tocasse na maçaneta. Recuei assim que vi de quem se tratava. O destino das causas desastrosas, não cansava de brincar com minha vida. Engoli em seco, sentindo os pelos dos meus braços ficarem eriçados.
— Onde pensa que vai? — questionou de cabeça erguida. Por alguns segundos fitei seus olhos esverdeados, totalmente hipnotizada por sua beleza. O sorrisinho de canto dele me fez despertar para realidade. A culpa era dele por eu estar naquele lugar, seu plano maligno era me falir.
—
Filho da mãe, foi você que me trouxe pra cá? — perguntei, indo pra cima dele com o soro na mão. — Acha que sou rica por acaso? Não vou pagar essa conta não!— Sério? Você tá querendo discutir? Na próxima deixo você morrer então!
Uma pessoa sensata agradeceria, mas eu não era essa pessoa! Ele não merecia nada de gentileza, não passava de um carrasco.
— Sai da minha frente, seu merda! Quero ir embora antes que tragam a conta. — disse dando um passo à frente.
— Pode voltar para aquela cama, agora!
Quem ele pensava que era? Meu dono? O imbecil pensou mesmo que poderia me controlar? Talvez sim!
— Vou voltar porcaria nenhuma! Aposto que me trouxe para cá, pra rir de mim!
Claro que ele aproveitaria uma oportunidade daquelas para debochar do meu estado físico e emocional. Sem pensar direito estapeei a cara dele, confesso que sempre quis dar uns tabefes em seu rosto. Minha mão ficou formigando, mas posso dizer que a alegria que senti por dentro compensou tudo.
— Caralho! Enlouqueceu de vez? Volta logo para aquela cama, ou vou te colocar em uma camisa de força! Porra, isso dói, mulher dos infernos!
Ele realmente ficou muito bravo, acabei sentindo-me coagida. Se sua intenção era me intimidar tinha conseguido.
— Meu sofrimento é diversão pra você? — questionei, deixando algumas lágrimas caírem pelo meu rosto. Bernardo Fonseca nunca entenderia o que era ser uma pessoa como eu, gorda e pobre.
Quem me deixou naquela situação foi um dos babacas do setor financeiro, lembro bem tudo que ocorreu minutos antes que eu perder a consciência...
Depois do que aconteceu no elevador meu nome ficou na boca de muitas pessoas, algumas delas passavam perto de mim para debochar. Ele era pra ser só mais um entre elas, no entanto, seus planos eram outros.
— Quanto você quer pra liberar esse traseiro pra mim? — perguntou com um sorrisinho de cafajeste.
— Não entendi, senhor. — falei mentindo na tentativa dele me deixar em paz.
— Eu não acho que o senhor Fonseca tenha pagado muito. — disse ele, fitando-me dos pés a cabeça. — Vamos lá gracinha, uma rapidinha no banheiro, te dou duzentos reais!
— Não sou prostituta! — berrei, não aguentava mais aqueles boatos de que eu tinha transado com o presidente da empresa. Empurrei o desgraçado após ele tocar meu braço.
A partir daquela minha reação deixei ele furioso, o resto tornou-se um grande borrão na minha memória, talvez fosse melhor assim.
— Responde, senhor Fonseca! — exige depois do seu silêncio eterno. Ele tinha voltado para fazer da minha vida medíocre um pouco pior.
Bernardo Fonseca, simplesmente me ignorou e saiu pela porta. O que ele tinha afinal? Ele não parecia o mesmo de sempre, aquele lado covarde não conhecia. Decidi voltar para cama pois não aguentava mais ficar de pé.
Como uma desempregada pagaria cuidados médicos particular? Sentei na cama e chorei. Grande advogada eu era, não conseguia nem manter um trabalho. Eu cansei de ser humilhada e não revidar. Meus pais quando soubessem a verdade que menti todo esse tempo, não sentiriam orgulho de mim. Voltar para o Ceará e encarar toda minha família era vergonhoso demais.
Não sei quanto tempo fiquei me lamentando até ter minha atenção chamada na direção da porta.
— Deitei porque eu quis. — disse evitando contato visual. Fitei o nada enquanto ouvia seus passos. O cheiro do seu perfume quase me fez suspirar.
Ele era um homem horrível e superficial assim como muitos. Caras como o senhor Fonseca costumavam valorizar apenas o dinheiro.
— Assina. — disse ele, entregando-me um documento em mãos.
— Que merda é essa? — questionei, quase tomando a caneta de suas mãos para enfiar em um dos seus olhos.
— Você não pode pagar esse hospital, certo? E eu não faço caridade, portanto, você será uma das minhas modelos plus size, trabalhará para mim gratuitamente finais de semanas e afins.
Qual era o problema dele? Eu, modelo? Sempre vi de longe as modelos plus size que eram usadas em algumas propagandas de cosméticos da empresa. Posso afirmar que eu não era nenhum pouco atraente. Bernardo Fonseca além de um pão-duro, queria me humilhar ao aceitar tal absurdo.
— Fica com o meu salário desse mês. Vou dá um jeito de voltar para meu estado. — disse lhe entregando o documento. — Não estou brincando, pega logo essa porcaria!
— Já disse, não faço caridade. O salário que você ganha não cobre os custos. Pode esquecer essa ideia de que vai embora, assina logo ou vou te processar!
Processar? Isso era possível? Engoli em seco, enquanto pensava sobre o assunto. Quais eram as opções? Fugir escondido? Aceitar sua proposta? Eu era apenas uma gorda feia e não uma modelo plus size.
Lembro bem da época que descobri modelos tamanho GG...
Cheguei em casa com um brilho nos olhos depois de comprar uma revista de moda que encontrei em uma banquinha de jornais. Minha intenção era mostrar para os meus pais que as modelos não precisavam mais ser tão magras pra serem aceitas no mundo da moda. Quando aproximei-me da cozinha dei de cara com meu ex que naquela época era o atual.
— Ricardo, você não vai acreditar no que encontrei. — falei empolgada, meus pais não estavam por perto. Mostrei-lhe a revista.
— Quantas gordas expostas. Por que comprou isso? São todas feias como você, quer dizer, você é fofinha apesar de ser tão gordinha.
Ele soube bem como acabar com minha felicidade, mas eu era cega e pensei que ele não tinha falado por mal, na verdade fiquei defendendo ele durante bastante tempo. Fui uma imbecil que só vi quem ele realmente era quando foi tarde.
Saí das lembranças do passado e retornei a situação em que estava com meu chefe de merda.
— Por quanto tempo vai ser essa escravidão? — perguntei, fitando um sorrisinho em seus lábios carnudos. Eu realmente estava prestes a aceitar aquela proposta maluca?
— Oito meses, senhorita Andrade, por favor, leia todas as linhas do contrato.
Ler pra quê? De qualquer forma assassinaria. Era apenas oito meses e acreditava que quando ele percebesse que não levava jeito pra tal trabalho abriria mão dos meus serviços. Não eu não era uma advogada burra, contudo, que opção eu tinha? Eu era pobre para tentar abrir um processo contra ele! Quem acreditaria em mim envolvendo todo o dinheiro que ele tinha? Acreditava que ninguém.
— Passa a caneta. — pedi e ele me entregou, assinei o bendito contrato, seria por pouco tempo aquela tortura.
Assinar aquele contrato foi como assinar um contrato com o diabo. Vi nos seus olhos esverdeados satisfação ao receber tal contrato. Se foi um erro assinar sem ler? Provavelmente! Praticamente entreguei minha vida em suas mãos. E adivinha? Aquele nosso acordo traria tormentos para minha vida, acreditava fielmente nisso.
Bernardo FonsecaEu não pensei que fosse tão fácil convencer Marcela Andrade há assinar um contrato. Não planejava cobrá-la com os gastos do hospital particular, pagaria sem problema algum, afinal, um dos meus funcionários deixou-a machucada. Ela nem sequer agradeceu e ainda me agrediu. O contrato foi feito às pressas e entregue pra mim no hospital. Usá-la como uma das minhas modelos plus size foi a desculpa perfeita para meus planos reais. Queria estar na sua frente quando ela recebesse a cópia do contrato, mas isso não era possível e muito menos sensato da minha parte.Ser pobre não deveria ser tão ruim assim, ela tinha um trabalho e pelo seu tamanho, com certeza, comia bem e muito. Nunca gostei de mulher acima do peso, elas dão gastos de mais.
Marcela AndradeQuais são as chances do homem que você gosta, estar te tratando como uma rainha? Poucas claro! Rafael nos últimos quatro dias depois do que aconteceu comigo decidiu ser meu companheiro de todas as noites. Que companheiro maravilhoso! Passávamos horas coladinhos no meu sofá de dois lugares, assistindo filmes. Naquele momento estávamos bebendo cerveja enquanto conversávamos assuntos aleatórios. Deixei de tomar as porcarias que o médico receitou, não me fez muito bem, então cortei.Nunca antes estivemos tão próximos daquele jeito, precisou algo ruim acontecer para o melhor vir. Eu não queria saber de nada além de aproveitar sua companhia. Talvez fosse o momento de dar uma investida, tentei deixar de lado o nervosismo e olhei nos seus l
Bernardo FonsecaNa noite anterior mal consegui dormir porque Marcela Andrade roncava como um motor de carro do século passado. Levantei algumas vezes durante a madrugada, até filmei o jeito estranho que ela estava dormindo no sofá de dois lugares. Acredita que seu pijama era uma fantasia de panda? Infantil, eu sei! Fiquei surpreso ao descobrir que ela era advogada. O que mais eu não sabia sobre ela? Apesar do seu apartamento ser minúsculo tudo era bem organizado. O cheiro dela ficou pela cama inteira e posso afirmar que não era nada mau.Passar a tarde e a noite do dia anterior com ela foi uma verdadeira guerra. Brigamos por comida e também pelo controle da tv. Ela não queria dividir nada comigo, nadinha! Mas como um bom lutador insisti até conseguir tudo que queria.
Marcela AndradeDe todas as tragédias que poderiam me acontecer, aquela sem dúvida, era uma delas, que sequer pensei que pudesse acontecer. Inventei uma desculpa para ficar longe daquele escroto e ele acabou com os meus planos. Odiava a forma como ele me atiçava sem ao menos dizer qualquer palavra. Odiava a maneira com a qual tentava me manipular. Odiava o simples fato dele existir e ser tão presente de um jeito cruel na minha vida.Bernardo Fonseca chamava atenção em qualquer lugar, no supermercado não foi diferente. Não queria sua companhia, no entanto, caminhávamos juntos pelos corredores. Por que ele tinha que se intrometer? Eu não tinha chamado ele para o supermercado! Apenas queria ficar sozinha e por alguns minutos, esquecer tudo de ruim que estava acontecendo comigo, entret
Bernado FonsecaNão sei em que momento fui parar no terraço daquele condomínio, mas aconteceu. Os olhos tristes de Marcela não saiam da minha cabeça. Eu era como aquelas duas que estavam conosco no elevador, entretanto, dez vezes pior. Não foi divertido ter presenciado toda aquela situação, não intervi porque pensei que a qualquer momento a mulher feroz que havia dentro dela fosse surgir, no entanto, ela não fez nada, simplesmente nada! Chorar e se trancar no banheiro não era a solução. Me senti tão envergonhado, por ter feito coisas piores com ela. Foram tantas brincadeiras e piadinhas de mau gosto, apenas para minha diversão.— Até mesmo o diabo sabe a hora certa de se redimir. — murmurei, sabendo exatamente o que deveria ser
Marcela AndradeEra finalzinho de tarde e eu resolvi trocar mensagens com Talita, falávamos sobre Rafael e do quanto ele havia me magoado. Por que não contei nada do asqueroso que se enfiou no meu apartamento? Não contei porque ela sempre foi boca aberta, no caso, não sabia guardar segredo. Eu não me surpreenderia dela aparecer no meu apartamento, apenas para ter certeza que era realmente ele. Certas coisas eram melhor guardar as sete chaves e se possível jogar fora as chaves!Bernardo Fonseca não cansava de me importunar e novamente aprontou uma das suas. Do que estou falando? O dito cujo transitava de maneira descarada na minha frente, apenas de toalha de banho, isso mesmo de toalha de banho! Dificilmente conseguiria ignorar um homem como ele caminhando pelo meu apartamento tão à vontad
Bernado FonsecaNão pensei que uma simples ida a cozinha se tornasse em um momento cômico. As luzes apagaram assim que me aproximei de Marcela, que estava de costas para mim guardando alguma coisa no armário aéreo de três portas. Permaneci no mesmo lugar e em silêncio, nem eu mesmo sei porque não falei nada. Escutei ela resmungar depois de bater em algum lugar, uma atrapalhada, eu sei! Mas ela me pegou de surpresa, quer dizer, desprevenido, não esperava que ela fosse me tocar do jeito que tocou. Cheguei a conclusão de que a minha carência era tamanha que me fez sentir tesão por ela, uma segunda vez, e no mesmo dia! Me senti um adolescente virgem que ficou excitado com alguns toques não propositais. Porra! Eu quase gozei precocemente nas calças! Tudo parou no momento que a luz voltou e ela se deu conta do que havia f
Marcela AndradeTalita falou tantas bobagens apenas para me fazer sorrir, naquela manhã estava de mau-humor, não era pra menos, mal havia dormido a noite por não conseguir esquecer o constrangimento de ter tocado as partes íntimas de Bernardo Fonseca. Quando cheguei para trabalhar na copa aquele desgraçado já havia ligado para que eu levasse seu café, me recusei de todas as maneiras possíveis até convencer alguém levar no meu lugar. Não queria vê-lo depois da noite anterior, pelo menos ele teve a decência de sair do meu apartamento e não voltar mais.— Meu Deus! O senhor Fonseca, está vindo para cá! — minha amiga ficou pálida. — Preciso ir, desculpe!Fiquei boq