MayaDepois de um banho demorado, tudo o que eu mais queria era me deitar na cama e dormir até o dia seguinte. Peguei meu celular e deitei-me sob o edredom macio. Ao destravar a tela, vi que havia seis ligações perdidas da Clarice, somente na última hora. A última vez que nos falamos, eu estava passando por Memphis. Estava tão cansada e nada a fim de conversa, então, resolvi apenas mandar uma mensagem a ela.Já cheguei.Estou bem.Maya20:23 p.m.Não vai me dizer onde está?Clarice20:24 p.m.Ainda não. Boa noite.Maya20:24 p.m.Deitada, comecei a pensar um pouco na bagunça que se encontrava minha vida. Abri a galeria de imagens e comecei a buscar fotos das minhas férias no ano passado. Minha mãe estava bem e havia acabado de se curar do primeiro câncer. Seus cabelos ainda estavam curtinhos, mas lindos e bem arrumados. Seu sorriso era grande e de pura gratidão.Em meio a tantas fotos de momentos especiais com meus pais e em dias bons com amigos da faculdade, achei uma que marejou me
MayaFechei a porta e descemos para o térreo. Caminhamos pela calçada até o ponto de ônibus a alguns metros mais à frente.— Então... qual é a sua história? — perguntou ela.— Como assim, a minha história?— Você não é daqui, está sozinha e desempregada. Então, você tem uma história.— Ah, bom... Eu sou de Oklahoma e vim para Chicago, porque precisava de um novo ponto de partida. História curta. E você?— Meu pai é um alcoólatra machista, que acredita que amor se demonstra com socos e chutes. Seu talento é bater na minha mãe e nos seus filhos. Fugi dele e vim parar aqui, mas voltarei em breve para livrar minha família daquele crápula.— Sinto muito.Realmente sentia, tive pena da sua história.— Seus irmãos ficaram na sua cidade? — perguntei curiosa.— Sim, mas estão em uma casa de apoio para menores.— E a sua mãe?— Ela se recusa a deixá-lo e toda vez que apanha, justifica dizendo que ele só está em um dia ruim e sempre acredita quando ele diz que vai mudar.— Você vai conseguir bus
MayaSegui-o em silêncio e ele abriu a porta dando-me passagem para entrar primeiro. Pette entrou em seguida e fechou-a nos dando privacidade. Tomou seu lugar atrás da mesa espelhada com base de ferro cromado. Fiquei parada de pé à sua frente enquanto ele abria uma pasta preta sobre sua mesa.— Pode se sentar, eu não mordo — disse sem me dirigir o olhar.Aproximei e me sentei em uma das poltronas postas à frente da sua mesa. Meu rosto formigava e minhas mãos suavam frio. Senti um nervoso de pura ansiedade gelar meu estômago.— Gostei do seu trabalho — elogiou quebrando o minuto tenso de silêncio.Ele recostou-se em sua cadeira e me dirigiu seu olhar duro. Pette era um homem bonito e jovem, mas seu jeito me intimidava. Seus curtos cabelos pretos eram bem penteados para trás e cheios de gel. A pele levemente bronzeada dava destaque a sua barba um pouco cheia e bem-feita. Seus belos olhos azuis eram o que chamava a atenção, nunca havia visto uma íris tão clara como a sua.— Você aprendeu
MayaMudamos de assunto e começamos a interagir em outra conversa mais leve, adequada para um almoço. A movimentação intensa no balcão chamou minha atenção. Encostado a ele muita gente comia de pé e apressada. A maioria, homens de terno com suas gravatas jogadas sobre o ombro e suas pastas presas entre as pernas.O pequeno sino acima da porta badalou anunciando a entrada de mais clientes no lugar abarrotado, atraindo meu olhar. Fiquei estática com quem vi entrar. Não queria acreditar no que meus olhos enxergavam. Não pode ser! Será? Olhei mais uma vez, encarando-o atentamente e não me restaram dúvidas.— O que foi? — Escutei Sasha me interrogar.— Eles chegaram! — disse Kim animada.Olhei para ela e a vi com um enorme sorriso no rosto. Ela se levantou e ergueu a mão acenando para os dois homens que haviam acabado de passar pela porta. Olhei sorrateiramente pelo canto dos olhos e vi que os dois se aproximavam. Abaixei minha cabeça sentindo-me envergonhada e sem saber o que fazer.— Oi,
MayaPegamos nossas coisas sobre a mesa e seguimos com nosso “plano turístico”, assim chamado por Sasha, caminhando pela cidade. Já passava das quatro quando voltamos de táxi para o hotel. Atravessamos o estacionamento conversando e rindo, quando Maggie apareceu dando broncas em Kim por ter demorado tanto. Assumi a culpa, já que era verdade, explicando-lhe que perdemos a noção do tempo no passeio pela linda Chicago.Subi para o meu quarto e tomei um banho renovando minhas energias e disposição para trabalhar até as quatro da manhã. Prontas, eu e Sasha pegamos o ônibus e fomos para a Wilcox. Já sabia como tudo funcionava e devia ser. Fui direto para o vestuário feminino e troquei de camiseta, indo depois para o bar pegar minha bandeja, o avental e o tablet. Estávamos prestes a abrir as portas, quando Pette veio até mim e me chamou em seu escritório.— Feche a porta! — mandou rude. Eu a fechei e caminhei até sua mesa, parando à frente dele. — Vou ser direto, não sou de rodeios. Já tive
MayaNo dia seguinte, passamos a tarde na recepção conversando sobre bobagens e ideias para a decoração do casamento da Kim, que aconteceria em janeiro.— Oi, amor — cumprimentou Jack ao passar pela porta.— Oi, lindinho — retribuiu Kim, indo até ele e lhe dando um beijo nos lábios. — Estamos vendo ideias de decoração para o casamento. Quer opinar?— Não, eu confio em você — disse ele sorridente, puxando-a pela cintura.Os dois começaram a sussurrar e rir baixinho no canto, trocando alguns beijos e carícias no rosto. Senti-me uma intrusa ali. Olhei para Sasha, que estava de pé à minha frente, escorada no balcão, e fiz um sinal com minha cabeça para sairmos dali. Ela assentiu e eu me levantei saindo de fininho à frente dela.— Eles são tão fofos, não são? — perguntou ela rindo.— Até demais. — Ri também.— Oi, Maya — cumprimentou uma voz masculina, vinda do estacionamento. Olhei e vi Allan se aproximar de nós. — Não deu para ficar muito lá, não é? — Riu.— Oi, Allan. Não. — Sorri aprox
MayaSaímos todos juntos do bar pela porta da frente, rindo das piadinhas clichês que Tyler fazia da própria cultura. A madrugada estava fria e eu não via hora de chegar logo no hotel e tomar um banho quente antes de ir para a cama.— Opa! — disse Zoe apreensiva. — “Tira” na área, galera — sussurrou para nós o alerta.Todos encaravam tensos algo atrás de mim. Virei-me e encontrei um cara bonito encostado em seu carro preto que reluzia a pintura encerada sob a luz do poste na calçada.— Está tudo bem. Eu o conheço — disse baixo, acalmando-os antes de me afastar deles.— Oi — cumprimentei Allan com um sorriso tímido.— Oi — retribuiu ele, desencostando-se do carro e dando alguns passos até mim.— O que faz nas ruas tão tarde, detetive?— Fui chamado para uma emergência não muito longe daqui e resolvi vir buscar você. Conheço esse bar e sei que fecha tarde.— Então vamos ter carona? — perguntou Sasha parando ao meu lado.— Você é uma chata, mas vou dar carona para você também — respondeu
MayaAcordei às oito horas com a conversa alta das pessoas que passavam pelo corredor lá fora. Deitada na cama e encarando o teto, resolvi que era hora de dar sinal de vida para Clarice. Estava a ignorando há dias. Aliás, não só ela, mas também minha avó, Dick e Penny. Sentei-me na cama e peguei meu celular ao lado sobre o criado-mudo e busquei seu número na agenda. Ela atendeu no segundo toque. — Graças a Deus, Maya! — Senti o desespero em sua voz. — Sabe como estou preocupada com você? Quase não tenho dormido à noite.— Oi. Desculpe-me, Clarice. É que meus horários andam meio loucos e tenho trabalhado bastante. Como você está?— Furiosa com você, mas agora que sei que está bem, me sinto melhor. — Suspirou aliviada.— Perdoe-me — pedi ressentida em lhe causar isso. — Maya... Já é hora de me dizer onde está! Com o que está trabalhando?— Clarice... Desculpe-me, mas não vou dizer onde estou. — Não podia. Sabia que ela viria atrás de mim. — Eu estou bem, fique tranquila. Estou trabalh