Ângelo encarava Aldora com um misto de diversão e contemplação.
— Está me dizendo que sabe quando estou chegando? Talvez acelere a motocicleta, como um canto, para chamá-la.
— Normalmente ainda estou dormindo. Não o ouço.
— Isso parte meu coração.
— Como se fosse possível! Pelo que comentam é o senhor o autor de corações partidos na cidade.
— Sinto-me lisonjeado pelo seu interesse, mas posso lhe dizer que não é bem assim. As mulheres não me levam a sério, senhorita.
— Na verdade não tenho interesse algum em saber sobre seus passos mas, aparentemente, todos os homens da fazenda sim. Estão escondendo suas mulheres e filhas do senhor.
— Santo Deus! Minha fama me precede. Sou um homem incompreendido, pequena Aldora. E por que ainda não fugi
Encarei Marina, flertando com seus olhos tristes, antes de continuar:— Entendo! Você o via dentro de si, mas ele não. Ele tinha necessidades que você não entendia.— Por que isso acontece, Alberto? Por que um homem não pode se contentar apenas com uma mulher? Por que dessa necessidade de pular de cama em cama quando se tem alguém que o ama esperando em casa, abdicando de coisas importantes por ele?— Não tenho resposta para isso, Marina. O que posso te assegurar é que nem todos são assim. Há aqueles que simplesmente amam uma mulher com toda sua alma. Que sentem orgulho, que querem estar com ela em todos os momentos do dia, que espera a noite chegar apenas para vê-la entrar pela porta e sorrir rasgado, perguntando como foi seu dia. Fazendo pequenas coisinhas sem importância pelo simples prazer de estarem juntos.Ela me encarou e pude ver a dúvida em se
Augusto acordou pela manhã com um ligeiro tremor. Sentiu um breve mal estar, talvez associado à noite agitada por sonhos confusos. Resolveu ficar na casa da mãe. Fazia alguns dias que não a visitava. Uma decisão acertada, já que ela não se encontrava bem. A recente morte do pai havia deixado a velha exaurida. — Como se sente, mamãe? Está um pouco pálida.— Um pouco cansada, filho.— Acho que é mais que isso, mamãe — Disse ele, enfrentado seu olhar.— Ando um pouco preocupada. Seu irmão andou trazendo notícias da América.— Não precisa se preocupar, mamãe. Ângelo não entende nada de negócios. Deveria se dedicar àquilo que aprendeu e deixar tudo em minhas mãos. Estou pensando em utilizar algum imóvel e montar um escritório para ele fazer seus p
Glória entra no escritório assim que Augusto retorna da conversa com dona Helena e o encara pensativa.— Marquei a consulta para sua mãe com o Dr. Inácio Duarte dos Reis, para segunda feira às quinze horas.— Obrigado, Glória.— O que ela tem?— Não sei exatamente. A morte de papai a abalou muito. Talvez seja só tristeza.— Espero que sim.— Augusto! – chamou Ângelo porta adentro — Trago uma surpresa para você. Veja quem encontrei perdida por essas bandas.— Como vai, Augusto?Mercedes adentra altiva no escritório, sorrindo, enquanto retira as luvas de renda das mãos delgadas. Encara Glória com um olhar petulante, deixando-a corada.— Que grande surpresa! — disse Augusto, encarando-a estupefato — Não imaginava que a veria tão cedo.— Pa
Ângelo sentia-se exultante com a súbita demonstração de interesse de Mercedes por Augusto. A recíproca sendo verdadeira, terá nela uma grande aliada para seus propósitos, uma vez que tentara com Glória e essa se mostrou arredia. Mercedes, além de bela, tinha dinheiro. Talvez pudesse convencer o irmão a se casar com a filha ilustre de um Coronel. Arranjos seriam acertados, bens seriam unidos, já que a beldade é filha única. Com esse dote Augusto não o impediria de investir em seus sonhos, contudo, precisaria ser feito de uma forma que ele não desconfiasse de sua artimanha. Sonhando, Ângelo segue à casa do Coronel.— Ângelo! Que ventos o trazem? — indaga o Coronel, desconfiado — Esperava que seu irmão fosse me procurar.— Lamento decepcioná-lo, Coronel. O que exatamente deseja com Augusto? Espero não ser o
Marina suspirou fundo na poltrona. Fingi que não ouvi. Não queria interromper a leitura. Sabia bem o que ela tinha a dizer a respeito de Ângelo. Confesso que compartilhava com ela suas reações sobre ele, mas não iria admitir. Não ainda.Enquanto Ângelo coloca os seus planos em andamento, aproveitando-se da ausência do irmão, Augusto segue para a Capital, preocupado com a mãe. Na última semana ela parecia ainda mais frágil. Instalaram-se no Hotel Terminus e depois seguiram de taxi para a Irmandade Santa Casa de Misericórdia, onde se daria a consulta de Dona Afonsina.— Como ela está, doutor Reis? — Perguntou, enquanto a enfermeira ajudava a mãe a se trocar na sala de exames.— Vou pedir mais alguns exames, mas tudo leva a crer que o coração dela está um pouco fraco. Normal para a idade, contudo, recomend
Augusto encara Domingos, engolindo em seco. Havia preocupação em seus olhos.— Você acha que o país pode entrar num colapso financeiro? — pergunta de chofre, encarando o amigo.— Não sei. Talvez. Por outro lado os banqueiros são fortes e há muitos bancos naquele país. Mas o meu lema é prudência. Se nada acontecer, volto para lá. Espero que nada aconteça. E você, ainda continua morando em São Carlos?— Sim. Apareça qualquer dia desses. Acho que ainda se lembra do caminho para a fazenda, não é mesmo?— E como poderia esquecer? Passamos ótimas férias pulando naquelas águas e ouvindo seu pai ralhando conosco. E como estão todos?— Papai faleceu a pouco mais de dois meses.— Sinto muito, Augusto. Ele era um grande homem.— Também sentimos. Vemo
Devo confessar que senti um misto de satisfação, misturado a certa apreensão ao ver Verônica em minha porta.— E aí? Posso entrar? Trouxe algo para comemorarmos. — Sorriu travessa.— Comemoração? Isso é sempre bom. A que devo a honra? — Perguntei, deixando-a entrar.— Pegue as taças, enquanto me ajeito aqui. — Pediu, sentando-se no sofá, apoiando a garrafa na mesa de centro.— Então! Não vai me dizer? Estou curioso. — Entreguei-lhe uma taça, enquanto pegava o vinho para abri-lo.— Bom, já disparei em meu blog as informações sobre seu trabalho. Contatei algumas pessoas que se mostraram interessadíssimas. Até mesmo uma grande editora quer se encontrar com você.&m
Sentado à mesa do escritório da fazenda, cansado de tantos papéis sem sentido, Ângelo se pega arquitetando planos para juntar Mercedes e Augusto. Cada estratégia acabava em nada. Era como tentar unir dois polos de mesmo sinal. Teria que apostar em algumas lágrimas da moça para amolecer o coração empedernido do irmão. Mas como chegar a isso? Bastaria um simples beijo e quem sabe na frente do Coronel? Entretanto os tempos eram outros. Na época de seus pais isso teria dado certo, mas quase nos anos trinta, onde as mulheres estavam fazendo campanhas para votar, depois de todo aquele movimento sufragista na Europa, não daria muito certo. Tem que haver outra maneira. Um ataque? Isso seria interessante.Armar um ataque contra a pobrezinha da moça indefesa, deixando-a debulhar-se em lágrimas, talvez despertasse em Augusto seu lado cavalheiresco e o desejo de consolá-la. Teria que r