Capítulo 8

Malu

Durante o restante do dia, minha mente esteve longe, não houve um só momento em que eu não estivesse pensando em minha mãe, pedindo mentalmente que as horas passassem rápido para que eu pudesse ir embora e me certificar que o aperto no peito que eu estava sentindo era coisa da minha cabeça e quando eu chegasse em casa, ela estaria sentada no sofá, assistindo novela e comendo pipoca ou cozinhando para mim.

Assim que encerrei meu expediente, me apressei em organizar minhas coisas para ir embora. Aparentemente, a Joice estava com medo de mim, porque ficava me olhando de soslaio e quando eu a desafiava, olhando bem na cara dela, desviava o olhar. Chegava a ser engraçado, confesso. Mas isso é ótimo, pessoas preconceituosas precisam aprender onde é o seu lugar.

Segui meu caminho até em casa, vendo novamente o vapor do Pardal bem perto, a vontade que eu tenho de meter a mão na cara dele e perguntar porque está rondando é imensa. É óbvio que não farei isso, pois, corro o sério risco de levar uma bala no meio da testa, no mínimo ele me espancaria, como esses bandidos estão acostumados a tratar as Marias fuzis que vivem em cima deles como urubu na carniça. Ridículos!

Sem dar a menor importância a presença dele, empinei meu nariz e entrei em casa.

— Mãe? — chamo, ao mesmo tempo em que olho ao redor para ver se realmente cumpriu sua palavra e não cedeu ao vício, derrubando a casa, em seguida, como sempre.

Mas, não, ela não fez isso. Está tudo intacto.

— Mãe? — chamo novamente após fechar a porta.

Como não obtenho resposta, deixo minha bolsa no sofá e vou procurando por ela em cada canto da casa, escancarando todas as portas, porém, não tem ninguém, está vazia. Pego meu celular no cós da calça para ligar para a Yasmin, disco seu número, mas apenas chama e nada de ela atender. Continuo tentando, até que, finalmente, sou atendida.

— Amiga, está em casa?

— Tô, sim, aconteceu alguma coisa? Parece preocupada…

— E estou, Ys. Posso passar aí para conversarmos pessoalmente? — retorno para a sala.

— Pode, sim, amiga. Espero que não tenha acontecido nada grave.

— Fica tranquila, vai ficar tudo bem.

A verdade é que nem eu mesma posso garantir isso, porém, espero muito estar certa.

Ignoro completamente o meu cansaço físico e mental, e a fome, guardo meu celular na cintura e saio de casa.

(...)

Parada em frente a casa da Ys, dou dois toques na porta de madeira com os nós dos dedos.

— Oh, minha menina! Que bom te ver, faz dias que não aparece aqui. — a mãe da minha amiga me recebe calorosamente com um abraço apertado.

— Me desculpe, tia, sei que estou igual político ultimamente, mas os problemas têm me perseguido. — forço um sorriso.

— Tá mesmo, só aparece quando precisa — ela diz rindo — Mas tem algo errado, minha filha? — sua voz soa carregada de preocupação e vejo-a franzir o cenho.

— A senhora nem faz ideia. — suspiro pesadamente e murcho os ombros.

— Vem, vamos entrar. A Yasmin já deve estar saindo do banho, não repara a bagunça. — ela abre mais a porta e faz menção para que eu entre.

Acabo rindo porque ela sempre diz isso, o que eu realmente não consigo entender, já que, apesar da simplicidade da casa, é muito bem limpa e organizada.

— Quer sopa? Acabei de fazer.

— Não precisa se incomodar comigo, tia. Não estou com fome. — a respondo, sentando no sofá e, no mesmo instante em que digo isso, ouço meu estômago roncar, me contrariando.

Ela dá uma gargalhada gostosa, inclinando a cabeça para trás.

— Até eu ouvi. — minha amiga surge, secando as tranças com uma toalha e usando um baby doll, deixando seus mamilos aparecerem sob o tecido da blusa.

A mãe dela vai para a cozinha, nos deixando a sós e minha amiga se j**a ao meu lado no sofá.

— O que tá rolando?

— Minha mãe sumiu de novo, Ys… O pior nem é isso, desde cedo tô sentindo um aperto no perto, sabe? Uma sensação ruim, não consegui parar de pensar nela o dia todo. — minha mente viaja e torço os lábios.

— Essa não seria a primeira vez que isso acontece, tu tá ligada, né? Tu aí toda preocupada e ela pode estar em uma boca qualquer por aí ou no lugar onde trabalha.

— Não sei, Ys… Dessa vez é diferente, não sei explicar. Na verdade, eu só queria saber se vocês a viram. — a encaro.

— Como isso seria possível, Malu? A gente nem sabia que sua mãe tava em casa, não foi tu mesma quem disse ontem que ela fez merda e se saiu?

— É, eu sei… Quero tentar encontrá-la, tu me ajuda a procurar? — arqueio as sobrancelhas, esperando por sua resposta.

— Puta que pariu, Malu! Tu já viu que já anoiteceu, né? Onde, caralhos, a gente vai achar tua mãe? Pensa, filhona. — b**e os dedos na própria testa.

— Eu sei, Ys, mas preciso ao menos tentar, por favor, me ajuda. Não sei a quem mais recorrer. — faço cara de cachorro que caiu da mudança e noto que ela revira os olhos.

— Ok, mas depois não diz que não avisei.

— Vamos, então?

— Deixa só eu trocar de roupa e já venho. — diz, levantando.

— Ninguém vai a lugar algum antes de comer. — dona Rebeca vem em nossa direção, segurando um prato nas mãos.

— Oh, tia, não precisava.

— Sem história, Maria Luiza, pode comer. — coloca uma almofada em minhas pernas e o prato com a sopa de carne e legumes borbulhante, sobre ela.

Fecho os olhos, aspirando o delicioso aroma no ar.

— Pra mim, ninguém traz sopinha na mão né, dona Rebeca?

— Vai procurar o que fazer, menina grande a toa. Vou pegar a sua ainda. — ela limpa o suor da mão num pano de pratos que está pendurado em seu ombro.

— Aí eu dei valor. — minha amiga saltita como uma criança e gira os calcanhares para ir se trocar.

Enquanto a espero, vou tomando a sopa que está deliciosa.

— Tia, a senhora tem mãos de fada, isso está delicioso.

— Obrigada, querida. Vem me visitar mais vezes que eu faço aquele doce de banana que você ama.

— Aí é covardia. — falo e ela ri.

— Alguém aí falou doce de banana? — a esfomeada da minha amiga volta toda produzida.

Ela senta para comer e, como eu já estava terminando, não demoramos a sair a procura da minha mãe.

(...)

Batemos de porta em porta, até dos menos conhecidos, perguntando se alguém a viu, mas a resposta era sempre a mesma, alguns diziam que não, outros simplesmente não queriam se envolver. Passamos pela frente da boca e vemos um grupinho de homens conversando, entre eles o Pardal e outros vapores conhecidos, inclusive, o que vive rondando a minha casa.

— Aê, mina! — a voz do Pardal, seguido de um assobio, nos faz olhar em direção a boca.

— É o quê, que esse cara quer? — pergunto a Ys, sem a menor paciência para dar trela a bandido.

— Tá surda, porra? — ele grita novamente.

— Acho melhor a gente ir lá, mona. Não tô afim de levar porrada de bandido. — Yasmin comenta comigo.

Bufo e me sinto sendo obrigada a concordar com ela.

— Assim que eu gosto… — o idiota deixa a frase no ar, à medida que nos aproximamos dele.

— Diz logo o que tu quer, não tenho tempo a perder. — falo, o encarando com firmeza.

— Iiih, essa é marrentinha, hein, patrão. — um vapor diz, fazendo graça.

— Estou esperando. — sem dar a menor importância ao que foi dito pelo vapor, pergunto novamente ao Pardal.

— Tá fazendo o que na rua uma hora dessa? Tá pagando de doida? Esqueceu que rolou invasão hoje? — ele pergunta como se fôssemos amigos íntimos.

— Primeiramente, o que eu faço ou deixo de fazer da minha vida, não te diz respeito, segundo, eu sou tão cria do morro quanto você, posso andar a hora que eu quiser e não vai ser você quem vai me impedir. Agora posso ir, vossa majestade? — lhe pergunto com deboche e o desafio com o olhar.

Noto seu olhar desviar dos meus para minha boca.

— Malu… — minha amiga tenta me fazer parar.

— Só vou perguntar mais uma vez e espero que me responda… O que porra tu tá fazendo na rua a essa hora?

Reviro os olhos.

— Tô procurando minha mãe, ela sumiu e como teve invasão, pode ter acontecido alguma coisa… — somente em citá-la, meu peito se aperta novamente.

Ele ri anasalado.

— Tua mãe? — sei bem o que ele quer dizer com isso.

— Sim, algum problema?

— Ok, vou com tu.

— Não lembro de ter te convidado.

— Não te pedi permissão, acho que tu tá se esquecendo quem manda nessa porra aqui, né. Tu aí, vai com a amiga dela procurar, enquanto eu ajudo ela — Pardal dá ordens a um dos vapores e eu queria dizer para Yasmin vir comigo, mas sei bem a resposta que eu teria — Bora lá. — meneia a cabeça, fazendo menção para andarmos.

Mesmo que eu quisesse retrucar, sei que ele não permitiria, então apenas o faço, até porque, o fato de ele ser o dono de morro, me dá uma vantagem maior em encontrá-la.

O caminho é todo feito em silêncio, não somos amigos, não teríamos qualquer assunto em comum para conversar. Após alguns minutos andando, literalmente, em círculos, ouvimos um grito atrás de nós, seguido da Yasmin correndo em nossa direção e parar com as mãos nos joelhos, recuperando o fôlego.

— Respira, amiga.

— Fala tu aí. — Pardal pede a ela, com seu tom de voz autoritário.

— Malu, você precisa vir comigo, mona. — sua voz soa resfolegante.

— Encontraram ela? — ao mesmo tempo em que pergunto, sinto meu coração errar as batidas, mas não sei se exatamente de uma forma boa.

— Talvez… Não sei… Só vem, Malu, pelo amor de Deus! — a maneira como ela fala, faz o desespero ameaçar tomar conta do meu ser.

Não penso duas vezes, antes de segurar na mão dela e segui-la, sem nem me preocupar se o Pardal veio atrás.

Paramos numa vala e me deparo com um corpo estirado no chão, completamente sem vida e ensaguentado. Ligo a lanterna do meu celular, devido a pouca iluminação do lugar e meu coração paralisa no momento em que reconheço suas roupas, ajoelho devagar, tremendo em nervosismo. Não, não pode ser.

Não, isso não pode ter acontecido.

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