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3 |pura de corpo e alma|

Anna Andaria


É DIFÍCIL para mim, como imagino ser difícil para todas as outras faxineiras de Riad. Sinto vontade de chorar, mas não choro. Seguro um nó desafiador em minha garganta ao ponto de me sufocar com ele. 

  A casa mal se abriu e eu nunca vi tantos homens em toda minha vida. Eles ocuparam quase todo pedaço, mesmo assim tem dezenas de mulheres. Jamal mantém os olhos em mim, estou limpando o bar, copo por copo, garrafa por garrafa. Dói ver minha mãe dançando para todos aqueles homens no palco principal, ela não me olha. Seduzia eles. 

— Rapariguinha.

  Jamal se aproximou do bar em que estou limpando, e olhou para Dandara, a moça que prepara as bebidas. 

— Caia fora, Halan! 

Dandara saiu sem olhar para trás. Jamal tamborila os dedos infestados de anéis no balcão, eu tento esconder meu olhar do seu. Mas ele me observa esperando eu olhá-lo. 

— Sabe preparar as biritas da casa? 

Balanço a cabeça negando, ele bate o punho com força no balcão. 

— O que sabe fazer rapariguinha?! Achei que era moça prendada! Mas só serve como bom corpo e limpadeira. 

— Sei costurar e cozinhar, principalmente iguarias. 

— Hmm. Nada de tão mal. Vai concertar as roupas das concubinas e fazer os petiscos da noite também. Depois limpará tudo e ficará no bar até o dia amanhecer e limpar tudo de novo. Será a última a pregar os olhos, mas hoje a noite eu farei uma visita em sua cama! 

Tento manter a respiração no ritmo, mas foge completamente. Eu estou em uma tremenda enrascada! 

O cubículo pequeno no qual as barregãs se trocam e ficam lindas para os frequentadores é pequeno e apertado, mas não é tão ruim quanto pensava. Um lugar animado, um dos momentos que as moças mais dão risadas. Tecidos coloridos, bijuterias e maquiagem. A única coisa ruim entre todas as barregãs e a inveja de algumas delas, a mais invejada e invejosa é Yasmin, se vê há distância o quanto as concubinas são falsas com ela e o quanto ela se acha superior. 

— Anna venha aqui! Deixe-a e arrume os meus cabelos. 

Termino de arrumar a fenda do sári de Jana, e vou até a penteadeira única de Yasmin. 

— Olhe só, são joias de verdade? 

Ela passa as mãos nos brincos de esmeralda e no colar de diamantes. 

— Claro que são, o Sheik que me deu, e ele vai me dar muito mais quando eu for para o harém dele. 

— Nunca vi um harém. 

Ela me olha pelo espelho e bufa com uma risadinha desdenhosa. 

— Só as concubinas e amantes que ele escolhe podem entrar, você não entraria nem como faxineira e olha que tem muitas lá. 

— E você tem certeza que vai entrar? Já li que apenas mulheres de serventia e interesse entram. 

Ela pega uma tiara de diamantes e coloca na minha mão com raiva. 

— Olhe para mim tola! Eu sou a mais desejada das concubinas, ele me dá joias! Ele não conversa com nenhuma das amantes, só as usa, mas eu fui a que mais ganhei joias e a única que dormiu com ele por dois anos, provavelmente serei a única desse inferno que irá para o harém!

— Está certo.

Arrumo a tiara em seus cabelos, não me importo de ser tratada por ela assim. Eu nunca tinha falado com Yasmin antes, ela pode ser ruim como veneno, mas de fato é a mais inteligente por desejar alguma coisa. 

É bonita e vaidosa, invejosa se percebe a metros, mas acredito que ela será a primeira a sair daqui nem que seja para ir para outro prostibulo. 

Quando termino, ela balança o sári verde e as pulseiras. As outras meninas a elogiam. 

— Anna você não é feia, consegue ao menos algumas notas se dormir com os seguranças da casa, mas vai ter que persistir um pouco pelos trocados. 

Algumas delas dão risada da piada sem graça de Yasmin.

— Eu prefiro ser quem eu sou e não dormir com ninguém, do que ser como você que dorme com todos. 

Ela arranha os dentes, me arrependo de ter falado, nunca diria isso para uma mulher, ela tenta partir para cima de mim. 

— Deixe-a, se tocar nela sabe o que Jamal fará com você! 

Graça, uma das faxineiras fala, Yasmin me dá um olhar severo e ergue o queixo na minha direção. 

— Uma noite inteira me aguarda, continue suja lavando tudo malcriada, albashie! Nem os ratos vão querer ficar ao seu lado. 

Ela sai rancorosa, sem olhar para trás. 

— Anna pode costurar isso para mim? Não acredito que rasgou! 

Seco uma lágrima que escorre e ando até a mesa de Mera, com o saquinho de linha e agulhas. 

Mera é morena e também uma das garotas mais jovens da casa. 

— Não ligue para ela Anna, Yasmin é uma invejosa ela sabe que você é mais bonita do que ela e isso já é suficiente para um escândalo. 

— Não acho, olhe para minhas roupas. Eu não ligo para isso também, não me importo é que... 

— Enfim, ela nunca irá para o Harém do Sheik. Ela sonha até em se casar com ele, sonhadora demais, besta. 

— Tudo gira em torno desse Sheik. 

— Claro que sim, ele é o patriarca desse país! A esposa dele, Aisha é a mulher mais admirada da Arábia. 

— Eu imagino que seja. 

— Dizem que as amigas dela também são, mas não é nem comparado. Khalil já se deitou com todas as amigas dela, é só uma delas sorrir que ele já quer. 

— Como sabe disso? 

— Já fui uma das amigas dela. Aisha é uma mulher perigosa, tem mais ciúmes do marido do que qualquer outra e isso é incomum por aqui. 

Fico surpresa, e boquiaberta. 

MINUTOS SEGUINTES:

Volto para o bar depois de ajudar todas concubinas, o lugar estava lotado e era só um pedaço de Amiras hari's. Preparo alguns petiscos e ajudo Dandara com as bebidas, de hora e outra vejo Jamal me observando. 

— Anna pode levar as bebidas no segundo andar, na sala três? 

— Tem bar para todo lado aqui, pediram especialmente aqui. 

— O Sheik prefere os bebes feitos por mim. 

Ela me entregou uma bandeja espelhada com um baldinho de gelo, as garrafas lacradas e os abridores e copos do jallab. 

— Tudo bem. 

Passo por quartos onde o som que se escuta é de gemidos, outros de brigas e jogos de azar. Risadas, palavrões e nudez. 

Quando chego no segundo andar, abro a cortina vermelha e entro em uma sala vermelha, com música calma e diversas garotas e apenas dois homens, um capanga e o Sheik. 

Ele está sentado no sofá mais afastado, cheio de pantufas, travesseiros e tecidos do seda mais aclamado. Yasmin está ao seu lado sorrindo e murmurando coisas em seu ouvido, ele está sério. Assim que entro ele me degola com o olhar, sinto um medo abrupto ao ponto do meu coração disparar. Mulheres caminham para todos os lados atrapalhando minha vista, mas eu consigo sentir seus olhos me destroçando. 

Azuis cobaltos da cor mais profunda das noites, o cabelo preto como carvão, sedosos e bem arrumados. A burca branca, os anéis e o relógio de ouro, a barba bem feita. Me sinto baixa e suja com o sári amarelo surrado. Meu corpo queima como se o fogo das trevas estivessem me queimando. Minha pele se arrepia como se tivesse frio ao mesmo tempo calor, ele aperta a mandíbula e ergue uma sobrancelha. Yasmin vira o rosto dele para sua direção. 

Volto a me recompor e coloco os álcoois em cima da mesinha perto dele. Não o olho, olho para o chão, mas sinto que ele ainda me olha. 

Ala o que está havendo comigo?! 

O medo que sinto é enorme, a beleza dele é mágica, surreal, demoníaca. 

— Alah... 

Sussurro e saio com passos curtos, quando chego nas cortinas meus olhos me enganam e eu olho sem querer para ele, meus olhos tristes e secos sem força vital alguma. Os olhos dele, mágicos e ameaçadores. 

HORAS DEPOIS:

Trabalho no bar sem conseguir total concentração, não sei o que aconteceu comigo quando olhei para o Sheik pela primeira vez em minha vida. Ele sem dúvidas é o homem mais belo que já vi, as pessoas dizem que Sheik's são mais cruéis que homens de vida comum, eles comandam coisas desumanas e ganham muito por isso, Khalil Mustafá não deve ser diferente! 

Droga Anna, pare de pensar nos olhos e na beleza diabólica desse Sheik! Eu nunca pensei em um homem dessa forma antes e agora sinto que vou desmaiar de tanto ponderar. 

— Dandara, saía e me deixe conversar com Anna. 

Jamal aparece, rapidamente pego os copos sujos do balcão e coloco na pia. 

— Senhor? 

Pergunto com os olhos baixos, ele dá um sorriso maléfico. 

— Você é uma rapariguinha de se admirar não é mesmo? Deixa o Sheik louco apenas sendo uma ninfetinha faxineira, pela segunda vez na vida. 

— Não entendo. — Ele segura meu braço com força e gemo com a dor: 

— Me solte! 

— Mustafá vai pagar 300 mil para dormir com você por uma única noite, uma garota simples custa no máximo 10 mil, mas como você além de não ser concubina é virgem... Vale muito mais! Não andou se tocando, andou?! 

— Hã?! Eu não vou me deitar com ninguém, não pode me obrigar! Não quero! Por favor não, Jamal... 

Recebo um tapa forte que faz-me cair. Ele bate o punho no balcão fazendo taças quebrarem e ordena:

— Eu mando em você rapariguinha! Uma pena que não seja eu a tirar seu cabaço, mas vou ganhar muito! Mando em você como o homem e dono dessa casa, mando em você porque sustento você e sua mamacita! Vai dar para ele até não aguentar mais e só para você ver o como Soraya é maravilhosa, ela que vai decidir se você dorme ou não com o Sheik, se ela aceitar eu dou a metade da grana para ela, se não, você trepa assim mesmo com ele! 

Não, não, não!!! Não pode ser. 

— Agora vamos, você tem dois banhos a tomar e ficar arrumda. Yasmin já foi dispensada por sua causa, eu sei que você vai render muito rapariguinha pura de corpo e alma.

***

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