Capítulo-5

Marcos que estava sentado, se levanta depois de soltar seu veneno em mim, me encarando de um jeito presunçoso. Eu diria que se ele pudesse me matar... o faria agora, nesse exato momento.

— O que está fazendo aqui? Bruno está bem? Eu o pergunto sem fazer questão da forma como me tratou.

Apesar de ele me tratar super mal, eu não posso fazer nada contra isso... Marcos está sendo apenas um pai zangado como qualquer outro, reagindo a essa situação rudemente. Eu acho que faria a mesma coisa se tratasse de meu filho. E somente por esse motivo, eu engulo minha raiva e deixo passar o seu tom agressivo.

— Eu vim por que está mais caro. Bruno teve uma recaída, e preciso pagar um novo tratamento eficiente de fisioterapia.

— Mas... e o dinheiro que eu mando todo mês? Não está cobrindo o plano de saúde?

Como se eu tivesse dito algo estúpido, Marcos bufa irritado.

— O dinheiro que você manda, não dá nem para tampar o buraco do dente Maia. Eu agradeço a ajuda...mas não é mais o suficiente para pagar a conta do hospital.

Colocando minha bolsa no canto da sala, eu cubro meu rosto ao passar minhas mãos sobre ele, tensa demais por essa notícia que acabei de receber.

— Mas como... vou arrumar esse dinheiro agora? — Digo estarrecida.

— Você tem que me dar esse dinheiro, é sua obrigação. Eu não sei como vai fazer, mas quando chegar o fim do mês, espero ter o que é meu por direito.

Eu sei que tenho que cumprir com meu trato e jurei para Celina que faria o possível, fora que Bruno depende de mim já que o pai não trabalha e fica nessa poça de lama emocional em que se colocou.... mas uma coisa que não aceito, é alguém vir me dizer o que devo fazer. Então ergo meu peito e caminho em sua direção, determinada.

— É aí, que está.... esse dinheiro é para o tratamento do Bruno ou você está pensando em fazer outra coisa com ele, Marcos?

Enfrentando-o, eu debato sua frase olhando profundamente em seus olhos. Sei que ele deve estar sofrendo por ter que ficar sem beber, mas também sei, que ninguém fica limpo do dia para noite como ele pressupôs.

— O que está querendo insinuar?

Ele responde com a voz alterada. Creio que acabei tocando na ferida que ainda nem se cicatrizou.

— É isso mesmo que você ouviu. Bruno... precisa mesmo desse tratamento, ou você pretende gastar todo esse dinheiro em um bar, enchendo a cara, como no dia em que Celina morreu, e como no dia do acidente? Você não mudou nada...

— Você não entende, e nunca vai entender.... por que mesmo não estando lá no momento em que ela fechou seus olhos, eu a vi indo embora aos poucos, sofrendo todos os dias, eu estive ao lado de Celina e você não. Tive que ver o brilho dela se apagar conforme aquela doença a destruía por dentro, e a cada vez que isso acontecia, ela destruía uma parte de mim também. Quanto a você Maia, quer mesmo procurar culpados? Então me responda... onde estava quando Celina precisou de você? Quando ela já sabia que iria partir?

As lembranças de minha melhor amiga se passam pela minha cabeça e eu fico sem palavras, me sinto caindo em um lugar escuro e frio. Eu queria ter me despedido dela, mas me acovardei, fui fraca e egoísta. Marcos não está errado... eu nunca me fiz essa pergunta, por que já sabia a resposta.

Vendo que eu não consigo respondê-lo, ele sorri de um jeito cínico, dizendo em seguida...

— Que hipócrita você é... está julgando quando o julgamento serve para si mesma. Estamos no mesmo barco Maia.... porém eu tenho coragem de admitir que ele está afundando, enquanto você usa uma peneira para esvazia-lo.

Suas palavras me atingem como um tapa, me fazendo enxergar tudo que eu estava procrastinando durante esse tempo, em que Celina se foi.

Ela era cheia de alegria e energia, onde passava levava sorrisos... Até mesmo quando estava debilitada, ela foi forte e nunca reclamou. Eu preciso ter a força que ela teve, eu preciso fazer isso por ela e por Bruno. Eu tenho que conseguir porque se ela estivesse aqui agora... tenho certeza de que me pediria paciência e resiliência.

— Tudo bem... eu vou arrumar mais dinheiro. —Digo ao olhá-lo.

Por sua vez, mamãe se aproxima de mim ao meu lado tocando em meu ombro, com uma expressão que eu conheço muito bem.

— Maia, como vai fazer isso? — Mamãe pergunta preocupada.

— Eu posso arranjar um bico nos finais de semana e nas minhas folgas mãe. Não posso deixar Bruno sem o tratamento.... é importante para sua recuperação.

— Bruno é a luz que restou em minha vida, sei que não nos damos bem, mas por ele, eu faço qualquer coisa... inclusive vir aqui. Estou até mexendo com artigos de carpintaria e já juntei uma grana, não é muito, mas vai ajudar a pagar o tratamento. Volto no final do mês Maia, e espero que consiga o restante pelo bem de Bruno. Obrigada por me receber Tereza, até breve!

Marcos caminha até a entrada sozinho e vai embora logo depois, fechando a porta atrás de si, enquanto deixa mamãe e eu desoladas na sala de estar.

Tudo que eu consigo pensar agora é em Celina, estou tão abalada pela visita de Marcos, que coloco tudo para fora assim que ouço o carro dele indo embora. Minhas lagrimas caem pelo tapete em gotas, entretanto para mim é como um peso.... um peso de um portão de concreto que ficou muito tempo fechado.

Mamãe me abraça forte e eu soluço em seus braços como um bebê recém-nascido, até que ouvimos o barulho de alguém entrar.

— Desculpem, a porta estava encostada... eu bati, mas ninguém abriu.

Kevin fala ao surgir com sacolas na mão, tímido por ver que interrompeu um momento importante entre minha mãe e eu.

— Ah meu bem, você é um amor..., mas não precisava comprar a cafeteria inteira.

Mamãe o agradece ao se aproximar dele pegando as sacolas, o deixando vermelho pelo comentário cômico. É então quando aproveito para limpar meu rosto molhado, com a desculpa de arrumar minhas malas.

— Vou arrumar minhas coisas. — Digo indo para meu quarto ao esconder meu rosto com minha franja.

Kevin me encara quando estou saindo da sala, e por um instante seus olhos se encontram com os meus me deixando elétrica, no entanto sua atenção volta para minha mãe que o puxa pelo braço o levando para a cozinha.

— Venha querido, vamos comer o bolo que trouxe.

Já no meu quarto, eu separo minhas roupas e coloco na mala ainda entristecida com tudo que está acontecendo na minha vida. De um ano e meio tudo desandou, perdi minha melhor amiga, perdi amigos, perdi o Scott e me tornei uma presidiária... mesmo não sendo realmente culpada.

Eu me sento em minha cama e suspiro pesadamente, colocando os últimos itens com cuidado na minha bolsa. É um porta-retrato de mamãe e papai comigo no meio deles, era meu aniversário e o melhor presente para mim foi meu pai comparecer de terno. Era alugado, e mal cabia nele, porém foi o jeito dele me dizer "Eu amo você". Papai sempre foi problemático, seu jeito impulsivo fez mamãe o deixar e sair da nossa cidade Natal. Ela dizia que era impossível lutar por um relacionamento sozinha. Querer que a outra pessoa mude, é o sinal de que você já não cabe mais nela... e não deve se estreitar em um espaço pequeno, quando seu coração quer algo maior, quando você merece mais e não o pouco.

Meus pensamentos me levam até San Diego, a cidade em que eu cresci e me tornei quem eu sou, e a que me expulsaram também. Mesmo com o final que tudo levou, não posso odiar San Diego, pois foi lá que vivi momentos lindos e me apaixonei profundamente... pena que somente o meu amor não era o suficiente e isso me dilacerou ao meio.

Como se fosse telepatia, meu celular toca com o nome do meu ex-namorado na tela... Colin Scott. O que me deixa bastante surpresa já que desde o acidente, ele não ousou me ligar, não mandou notícias, e agiu como se eu não existisse.

Olhando fixamente para o telefone, eu o deixo tocar... logo cai na caixa postal e recebo uma mensagem de texto dele.

— Maia, por favor atenda. Eu quero te ajudar, não sou mais o mesmo de antes, estou aqui por você agora.

— Fico feliz que tenha acordado Colin, mas não estou presente para ver seus olhos abertos, como não esteve para lutar por mim. Não me procure mais, isso é tudo que tenho para te dizer.

Respondo sua mensagem desligando o meu tele móvel e descendo com minhas duas malas para a sala de estar. Quando voltei para San Francisco eu não tinha muita coisa, além de um coração partido, e problemas.

— Ah, ela ali, Maia... se junte a nós.

Mamãe diz sorridente, ao se levantar e puxar a cadeira do lado de Kevin.

— Claro mãe.

Eu me sento junto a eles sem graça, e sem clima para conversar ao cortar uma fatia de bolo. Sempre fui horrível para esconder minhas emoções, e agora mais do que nunca estou tendo dificuldades para isso... pareço um robô muito cansado que precisa trocar suas embreagens.

Depois de meia hora, estamos na porta despedindo de minha mãe, que me abraça fortemente.

— Se cuide meu amor, não se esqueça de quem você realmente é, uma mulher inteligente, que pode fazer mais do que imagina.

— Obrigada mamãe, vou sentir sua falta.

Digo a ela angustiada. Eu não queria sair de casa agora que voltei há pouco tempo, mas é necessário se eu quiser ficar nesse emprego.

— Obrigada Tereza, pela sua hospitalidade.

Kevin diz depois de abraça-la ao meu lado, e eu realmente vejo um brilho em seus olhos quando sorri ao se afastar... levando minhas duas malas para o bagageiro do carro.

A volta para casa dos Miller é mais silenciosa que a ida para casa da minha mãe. Ao chegar no portão da mansão, ele se abre sozinho e logo estamos dentro da garagem outra vez.

Miller sai do carro, dá a volta até mim e abre a porta do passageiro. Eu saio, e vou até a parte traseira do seu Bugatti, esperando que abra para que eu possa pegar minhas duas malas. É o que ele faz.... porém, não me entrega.

— Eu te ajudo com isso.

Ele diz ao caminhar para dentro da mansão, passando pelo corredor e o jardim. Eu logo o sigo, e então o vejo parar diante da porta do meu quarto de serviçal.

— Obrigada, Senhor Miller. Não precisava..., mas obrigada.

Lanço um sorriso de lado pegando minhas malas de suas mãos, pronta para entrar em meu quarto.

— Sempre a sua disposição, Senhorita Silva.

Ele flerta quando seus dedos roçam levemente em meu pulso, e a intensidade de seu olhar me faz ver estrelas através de suas pupilas cintilantes. Deus... esse homem é tão magnético, não podia ter me colocado com um patrão mais feinho, de preferência desajeitado? Entretanto... pensando bem, do jeito que eu sou né, eu não duvido que ficaria caidinha por ele assim também.

— Boa noite, Senhorita. — Ele diz me tirando do meu torpor.

— Boa noite Senhor.

Horas depois....

Vesti o meu pijama, mas não consigo dormir, me sinto uma estranha no ninho. Cansada de me remexer para lá e para cá, resolvo levantar e me sentar na cama, e é nesse instante... que ouço vozes perto da minha porta.

— Ela não está aqui... já olhei em toda casa Senhor.

— Procure-a outra vez, e não parem até encontrar. Minha mãe não podia ter saído assim, sem mais nem menos... vocês entendem o tamanho da situação? Quem deixou o portão aberto?

Kevin gritou do outro lado bastante alterado. Em choque eu abro a porta, preocupada com o que ele acabou de dizer... pelo o que entendi, Esther Miller sumiu e não há sinal da doce Senhora.

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