E fim...
A pedra da lua reluzia na palma de Selene, um brilho opaco e sem a magia que o Rei Phelix Völun de Magdala, seu pai, exigia. Furioso, ele chutou as costas da jovem com tamanha força que a lançou ao chão. Selene não emitiu nenhum som apesar da dor. Sabia que se gritasse ou mesmo gemesse ele a espancaria. — Não passa de uma inútil — ele bradou queixando-se: — Não herdou nem mesmo uma fagulha da magia de Myra. Alto e imponente, seus olhos azuis enevoados lançavam desaprovação e desdém a filha. O longo e liso cabelo loiro caía graciosamente em seus ombros, a aura purpúrea emanando dos fios destacando a natureza sombria de sua magia. — Selene é uma vergonha para Magdala — Phelix indicou para Mamba, seu maior aliado, parado poucos passos atrás dele. O poderoso feiticeiro, esguio e astuto, envolto em vestes brancas e azul royal, cores de Magdala, observava Selene com os frios olhos alaranjados carregados do mesmo brilho sombrio do rei. — Existe magia na princesa. Posso sentir a mesma ess
O quarto de Selene situado no topo da segunda torre de Magdala era um espaço pequeno e escuro, com uma única cama e uma latrina. Um feixe de luz fraca entrava pela única e diminuta janela, e as paredes de pedra fria pareciam fechar-se sobre ela tornando o lugar semelhante a uma cela. O que de fato era para Selene. A cama era rígida, coberta por lençóis desgastados, testemunhas dos anos de confinamento carregados de lágrimas. Tendo revirado na cama por horas e dormido só de madrugada, por causa de outra torturante tentativa de seu pai e de Mamba de obter magia lunar, despertou com o chiado de abertura, algo que sempre a preparava para o horror e repreensões diárias. Gemendo, por causa das dores que cortavam seu corpo, devido os golpes da noite anterior, sentou e passou os dedos pelos fios loiro-platinados de seu cabelo, esperando que assim tivesse uma aparência no mínimo digna para recebê-lo. Preparou-se para mais um dia de dor e sofrimento, mas algo parecia diferente. O rei Phelix e
Selene não esperava uma grande recepção em sua chegada, mas a falta de pessoas no dia de seu casamento e a frieza que a cercava era angustiante. O sacerdote começou a cerimônia, pronunciando palavras vazias em um pacto frágil. O homem ao seu lado, recebendo com ela a benção matrimonial aumentava seu receio. O pai estava louco se achava que teria qualquer chance contra o cavaleiro alto e musculoso para o qual ele a entregou em casamento. Quando Cedric entrou na capela, estranhamente Selene sentiu o coração disparar e um frio na barriga ao erguer os olhos para o rosto másculo. Ele tinha profundos olhos pretos, cabelo escuro e a pele bronzeada, como se passasse cada hora do dia sendo beijada pelo sol. Uma beleza alta, selvagem e fria, foi como sua mente o descreveu conforme ele caminhava com a expressão fechada na direção dela e do sacerdote. Inimigos de guerra unidos em matrimônio, forçados a isso em um acordo tão frágil quanto um dente-de-leão ao vento. Assim foi o matrimônio de Sel
Deixando evidente o quanto a desprezava e a queria distante de si, Cedric, a enviou para a ala oposta a que ocupava. Meses se passaram em que Selene via o “marido” somente à distância e nenhuma palavra era trocada entre eles. Passado o medo, quando dois guardas agarraram seus braços e a forçaram a ir para um quarto aconchegante na ala oposta a do rei, Selene ficou confusa, mas feliz por ter seu próprio canto, por poder ficar em um ambiente tranquilo, sem agressões e ameaças. Dias depois foi informada que teria algumas aulas com Ayala Trever, a maga poderosa de Eszter conhecida como Feiticeira Dourada. As aulas incluiriam aprender a ser uma boa rainha para Eszter e a usar magia. Relutantemente, mas sem escolha a não ser obedecer, aceitou e deu início a uma vida praticamente solitária. Cuidavam da ala quando estava nas aulas, limpando e deixando comida a sua espera, mas quando retornava ficava completamente sozinha, as refeições frias e o ambiente silencioso. Ainda assim, era melhor qu
Mantendo o corpo inconsciente de Selene junto ao seu, Cedric, seguiu em direção à ala médica da fortaleza. Ao pousar, a magia alada se desconectou de seu corpo voando de volta para as acomodações reais. De imediato foi cercado por alguns de seus homens e aldeões curiosos com o corpo que carregava ensanguentado em seus braços. Não dando atenção as indagações, com o coração acelerado, correu para dentro da propriedade até passar pelas portas de madeira do cômodo ocupado pelo médico de Eszter. — Majestade...! Colocou Selene na cama mais próxima e ordenou imperioso: — Salve-a! O idoso chamou sua equipe para atender a esposa de seu rei, ainda sem compreender como ela acabou naquela situação, com o pequeno corpo minando sangue. Cedric deixou a equipe médica cuidando de Selene e foi ao encontro de três cavaleiros que o seguiram, preocupados com a possibilidade de o rei estar ferido. — No jardim do sul deixei um homem amarrado. Peguem-no e levem para o calabouço para ser interrogado — co
Forçando as pálpebras a se abrirem, Selene observou um teto branco por um segundo, antes de uma dor aguda a fazer fecha-los com um gemido trêmulo. Seu corpo doía por inteiro. Ergueu um braço, para suavizar a luminosidade em seus olhos. Com a visão melhor, reparou nas ataduras cobrindo todo seu torso. Como um raio as lembranças do que aconteceu antes de desmaiar a atingiu. O empregado conjurando um portal; a fera esverdeada; o ataque feroz; a chegada de um ser alado, que logo soube se tratar de Cedric, junto com a certeza de que ele terminaria o serviço e a mataria como tentou no dia do casamento; o abrigo quente e reconfortante que encontrou nos braços dele. Confusa, fraca, com uma sensação pastosa na língua, e sentindo os braços e pernas pesando como chumbo, piscando observou o que a cercava. Estava em um quarto pequeno, com outras três camas, um armário com remédios e havia uma cadeira próxima a sua cama. Sentado na cadeira, em trajes elegantes e encarando-a com os profundos olho
Tendo desistido de começar a missão de seduzir Selene, Cedric, focou sua atenção para o segundo problema que tinha em suas mãos: O motivo do atentado contra a esposa. Embora não fosse comum aos reis interrogarem prisioneiros, Cedric, acostumado a executar todas as funções durante sua saga em reconstruir seu reino, acostumou-se a tomar a frente de todas as situações importantes dentro e fora das muralhas da fortaleza de Eszter. Seguindo pelos corredores úmidos que levavam ao calabouço, Cedric preparava-se para interrogar o homem, trajando roupas de empregado do castelo, e tirar dele a motivação e nomes de todos que estavam envolvidos na tentativa de matar Selene. Ao alcançar o enorme e pesado portão de ferro da prisão, sem ser necessário soltar uma só palavra, os quatros guardas, protegendo o castelo de possíveis fugas dos prisioneiros, o abriram para lhe dar passagem. — Vim falar com o prisioneiro que mandei trazer hoje — anunciou imperioso. Um dos homens, o de maior posição entre
Embora todo seu corpo doesse e tivesse de se manter quieta para recuperar-se rápido, Selene muitas vezes esquecia-se das feridas e se remexia de um lado para o outro, entediada em ficar na cama. Não queria permanecer imóvel em um leito lúgubre. Desejava estar ao ar livre e não em uma “cela” como tinha estado durante grande parte de sua vida ao lado do pai. — Boa tarde, princesa Selene! Novamente esquecida dos ferimentos, dessa vez movida pela empolgação, Selene se ergueu com a intenção de abraçar o único amigo que tinha em Eszter. Um instante depois, com um urro de dor, voltou a jogar o corpo nos lençóis. — Calma! Não faça movimentos bruscos, princesa — Tristan pediu se aproximando veloz dela. — Tem que ter cuidado — disse passando a mão carinhosamente pelo cabelo dela. — Obrigada por me visitar — disse com um sorriso agradecido. Tristan era seu único amigo dentro da fortaleza, nas terras de Eszter e até além das fronteiras de todos os reinos restantes. Somente em sua infância, an