Após terminar a verificação dos arredores, pausada por causa do ataque a Selene, e conversar com seus guardas, exigindo que espalhassem, dentro e fora da fortaleza, à condenação que atentar contra a rainha causaria, Cedric, voltou para o palácio. Precisando de um banho e trocar as roupas sujas do sangue de Selene e do empregado condenado, logo na entrada do palácio deu ordens que esquentassem água e enchessem a tina de suas acomodações. Passava pelo grande salão, rumo a escadarias para o piso superior, quando viu Tristan saindo do corredor que levava a ala médica. Com o olhar indecifrável, permaneceu parado no lugar, aguardando o amigo aproximar-se já imaginando o motivo dele estar daquele lado do palácio. — Boa noite, Majestade! — Tristan saudou com toda pompa, o sorriso atrevido fazendo Cedric revirar os olhos. Cresceram juntos, até mesmo lutaram lado a lado nos anos sangrentos de guerra contra o reino de Magdala. Tristan conhecia Cedric melhor que qualquer pessoa no mundo e até
Sem sono e com as feridas latejando, indicando que as ervas falharam em alivia-las, Selene desistiu de dormir e, mesmo odiando os manuscritos sobre magia, pegou um dos encadernados pousado ao lado de sua cama. No entanto, por mais que forçasse a visão, a leitura dos manuscritos antigos era difícil. A esfera flutuante acima de sua cama tinha pouca luz. A magia de trovão presa nela, que emitia fortes raios esbranquiçados quando cheia, estava quase apagada, provavelmente pelo passar do tempo não tendo sido recarregado para a iluminação não prejudicar o descanso noturno. Largou o livro e puxou a bolsa trazida por Tristan, remexendo seu interior em busca de algo para distrai-la. Havia algumas peças para distrair, como cartas e jogos, mas precisava de uma segunda pessoa. Observou cada peça com curiosidade, desconhecendo a maioria. Após a morte de sua Myra, seu pai a proibiu de gastar energia com tolices infantis e concentrar-se em ser tão poderosa quanto sua mãe foi. Era assim que conside
Estreitando o olhar, Cedric fechou a mão em volta da cabeça de corvo incrustada no punho da espada. Um movimento instintivo, comum quando algo ou alguém o perturbava. Nesse caso, estava extremamente zangado com a atitude rebelde de sua pequena esposa. — Sou seu marido e, acima disso, seu Rei. Assim que estiver melhor retornará as aulas de magia, que serão intensificadas até que domine algum elemento — comandou com dureza. — Não posso, não quero e nem preciso aprender magia — declarou encarando-o com determinação. — Passei meses em aulas aborrecidas para despertar algo impossível. Meu poder acabou para sempre. Cedric estreitou o olhar. — O que quer dizer com acabou? Já teve algum poder? — sondou interessado. — Tive na infância. Quando minha mãe vivia compartilhávamos o mesmo poder — respondeu, logo argumentando para fazê-lo entender sua motivação em acabar com as torturantes aulas. — Meu pai e o feiticeiro Mamba me davam aulas diárias, forçavam os treinos até minha exaustão, mas si
Na cúpula da segunda torre do castelo de Magdala, Mamba trabalhava em seu novo projeto para capturar magia, quando o som rastejante chamou sua atenção para a única e grande janela. Em silêncio observou uma serpente de escamas esverdeadas atravessa-la e se mover até ele. Ao chegar aos seus pés, a criatura ergueu-se, as escamas soltando fortes raios esbranquiçados que fariam qualquer um desviar o olhar, mas não o feiticeiro de Magdala. Ele continuou com os olhos fixos na cobra, um sorriso ladino formando-se ao visualizar a transformação de sua maior cúmplice. Quando a luz se desfez o demônio da água tomou a forma de uma jovem nua de pele pálida e cabelo longo, úmido e verde. — Fiz como me pediu mestre, seduzi os ouvidos de um humano, aticei seu ódio contra os magdalianos, contra Selene, e o manipulei para que me ajudasse a entrar na fortaleza e atacar mortalmente a princesa — relatou fitando-o com brilhantes olhos esverdeados. — Selene morreu? — questionou Mamba com expectativa. —
Deitada em um mar de peles quentinhas, usando uma camisola de algodão macio e alimentada com um guisado saboroso acompanhado por frutas frescas, mesmo com as dores das feridas, Selene sentia-se uma princesa de verdade pela primeira vez em anos. Só tivera tratamento semelhante quando sua mãe era viva. Levou um susto quando naquela manhã foi levada para um quarto novo, maior e muito bonito na ala norte do palácio. Também foi apresentada a Cira, governanta do palácio, e a Patry, sua agora dama de companhia. No começo temeu o tratamento que receberia, até encarou com desconfiança a tina com uma névoa quente em sua superfície, com medo de ser uma armadilha como a que faziam para o preparo de rã. Mas ao entrar devagar na tina, encontrou a água perfumada e numa temperatura agradável. Só não dormiu durante o banho por ainda restar uma parcela de suspeita de que seria afogada se relaxasse demais. Em silêncio desde que foram apresentadas, Patry a ajudou a secar-se, colocar a camisola e deita
A desconfiança de Cedric aumentou ao perceber a tensão e palidez em Selene diante da pergunta. O medo, como uma sombra, dançava nos olhos azulados, arregalados e fixos nele como se tivesse acabado de condená-la a morte. — Por que pede para ser uma aldeã em Eszter, no lugar de pedir para retornar à sua vida de princesa em Magdala? — questionou novamente quando o silêncio perdurou e Selene desviou o olhar. Selene hesitou por um instante, o olhar perdido nos dedos se apertando nas peles em seu colo, incerta entre mentir, deixando que continuasse a acreditar que era a filha amada que veio trazer a paz, ou contar toda verdade do pesadelo que viveu presa e maltratada pelo próprio pai. Inspirou fundo e decidiu que se queria ter uma chance dele aceitar seu pedido tinha de caminhar de mãos dadas com a dolorosa verdade. — Magdala deixou de ser um lugar bom depois da morte da minha mãe — disse suave e trêmula. — Meu pai... algo mudou dentro dele... O fez ficar cruel... — A ambição e maldade d
O cetro acertou seu braço direito com violência e sem aviso. A pedra da lua em suas mãos voou longe, ao mesmo tempo em que um grito de dor e medo saiu de seus lábios, o corpo diminuto colidindo contra o piso frio. — Criança inútil! Myra deixou-me somente decepção — o Rei Phelix, seu amado pai, bradou descendo novamente o cetro ativado com magia do trovão nas costas dela. Era a primeira vez que ele a agredia e Selene não entendia o motivo, não compreendia nada do que ocorrera nas últimas horas. As lembranças estavam confusas. Luzes azuladas e púrpuras se colidindo. Myra, sua mãe, correndo com ela nos braços, murmurando cânticos em desespero. Uma força intensa e agradável unindo-as. Phelix, até aquele dia o bondoso rei de Magdala e seu pai, lançava através de seu cetro todo tipo de magia elemental contra elas. Acompanhando-o na “caça”, Mamba sorria largamente enquanto fortificava a magia do rei. Ao ser encurralada ao fim da torre mais alta, abraçando a filha com força contra o peito,
Antes de sair para a vistoria da muralha, Cedric atravessou os corredores que levavam as acomodações reais, o passo lento, guiado pelos ecos das lembranças da noite anterior. Ao alcançar a porta de Selene, hesitou por um instante. Segurando o primeiro instinto, o de simplesmente entrar, bateu na porta. A acompanhante de Selene abriu a porta e o olhou apavorada. Dobrando-se em reverências, ela o deixou entrar antes de partir apressada. Recostada contras as almofadas, Selene ajeitou-se, observando inquieta Cedric se aproximar. — Como você está hoje? — ele questionou, sentando na poltrona ao lado da cama. — Estão cuidando adequadamente das suas feridas? — Estou bem... — respondeu incerta de como agir após o beijo. — As feridas já estão curadas, não se preocupe... Desconfiando que ela mentia por causa do ocorrido entre eles, Cedric observou-a atentamente, examinando cada detalhe de seu rosto em busca de qualquer sinal de dor ou desconforto. — Não é necessário que minta — Cedric expre