Lucas Park, o típico herdeiro que toda garota sonha em ter como companheiro. Bonito, carismático e com uma conta cheia de dinheiro. Eu não me importava com sua simpatia, tampouco precisava de seu dinheiro, a única razão para eu não raspar sua cara no asfalto quente, é pelo simples fato que seria um desperdício. Sua simetria era assustadora quando observada por algum tempo. Com sua descendência oriental, era quase impossível não olhar em seus olhos escuros e profundos, seu nariz levemente empinado e fino, a boca era grande com lábios volumosos. Era possível ter aqueles traços naturalmente?
Se a inocência tivesse um rosto, aos vinte e três anos, com certeza seria aquele. Até mesmo seu sotaque era charmoso, qual me deixou completamente surpresa. Era realmente um contraste agradável quando visto por inteiro. Exceto pelo cabelo, que estava todo brilhante, com um topete estilo John Travolta nos tempos da brilhantina.
— Pode parar de me encarar agora — me censurou.
Sorri para ele, como meu pai havia me ensinado, e caminhei para dentro da velha casa. Jonh sempre havia me ensinado a sorrir. Em situações que fugissem de meu controle, ou simplesmente quando me roubassem as palavras, eu deveria sorrir, por algum motivo, sempre funcionava. Nunca entendi o porquê. A situação não poderia ficar mais constrangedora, ninguém, absolutamente ninguém, estava com espírito natalino. Todos dançando e pulando, com copos de sangria e pipoca. Quem no universo leva pipoca para uma festa de natal? Céus, aquelas pessoas não eram nem um pouco normais, e estavam se divertindo tanto, que simplesmente senti vontade de sair silenciosamente, sem que ninguém notasse minha presença, assim eu não arriscaria atrapalhar nada. Pelo menos era essa minha intenção. Não durou muito tempo.
— Atenção pessoal! — gritou Lucas, se pondo ao meu lado — Temos uma convidada especial na noite de hoje!
No mesmo momento, todos se viraram em minha direção, levantando os copos e gritando, somente rugidos e grunhidos, feito animais na selva. Me senti como um cordeiro ciente que seria abatido. Olhei ao redor, e a situação parecia piorar a medida que percebia o que acontecia em minha volta. A velha casa se iniciava na sala de estar, não deveria ter mais do que vinte metros quadrados, mas sua capacidade de volume era surpreendente, sentados no sofá de três lugares, haviam cinco pessoas; no de dois, haviam três. Haviam também almofadas espalhadas próximas as paredes, onde havia algumas sentadas, conversando. Uma sala com cada pessoa ocupando um único metro quadrado. Sufocante demais para mim. Para minha surpresa, senti alguém me puxar pela mão, e seguir para o próximo cômodo: a cozinha.
Ao entrarmos, olhos selvagens nos encaravam. Senti como se quisessem pular em meu pescoço, apertar suas mãos até ter toda a minha vida escapando por seus dedos e nem sabia a razão, pelo menos até seguir os olhares curiosos, até encontrar as mãos de Lucas segurando as minhas, abrindo passagem até chegarmos a porta de saída para a piscina. Por sorte nosso percurso não demorou mais do que poucos segundos, ou eu seria obrigada a me libertar de suas garras e sair correndo por mim mesma, mesmo não conhecendo a casa.
Nunca pensei que pudesse caber tantas pessoas destro de uma mesma piscina. Toda a universidade estava ali. Pessoas bêbadas, sem qualquer pudor. As luzes piscavam freneticamente ao som de alguma música que eu desconhecia a origem, os restante do pessoal, que não coube na piscina, espalhavam-se pelo piso de madeira e gramado. Em geral, era uma área bastante espaçosa para uma velha casa.
Nos sentamos em espreguiçadeiras próximas a piscina. Ele estava me encarando tanto, que poderia até fazer um furo em minha testa, se tentasse com mais afinco. Eu não queria olhar para ele, ou seria obrigada a ser deselegante, teria de me retirar da festa, e perderia para Jullian. A verdade é que já não me sentia a vontade em sua presença, pois após seu retorno ao país, parecia ser uma pessoa completamente diferente da qual eu me lembrava. Então fiz o que meu pai me ensinou a fazer, sorri para um cara que passava, que me retribuiu me oferecendo seu copo. Eu jamais aceitaria em outras circunstâncias.
— Eu não faria isso se fosse você — disse Lucas sombrio, retirando bruscamente o copo de minha mão.
Não sei o que me fez levar um susto, se foi sua atitude rápida e inesperada ou sua voz aveludada com seu sotaque pesado. Um frio percorreu minha espinha, como se eu tivesse feito alguma coisa de muito errado para tirar dele aquela reação. É verdade que não sabíamos absolutamente nada um do outro, mas não pude deixar de pensar que a pessoa que eu conhecia, não seria tão rude sem um bom motivo. Eu não perguntaria o porquê. Nos conhecíamos desde nossa infância, então eu sabia que antes da explicação minimamente calculada, teria sarcasmo e humor negro.
— Pensando melhor, seria interessante vê-la se divertindo — continuou ele, me devolvendo o copo.
— Essa é a visão de diversão que você tem? — questionei, gesticulando para as pessoas dentro da piscina.
— A minha visão de diversão, é provavelmente a mesma de Rodriguez, o cara bonitão que te entregou o copo batizado de sangria — disse ele se aproximando de mim, baixo o suficiente para que só eu o pudesse ouvir — Mas não posso permitir que vejam a única herdeira do império Gold desfilar nua pela casa.
Foi como se uma luz se acendesse em minha mente. Então, estavam todos drogados? Fazia sentido. Eu jamais poderia imaginar que aquelas pessoas, jovens de famílias nobres e respeitadas, com futuros promissores e imagens a preservar, pudessem ser tão irresponsáveis ao mesmo tempo. E como se moviam, em sincronia, como se pudessem ouvir um som que eu não podia, era realmente assustador. Então havia sido esse o motivo dele estar tão próximo de mim, por esse motivo havia pego em minha mão e me guiado para longe daquela aglomeração. Para me poupar. Mas por quê?
— Dave me pediu para cuidar de você — confessou Havíamos passado tanto tempo juntos no passado, que algumas perguntas não precisavam serem feitas. Dave era pai de Lucas, também era melhor amigo e sócio de meu pai, por esse motivo, passamos nossa infância inteira juntos. A mãe de Lucas havia morrido ao dar à luz, então eu emprestei a minha, simples assim. Crianças são tão ingênuas. — Como tem passado Gabrielle? — iniciou ele — Você esteve fugindo de mim desde que retornei. — Não sou uma pessoa nostálgica — confessei — Sinto muito se não te ofereci a recepção que gostaria. Ele sorriu. Não um sorriso de deboche. Ele realmente sorriu. Um sorriso envergonhado, quase escondido, que ao que parecia, eu não deveria ter notado. Ainda havia covas em suas bochechas, assim como quando éramos crianças. Olhar para ele sorrindo fez surgir um mix de emoções que eu nem sabia que era possível para alguém como eu. Senti falta daqueles dias em que passamos horas brincando e conversando
Eu não suportava mais tanto barulho. Não suportava mais olhar para aquele desconhecido. Mas o que me deixava mais infeliz, era aquele sentimento de posse que senti brotar em mim, assim como quando éramos crianças. Eu poderia detestar todas as pessoas, implicar com cada uma delas e maltratá-las, mas em nenhum momento em toda minha vida, consegui vê-lo da mesma forma que os demais. Lucas sempre foi importante demais para mim, tão precioso quanto meu pai. O destino me tirou os dois, um após o outro, e mesmo que tivesse me devolvido um, ele já não carregava toda a importância e carga emocional de antigamente, e mesmo se o fizesse, eu não era mais capaz de suportar nenhum volume de sentimentos. Me tornei um invólucro raso, incapaz de conter qualquer sentimento por muito tempo, sem deixá-lo escapar pelas paredes rachadas. Fiz o que deveria ter feito desde o momento em que cheguei. Me levantei e caminhei pelo gramado, ignorando o chamado de Lucas, que deixei me observando partir. C
Lucas Park Finalmente, havia chegado o dia. Eu a veria, estaria ao lado dela, e, ao contrário daquela manhã decepcionante, Gabrielle não poderia fugir. Passei horas acordado durante o voo, me preparando, repassando mentalmente tudo o que eu diria a ela quando nos encontrássemos. Ensaiei dezenas de vezes como deveria me apresentar, escolhi cuidadosamente a roupa que iria vestir e calculei o tom exato que deveria usar para não a assustar. E apesar de ter minhas mãos suando e minhas pernas tremulas, eu não poderia permitir que ela percebesse meu nervosismo, pois poderia interpretar de forma errada. De nenhuma forma ela poderia ter a impressão de que eu não queria estar ali, com ela. A verdade é que eu sabia que não nos víamos havia cerca de 10 anos, e que não sabia absolutamente nada sobre quem ela havia se tornado. Talvez ela fosse parecida com as outras garotas da sua idade e status, o que me deixaria um pouco decepcionado. As garotas com quem tive contato, daquelas que tinha
Lucas Park Tentei controlar a aversão daquelas pessoas, que crescia conforme eu olhava para elas. Sei que é errado julgar sem conhecer, mas era algo que se podia sentir pelo ambiente. Aquela soberba fedia, e me lembrar do dossiê de cada um deles, não me fez gostar mais de nenhuma daquelas cabeças vazias. — Que bom te ver, cara! — disse Ramon Rodriguez, me puxando para um abraço. — Vou te apresentar ao pessoal. Ele era meu colega de turma na época do colégio. Não me lembrava de sua aparência, nem se éramos muito próximos, mas, segundo as anotações de Dave, podíamos ser considerados melhores amigos. Olhando para ele, sorrindo para todas as garotas que passavam por nós, parecia ser mais ignorante do que supus ao ver sua foto. Ramon era mais alto que eu, mais forte e muito barulhento. Vestia uma camisa de linho clara, completamente aberta, exibindo seu corpo musculoso, que fazia questão de mostrar para todos. A primeira impressão não poderia ter sido pior. Para mim, e
Lucas Park Quando abri a porta, uma onda de emoção percorreu cada célula do meu corpo ao vê-la parada ali, pisando em um pequeno gorro de Natal, xingando o objeto com palavras que eu jamais esperaria ouvir da boca dela. Ela estava adorável usando aquele vestido vermelho, que definitivamente foi a primeira menção ao natal que vi desde que cheguei. Embora tivesse a curiosidade de perguntar o que o gorro havia deito de tão grave, para merecer sua ira, eu não queria ser o próximo de sua lista, portanto guardei para mim. Não pude deixar de sorrir com a cena. — Jingle bells, senhorita Gold — disse a ela. Eu estava tão nervoso, e ao mesmo tempo me divertia com a cena à minha frente, que nem pensei antes de dizer aquelas palavras. Quando ela se virou e encontrou meu olhar, foi como se todo o esforço que empenhei durante aqueles anos estivesse sendo recompensado. Em toda a minha vida, nunca estive diante de alguém tão bonita quanto ela. Seu rosto era sereno, impecável, e eu pode
Lucas Park Antes que Gabrielle pudesse levar o copo à boca, o tomei de sua mão. — Eu não faria isso se fosse você — disse a ela, tentando manter a calma. Sua reação foi inesperada. Gabrielle me lançou um olhar de incredulidade e raiva. Raiva? Por eu tentar salvá-la daquele cara nojento? Ela não fazia ideia de quem eram essas pessoas, pelo menos era o que eu esperava. Não podia acreditar que aceitou aquele copo e iria beber sem sequer questionar o que estava dentro. Não se importava com sua própria segurança e integridade? Mas, pelo olhar que me lançou, parecia que eu era o errado ali, e não ela. — Pensando bem, seria interessante vê-la se divertindo — devolvi o copo a ela, com relutância. — Essa é a sua ideia de diversão? — apontou para as pessoas na piscina, com um tom ácido. Ela não podia estar mais equivocada. Não havia nada de divertido naquele cenário, pelo menos não para mim. Eu apenas devolvi o copo para evitar uma discussão que ela claramente esta
Lucas Park Passei tanto tempo sofrendo — física e psicologicamente — me preparando, me privando de uma vida normal, tudo para estar apto a me colocar novamente diante dela. Em nenhum momento cogitei a possibilidade de que ela me rejeitaria. Mas, talvez, fosse merecido. — Me perdoe por nunca ter retornado suas ligações — comecei, com a voz mais baixa do que pretendia. Era a conversa que eu vinha ensaiando há tanto tempo. — Eu só achei que você ficaria bem sem mim. Você sempre pareceu ficar. Ela forçou um sorriso que não alcançou os olhos. — Estou muito bem, obrigada — respondeu, seca. — Já pode me deixar em paz agora. Cada palavra dela, envolta naquele sorriso falso, fez meu coração se apertar com a culpa. Eu a tinha magoado de formas que nem conseguia medir. E agora, ver o peso que aquilo tudo ainda carregava para ela era como uma punhalada lenta. Talvez ela estivesse certa. Talvez eu realmente não tivesse me esforçado o suficiente. Pude ver em seus olhos
Lucas Park — Deixe-a ir — disse Ramon, posicionando-se ao meu lado. — Aguentou mais do que eu esperava. Apenas pensar que aquele cara conhecia mais dela do que eu, fez meu sangue ferver. Julgando por seu comentário, ele costumava convidá-la para aquele tipo de festa com frequência, e, graças a Deus, ela não permanecia por muito tempo. Então, ele estava nos observando? Estava cronometrando o tempo em que passávamos juntos? Por quê? Eu não queria pensar nele se aproximando dela de nenhuma forma possível. Como alguém como ele poderia dizer para eu deixá-la ir? Como teve a audácia de me impedir de segui-la? Sem nem mesmo perceber, senti a dor de minhas unhas cravarem na palma das minhas mãos. Definitivamente, não havia me preparado o suficiente para aquele encontro, e ter alguém que passou todos aqueles anos próximo a ela, me dizendo como ela se comportava, me deixou mais irritado do que supus que poderia ficar. Ramon estava testando minha paciência em um nível que ninguém