Era uma bela manhã de Domingo, Kátia e sua irmã mais velha Akemi estavam preparando-se para irem ao templo de orações. Elas moravam com seu pai no centro da cidade, muito próximas do Templo de Cirana. A mãe das garotas havia falecido há muitos anos. Akemi também tinha traços orientais assim como sua irmã. Elas moravam com seu pai, o senhor Alcebíades.
Akemi já tinha completado seus vinte e sete anos e nunca interessou em casar com ninguém, apesar dos inúmeros pretendentes que possuía. Seu maior interesse era cuidar de sua irmã e de seu pai, que já não andava há cinco anos, devido a um acidente de carro que sofrera. Desde então passou a locomover-se com uma cadeira de rodas.
Eles possuíam uma pequena loja de roupas na cidade. Akemi conduzia o pequeno comércio com muita dedicação e Kátia a ajudava todos os dias. O senhor Alcebíades ficava boa parte do seu tempo em casa. Às vezes, ele até arriscava-se em ir à loja da família, mas irritava-se demasiadamente com a dificuldade que era andar pelas calçadas com sua cadeira. Na maioria delas, não tinha um acesso muito fácil para os cadeirantes como ele.
O único lugar que ele não deixava de comparecer era ao templo. Além de ser bem próximo de sua casa, os três iam juntos. Assim sendo, as meninas o auxiliavam o tempo todo durante todos os obstáculos da trajetória. Seu Alcebíades gostava de realizar preces em homenagem a alma de sua amada e falecida esposa Hiromi.
O senhor Alcebíades fazia questão de ele mesmo preparar o café da manhã, era apenas auxiliado pelas meninas. Detestava sentir-se inútil, principalmente dentro de sua própria casa. Mesmo em outras tarefas domésticas, ele procurava executá-las com o máximo de perfeição possível. Terminado o desjejum, todos partiam felizes para exercerem seus rituais de orações.
No templo, acomodavam-se todos para desfrutarem o máximo possível dos sermões de Padre Roberto. Eram sempre muito animados, o reverendo gostava inclusive de interagir com seus seguidores, algumas vezes ousava fazer brincadeiras para descontrair o ambiente. Suas celebrações estavam costumeiramente abarrotadas de pessoas. Todos cantavam, batiam palmas e alguns até arriscavam passos de dança. Havia muita descontração e esta fazia com que até os jovens gostassem de comparecer aos cerimoniais.
Nesses dias em que o ambiente era preparado somente para cerimônias, a Urna Imaculada de Almas ficava guardada na biblioteca, trancafiada em um baú de ferro. Apenas uma vez por semana ela era colocada em exposição no altar principal do templo. No dia em que isso acontecia, havia um segurança que ficava o tempo todo ao lado da urna. Era Romualdo, um vigoroso professor de artes marciais que prestava esse favor ao padre e a comunidade.
Durante toda a celebração Pilar não tirava seus olhos de Rodolfo, sequer disfarçava. Assim como ele acompanhava a todo momento cada passo de Kátia. Os olhos dele costumavam até transparecer um brilho diferente, mas ele disfarçava o quanto podia. Muitas vezes ele acabava sendo traído por sua distraída contemplação à moça oriental.
Akemi já havia percebido há muito tempo a afeição que o moço demonstrava por sua irmã. A princípio, Kátia achava que era bobagem de Akemi, que a mesma andava fantasiando a respeito disso. Depois de certo tempo, notou que ele não afastava o olhar de sua direção. Ela sentia-se mal com a postura de Rodolfo, pois sabia que sua amiga era fascinada por ele e não queria ser a causadora da infelicidade de Pilar. Ademais, não gostava muito de Rodolfo. Achava-o antipático e arrogante. O jeito como ele tratava Ciro também a incomodava bastante, pois achava o rapazinho muito amável e gentil.
No trajeto de volta para casa, Akemi gostava de perturbar sua irmã com brincadeiras em torno da paixonite de Rodolfo por ela. Seu pai não se importava com a ideia, já que o jovem pertencia à uma ótima família. Os pais dele, ambos eram advogados em exercício da profissão. Eram extremamente respeitados na cidade. Rodolfo estava cursando a universidade, fazia o curso de administração.
Seu Alcebíades, até entrava na brincadeira, dizendo que seria um ótimo partido para a filha, como administrador iria ajudar a gerir sua lojinha com muita eficiência.
— Parem vocês dois, por favor. Eu não gosto do jeito dele. Não me atrai nem um pouco a ideia de me envolver com aquele entojado.
— Calma, irmãzinha. Não precisa ficar brava. — Akemi tentava amainar.
— Tudo bem, mas esqueçam sobre Rodolfo e eu. Não existe essa possibilidade.
— É uma pena, filha. Eu até gosto daquele rapaz. —Seu Alcebíades esboçava um sorriso desanimado.
Pilar era uma das últimas a sair do templo. Ficava apenas observando a movimentação das pessoas indo embora com grande ansiedade. Quando não restava praticamente ninguém lá dentro, aproximava-se de Ciro e Rodolfo. Começava sempre puxando assunto com Ciro, até chegar perto de Rodolfo.
A inocência de Ciro não o deixava perceber que a moça estava pouco se importando para ele. O garoto dispensava toda atenção e sorrisos a ela em tempo integral. Rodolfo até trocava algumas palavras com Pilar, porém não dava muita importância a sua tagarelice. Ficava aliviado quando ela finalmente ia embora.
— Essa garotinha é mesmo irritante. — Rodolfo comentou com Ciro, assim que ela partiu.
— Como você pode dizer isso? Ela é um doce.
— Você só pode estar brincando. Ela não para de falar um instante e nada que sai da boca dela é aproveitável.
— Não diga isso, Rodolfo. Você só precisa conhecê-la melhor para entendê- la.
— Você está ficando louco? Já conheço a vida dela inteira, inclusive o nome de seus cachorros, a cor preferida dela, o seu signo ascendente… — Ele meneava a cabeça negativamente.
— Puxa, ela é tão linda, tão inteligente. — Ciro até suspirava quando elogiava a moça.
— Pois bem, fique com toda essa preciosidade para você. Não faço questão.
— Por que você está falando assim?
— Você é muito boboca mesmo, não é Ciro? Não vê que enquanto você fica aí salivando pela Pilar, ela fica de chamego para cima de mim?
— Eu não faço isso. — Ciro proferia com certo embaraço. Fez uma pequena pausa e continuou, inocente. — Ela não está dando em cima de você, só está sendo gentil.
— Às vezes eu queria ter sua ingenuidade, Ciro. Abra seus olhos, rapaz. — Rodolfo riu com arrogância e deu as costas ao garoto. Foi terminar seus afazeres.
Ciro permaneceu um tempo disperso nas palavras do companheiro, sentou-se em um banco e começou a comer um pedaço de torta de chocolate que sua mãe havia feito pela manhã. “Será que o Rodolfo está certo?”, Pensava enquanto lambuzava suas mãos com todo aquele creme de chocolate que escorria por cima da torta. Depois de lamber os dedos, levantou-se e foi ajudar ao padre e Rodolfo.
Pilar era tão cheia de si, que em nenhum momento percebia que seu amado Rodolfo não nutria interesse por ela. Nem mesmo ela conseguia notar o descaso que muitas vezes ele fazia com as inúmeras narrativas e explanações dela. Muitas vezes, Kátia até lhe mandava algumas indiretas com relação a isso, mas não adiantava muito.
Terminadas as tarefas de Ciro e Rodolfo, o reverendo os dispensava mais cedo aos domingos, porém deixava a encargo dos jovens trancar tudo antes de irem embora. Ciro adorava os domingos em sua casa. Seus pais reuniam toda a família nesse dia para o almoço. O rapaz era o caçula de quatro irmãos, todos homens. Tios, primos e cunhadas, compareciam à reunião. A casa ficava cheia e a mesa era sempre farta.
Padre Roberto também ia para sua modesta casa. Era composta apenas por dois cômodos e ficava ao lado direito do templo. Morava junto com seu cãozinho, ao qual ele deu o nome de Feioso. A característica que predominava no animalzinho era justamente a feiura. Feioso havia sido adotado pelo homem há mais de um ano. Era já um cachorro adulto quando fora encontrado por ele, perambulando pelas ruas e revirando o lixo para se alimentar.
Após um longo dia, o padre gostava de sentar-se em sua pequena varanda e interagir com seu cachorro. Ficava um tempo dialogando com ele, enquanto o mesmo ficava todo o tempo o encarando e abanando a cauda. Era como se o bicho o compreendesse. Ele e seu animalzinho permaneciam ali até o cair da noite, depois disso iam dormir, pois no dia seguinte, muitas tarefas o esperava em seu templo.
Findado o final de semana, o padre Roberto acordou muito cedo, como era de seu costume, pois tinha suas energias vitais plenamente renovadas após uma boa noite de sono. Acariciou o pequeno Feioso em sua barriguinha e logo após alimentou o animalzinho. Após suas tarefas corriqueiras, ele despediu-se de seu companheiro e rumou ao templo, provavelmente ainda não encontraria os garotos por lá devido ao horário, por isso pegou seu molho de chaves e saiu.O sol também não havia nascido, o padre abeirou-se do Templo de Cirana, quando algo chamou sua atenção. Notou que a porta principal estava entreaberta. Que estranho, por que os garotos chegariam tão cedo assim? Pensou ao ver a cena.Adentrou lentamente, tateou a parede procurando o interruptor de luz, pois o local encontrava-se até ent&
O entra e sai de pessoas na sofisticada bomboniere da senhora Justine, era constante. Era a mais movimentada de Roania e famosíssima pelos seus bolos e tortas memoráveis. Inúmeras encomendas eram feitas a todo instante. Muitos clientes costumavam deliciar- se ali mesmo, mesinhas estavam dispostas para que os mesmos pudessem degustar aqueles apetitosos quitutes e passarem agradáveis momentos durante seu dia na Justine Bolos e Cia.Era um local de muito prestígio e plenamente respeitado. Contudo algo duvidoso andava intercorrendo lá dentro que era de total desconhecimento dos outros cidadãos de Roania. A proprietária do estabelecimento iniciou uma sequente série de reuniões noturnas. Nelas costumavam estar presentes seu filho, Arnaldo. Ernesto, o coveiro da cidade. Rose, uma jovem professora de jardim de infância e Rodolfo.
Pela manhã, no templo, Ciro e Rodolfo preparavam tudo para mais uma das celebrações rotineiras. Rodolfo, como sempre não exprimia muitas palavras, desempenhava suas tarefas de modo mecânico, assemelhava-se a um robô.Ciro, inverso ao seu colega, era constantemente mais indulgente, sempre à disposição. Andava muito preocupado com o clérigo, que já não desbaratava mais sua alegria costumeira. O homem estava ofuscado por ler todos os jornais e ouvir os noticiários. Tinha grande apoquentação em relação a cidade, temia que algo maléfico pudesse acontecer.—Não fique assim, padre. Não irá acontecer nada de ruim. Tenha fé nisso. —Um misto de culpa e preocupação dominavam o cerne do jovem Ciro.
A cidade havia amanhecido movimentada. Rodolfo cursava sua trajetória habitual ao templo, quando defrontou-se com carros de bombeiros dobrando a esquina da alameda por onde ele andejava. Ele seguiu na mesma direção, quando deparou-se com a sorveteria em frente a loja de bolos de Justine, em chamas.O jovem casal proprietário do local estava ao lado de fora, olhando todo o alvoroço. Estavam desalentados, pois aquele comércio era a fonte de renda deles. Amigos tentavam aplacar-lhes ao padecimento.Rodolfo parou por alguns instantes e atentou-se a toda balburdia que acontecia por ali. Por alguns segundos viu Merônia e Maiityh saírem de dentro daquele espaço, em meio às línguas de fogo. Notou que Merônia não estava mais atadas às suas correntes. Elas eram perceptíveis apenas a Rodolfo
Ernesto já estava ciente dos acontecimentos que apontavam o início do triunfo sendo alcançado por Justine e seu filho, assim como Rodolfo. Estava ansioso por bons ventos soprando a seu favor também. Parte de seus desejos estava realizando-se. No dia posterior ao pacto, Maiityh apossou-se do princípio vital de sua esposa, Catarina. O coveiro presenciou ao momento em que o ser maligno aproximou-se da mulher e assim como fez com a jovem Kátia, sussurrou ao seu ouvido. A jovem senhora sentiu um grande mal estar e desfaleceu no mesmo instante. Ernesto acudiu-lhe prontamente, ficou um pouco assustado. Chegou inclusive a duvidar da decisão que tomou ao selar o perverso acordo. No entanto, sabia que não havia mais volta. Estirou Catarina em sua cama e ficou ali assistindo a mulher empalidecida e de lábios desidratados por mais de quarenta minutos, quando a mesma finalmente acordara. Aos
Na cidade de Roania, as notícias propagavam-se demasiadamente célere, assim como em qualquer lugar pequeno. Era de conhecimento de todos o enriquecimento do coveiro, o triste acontecimento aos pais de Rose e todos os tópicos alusivos a este grupo. Os comentários em torno desses assuntos eram geralmente de inveja, despeito ou mesmo de inconformidade, principalmente no que dizia respeito a Arnaldo. Diversos cidadãos não conseguiam conceber como ser humano como ele adquiria tantas coisas sem esforço algum. Contudo uma pessoa entre todas, não compartilhava dos mesmos sentimentos dos outros, só adquiriu enorme tristeza em seu coração. Era Pilar que através de outras amigas elucidou o namoro de Kátia e Rodolfo. O seu adorado Rodolfo. A moça ficou muito desapontada, pois além do desengano amoroso em relação ao rapaz, desmedido dissabor rompeu em seu cerne, considerava Kátia uma de suas
A vida fluía perfeitamente bem aos conluiados dos demônios. Estavam todos contentes a exceção de Rose. No entanto o mais feliz de todos era Rodolfo, que apesar de não ter exigido bens materiais, ter Kátia ao seu lado era para ele, enorme riqueza.Kátia, por sua vez, não era mais a mesma pessoa. Antes, uma garota gentil, tímida e amigável. Agora portava-se de maneira áspera, desinibida e transbordava vaidade. Dentro de casa, não colaborava com os afazeres domésticos como antes, tampouco habilitava— se em ajudar Akemi na lojinha. Preocupava-se apenas com frivolidades ou em passar seu tempo ao lado de Rodolfo.Akemi andava muito chateada com sua irmã, muitas vezes acabavam por discutir. O senhor Alcebíades estava ainda mais desolado. Logo sentiram que o namoro da garota com Ro
Arnaldo estava cada vez mais chafurdado em negócios obscuros. Tinha ao seu lado de todos os tipos de pessoas de índole duvidosa. Cada dia uma mulher diferente estava com ele ou até mesmo várias mulheres ao mesmo tempo, exatamente como ele queria. Havia noites em que ficava incalculavelmente bêbado. Sua vida resumia-se a esbórnia. Acabava de comprar um carro magnífico que custou-lhe uma razoável fortuna. Sua vida estava perfeita em sua opinião.O sujeito investia em noites de orgias extremas, não importava-se nem um pouco com a sua moral. Por vezes, ele até deleitava-seem farras desatinadas com Maiityh e Merônia. Os seres mundanos divertiam-se com a perversão humana. Ele praticava sexo deliberadamente com as sucubus, por vezes até com as duas ao mesmo tempo.O problema de Arnaldo, é