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Capítulo 01 (Parte 03):

— Achei que sua reunião iria demorar mais — Alexandria forçou sua mais plena feição de tranquilidade para o pai, a expressão calma não deixava transparecer em momento algum que Christian Peña estava escondido sob sua cama. 

— Eu saí antes — Teddy massageou a própria nuca, as bolsas levemente arroxeadas se formavam aos poucos sob os olhos azuis do homem e o deixavam com a aparência de alguém muito mais velho do que os poucos 47 anos que ele tinha — Eu conheço meu sistema tático melhor que ninguém, a última coisa que eu preciso é de um bando de engravatados me dizendo quem eu devo ou não liberar para venda. Você acredita nisso? Eu levei esse time para a primeira divisão sem apoio nenhum, agora eles acham que podem me dizer o que fazer com os meus jogadores? É sério, acha que eles chegariam à Premier League sem mim? — Ele bufou, mas emendou outro assunto antes que a filha pudesse responder algo — Além disso, eu precisava passar naquele restaurante italiano com nome estranho. Cinccino, Cechichi…  

Sua testa franziu, ele não era bom com nomes de restaurantes, principalmente quando não estavam em sua língua oficial: francês. Teddy não era francês, mas belga, e crescer em Bruxelas o garantiu domínio do idioma mais bonito do mundo, além de uma fluência impressionante em alemão e inglês. Mas italiano? Definitivamente não era o seu forte.

Cicchetti — Alexandria sorriu, mas deixou as expressões vacilarem por um segundo quando Teddy pôs o pé dentro do quarto da filha. Seu estômago embrulhou e suas mãos gelaram. Por um momento, Alex achou que poderia ter uma síncope. A cada passo que o pai dava, sua respiração falhava. — Por que? Por que teve que passar lá? — Alex teve dificuldade em formular uma simples frase.

Teddy sentou no colchão e a madeira da cama acima de Christian rangeu. Ele estava completamente suado, talvez tão suado quanto estaria depois de correr em um campo por noventa minutos. Sua mão cobria sua boca e nariz para evitar que sua respiração ofegante soasse ruidosa. Christian tinha uma certeza: ele estava ferrado.   

— Eu convidei o Christian para jantar — a naturalidade com que as palavras saiam da boca de Teddy Tapper deixava Alex ainda mais nervosa, como se o pai fizesse seu último movimento sutil em uma partida de xadrez antes do grande xeque mate, xeque mate esse que envolveria ele arrastar o jogador para fora dali deixando claro que ele sabia de tudo desde o começo. Alexandria juntou as sobrancelhas, fazendo o pai rir — Ele voltou do Equador hoje e eu sei que você não odeia ele como odeia a maioria das pessoas que trabalham comigo — Deu ombros despojado — Ele é um bom garoto, eu gosto dele, e acima de tudo, eu gosto de manter uma relação pessoal com meus jogadores.  

 — Você poderia ter convidado o Keegan — sugeriu e Teddy rolou os olhos coçando o queixo em seguida, acabara de lembrar que o goleiro poderia ser um bom nome para incluir na janela de transferências. Alexandria coçou a garganta — Então a gente comprou comida italiana pra agradar um equatoriano? 

Teddy riu, mas não respondeu. Ele sabia, melhor do que ninguém, que os comentários engraçados da filha evoluíam para acidez em uma velocidade quase sobrenatural e ela parecia bem humorada o suficiente para ele preferir mantê-la assim. Seus dedos tatearam a cama até um exemplar azul da Julia Quinn próximo aos travesseiros. “Um perfeito cavalheiro” diziam as letras brancas sob o chocante nome da autora em destaque. Um sapato, incrivelmente feio marcava a capa, deixado em uma escadaria, como em um conto de Cinderela. Teddy encarou a filha.

— Sabe o que eu mais gosto em livros? Se alguém fizer merda, eu posso mandar o personagem pro inferno sem risco de ser demitida — ela parou por um segundo, não perderia a deixa de criticar os homens que trabalhavam com Teddy — Eu não posso fazer no trabalho, o machismo é tão naturalizado e enraizado naquele time que… 

— Eu não sabia que você era uma romântica, Alex — o pai a interrompeu, sabia onde aquele diálogo pararia e a enorme vontade da fotógrafa de mandar toda diretoria do King's Road Soldiers tomar naquele lugar, não colocaria apenas a própria carreira em risco — Você deveria arrumar um namorado. Te tiraria desse mundo fantasioso de romances idealizados, te deixaria menos amarga também — ele pensou nas próximas palavras com um certo cuidado, considerando se deveria dizê-las ou não, mas falou assim mesmo — Te deixaria feliz.

Alexandria arrancou o livro das mãos do pai o devolvendo na coleção. Não é que ela não apreciasse a natureza de se apaixonar, mas ouvir do pai que colocar sua felicidade nas mãos de um homem era uma ideia fantástica deixava Alex incomodada, para dizer o mínimo. Ela não respondeu. Christian estava debaixo da cama, ele não precisava ouvir uma discussão familiar sobre machismo. Alex escancarou a porta branca do próprio quarto, um convite não verbalizado para que Teddy saísse, que logo viraria um arrogante “saia”, se não fosse prontamente atendido. O homem levantou deixando alguns mínimos tapinhas no ombro da filha.

Assim que Teddy passou pela porta, Alexandria girou a chave na fechadura deixando um longo suspiro aliviado escapar pelos lábios. Christian riu, o tipo de risada sem sentido e completamente sem graça que uma pessoa solta, nervosamente, depois de uma situação complicada. 

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