Capítulo 3

A casa dos meus pais sempre foi o refúgio onde eu podia desligar a cabeça por algumas horas. Sabe, aquele lugar onde a vida parece mais simples? Onde os problemas, mesmo os maiores, se dissipam como poeira no vento? E foi para lá que eu fui depois de ver aquela foto de Gabriel com a outra mulher. Dirigir até a casa deles me deu a sensação de estar voltando para a adolescência, quando qualquer problema parecia menor assim que eu atravessava aquela porta.

Minha mãe, claro, percebeu de imediato que algo não estava certo. Ela tem esse talento. Assim que entrei, sem precisar dizer uma palavra, ela me olhou com aquele jeito que só mães têm e já estava me oferecendo café. “Vem, filha, senta aqui. Me conta o que aconteceu.”

Eu sentei, e o cheiro familiar de bolo recém-saído do forno me acolheu. Não tinha nem fome, mas só de sentir o calor daquela casa, a vida parecia menos pesada. Meu pai estava lá fora, podando as plantas como fazia todo domingo. Sempre gostei de como ele era simples em suas prioridades: família, a horta e uma boa cerveja para terminar o dia. Talvez fosse isso que me faltava, essa capacidade de encontrar felicidade nas pequenas coisas. E eu nunca fui assim. Sempre movida por grandes planos, grandes metas.

Contei para minha mãe sobre a foto, sobre o que senti ao vê-la, mas tentei manter a compostura. Sabia que ela se preocupava comigo, mas também sabia que estava cansada de me ver tão focada no Gabriel. “Filha, eu sei que ainda dói, mas ele seguiu a vida dele. Você tem que pensar em você agora. E no Davi, claro.” O que ela não disse, mas eu sabia que pensava, era que eu também precisava seguir em frente, parar de ficar esperando algo que, claramente, não ia acontecer.

Ela estava certa, claro. Eu sabia. Mas saber não tornava mais fácil.

Enquanto eu estava perdida nesses pensamentos, meu telefone vibrou. Era Gabriel, pedindo para conversarmos sobre o fim de semana. Ele tinha um tom educado, o que não era surpresa, mas havia algo na forma como ele pediu que me fez perceber que não era apenas sobre Davi. Ele queria falar de outra coisa. E no fundo, eu já sabia o que era.

Nos encontramos dois dias depois, em um café perto da casa dele. Aquele lugar tranquilo onde sempre levávamos Davi para comer um pedaço de bolo de chocolate depois da escola. Quando cheguei, Gabriel já estava lá, como sempre pontual, mexendo no telefone. Quando me viu, levantou o olhar e, por um breve momento, vi aquele homem que eu conhecia tão bem. O mesmo homem com quem compartilhei uma vida, mas que agora parecia estar em outro lugar, em outro tempo.

Sentei e tentamos seguir com a pequena conversa sobre Davi — horários, escola, atividades. Mas eu sabia que ele estava adiando o verdadeiro assunto. E então, finalmente, ele disse, com um tom calmo e controlado, como sempre faz quando quer ser cuidadoso.

— Sofia, eu queria falar com você sobre uma coisa. Eu conheci alguém — ele disse, direto. Minha respiração parou por um segundo, mas eu mantive a expressão neutra. Eu já sabia, claro. A foto tinha me preparado, mas ouvir isso em voz alta era outra coisa. Ele continuou. — Eu achei que você deveria saber, antes que o Davi perceba. Ainda é tudo muito recente, mas achei importante te contar.

Fiquei em silêncio por alguns segundos, processando o que ele disse. Gabriel sempre foi assim, honesto, direto. Parte de mim apreciava o fato de ele ter sido transparente, mas isso não diminuía o aperto no peito. Respirei fundo e tentei colocar minha mente em ordem.

— Obrigada por me contar — respondi, num tom que me surpreendeu. Eu esperava que minha voz fosse falhar, mas soou firme. — Eu sei que é inevitável, e faz parte. Só espero que a gente consiga continuar colocando o Davi em primeiro lugar.

Ele assentiu, com aquele ar tranquilo que sempre o acompanhava. Parecia mais relaxado agora, como se um peso tivesse sido tirado dos seus ombros. E talvez tivesse. Ele estava seguindo em frente, realmente. A realidade me atingiu ali, de frente, mas de uma forma diferente. Não havia melancolia naquele momento, apenas aceitação. Ele tinha conhecido alguém. E por mais que doesse, era isso. O ciclo estava se fechando.

— Claro, Sofia. Sempre. Davi é o mais importante pra mim — ele disse, e eu acreditei. Se havia uma coisa sobre Gabriel que eu nunca duvidaria era o amor que ele tinha pelo nosso filho.

Nos despedimos de forma cordial, como sempre fazíamos. Ele se levantou e saiu pela porta do café. E, desta vez, enquanto o via se afastar, não senti aquela pontada de angústia. Claro, a tristeza ainda estava lá, mas agora misturada com algo novo. Aceitação. Uma parte de mim, talvez bem pequena, começava a se libertar.

Voltei para casa e, dessa vez, ao pensar no futuro, imaginei algo diferente. Algo para mim. Não sabia ainda o que seria, mas a ideia de que existia algo além de Gabriel começou a tomar forma.

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