Roman me analisa de cima a baixo. Droga! Eu estou com um pijama cor de rosa com estampa de coelho, sem nada nos pés e os cabelos bagunçados. Mas que merda! Digo a mim mesma.
Reparo como seu olhar desliza sobre meus ombros, que estão expostos pela vestimenta grande. Vejo levemente seus lábios entre abrirem-se, assim como os meus que se movem sem sair o som.
O cheiro de sua colônia, algo como couro e madeira inunda o ar e fico paralisada sem saber quem de nós está mais surpreso. Não, eu não posso me deixar ludibriar. Esse Roman que está na minha frente, é longe de ser o que eu conheci. Eu deveria dizer alguma coisa, uma palavra qualquer e nesses segundos que transitam entre nós, não consigo sair de seus olhos brilhantes, frios, hipnotizados e firmes em minha direção.
— Oh, senhor Mikhailovitch Bom dia. —ouço meu pai atrás de mim. —Como vai? Está é minha filha.
Na tentativa de entender de onde meu pai conhece Roman, não consigo sorrir e dizer nada.
—Como vai? —ele pergunta, com o canto da boca em uma curva maliciosa.
—Estou bem. —murmuro
—Pronto, senhor Roman podemos ir. —diz meu pai saindo e adverte—Se cuide minha filha e por favor, não esqueça de trancar bem as portas quando sair.
Os dois se afastam indo em direção ao carro luxuoso de Roman, estacionado a alguns metros, vejo ele virar o pescoço lançando -me um último olhar e os dois entram.
Quando fecho a porta com um baque, tento buscar em minha memória de onde meu pai conhece Roman. E o que exatamente ele faz? Se sua casa é a mansão que estive, ele é um homem muito rico. Com um suspiro profundo apoio as costas na porta e decido não mais pensar, preciso voltar à luta por emprego.
Roman
O sangue respingou minha camisa e parte da parede, quando meus punhos, envolvidos pela soqueira de ferro bateram em cheio o maxilar do homem à minha frente. Era o décimo soco que ele recebeu durante todos aqueles cinco minutos e nada de ceder. Levantei sua cabeça com fúria pelos cabelos, vi seu rosto deformado, nariz quebrado, olhos como duas bolas roxas e a face inchada.
Há uma semana no cárcere e sofrendo todos os tipos de tortura e nenhuma delas serviu ao desgraçado confessar. Soltei a cabeça mole com brusquidão fervendo pela raiva e saquei da arma, atirando em cheio em seu crânio.
Cansado, com respiração pesada, passei as costas da mãos na testa e com alguns passos tomei do comunicador:
—Nada. Perdi todo o meu tempo com esse infeliz! — Bradei furioso vendo o rosto de Mikhail com um sorriso. Ele assistia tudo por trás da tela transparente em outra sala.
— Roman, —a voz pacífica de Mikhail do outro lado irritou-me— Um dia, mais um dia e eu garanto a você que encontraremos o que precisa.
—Eu não quero esperar mais um minuto!!-
—Ei, ei! Calma aí. Aliás, eu tenho um ótimo relaxante para você agora. Nosso trabalho não está terminado.
O suor escorria minha testa e trinquei os dentes vendo ele com um sorriso diabólico no rosto. A crueldade de Mikhail não poderia ser descrita em palavras, talvez por isso minha devoção por ele só aumentava.
Mas essa semana não estou generoso, muito menos de bom humor.
Ando no limite por tantos problemas, trabalhos sem resultados, pessoas que só servem para aumentar minha raiva. Era o quinto elemento que negava até a morte todas as informações sobre a campanha política. É, eu não devia me meter nessa merda, mas apenas cumpro ordens de Mikhail, nosso Pakhan.
Há mais coisas que preciso descobrir, e cada vez mais me deparo com inconvenientes. Durante a semana toda, contei todas as vezes que tive de deixar de lado outros afazeres para executar a ordem de tortura da Bratva. Mickail e Serguei, não confiariam tanto em mim para estes trabalhos.
Caminhei e tomei a garrafa da água, na mesa há poucos metros e a joguei sobre meu rosto, para aliviar a tensão. Subitamente a porta se abre e vejo, a segurança trazer uma mulher. Ela está debilitada, frágil, há hematomas em seu corpo e rosto, lábios inchados. Olho para o vidro vendo o sorriso maquiavélico de Mikhail aumentar. Ao lado dele, surge Serguei que toma assento e me encara com os braços cruzados.
—Esse é um presentinho pra você. —ele diz ao microfone —A torture o máximo que puder. Quero que extraia tudo dela. E, claro eu sei que você está precisando de sexo, ela pode servir um pouco para sua distração.
Eu não estava pensando nisso. Minha raiva não me deixava cair em sentimentalismo, muito menos pegar uma mulher. Não que eu não quisesse ou precisasse. Naquele momento eu só queria saciar meu desejo de morte.
Minha primeira atitude foi arrastá-la e pendurá-la nas correntes pelos punhos. Ela se debateu, gritou, chorou e não tive piedade. A soquei no estômago repetidas vezes, quando negou o que perguntei. Do outro lado meus parceiros assistiam fixos o trabalho. Nada do que fiz foi suficiente, quebrei seus dedos, braços e quando a soquei na cabeça, e tomei da faca vi Serguei baixar o rosto.
—Oh, —fez Mikhail cínico—Acho que Serguei está de TPM. Gargalhou com vontade.
Ele sabia o processo final. Era doloroso, terrível e odioso, mas eu preferia desse modo. O orgulho que cintilava nos olhos de Mikhail após terminada a tarefa, me enchiam de satisfação. Ao final, eu saia precavido, cheio de dinheiro e cada vez mais perto de liderar ao seu lado. Em breve, poderia ser um pakhan como ele.
Porém, por alguma razão, que não soube explicar, a cena de um casal sorrindo, invadiu minha mente. Os olhos nublaram seguido de um tremor súbito e tudo rodou ao meu redor.
Quando acordei, em cima de uma maca de hospital, um médico me examinou minuciosamente. Ao meu lado estava Mikhail, encostado na parede, dedos entre o queixo, numa expressão severa de desconfiança.
-Está dando mostras de estresse e ansiedade. Precisa de repouso, atividade física e ...—explicou o médico.
—Alto lá. —interrompeu Mikhail olhando grosseiro para ele— Não. Nada de atividades. Eu quero a solução e o mais rápido possível.
—Bem, essas são as alternativas mais eficazes senhor, depois os remédios.
Um sorriso incrédulo formou-se em seu rosto.
—Eu quero os últimos, então é bom que você passe todos eles rápido.
—Como quiser senhor.
Quando o doutor saiu e fechou a porta, Mikhail se aproximou encarando-me friamente.
—O que há com você?
Sentei um pouco. Me sentia enjoado com a garganta seca.
—Você acabou de ouvir.
—Não. Eu me nego a acreditar nas palavras dele. Eu não confio em médicos.
Balancei a cabeça.
—Você é o diabo, um anjo negro, —afirmou ríspido—um enforcer...sua missão não é se compadecer de ninguém e sim, torturar e matar!
—E o que acha que estou fazendo? —devolvi a resposta sem paciência.
Ele passou as mãos pelos cabelos irritado e olhou bem fundo nos meus olhos.
—Escute aqui Roman. Você é um monstro, o meu monstro e não permitirei sentimentalismos.
Não respondi vendo ele andar agitado.
—Você vai sair daqui, —pontuou com o dedo—vai terminar todo trabalho com aquela mulher e se eu presenciar outra crise novamente, você vai se arrepender.
Ele saiu fechando a porta com um estrondo e não tive como dizer nada. Eu realmente andava estranho sem conseguir explicar. Após alguns minutos o médico apareceu, entregou a receita e fui liberado, não sem antes encontrar Serguei. Trocamos algumas palavras e voltei ao local de antes.
Angelina
Ainda não havia anoitecido. Enquanto asso uma bela torta de maçã na cozinha, meu pai se dedica a arrumar seu caniço de pesca.
—Porque não falou que estava trabalhando particular? — pergunto, na esperança que meu pai diga alguma coisa. Ele é esperto e tento disfarçar para não ir direto ao ponto. Ele ergue as sobrancelhas surpreso.
—Porque recém comecei, ficarei em experiência. Senhor Roman precisa de um motorista e ficou sabendo de meu trabalho através de uma indicação.
—Hum.... —digo, indo olhar o forno. —Ele me pareceu estranho.
—Estranho? Oh, não—sorri animado—é um bom homem, empresário, trabalha bastante tem sua vida. A propósito, ele precisa de alguém que cuide de sua mãe e acabei falando de sua formação. Está interessado e passei a ele seu telefone.
Está interessado e passei a ele seu telefone
—Ah, não .... —arregalei os olhos em choque— O senhor não fez...—Qual o problema? Você está sem trabalho. Ele tem uma boa vida, pode pagar o salário que merece.—Eu não acredito que estou ouvindo isso...— Mas o que há de errado? —questionou sem entender—Vocês se conhecem?—É claro que não! -minto alterada vendo ele me olhar confuso. —Droga, pai você não podia ter feito isso sem me consultar! —e de tão nervosa queimei o dedo ao mexer na forma.—Mas...—Isso não pode estar acontecendo...— abro a torneira inconformada e deixo a água cair sobre a queimadura.—Angelina, —sua voz muda o tom—se ele ligar, ouça o que tem a dizer. Não se atreva a me fazer passar pela vergonha de um mentiroso. Eu recém iniciei esse
A porta fechou com um estrondo tão violento, que jurei os vidros da janela tremerem. Roman está mais forte da última vez que o vi, parece um sniper cheio de músculos por anabolizante; em compensação seu cérebro deve ter diminuído. E a dor de cabeça pela pancada se juntou as lágrimas que comecei derramar sem controle. Depois de uns segundos tentei me concentrar em alguma ideia, plano, qualquer coisa que fizesse eu me livrar de Roman, porém estaria sendo burra em ousar contrariá-lo. Eu conhecia uma parte dele, e poderia usá-la a meu favor, no entanto a fúria como fui tratada nublam as possibilidades, tornando qualquer atitude imprecisa e perigosa, tirando de mim todas as esperanças. Levantei da cama com cuidado e pude ver a vista pela janela aberta com grades. Haviam residências longínquas cercadas por vegetação, no mesmo padrão moderno a que me encontro. Há cheiro de móveis recentes no quarto com cama de casal, banheiro e um armário. Creio que estou em Mulholand Drive, e se estiver c
Ergui-me da cadeira seguindo com ele, buscando ocultar a onda de medo que se apossou de mim. Não, eu não queria demonstrar fraqueza. Seria notório para alimentar sua brutalidade, ódio ou qualquer sentimento que pudesse haver dentro de seu coração. Cogitar essa ideia seria até mesmo insano. Roman devia ter seu coração oco.Ele abriu a porta do mesmo quarto ao qual estive antes, fechou-a e quando parou diante de mim, deu um berro:—O que pensa que está fazendo sua imbecil?Lágrimas escorreram por minha bochecha. Como pude ter o azar de dormir? Estava ali para cumprir a missão que me foi confiada. Óbvio, anoiteceu e foi normal o corpo reclamar de sono. Eu devia me atentar para esse fato. Fiquei exausta, não pude me alimentar, sair dali para nada, tampouco fazer a higiene. Pelo horário era ainda muito cedo. O Sol nem mesmo havia aparecido. Olhei para ele com lábios trêmulos e a garganta seca, meus olhos foram em direção a um objeto em sua cintura, uma arma e meu pulso acelerou.—Eu...sint
RomanHá algo errado. Muito errado nisso tudo. Posso jurar que essa garota tem semelhança com alguém, ou a vi antes. É possível que ela tenha estado comigo em uma de minhas noites promíscuas. Porém esse cheiro vindo de seus cabelos misturados a sua pele é o cheiro da perdição. O rosto levemente rosado e os lábios de boneca, atiçam desejo em meus pensamentos. Os seios redondos macios como as pinturas pré-rafaelitas à espera de lábios. Toda ela exala sexo, feminilidade e fico parado, ouvindo seu choro que causa-me um aperto no peito inexplicável.Que porra é essa?Tiro meus braços dela, vendo seu rosto virar para o lado abalada e triste. Eu não me sinto bem com isso. Aliás, ergo-me com rapidez ouvindo seus soluços. Se eu já estava com remorso, agora tudo piorou.—Pare de chorar! —peço com autoridade, vendo ela estirada no chão. Me aproximo encontrando seus olhos hesitante—Escute bem garota, não se atreva a fazer outro escândalo. Estamos entendidos? —Ela acenou com a cabeça —Levanta. Voc
AngelinaNão havia como fugir. Nada que pudesse mudar o destino de continuar na mesma posição sendo vítima de Roman e esperar o pior. Eu não tinha escolha que permanecer em cativeiro.Gostaria que o fato de já ter estado com ele antes, tê-lo amado, e desgraçadamente ainda nutrir esse sentimento; não me deixassem fraca após descobrir sua monstruosidade. Roman foi o primeiro homem que amei. O primeiro que entreguei o meu coração e minha virgindade. Isso devia ser uma lembrança feliz e eu devia seguir em frente. Mas ele sempre esteve preso ao meu coração, vivo nas minhas memórias e eu queria matá-lo dentro de mim.Fiquei no mesmo lugar trancada até o meio da tarde. Meu estômago roncava fervorosamente e a cabeça doía de tanto pensar.Sentada no chão com os joelhos dobrados e sonolenta, ouvi um barulho na porta. Rapidamente me ergui. Ao abri-la lá estava ele. Pensei no seu pedido anterior. Ele queria que me banhasse para dormir com ele e o fato de medir meu corpo com o olhar dava-me a cer
—Na verdade não sabemos. —disse Joe com olhos de mim a Tracey—Ele não aparece a dias, tentamos falar com ele, mas seu celular apenas dá caixa de mensagem.—Tem certeza...ele não deixou, um bilhete ou...—questionei incrédula. Meu corpo inflamando de nervosismo.—Não. Eu sinto muito. —lamentou Joe com pesar e minhas pálpebras bateram diversas vezes na tentativa frustrada de segurar as lágrimas.—Talvez, ele tenha tido algum problema no celular. —Tracey tentou contemporizar, vendo meu silêncio. Engasguei sentindo o pulso acelerar a milhão.—Isso é impossível. —afirmei triste—Se ele sumiu deviam chamar a polícia.—Na verdade...—explicou Joe—Bom, ele é estrangeiro e seu visto está com problemas. Se buscarmos as autoridades não será muito viável.—Merda. —falei baixo.—Tudo bem. —Tracey ensaiou um sorriso gentil para ele arrumando a bolsa no ombro. —Nós vamos achar uma forma de encontrá-lo. Obrigada.Completamente em choque, como se o desespero engolisse meu coração, ela conduziu para voltar
MickailLiguei diversas vezes para o número de Roman e nenhum retorno obtive dele. Se for um aviso, lamento, mas nada funciona sem ser do meu jeito.Eu sei que as coisas parecem não estar muito favoráveis para o meu monstro. Sei que o luto na vida de alguém é difícil. Já tive muitas perdas que foram lastimáveis, outras que agradeci e sorri no final. ´O luto é apenas um estado. A morte -um ciclo comum da natureza de qualquer ser humano que atingirá todos nós algum dia. Mas para mim, ela é muito mais que isso.E foi assim que eu encontrei Roman atrás das longas grades que separavam ele de sua liberdade, seu mundinho pequeno e debilitado —Morto.Morto nas esperanças, nas atitudes, na capacidade de tomar decisões, lamentando seus passos, sentindo- se vulnerável, triste e acreditando que Deus poderia salvá-lo.Quanta idiotice!Tantos sentimentos, tantos anseios tolos que de nada serviam, a não ser separá-lo de um vislumbre de estar livre e ter sua dignidade de volta.E do que mesmo ia ser
LOS ANGELESCaminhei com a bolsa a tiracolo suspirando com as pernas cansadas. Há mais de semanas busco trabalho nas movimentadas ruas de Los Angeles. Estou formada em enfermagem e depois de terminar o estágio e viver boa parte voltada a minha mãe que faleceu há um ano, sinto agora mais do que nunca que devo seguir a profissão.Venho de uma família simples criada no interior do Texas e sou a filha mais nova de quatro irmãos. Três homens que seguiram seu destino. Dois casaram e um, chamado Donald preferiu colocar uma mochila nas costas e viajar o mundo.Eu gostaria de ser como eles ás vezes. Não ter medo de nada, não se apegar e viver uma vida longe da civilização, em lugares distintos, ás vezes perigosos com o único propósito de encontrar heranças perdidas, fósseis e o que mais ele puder contribuir a arqueologia.No entanto, sobrou para mim a difícil missão de ficar ao lado de mamãe, e com essa tarefa me senti impulsionada a seguir o caminho da enfermagem. Posso dizer, que dei esse or