MarcosO sol se põe, derramando tons de dourado e laranja pelas janelas da sala. Estamos todos reunidos no sofá, como tantas outras vezes desde que Yasmin chegou. Mas hoje é diferente. Não há planos específicos, apenas o desejo de estar juntos, como se o tempo fosse uma preciosidade a ser saboreada.Yasmin está no chão, com um quebra-cabeça espalhado à sua frente. John está ao lado dela, ajudando-a com as peças mais difíceis, mas deixando que ela tome a dianteira. Teresa está em sua cadeira favorita, costurando algo pequeno e colorido, um dos hobbies que ela voltou a praticar recentemente. E eu? Estou encostado na moldura da janela, observando tudo, gravando cada detalhe na memória.— Essa peça vai aqui — diz John, apontando para um espaço vazio no quebra-cabeça.— Eu já sabia! — Yasmin responde, sorrindo e colocando a peça no lugar.Teresa ri baixinho e ergue os olhos para mim. — Eles realmente se conectaram, não é?Assinto. — Mais do que eu poderia imaginar.Desde que Yasmin entrou
VivianO incômodo começa como uma pontada discreta, quase imperceptível. Estou na sala com Felipe, tentando distrair a minha mente com um filme qualquer, mas a sensação cresce a cada minuto.— Está tudo bem? — ele pergunta, os olhos preocupados fixos em mim.— Não deve ser nada. Só um incômodo — respondo, forçando um sorriso. Tomo um analgésico e subo para o nosso quarto, convencida de que um pouco de descanso resolverá tudo.Felipe, no entanto, não tira os olhos de mim. Ele se mantém por perto, como sempre faz quando estou vulnerável, a preocupação estampada em cada movimento. O tempo passa, mas o desconforto se transforma em algo mais intenso, uma dor chata que não pode mais ser ignorada.— Acho que está na hora, Felipe — confesso, tentando soar o mais calma do que me sinto.Sem perder tempo, ele liga para a minha médica, que nos orienta a ir direto ao hospital. Minutos depois, estamos no carro, e a cada curva parece prolongar a jornada. Ao chegarmos, sou levada para exames enquanto
FelipeO telefone vibra no bolso, e vejo o nome de Giulia aparecer na tela. A mensagem é breve, mas carinhosa:"Parabéns, papai. Estou com Marcos e Teresa. Gian Carlo veio comigo. Vamos subir."Respondo com um sorriso no rosto, mal contendo a emoção do momento. Minha mãe sempre teve esse jeito acolhedor, e saber que a minha família está aqui me conforta ainda mais. O peso do cansaço e da tensão que carreguei nas últimas horas começa a se dissipar, dando lugar a um alívio imensurável. Enquanto espero por eles, observo os enfermeiros do laboratório chegarem. Com a precisão meticulosa de quem lida com algo valioso, eles explicam o processo de coleta e armazenamento do cordão umbilical de Pedro. Assino os papéis necessários, mas minha mente não está ali. Meu coração está na sala de recuperação pós-anestésica, onde Vivian repousa, e ao lado dela, nosso filho.Assim que tudo é resolvido, somos liberados para o quarto. O trajeto parece mais longo do que realmente é, talvez porque minha atenç
BeatrizO som abafado dos pés descalços contra o tatame ecoa na academia, misturado às risadas das crianças e às instruções firmes que dou entre uma demonstração e outra. O ambiente vibra com energia, mas minha mente está em alerta constante. Cada movimento, cada queda controlada é uma lição, não só de técnica, mas de disciplina e autocontrole.— Giulia, mantenha o equilíbrio! — digo, enquanto minha filha se posiciona para derrubar Nicolas em um golpe bem executado.Rafinha ri ao fundo, provocando os gêmeos Clara e Artur enquanto eles tentam imitar a sequência que acabei de mostrar. Luan e está concentrado como sempre, uma determinação no olhar que parece anos além de sua idade. Nicolas se ergue do tatame, balançando a cabeça, mas com um sorriso que mostra o quanto ele está se divertindo.— Muito bem, turma! — bato palmas, sinalizando o fim da aula para os pequenos. — Podem pegar suas garrafas de água e descansar.Enquanto eles correm para os bancos laterais, olho para Yasmin, que já
Don FalconeO dia começa com um telefonema urgente. Um carregamento foi interceptado, e meus homens precisam de instruções rápidas. Dou ordens precisas enquanto termino meu café, o aroma forte preenchendo o escritório que, para mim, é tanto um santuário quanto um campo de batalha. A máfia nunca dorme, e eu também não posso me dar a esse luxo. Mas hoje, algo além do habitual peso dos negócios me acompanha, uma sombra que nem mesmo o café mais forte pode dissipar.No meio do caos do dia, Isabella retorna. Assim que entra pela porta, sua presença ilumina a sala. Ela se joga nos meus braços com a alegria genuína de uma filha que ama o pai acima de tudo.— Papà! Finalmente em casa! Estava com tanta saudade.Sorrio, apertando-a em um abraço forte. — Minha menina, como foi a viagem?— Maravilhosa! Mas não é a mesma coisa sem você. — Ela me olha mais de perto, a felicidade dando lugar a uma preocupação silenciosa. — O que está acontecendo? Você parece... distante.Balanço a cabeça, tentando d
VívianO choro de Pedro preenche a madrugada como uma melodia desconhecida que ainda estou aprendendo a decifrar. Cada nota é um chamado, um pedido que me deixa alerta. É difícil acreditar que já se passou um mês desde que ele chegou ao mundo, transformando completamente a dinâmica das nossas vidas. Mesmo agora, enquanto o balanço da cadeira o acalma nos meus braços, uma parte de mim se pergunta: será que estou fazendo isso certo?Giulia entra no quarto com aquele sorriso tranquilo que parece ter o poder de dissipar qualquer dúvida. Ela me observa por um momento antes de se sentar ao meu lado, apoiando a mão no encosto da cadeira.— Você está indo muito bem, Vivian — ela diz, como se lesse meus pensamentos.Felipe chega em casa pouco depois, trazendo mais um presente. Não consigo evitar a risada ao vê-lo entrar com uma pequena caixa decorada com laços.— Mais um? — pergunto, divertida.— Foi dos colegas da faculdade — ele explica, inclinando-se para beijar Pedro na testa. — Acho que n
BeatrizO dia começa com uma energia diferente. Assim que entro no ginásio, sinto os olhares de expectativa. Há algo no ar, uma vibração que torna cada passo mais pesado, mas também mais significativo. Hoje é o meu exame para o quarto dan de judô. Anos de dedicação, suor e até lágrimas culminam neste momento. O meu coração acelera, mas não de nervosismo, é pura emoção, a adrenalina correndo. Sei que estou pronta, mas nada poderia me preparar para o que vem a seguir.O exame para o quarto dan é uma cerimônia de técnica, resistência e história. Ao entrar no tatame, sinto a tensão nos meus músculos e a clareza na minha mente. Estou pronta para isso. É mais do que um teste físico, é a culminação de anos de prática, dedicação e aprendizado.A primeira parte do exame é o kihon, as bases. Demonstrar os movimentos fundamentais é crucial. Cada passo, cada golpe e cada transição devem ser impecáveis, não apenas executados, mas compreendidos. Quando o examinador me pede para realizar o harai gos
BeatrizO som seco de um disparo ecoa pelo estande de tiro e me faz acelerar o passo. Recebo a mensagem de Ramiro dizendo que a aula vai começar em cinco minutos e sinto uma mistura de curiosidade e ansiedade. Hoje, o treinamento promete ser diferente. Quando entro no estande, vejo Priscila, Lua e Luana já preparadas, com seus equipamentos de proteção em ordem, e Ramiro ajeitando a mesa com as pistolas e munições. O ambiente é carregado de expectativa, como se algo especial estivesse prestes a acontecer.— Chegou atrasada, Beatriz! — brinca Ramiro, com um sorriso no rosto. — Espero que esteja pronta, porque hoje o treino vai ser intenso.— Sempre pronta — respondo, colocando meu protetor auricular e ajeitando os óculos de proteção. — Vamos ver do que somos capazes.Começamos revisando os fundamentos, empunhadura, postura, mira. Ramiro é implacável, corrigindo cada detalhe com a precisão de quem passou anos aperfeiçoando a sua própria técnica. Priscila é a primeira a acertar o alvo c