LucianaA manhã começa com um burburinho típico da nossa casa, Lua e Andrey implicando um com o outro enquanto ajudam a organizar as coisas. André está na varanda, conferindo as bebidas, enquanto eu, com as mãos ocupadas em uma tigela de salada, tento impor alguma ordem no caos. Mas no fundo, adoro esse som de vida, de família. É incrível pensar como a vida nos trouxe até aqui, juntos, seguros, felizes. Só que uma sensação sutil de algo à espreita me faz olhar pela janela, como se houvesse algo mais além do horizonte claro deste dia.— Mãe, essa salada de quinoa é mesmo necessária? — Lua resmunga, cortando tomates com a destreza de alguém que claramente não gosta da tarefa. — As pessoas só querem carne e sobremesa em churrasco.— Salada é essencial, menina. Não é só sobre carne — respondo, rindo. — Além disso, a Fabrícia me pediu. E quando ela pede, você sabe que é sério.Andrey surge carregando um engradado de refrigerantes, com o rosto franzido.— Pai acha que isso é pouco. Tá q
MariaO clima no churrasco está perfeito. Risadas ecoam, o som de música embala todos e o cheirinho da carne na brasa mistura-se ao ar de alegria que toma conta de cada canto do quintal. Quando Tobias chega com Mia e o pequeno Willian, a energia já é contagiante. Não demora para que Mirna, Liam e Luana também entrem no clima, e, claro, Monica com seus filhos – Robert, Rodrigo e eu – completamos a festa.Enquanto a música toca, Lua, Luana, Robert, Rodrigo, Lucas e Priscila decidem criar uma “boate improvisada” na parte de trás do jardim, onde as luzes piscantes e uma caixa de som montada estrategicamente transformam o lugar em uma verdadeira pista de dança. Na verdade eles reverenciam a missão mais importante que já viveram. Eu, como sempre, não consigo resistir e vou dançar!– Vamos lá, Maria! – grita Lua, puxando-me pela mão para o meio da pista.A música aumenta, e logo estamos dançando sem preocupação. Cada movimento é uma celebração da vida, da família e das histórias que compar
Meses depoisBeatriz Estou inclinada sobre a bancada, anotando os últimos resultados, enquanto Rafael organiza os equipamentos com precisão quase militar. Trabalhar com ele é como dançar uma coreografia bem ensaiada, cada movimento sincronizado, cada gesto antecipado. Não trocamos muitas palavras, mas o silêncio entre nós é confortável, um reflexo da cumplicidade que construímos ao longo dos anos.A porta se abre, interrompendo o ritmo. Marlon e Antônio entram, carregando aquele ar de descontração que sempre trazem consigo.— Trouxeram problemas ou soluções? — pergunto, brincando, enquanto tiro as minhas luvas e as deixo sobre a bancada.— Depende de como você enxerga. — responde Marlon com um sorriso de canto. — Mas, para ser justo, talvez as duas coisas.Rafael ergue uma sobrancelha, mas mantém o foco nos papéis à sua frente.— Isso soa promissor — comenta ele, com o tom seco que me faz segurar um sorriso.— Promissor é o que vocês têm feito aqui — diz Antônio, puxando uma cadeira
RafaelO silêncio da manhã é quebrado pelo som da risada de Giulia enquanto corre atrás de Rafinha no jardim. Olho para eles pela janela e uma onda de gratidão me invade. É surreal pensar que já se passou um ano desde que removi o tumor. Um ano desde que minha vida esteve por um fio. Hoje estou aqui, vivo, forte e mais completo do que jamais imaginei ser possível. Beatriz aparece ao meu lado, me abraça pela cintura e sorrimos juntos. Nossa família, que antes parecia um quebra-cabeça com peças perdidas, agora é uma obra completa e cheia de vida.Giulia já entende o passado, já sabe de quase tudo. E mesmo assim, me chama de pai com o mesmo carinho que chama Felipe. Ela se sente parte de todos nós, e o vínculo que criamos é algo que supera qualquer história mal resolvida. Sempre que Felipe e Vivian vêm com Pedro para nos visitar, a casa vira uma festa. Yasmin, que antes era tão reservada, agora corre atrás de todos como se sempre tivesse feito parte da pequena tropa que criamos. A última
Rafael Eu e Beatriz nos entreolhamos, a incredulidade estampada em nossos rostos.— Como assim, Priscila? — perguntei, endireitando minha postura, já sentindo o coração acelerar.— Encontrei onde ela estava e resolvi aquele problema. — Ela deu um sorriso travesso. — Dei outra surra nela. Não uma simples briga, Rafael. Foi sério. Ela chorou, jurou que nunca mais vai chegar perto de você.Beatriz tentou manter a seriedade, mas eu notei a surpresa e talvez uma pontada de satisfação em seus olhos.— Priscila, isso... — comecei, mas ela não me deu tempo de continuar.De repente, ela largou as luvas no chão, caminhou até mim e, para minha surpresa, me abraçou com força. Foi um abraço inesperado, um gesto que parecia conter toda a intensidade que ela sempre esconde por trás de sua atitude despreocupada.— Rafael, você é minha família. — Sua voz estava embargada, carregada de emoção. — Eu nunca tive alguém que me protegesse de verdade, mas você me deu isso. Você e a Beatriz me deram isso. E
Cesare VassaloNo silêncio da madrugada, enquanto o mundo lá fora repousa em uma falsa sensação de segurança, eu permaneço desperto. Meu mundo não conhece descanso. Aqui, não há espaço para fraqueza. A máfia não perdoa os despreparados, e eu sou a prova viva de que sobreviver é uma arte cruel.Diante do público, sou Cesare Vassalo, magnata de uma das maiores empreiteiras do Brasil, um homem de negócios impecável e dono de um império. Mas nas sombras, sou o estrategista implacável, o arquiteto de cada movimento no tabuleiro da máfia. Minhas mãos são de ferro, e meu coração, uma fortaleza. O destino me moldou para liderar, mas não sem antes me testar de todas as formas possíveis.Parte dessa provação foi Giulia. Ah, Giulia... Quando me forçaram a me casar, encarei o matrimônio como uma negociação, um acordo entre famílias que perpetuava o poder. As mulheres, para mim, eram ferramentas úteis, nada mais. Porém, naquele altar, ao levantar o véu de Giulia, o que vi não foi fragilidade, mas u
RafaelOs números nunca mentem, mas as pessoas, sim. E é nisso que reside minha vantagem. Aqui, no laboratório, eu sou o único com a visão completa do jogo. O silêncio ao meu redor é apenas uma fachada, sob ele, há uma complexa teia de segredos que se entrelaçam com cada experimento, cada fórmula, cada decisão.Enquanto ajusto os parâmetros do espectrômetro, minha mente viaja para além dos dados e dos reagentes. Contratar Beatriz foi um movimento estratégico, como mover um peão no tabuleiro. Jovem, recém-formada, idealista, sem vícios de mercado. Um vaso vazio esperando ser preenchido com aquilo que eu escolher.Ela chega amanhã. Seus olhos provavelmente brilharão diante dos equipamentos de última geração e da estrutura impecável deste lugar. Mal saberá que, por trás de cada detalhe cuidadosamente projetado, há um mundo oculto que ela jamais poderá acessar.Beatriz vai trabalhar aqui comigo, esse laboratório é a personificação de uma pesquisa legítima. Equipamentos de ponta, a document
BeatrizATENÇÃO SENHORES PASSAGEIROS ÚLTIMA CHAMADA PARA O VOO 1429 COM DESTINO A BRASÍLIA EMBARQUE NO PORTÃO SETE. É agora, um dos momentos mais importantes da minha vida, respiro fundo e caminho puxando a minha mala, repleta com os meus pertences, alguns sonhos não vividos, a frustração de um de amor frustrado, a maior ilusão de toda a minha vida. De cabeça erguida, sigo em direção ao portão de embarque rumo ao meu novo destino, foi por mérito ter conseguido esse emprego de auxiliar de biomédico em outra cidade logo após a minha formatura, essa colocação veio na hora exata! Mesmo diante de um dia lindo e ensolarado, sentindo a brisa fresca da manhã acariciando o meu rosto, sabia que a vida estava me presenteando com essa nova oportunidade, e mesmo assim, o meu pensamento vagava longe, muito próximo a minha dor.Não sou aquele tipo de pessoa que fica se martirizando, ou que se faz de coitada para ter a piedade alheia, mas a dor que sinto é tão profunda que as vezes me apego a ilus