03. Duas opções

Ceyas

— O que merda é isso? — pergunto a Lugi que depois de algum tempo chegou mais perto, me auxiliando a segurá-la, já que seu corpo começou a se debater, indo contra a onda de dor que ela parece estar sentindo.

— Você acha que eu sei? — replica Lugi, segurando-a com força, mas é possível notar que sente dificuldade. Que força descomunal é essa que essa mulher tem mesmo com uma aparência tão fragilizada?

Qualquer um diria que o seu estado é doentio, ainda assim, estava emanando aquela aura assustadora e soltando palavras ácidas, ameaçando-nos como se pudesse passar por cima de nós a qualquer segundo.

— Ela vai morder a própria língua — comenta Lewyn baixo, no entanto, as palavras dele não foram processadas pelo meu cérebro rápido o bastante, assim ele se abaixou, ajoelhando-se perto dela, abrindo a boca dela com força, colocando o seu braço entre seus dentes.

— O que está fazendo? Nem sabe quem é essa mulher — profere Lugi, recriminando-o, o breve segundo em que a soltou foi o bastante para fazer com que ela se debatesse com força de novo.

Percebendo o que fez, ele volta a segurar os braços finos com força, puxando-os para cima. Mantenho minhas mãos em suas pernas, contudo, tenho a sensação de que o que fazemos não é suficiente.

— O que nós fazemos? Quer dizer, o que faz com que ela fique assim? — Inquire Lugi, e eu penso na mesma coisa, mas não consigo ter certeza do que poderia ser, contudo, tem uma possibilidade muito grande de que seja as magias que a bruxa lançou nesse lugar.

No entanto, nós não podemos nos livrar do sigilo sem Kanoi e não temos como saber quanto tempo levará para que ela chegue até onde estamos. Mesmo que seja rápida, é difícil dizer o que acontecerá com essa sujeita até lá.

— Porra — expressa Lugi, observando como o movimento feito pelo bebê em seu ventre pode ser visto claramente por nós. — Bebês costumam fazer essas coisas?

— Você acha que sei caralho? — inquiro, sentindo a raiva acida em minha boca. Não tem nada que possamos fazer? Tenho apenas que continuar vendo-a nesse estado?

O sangue de Lewyn desce pelo rosto dela, porém, ele não deixa um único traço da dor que sente ser expressa em seu rosto, na verdade, tem uma ação que novamente me deixa confuso.

Leva a sua mão para o topo da barriga dela e, no segundo em que o movimento feito pelo bebê alcança o ponto no qual a sua palma fica, consigo notar a diferença na aura exposta pela mulher. Devagar, ele passa a mão pela barriga dela e isso diminui ainda mais os movimentos bruscos dela.

— Que porra tá acontecendo aqui? — inquire Lugi, mas devia perceber que ninguém aqui tem a resposta para o que quer saber.

Abrindo os olhos, a mulher nos encara, contudo, foi muito breve, já que logo suas pálpebras se fecharam de novo e não foi porque ela queria evitar ver os nossos rostos. O ritmo do seu coração se tornou extremamente calmo.

Lewyn tira o seu braço da boca dela sem tirar a mão que pôs na barriga.

— Não solte ela — manda Lugi no instante em que tiro minhas mãos de onde estava para conseguir me aproximar um pouco mais do seu peito, pois seus batimentos diminuíram tanto que temo que a sua vida esteja se perdendo e, se ela falecer, talvez possamos tirar o bebê.

— Nem pense nisso, Ceyas — profere a voz nova vindo das minhas costas.

— Kanoi, nunca vou dizer que odeio te ver — declara Lugi.

— Não minta, consigo ver uma dezena de situações em que vai reclamar de mim — articula ela. Põe seus olhos em Lewyn e os dois parecem se comunicar de um modo estranho, já que ele espalma a sua mão como se anunciasse que protegerá o que há no ventre da mulher.

Esse mero pensamento me deixa irritado.

— Parece que encontraram alguém bem perigoso — fala Kanoi, concluindo que a mulher é um perigo sem nem ter visto o que ela fez há minutos atrás. — Estava certa em vir verificar o que fariam. Senti que algo estava errado.

— Podia ter ligado — pontua Lugi.

Eu diria o mesmo, contudo, a mão de Lewyn continua me irritando.

Olho-o e nem assim ele a retira de onde está.

— Faço as coisas do meu jeito — professa a bruxa. — Agora que a encontraram, só há duas opções: matar, seguindo as ordens que deu no início dessa missão para exterminar os híbridos ou salvar, levando-a para a alcateia.

— Já sabe o que vou escolher? — questiono e ela dá de ombros.

— Disse muitas vezes que o futuro pode ser mudado dependendo das escolhas feitas no momento — lembra a bruxa, chega mais perto, verifica minuciosamente o rosto apagado. Com o sangue secando sobre a sua pele. — Ela lutou bastante para tentar se soltar — comenta, estralando os dedos e toda a área obscurecida que não poderia ser vista fica nítida diante de nossos olhos.

Não costumo ver Lugi se surpreendendo, mas os olhos alarmados vendo a quantidade de cadáveres despedaçados estão amontoados em muitas partes. Tem sangue escorrendo pelas paredes e pedaços grudados em áreas inimagináveis.

Quem é essa mulher e por que estavam a escondendo aqui?

Tem tantos pedaços aqui que é difícil dizer quantas pessoas estavam a mantendo encarcerada. Ainda assim, Uvtrian foi embora, deixando-a para trás. Não, quem sabe confiou que seus homens conseguiriam levá-la até ele.

— Não vamos matá-la, é inimiga de Uvtrian, pode ser útil a nós — afirmo, porém, pela expressão de Lugi, eu tomei uma decisão horrível que me custará tanto que haverá um momento em que me encherei de arrependimentos.

— Ela pode ser um deles, uma que atua muito bem — pontua ele, se assustando quando Lewyn a pega nos braços, tirando-a do chão e Kanoi murmura um feitiço rápido que faz com que todas as correntes se soltem do corpo dela. — Está pensando direito nisso?

Não posso responder ao seu questionamento.

Minhas certezas nesse momento são muito poucas.

— Quer levar uma estranha para alcateia?

— Estranha ou não, se é meu, ninguém toca — pontuo, ouvindo-me me xingar antes de olhar para a cena grotesca, que era escondida pela escuridão uma última vez.

— Caso dê merda, me lembre de dizer que avisei — pede.

Mas pode mesmo acontecer algo de errado?

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