As lembranças mais antigas que Rebecca ainda guardava de sua mãe tinham teor agridoce. Quando ela ficava gripada, Ângela massageava seu peito com pomada mentolada enquanto segurava a máscara de um aparelho de nebulização contra o rosto da filha. Era uma das memórias mais felizes de sua infância. Ao mesmo tempo, porém, lembrava-se de perguntar ao pai o porquê de sua mãe não comparecer às comemorações do Dia das Mães na escola e a razão por que passava tanto tempo fora de casa, a ponto de Rebecca vê-la apenas pela manhã e nos fins de semana. Era uma mulher muito ocupada, como ela viera a compreender mais tarde.
Claro que vivera a maior parte da infância desejando ter com ela o mesmo tempo de qualidade que costumava ter com o pai. Todavia, já na adolescência, viera a descobrir que, num mundo de órfãos e de negligê
Os primeiros raios de sol penetravam as nuvens altas. Rebecca olhou para cima, enquanto segurava o próprio corpo. Estava anestesiada.Dominic finalmente desligou o celular dela, tirando-o do ouvido.— A ambulância está a caminho — disse ele.— E a polícia?Ele fez movimento positivo.— Também.Rebecca abriu um sorriso como resposta, que evanesceu quase instantaneamente.— Que bom.Haviam atado os braços e pernas de Aleksander usando os pedaços de corda, dessa vez aplicando-lhes um nó de verdade.Ao mesmo tempo em que um peso havia sido tirado das costas dela, outro se tornava impossível de ser suportado.— Rebecca. — Dominic se aproximou, receoso, e passou os braços em torno dos ombros dela, ignorando o sangue que manchava suas roupas. — Você tem que ir embora, se esconder.Sua express&
A cada etapa do processo, permanecer fiel às suas novas convicções se mostrou mais desafiador. Mas Dominic esteve lá por ela. Na sala de visitações, após a primeira noite em que ela dormiu em sua cela — que dividia com mais duas presidiárias e que não cheirava nada bem. Esteve lá em cada um dos seus aniversários, e em cada uma de suas vésperas de Natal.Esteve também quando Rebecca recebeu a notícia, por meio de um recorte de jornal, sobre a briga de facção que assolou o The Goldfather. Ao que tudo indicava, uma das gangues mais perigosas que Winterfelt já havia visto retaliou uma quadrilha menor, porém não menos temível, pelo ataque a alguns de seus membros. A coisa toda foi um tanto desinteressante e óbvia, embora sangrenta. Carros cheios de gângsteres estacionaram diante do antiquário. Em meio aos disparos, o
Apesar de não se tratar de um romance do tipo dark, este livro aborda assuntos sensíveis, desde crimes, uso de drogas e violência física, até relacionamentos abusivos e tóxicos. Tais temas podem gerar desconforto em determinados leitores, portanto aconselho a leitura com cautela e mente aberta.Caso vivencie ou conheça quem esteja passando por problemas parecidos com os aqui descritos, não pense duas vezes antes de entrar em contato com a autoridade ou pessoa capacitada para lidar com a situação.Proteja-se e proteja os seus, juntos faremos do mundo um lugar melhor.Com todo amor e carinho,Desejando que estejam bem,Carla Santi.
*******Prólogo*******“Não conseguia parar de pensar em como devia ser o cotidiano dele. Sabia que isso se dava porque ele exalava poder e notoriedade feito feromônio, e porque o gosto dela por filmes românticos da década de noventa lhe despertavam fascínio por ternos de caimento perfeito e ares de mistério a ser investigado. Heiler possuía aquele fator peculiar, que deixava os outros se perguntando ‘como será que é ser esse cara?’.”*******Capítulo 1*******Ocorreu-lhe que conseguiria amá-lo para sempre, reconhecia em si grande tolerância a dor. O que não suportaria, no entanto, seria conviver para sempre com uma decisão tão burra.— Rebecca Chase, pelo amor de Deus! — Ash urgiu, impaciente.Ela respirou fundo e bloqu
Della Dinastia era uma pequena joalheria de família, frequentada por arrivistas sociais e esposas troféus. Um par de irmãos ambiciosos pertenciam à segunda geração de responsáveis por conduzir o negócio, e eram tão bons vendedores quanto poderiam ser garimpeiros. Investiam pesado em publicidade e na ascensão do nome da loja nas mídias sociais, porém não tanto em segurança ou na originalidade das peças. Se fossem mais cuidadosos, não permaneceriam abertos após o horário de funcionamento dos pequenos prédios de escritórios ao redor, e certamente já teriam mudado de endereço — daquela rua afastada do centro para, quem sabe, um shopping center. Negociavam com a elegância pobre de quem quebrava pedras em busca de pepitas, mas as obtinham, afinal; eram mais talentosos fazendo dinheiro do que colares de pérolas ou an&ea
O antiquário se chamava The GoldFather. Rebecca nunca soube se se tratava apenas de um trocadilho com o título de um dos filmes favoritos de seu corretor de contratos (algo do que não duvidava, considerando que o ego de Richard “Dick” Push só não era maior do que seu talento para cafonices) ou se o objetivo era justamente atrair o mínimo de consumidores para sua lojinha de fachada brega, estampada com um adesivo gigante que ilustrava um peixinho dourado em posição de mafioso, numa caricatura malfeita de Marlon Brando — o letreiro numa fonte dura, laranja e sem serifa.Situava-se num dos bairros mais pobres da cidade e era cercado por igrejas, fábricas e estacionamentos. Durante o caminho até ali, Rebecca trocara apenas algumas poucas palavras com os demais.O portão de arame já esperava aberto; Timber contornou o antiquário pelo gramado descuidado e estacionou n
Ashton Smith tinha algo que Rebecca nunca encontrara em nenhum outro homem. Não era apenas físico. Era a maneira que ele a envolvia em seus braços fortes e fazia com que se sentisse segura, como se nada no mundo pudesse atingi-la, como se os momentos em seu abraço fossem os únicos lapsos de realidade em meio a um duradouro pesadelo.Agora que a chuva parara, Rebecca descansava sentada no gramado molhado, com a testa apoiada na cerca de arame. Precisava respirar, ficar sozinha… Às vezes era como se a mera presença dos demais interferisse na sua capacidade de processar as coisas.A vista não era nada bonita. Árvores ressequidas em canteiros cheios de ervas-daninhas, cães de rua. Podia ver o estacionamento a céu aberto, logo antes de um ferro-velho e um pedaço do muro de um antigo cemitério. Aquele buraco para o inferno não permitia nem que Rebecca glamourizasse seus m
Os Heiler podiam ser rastreados até o início do século XVIII, uma humilde família de botânicos que se mudara para os Estados Unidos na segunda onda histórica de emigrantes da Alemanha. Haviam vendido seu trabalho a fim de pagar pela viagem no Atlântico, e, junto com fazendeiros e operários, estabeleceram-se, num primeiro momento, numa colônia na Pensilvânia, em busca das terras oferecidas aos europeus. As linhagens se ramificaram num bem-sucedido esforço por subsistência; ainda que sem muita experiência no cultivo da terra, as mulheres se tornaram responsáveis por manter o legado dos Heiler vivo, dedicando-se ao plantio de ervas medicinais e à obtenção de minério; enquanto isso, os homens se beneficiaram do industrialismo americano, investindo no patrimônio e expandindo seu negócio.Embora muitas famílias tivessem deixado de exercer a pro