Nem mesmo sua intuição, de todo modo, pôde prepará-la para a manhã seguinte. Após o café da manhã, compartilhado, como de costume, por Jonathan, Gwen e os empregados, Rebecca se ofereceu para ajudar Wilford a levar os vasilhames vazios, os talheres usados e as sobras para a cozinha. Geralmente, não se demorava na sala de jantar mais do que o necessário, porém, dessa vez, fosse por ter se atrasado para descer ou porque, no fundo, vinha preferindo passar algum tempo sozinha — após a overdose de contato humano dos últimos dias —, foi a última a terminar a refeição.
Gwen já havia partido para o laboratório, e Jonathan vinha brincando com o cachorro no pátio interno.
— Precisa de uma mãozinha? — perguntou ao ver Wilford parado do lado de fora, mantendo-se próximo o bastante para desfazer a mesa rapidamente
Quando Santiago, o investigador particular dos Heiler, chegou, já havia passado da hora do almoço. Pelo pouco que permaneceu, pondo-se a par das evidências que Rebecca já havia reunido, tudo o que ela podia dizer sobre ele é que era alto, e que tinha dois terços de barba para um de rosto. Partiu da mansão tão logo lhe pareceu socialmente aceitável.Durante o resto da tarde, tudo o que conseguiu fazer foi perambular de um lado para o outro em seu quarto. Perguntava-se se não vinha se preocupando à toa, se Wilford não estava apenas blefando.Houvera aquela noite, a noite da chuva, em que ela discutira com Dick ao telefone e tentara abrir as portas do saguão. Se Wilford tivesse ouvido qualquer parte daquela conversa, já seria suficiente para que desconfiasse dela. Talvez, desde então, ele viesse observando-a. Bem, isso, por si só, não era um problema, cert
As batidas leves de Gwen à porta já a anunciavam, e, antes de atendê-la, Rebecca se perguntou se era algo positivo ou negativo estar familiarizada com o jeito característico das coisas naquela casa.— Venho num momento ruim? — cantarolou ela. Rebecca estranhou a visita, especialmente ao identificar uma fornada de pães de canela numa cesta enfeitada com laço. — Trouxe um mimosinho. Jana contou que você os adora.Demorou um instante para que a compreensão lhe adviesse, mas se lembrou de que contara à cozinheira uma história qualquer sobre pães de canela ser uma receita da família.Gwen permaneceu à porta, esperando convite para entrar. Rebecca puxou a porta e fez sinal para que ela se sentisse à vontade.— O cheiro está ótimo! — admitiu Rebecca. Era possível sentir o calor que os pãezinhos ainda emanavam.<
A mensagem inesperada de Stain chegou antes que Rebecca tivesse tempo de entrar, já atrasada, na sala de jantar para o almoço. “Precisamos conversar, amor. Mesmo beco de sempre. Venha sozinha. Já”. Desviou a atenção da tela do celular ao ouvir Gwen perguntar se havia algo de errado; só aí percebeu que se demorara demais, parada sob o umbral da porta, relendo a mensagem múltiplas vezes a fim de encontrar uma pista para o assunto que Stain não revelava logo. Viu que até Aleksander se sentava diante da mesa com os demais.Abriu um sorriso embaraçado.— Mais tarde. Não devia ter exagerado no café da manhã — inventou. Deu as costas e refez o caminho até o quarto de hóspedes.Só conseguia imaginar uma possibilidade: Stain tinha notícias sobre Ashton. Isso, por si só, já fazia seu estômago se revirar &
Não foi nada difícil derrubar o bloqueio de uma das janelas da casa. Estava abandonada há tanto tempo que a madeira fora corrompida pela umidade. Não era um esconderijo — ali, tão perto do The GoldFather —, apenas o local onde ela redefiniria seus planos. Ainda assim, procurou entre os entulhos no quintal coberto de lixo e folhas mortas algo com o que pudesse se defender caso fosse necessário. Achou um vergalhão enferrujado e longos cacos de vidro encroados. Era melhor que servissem.O interior se encontrava em melhor estado. Havia dejetos de rato pelo chão e teias de aranha enormes nas quinas das paredes; além disso, o cheiro era de amônia e lugar abafado; no entanto, ainda conservava as características próprias de um imóvel barato, com tacos como piso e portas mais ou menos funcionais.Escolheu o cômodo menos sujo, onde estendeu duas camadas de lençol. D
Usando o espelho retrovisor, Rebecca removia uma a uma as mechas de alongamento dos cabelos. Não havia mais por que se disfarçar de madame. Ademais, era uma boa ideia recuperar sua aparência convencional, uma vez que, agora, ser reconhecida como a mulher que estivera ao lado de Dominic na televisão lhe traria problemas incomensuráveis.Ela puxou uma mecha com mais força. Precisava manter Dominic fora da sua mente. Não conseguia suportar a ideia de que, a essa altura, ele já havia lido sua carta, já sabia de tudo — possivelmente a detestava como nunca detestara ninguém. Estagnava perante as inconvenientes lembranças que, por si sós, vinham à tona. Eram como um encontro inesperado numa rua deserta à noite; ativavam seu mecanismo de luta ou fuga, entrecortava sua respiração. Imaginava um cenário em que houvesse conhecido Dominic dentro de um contexto difere
A casa recendia a fósforo e acetona. A noite silenciosa era perturbada apenas pelas solas dos homens no segundo andar, movendo-se sobre a madeira gasta do assoalho, bem como o tilintar da munição sendo contada, posta em pilhas, antes de serem encaixadas no compartimento dos rifles. Permaneceu assim até um grito de aviso mobilizar todos os membros da gangue, fazendo-os agarrar a arma mais próxima à mão e partir em tropel para o primeiro andar. Cinco desceram pelas escadas, dois subiram da garagem…Apontaram os canos para a invasora na cozinha integrada a sala de estar. Ela mantinha as mãos para o alto desde que havia sido flagrada por um deles, e agora esperava que se reunissem em torno dela.— Paradinha aí! — berrou outro. — Quem é você?Ninguém ousou pronunciar palavra até que ela respondesse.Rebecca reparou nas roupas deles. Não ves
Sem fôlego, Rebecca olhou as horas e constatou que ainda lhe restavam trinta minutos. Precisava fazê-los valer.Diante do portão de ferro negro trancado, após ter percorrido uma boa parte do Summer Heights, não precisou se dirigir aos guardas à entrada. Um deles, por conta própria, exigiu que ela parasse onde estava, enquanto outro perguntava em voz alta “não é ela quem deveríamos anunciar caso víssemos?”.— Preciso falar com Dominic Heiler! — urgiu, com as mãos na cintura e suor cobrindo a face. — Rápido!— Fique bem onde está! — repetiu o guarda, autoritário. Depois, voltando-se ao colega, pediu que ficasse de olho nela enquanto ele chamava seu patrão pessoalmente.Meteu a pasta que carregava embaixo do braço, tomou o máximo de ar que pôde e, então, esvaziou os pulmões.
— Um ano atrás, uma outra mulher assumiu cargo temporário nesta casa. Não uma babá, mas uma cuidadora. Enviada pela empresa de serviços domésticos quando o sr. Aleksander Heiler veio passar o verão — continuou Wilford. Dominic baixou olhar para o carpete, concentrando-se em se lembrar. — Na ocasião, tive a sorte de ouvir uma das conversas dela ao telefone. Notei que escondia alguma coisa, mas, temendo alarmá-lo sem necessidade, senhor, contatei o investigador da família e o paguei por sua discrição. — Finalmente tornou a Rebecca. — Você conhece o nome dela. Conhece porque também buscou descobrir a respeito dela, estou errado?Foi a vez de Dominic apontar o dedo.— Isso é verdade? Você sabia?— Não! — adiantou-se ela. — Tudo o que sei é que ela veio para Winferfelt. Foi você quem de