Meu Deus! Quatorze anos! Era nada mais do que uma menina. Não era de se admirar que ela tivesse comentado sobre a paixonite de Anne por ele, já que deveria ter uma péssima imagem de adultos em relação a mocinhas muito jovens. O homem que deveria tê-la protegido a feriu da forma mais profunda.
— E durou por quanto tempo?
— Até os dezoito. Quando minha mãe tentou me defender, e ele a matou.
Puta que pariu! Que porra de história terrível. Como é que aquela mulher conseguia se manter tão forte, ainda com aquela personalidade gentil e delicada, depois de tudo pelo que tinha passado?
A dor de cabeça a impedia de abrir os olhos. Assim como a angústia que sentia no peito. O sono a protegia da realidade, então, se pudesse, permaneceria dentro dele por mais tempo. Continuaria dormindo por horas, dias, semanas, meses... para sempre. Porém, logo afastou este pensamento, enquanto sentia uma mão pequena tocar sua testa. Sabia que era Anne, e isso fez com que seu coração se enchesse de alegria. Sua irmãzinha deveria estar preocupada, o que significava que se importava, ao menos um pouco. Já dera sinais disso há pouco tempo, quando a vira sangrando, mas logo fingira indiferença. Daquela vez ela não fugiria, principalmente porque a sensação cálida logo se transformou em mágoa quando lembrou-se do que ela andava escondendo.&
Saíram caminhando, em direção à praia em anexo à pousada, seguindo em silêncio a princípio. Karen tirou as sandálias, passando a segurá-las na mão, enquanto Marcos preferiu manter-se de tênis. Avançaram na direção do mar, e no exato instante em que os pés descalços de Karen entraram em contato com o oceano e que o vento bagunçou seus cabelos, sentiu-se melhor. Porém, um pensamento ainda martelava em sua cabeça. — Marcos... — ela chamou, e ele virou-se em sua direção imediatamente. — Aquilo tudo que eu te contei... Sobre meu padrasto... — Um nó se formou em sua garganta, e ela não conseguiu terminar a frase de imediato. Precisou tomar um pouco mais de coragem
Já passava das dez quando Karen e Marcos retornaram à pousada, abraçados. Ela fingiu não perceber a expressão decepcionada no rosto de Sérgio quando a viu naquele clima de intimidade com o roqueiro. Claro que havia aquele interesse da parte dele por ela, mas também havia um pouco de preocupação, o que era fofo. Porém, Karen estava decidida a cuidar de si mesma. Não iria negar a atração que sentia por Marcos, mas não iria permitir que se tornasse algo mais profundo. Seria uma questão de pele, de beijos quentes e... quem sabe... algo mais? Não sabia se estava pronta para aquele passo, mas precisava tentar. Subiram as escadas juntos, entrelaçados, e ela chegou a cogitar que ele a convidaria para entrar em seu quarto. Por mais que tivesse tomado aquela decisão radical de experimentar coisas
A cama e Marcos tinham seus momentos. Por vezes eram melhores amigos, como quando capotava depois de um show eletrizante, ou como quando a preenchia com uma mulher, para transar loucamente pela madrugada inteira. Sofia, sua ex-esposa, era muito boa de cama, aliás, e ele passara bons momentos com ela sobre uma. Mas às vezes travavam batalhas ferrenhas quando a insônia o consumia. Desde a traição e depois da morte de Lauro, noites em claro passaram a fazer parte de sua rotina. Daquela vez, porém, os pensamentos que o preenchiam não eram tão dolorosos. Uma ruiva belíssima os tomava por inteiro, não dando espaço para mais nada. Portanto, quando decidiu levantar-se, correu para debaixo do chuveiro, para tomar um banho de água fria e aplacar sua necessidade de outra forma, porque simplesmente não conseguia tirar a imagem dela d
Ela se lembrava de ter dormido à beira da piscina, por isso, a sensação de um colchão macio sob seu corpo era algo que não conseguia compreender. Estava na cama, mas não fazia ideia de como tinha ido parar ali. Foi abrindo os olhos devagar e não reconheceu o quarto onde estava imediatamente. Precisou de um momento para se situar até que viu Marcos de pé, em frente à escrivaninha, arrumando alguma coisa. Por que diabos estava no quarto dele? O que estava acontecendo? Não tinha bebido para não se lembrar, então, começou a ficar apavorada. Tanto que levantou-se com pressa da cama, esbarrando no abajur sobre o criado mundo, que cambaleou, fazendo um barulho suficiente para que o homem à sua frente virasse na sua direção.
Sem muito o que pensar, os dois retornaram ao segundo andar. Marcos pega as coisas de Karen em seu quarto — a chave e o notebook — e a acompanha até o dela, esperando enquanto abre a porta. Assim que entram, são recebidos por uma melodia vinda do quartinho de Anne, cuja porta estava entreaberta. Tratava-se de uma música da Pitty, uma um pouco mais antiga, que Karen conhecia muito bem. Anne cantava junto, com uma vozinha muito afinada e cheia de atitude. Apesar de ainda estar um pouco magoada com ela, Karen não pôde deixar de sorrir, especialmente quando viu Marcos arregalando os olhos em uma expressão de agradável surpresa. — É Anne que está cantando? — ele perguntou com um sorriso, sussurrando.&nb
Rodopiando em frente ao espelho, com o vestido novo, penteada e maquiada bem discretamente, Anne sorria como Karen ainda não tivera a oportunidade de ver. Precisou segurar as lágrimas emocionadas, não apenas porque sua irmãzinha desabrochava diante de seus olhos, mas principalmente porque vê-la feliz sempre foi sua meta de vida, e finalmente achava que estava começando a fazer um trabalho decente. A sombra daquele telefonema maldito ainda a perseguia, e ela sabia que não seria capaz de esquecer aquela voz macabra que soara em seus ouvidos e que recuperara todos os medos que ela acreditara ter enterrado bem no fundo da sua mente. Tanto que quando se viu sozinha, depois que Anne desceu para ir encontrar-se com Tauan, jogou-se na cama, apavorada. Odiava aquela sensação de vulnera
O dia amanheceu cheio de novas nuances. Karen tinha dormido muito pouco, mas não se sentia cansada. Na verdade, sentia-se renovada. Muitas decisões foram tomadas naquelas horas insones, e todas elas tinham a ver com Marcos. Não parara de pensar nele um só segundo, principalmente em sua reação quando ela reagiu às suas investidas de forma amedrontada. Já tinha entendido que era um cavalheiro, apesar da aparência mais selvagem, mas tudo o que conhecera na vida relacionado a sexo era violência e tomado à força. Ele poderia ter feito isso na noite anterior. Poderia tê-la pressionado, continuado a tentar seduzi-la, e Karen tinha quase certeza de que acabaria cedendo, porque também o desejava. Mas ele preferira escolher o caminho mais honrado, e com isso, chegou definitivamente ao seu coração.&n