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A odiosa família Sanches

Aquela era uma viagem relativamente tranquila, apenas quarenta minutos de carro até os arredores de Estermond onde havia uma imensa propriedade que era de posse de Hector Sanches. Apenas mais um dos compromissos que o casal fazia juntos, embora aquele em especial fosse um prazer para Hanna, que visitaria a família, e um martírio para Nicolas, que tinha de aguentar o sogro e monstrinha da cunhada. Isso se, com sorte, não encontrar mais Sanches que o detestava reunidos, o que era uma chance imensa dada a circunstância que iam.

No som, tocava uma música suave e bem atual, e era somente aquele som que havia entre eles. Para Nicolas, era normal àquela altura ele ficar ouvindo Hanna falando de algo com empolgação, compartilhando alguma fofoca, ou apenas com seus pequenos planos e acontecimentos, mas ela estava apenas lá: calada, aborrecida claramente, e ele não sabia o porquê ou exatamente o que fazer. Aliás, ele sabia exatamente o que fazer, mas talvez fosse fraco demais, assumia… Havia coisas que simplesmente saiam do seu controle e por mais que tentasse retomá-las ao ponto inicial, era praticamente impossível e esse era um dos casos.

Hanna era boa demais, e ele sabia, na verdade, carregava isso consigo desde o dia que a pediu em casamento e da conversa que teve com Hector, lembrava-se exatamente do sogro repetindo essas mesmas palavras para si: “ela é boa demais para alguém como você” Engoliu em seco, a mente transtornava-se apenas com a mínima possibilidade perdê-la. Ele ia consertar as coisas entre eles… Tinha tempo afinal.

Hanna, naqueles primeiros minutos ao lado dele, pensava e repassava as questões dos últimos dias e do fundo do seu coração queria questioná-lo, queria mesmo olhar profundamente nos olhos azuis e com segurança questionar os porquês deles.

O que…

Ela não era bonita o bastante?

Jovem o bastante?

Quente o bastante?

Talvez fosse muito séria… Talvez fosse ocupada… Talvez fossem filhos que fazia falta…

O quê?

Qual era o problema, afinal?!

Ela partia-se angustiada… Aqueles pensamentos a arrastavam para o seu pior, ridiculamente se colocando abaixo dele, inferior a ele porque simplesmente a ideia de ser a mulher traída lhe doía e machucava tanto. Talvez seu reflexo partido e sem brilho a fazia enxergar a coisa toda distorcida. Culpava-se, mas era a vítima ali. De repente, acordou de seus questionamentos como se recebesse um choque ao sentir Nicolas segurando sua mão.

— Está gelada. — Ele comentou, com o toque dele em si, ela sentiu extrema vontade de puxar a mão de volta.

Inspirou e forçou tão debilmente o sorriso.

— Está tudo bem?

— Claro, querido! Por que não estaria?

Os olhos dele a encararam poucos instantes, voltando a atenção para a estrada. Suspirou aborrecido e sentiu-a largar sua mão com certa aspereza. É claro que não estava tudo bem, seu casamento estava se apagando e as coisas estavam péssimas, mas tinha que agir com frieza e sobriedade para não mostrar talvez toda a culpa e remorso que sentia em horas assim. O problema dessas coisas era que justamente depois do primeiro pico, que incluía a adrenalina e a emoção, vinha a culpa e o remorso, e tão logo elas vêm, vão embora e o ciclo recomeça vicioso.

A questão era: quando o primeiro gatilho veio?

Ele apertou com certa força o volante a ponto de ouvir um pouco do estalar do couro sobre pressão, empregava ali talvez suas divagações e frustração por ser um covarde.

— Não demoraremos lá, não é? Sabe que…

— É aniversario do meu pai. Ele insiste em ficar longe de grandes comemorações de mídias e perto da família. Acha bajulações exageradas falsas… — ela o olhou — talvez ele esteja certo.

Nicolas franziu o cenho.

— Você concordando com seu pai? O que eu perdi?

— Nada — ela falou em bom-tom “ainda…” Pensou ao virar o rosto e voltar a encarar a rodovia em silêncio novamente, esse estendeu-se mais longamente com cada um preso em seus próprios pensamentos.

Àquela altura, havia, sim, algo que a incomodava constantemente, um pensamento sombrio que simplesmente a atormentava e arrancava toda a sua paz.

— Só… É a minha família, se não puder ou quiser ficar, tudo bem, eu peço ao motorista do papai para me deixar em casa depois. — disse terminando aquela conversa, algo que ele entendeu claramente com a frieza por ela imposta e a mágoa na voz.

Hanna não era estupida, pelo contrário, e isso tornava tudo tão perigoso, seria aí a tal adrenalina? Ele bufou voltando a fitar concentrado o caminho que tinha poucos carros, o velocímetro aumentou a marcação quando ele pisou no acelerador, queria apenas chegar lá quanto antes e ir embora tão logo pudesse.

— Para o carro! — ela ordenou bruscamente. Ele a olhou confuso e perplexo.

— Olha… Não é assim. Estamos na expressa, não posso só parar o carro.

— Eu vou vomitar nessa merda de carro, droga! — praticamente gritou com ele e contorceu-se levando uma mão a boca bruscamente e a outra ao estômago.

Ele arregalou os olhos e jogou o carro para o mínimo que existia de acostamento, ligando o pisca-alerta do veículo. Hanna só desafivelou o cinto e abriu a porta do sedã bruscamente, saindo e vomitando todo o café da manhã. Aquilo se estendeu por longos minutos e somente parou quando finalmente não havia absolutamente mais nada no estômago dela.

Naqueles minutos que ela estava daquela forma, vulnerável e péssima, ele preocupou-se imensamente com sua esposa. Talvez essa estava doente e lhe escondendo isso, ou algo ainda mais sério. Estremeceu ao menos com a possibilidade disso. Sabia que a mãe da mulher havia morrido de uma doença que a acometeu praticamente de uma hora para outra e nem todo o dinheiro que os Sanches possuíam puderam salvá-la.

Abrindo o porta-luvas, ele tirou a caixa de lenços a estendendo para limpar-se.

— Obrigada — murmurou sentando-se novamente no seu banco. Estava incrivelmente mais pálida e abatida.

Era melhor ele ficar de olho nela…

A comemoração estava estranhamente acalorada para os modos Sanches, talvez fosse a idade chegando, ou o alívio de uma breve aposentadoria em favor de Haley assumindo a presidência da empresa, mas o fato era que Hector estava bem mais divertido, por assim dizer. Já era uma grande coisa não implicar com Nicolas, esse papel ele deixou exclusivamente com Haley e Nolan, seu sobrinho.

— Vem aqui — chamou o patriarca da família com sua primogênita, a arrastou para a sua sala intimista na mansão e assim que Hanna entrou ali ela viu sobre a lareira de pedras negras um quadro imenso tampado — isso precisa ser mostrado para você em primeira mão.

Ela sentiu-se ansiosa.

— Está pronta, filha?

Ela mordeu o lábio.

— To nervosa — disse pensando que o pai deveria ter investido em algum quadro caríssimo, lembrava-se claramente que aquela reforma de espaço estava tirando o juízo de Haley com o pai e ele realmente estava atrás de uma obra espetacular para a sua sala pessoal.

O Sanches caminhou até o tecido e segurando a cordinha a puxou revelando o quadro. Uma pintura de Helena Sanches com Hanna e Haley ainda crianças. Hanna começou a chorar, por alguma razão suas emoções estavam ainda mais intensas que o normal. Aquele quadro fora pintado por ela, tirado de sua foto favorita, a uma das melhores recordações que tinha da mãe. Em meio aqueles soluços de choro ela sentiu o pai a abraçando reconfortadoramente e isso vindo dele era algo tão… Bom, visto que ele sempre fora tão sério e frio.

— é perfeito — chorou Hanna.

— É sim! Foi minha artista favorita que pintou, sabe?

Ela sentiu-se quente e segura ali nos braços do pai como a um bom tempo não se sentia.

No antigo escritório do pai e agora recém-tomado por uma Haley extremamente metódica, às duas irmãs sentaram frente a frente nos sofás. A caçula estava realmente curiosa com suposta conversa com Hanna, sabia de algumas coisas, ciente que a irmã não se aprofundava como se deveria, mas sempre deixou claro que ela estava lá para irmã, assim como Hanna sempre esteve ali por ela.

— E-eu… Preciso de um bom advogado.

Haley arqueou a sobrancelha com ainda mais curiosidade e uma pitada de confusão, para que aquele sigilo por um mero advogado? Observando a confusão da irmã, Hanna prosseguiu:

— Preciso de alguém muito eficiente, completamente profissional e discreto. Não posso só marcar em vários escritórios sem chamar atenção. Não com o tipo de caso que eu preciso.

Haley desenhou um sorriso malicioso, quase perverso.

— É sobre o Scrudell panaca? Finalmente deixou de ser idiota?

— Talvez… — murmurou Hanna corada.

— Bom… Vejamos — disse pegando o celular e passando entre os contatos até achar o dito e enviá-lo para Hanna. — O nome dele é Jason Hoffman. É ótimo estrategista, reverte casos, realiza milagres impossíveis. Ele é o melhor e inclusive para os servicinhos que eu preciso atravessar da empresa, é ele que cuida. Ele que cuidou do divórcio do Nolan com toda discrição e deixou aquela vaca interesseira sem nada.

Hanna suspirou.

— Ótimo!

— Você tá bem?

— Pareço estar bem? — Hanna ironizou, sorriu sem humor.

— Parece… Morta. Sei lá, tá bem pálida, mesmo maquiada. Eu te conheço, tá horrível… Talvez sejam seus olhos…

— Sou uma mulher possivelmente traída. Eu deveria estar sorrindo pelos quatro cantos? Se eu pudesse, eu me encolhia na cama e não saia mais de lá, apenas chorando e me acabando.

— Sorte sua então, o senhor Hoffman ser um homem incrivelmente bonito e solteiro.

Hanna revirou os olhos, tudo que ela não precisava era daquilo. Não desceria ao nível do marido, essa não era ela, tinha ainda um pouco de dignidade, mesmo que essa muito pequena pelo visto.

(…)

Ela realizou uma pequena pausa do trabalho naquela tarde, em sua sala no instituto, ela recebia o Hoffman, e realmente Haley falava a verdade, era um homem realmente bonito, mas ela não tinha interesse algum, naquele momento. A assistente de Hanna serviu um café para ambos e saiu, os deixando sozinhos na sala.

Ele bebericou o líquido e deu um suspiro. De fato, era um homem mais velho que ela alguns anos, mas não perdia em absolutamente nada para qualquer “garotão”… Ele era o que as mulheres chamariam de um belo pedaço de mal-caminho, e Hanna sentiu-se nervosa internamente, afinal, desde quando se preocupava com essas estéticas bobas?

O Hoffman, vendo parte do desconforto da mulher de olhos violetas e filha de um dos seus maiores clientes, decidiu quebrar o gelo.

— Seria idiota eu falar que não entendo absolutamente nada de arte? — disse olhando alguns dos quadros na parede dela, e Hanna respirou um pouco menos tensa e sorriu.

— Seria sincero. Nem todos têm tato ou interesse, o que é perfeitamente normal. Pessoas tem gostos diferentes.

— Acredito que me enquadro nos dois, aliás, pensando bem, eu gosto da boa e velha sétima arte, também aprecio bons livros… — Hanna sorriu por trás da xícara bebendo seu café.

— Então entende algo, de alguma forma, certo?

— Certo — ele sorriu — talvez um dia possamos conversar sobre uma escultura, talvez, para o meu escritório.

— Perfeito! — sorriu Hanna docemente e então as xícaras foram repousadas a fazendo intender que a hora do recreio acabou.

Jason pegou um moleskine de capa de couro preta que ele andava e uma caneta dourada colocando sobre a mesa de Hanna, começando a fazer suas anotações sobre o possível caso.

— Bom, podemos começar, Senhora Scrudell…

Hanna hesitou, mexeu-se um tanto desconfortável e então começou a relatar desde o começo a relação e as suspeitas, bem como o resto. Ele não a olhava com olhos julgadores, tão pouco de pena. Ele a ouvia, questionava algumas coisas, anotava sempre… Atencioso e altamente profissional, e ela realmente gostou disso.

Ele soltou a caneta por um instante e falou:

— Temos um bom caso aqui, mas a presença de provas é realmente importante, como o bilhete de pagamento que achou, porem precisaremos de muito mais, embora só da senhora ser filha de um homem influente como o senhor Sanches já ajude, mas sinto que não quer usar esse escudo, não é?

— Não… Infelizmente é um problema meu.

— Nunca é apenas um problema individual. Bom, preciso saber toda a situação de vocês, o tipo de casamento que tem e se tem alguma proteção. Qualquer coisa que possamos usar ao nosso favor.

— M-meu pai… — ela empurrou sobre a mesa em direção a ele uma pasta de couro claro — antes de nos casarmos ele nos fez assinar um acordo pré-nupcial. Ele queria — ela sorriu frustrada — assegurar minha parte da empresa e herança, minhas finanças individuais.

— Seu pai é um gato velho, bem precavido. — Ele olhou a pasta dela abrindo-a e constatando a cópia da certidão de casamento. — Vocês têm uma comunhão parcial de bens, ou seja, o que era seu antes do casamento continua sendo seu, e o que era dele também é dele. O que inclui muitas outras questões. O que precisamos levantar é tudo que se tem nesse meio, entre o sim e o agora. Finanças, bens moveis e imóveis, débitos…

Ela torceu o rosto em uma careta, era tão trabalhoso…

— Uma procuração e você resolveria?

— Claro. Mais ainda precisarei de informações, realizarei um levantamento.

— Por favor, o mais discreto possível, não quero alarmá-lo.

— Claro, senhora Scrudell.

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