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Mudará. No momento em que eu saio do hospital eu sei que a minha vida mudará. Radicalmente até. E não da forma que eu esperava ou da forma que eu queria, mas de uma forma que me pegou de surpresa e abalou minha estrutura.

As últimas duas semanas se passaram lentas e rápidas ao mesmo tempo. De uma eu não me lembro muito. Estava a maior parte do tempo sedada em uma cama no quarto de recuperação do hospital após a cirurgia. Da outra eu me lembro como uma passagem dolorosa após o doutor Wood me falar sobre as sequelas resultantes do meu acidente. Mas tem duas coisas das quais eu jamais esquecerei. De dois faróis mortais pertencentes ao caminhão que bateu em mim no momento em que eu tive mais medo na minha vida e de dois olhos castanhos amorosos me vigiando como um falcão assim que eu acordei. O Nick ficou o tempo todo ao meu lado na cama, o Robert disse. Ele nem sequer foi trabalhar durante todo esse tempo. Apenas dava uma passada rápida em casa pra tomar banho e trocar de roupa, porque até mesmo as refeições ele fazia ao meu lado.

— Você está bem? — ele pergunta ao entrarmos no carro — Está confortável desse jeito?

— Estou.

Estou no banco da frente, no lado do passageiro. Ele tenta colocar o cinto de segurança em mim, mas eu mesma o coloco antes que ele tenha a chance. Não é porque minhas pernas não se mexem que eu não posso mover meus braços. Nick dirige de forma mais cuidadosa do que é estritamente necessário. E posso observar uma viga em sua testa em sinal de preocupação. A verdade é que desde que eu acordei, tenho a sensação de que ele me esconde algo. Três dias atrás eu acordei e ouvi que ele e o Robert falavam alguma coisa, mas já estavam no fim da conversa porque não pude saber do que se tratava.

Agradeço a ele por trazer as flores que eu ganhei durante o tempo em que fiquei hospitalizada, mas sua carranca – antes já nada boa – se aprofunda um pouco mais ao mencionar o Asher. Mas ele é meu amigo e foi muito gentil. Me visitou todos os dias desde que eu acordei e parece que também esteve lá enquanto eu estava inconsciente. Embora eu ache que não foi muito agradável para o Nick. Eu disse a ele que Asher e eu somos amigos, mas sinto que ele ainda tem uma pulga atrás da orelha.

— Ele é um bom amigo. — digo só pra reforçar.

— Eu sei. — ele responde sério.

Nick está mais sério do que eu estou acostumada a ver. Parece um pouco preocupado. Eu tenho certeza que ele ainda tem a ideia maluca de que a culpa pelo acidente é dele. E eu não sei de onde ele tirou isso, mas tenho que dar um jeito de acabar com esse pensamento.

Quando chegamos à sua casa, ele monta a cadeira de rodas ao lado da minha porta e me ajuda a sentar. É uma cadeira muito bonita e cheia de acessórios. Tem controle remoto para que eu não precise mexer nas rodas para me mover e com certeza deve ter custado uma fortuna. Às vezes eu gostaria de saber o quanto as ações que o Oliver deu a ele rendem só pra ter uma ideia de quanto dinheiro o Nick tem. Não que eu me importe com isso, mas é que desde que eu o conheci ele já gastou uma quantidade absurda de dinheiro comigo.

Assim que me acomoda na cadeira, ele se abaixa ao meu lado e faz o que sempre faz quando está tão perto assim. Põe a mais teimosa mecha do meu cabelo atrás da minha orelha e me beija levemente nos lábios. Eu adoro o jeito como eu me sinto quando estou com ele. Sinto-me especial e principalmente, sinto-me amada.

— Eu te amo. — ele diz com a boca ainda junto da minha.

Eu adoro quando ele me diz isso, mas agora mesmo não sei por que sinto que ele está dizendo isso não porque apenas quer dizer, mas porque acha que eu preciso ouvir.

— E eu a você, Nick. — toco seu rosto bonito com a ponta dos dedos e ele geme baixinho, mas não de prazer e sim como se doesse — Eu sei que está sendo difícil pra você amor, mas não precisa ficar reafirmando seu amor a toda hora só porque eu estou desse jeito.

— Eu não digo isso pra reafirmar pra você. — ele fala, olhando nos meus olhos — Faço porque eu preciso provar a mim mesmo o quanto eu amo você e me convencer de que nunca faria algo pra te magoar.

— Eu sei disso.

— Você acredita em mim? Acredita que eu nunca diria ou faria algo que te fizesse sofrer mais do que já está?

— É claro que sim, meu amor. Eu sei que você é a única pessoa que nunca faria nada pra me machucar.

— Ok. — ele sorri e se levanta.

Eu não entendo o por quê desse papo. Por que ele acha que vou pensar que ele me machucaria? Será se ele pensa que se passou por um minuto pela minha cabeça que ele vai me deixar agora? É claro que eu não pensaria nisso. Eu sei que ele me ama demais e que tem caráter demais pra fazer algo assim.

— Vamos entrar então? — concordo e ele fica na parte de trás da cadeira e começa a empurrá-la.

Uma olhada ao redor e na mesma hora eu percebo que tudo por aqui mudou. A frente da casa dele está muito mudada. A rampa que antes ia da entrada da varanda até a areia da praia agora tem uma irmã gêmea, menor e menos inclinada. Não falo nada. Mas quando entramos dentro de casa, as partes que sofreram alterações são ainda mais evidentes, a começar por um elevador de visão panorâmica ao lado da escada que leva à parte superior.

— Nick... — digo ofegante — O que você fez aqui?

— Eu sei que a casa está um pouco diferente, mas não é nada que não fosse necessário fazer.

— Era mesmo necessário colocar um elevador aqui? — sorrio.

— Bem... sim. Eu quero que você seja capaz de se locomover sozinha sem ter que sempre esperar por alguém.

É muito amável da parte dele querer fazer com que eu me sinta útil, pelo menos para mim mesma. Mas mesmo a sutileza dele me mostra mais uma vez que de agora em diante eu não dependo só de mim, até mesmo para as coisas mais simples.

— Obrigada, Nick.

— Ah amor, você não tem que me agradecer. Vem aqui. — ele me chama até a porta do pequeno elevador. Eu mesma vou guiando a cadeira através dos controles. — Está na hora de ver como as coisas estão lá em cima.

Ele aperta um pequeno botão verde no painel e a porta do elevador se abre. É relativamente grande. As paredes são de vidro e dá pra ver os cabos sendo puxados pelo motor. Um elevador de visão panorâmica. É claro que até nisso ele iria esbanjar. No momento cabemos eu e ele. Não sobra muito espaço, mas não chega a estar apertado. Porém se não fosse a cadeira, caberiam facilmente umas cinco pessoas aqui dentro.

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