Dois anos depois: O dia estava quente. O sol entrava pelas janelas do escritório, iluminando os papéis espalhados sobre a mesa. Projetos finalizados, outros em andamento, alguns aguardando fechamento. Tudo ali era um reflexo do que eu havia construído nos últimos dois anos. Minha vida tinha voltado a ser minha, e eu finalmente sentia que pertencia a ela. Meu celular vibrou ao meu lado, e o nome do meu primo brilhou na tela: Fernando. Sorri, porque já imaginava o motivo da ligação. Eu evitava os reencontros há tempo demais, não por medo ou dor, mas porque precisava desse espaço para mim. Dois anos atrás, eu não fazia ideia de quem era sem a sombra do meu passado. Hoje, eu sabia. Atendi no exato momento em que meu pai entrou no escritório. — Oi, Fernando. — Falei, apoiando o celular no ombro enquanto reunia alguns papéis. — Cindy, estou surpreso! Você me atendeu estranhamente rápido. — Ele brincou, e eu ri. — Só não atendo quando estou no meio do mundo, mas, no momento, es
Henrique O dia estava quente, e depois do almoço, Sabrina subiu para o quarto comigo. A viagem estava sendo boa, e eu realmente precisava desse descanso depois de uma semana intensa de trabalho. Sabrina e eu tínhamos um lance casual, algo leve, sem cobranças, e quando pensei na viagem, não parecia uma má ideia convidá-la. Fernando havia mencionado que passaria alguns dias em Ilhabela e me chamou para ir junto. Fazia tempo que não nos reuníamos assim, e embora as viagens ainda acontecessem, havia uma diferença inegável desde que a Cíntia foi embora. Nossa amizade continuou, claro. Carol, Fernando, Ana e Felipe eram parte da minha vida, mas era impossível ignorar o espaço que Cíntia deixou. No início, evitavam tocar no nome dela na minha frente. Com o tempo, pararam de mencioná-la por completo. E eu nunca perguntei. Nunca quis saber. Talvez fosse orgulho. Talvez fosse medo do que descobriria. Adormeci por um tempo, mas despertei com o calor do corpo de Sabrina junto ao meu. O
O som das risadas e o calor suave do fim de tarde tornavam o reencontro ainda mais especial. Eu estava rodeada de pessoas que amo, pessoas que fizeram parte da minha jornada, e pela primeira vez em muito tempo, sentia que tudo estava exatamente onde deveria estar. Ana me atualizava sobre a pequena Sofia, enquanto Carol contava alguma história engraçada das últimas viagens. Fernando e Felipe discutiam sobre qual seria o melhor roteiro para o fim de semana, cada um tentando provar que sua ideia era a mais divertida. Tudo parecia perfeito. Até que senti. O olhar. Foi como um arrepio involuntário que percorreu minha pele. Olhei para a escada e o vi ali, parado, me encarando como se eu fosse uma visão inesperada. Meu corpo ficou rígido por um instante, mas controlei a reação. Henrique. Dois anos sem vê-lo. Sem ouvir sua voz. Sem saber nada sobre sua vida além das pequenas informações que Fernando e Carol soltavam sem perceber. Ele estava diferente. Mais forte. Mais maduro
O pessoal decidiu sair para jantar perto da praia, o restaurante era agradável, bem iluminado, com uma decoração rústica que combinava com o clima praiano. As vozes do grupo se misturavam ao som das ondas lá fora, e todos pareciam se divertir. Todos, menos eu. Eu tentei prestar atenção na conversa, rir das piadas do Felipe, comentar qualquer coisa sobre o menu, mas minha cabeça estava em outro lugar. Ou melhor, em outra pessoa. Cíntia. Ela estava sentada do outro lado da mesa, entre Fernanda e Carol, e, por mais que eu me odiasse por isso, meus olhos sempre acabavam nela. O cabelo caía sobre os ombros, e toda vez que ela o jogava para trás, meu olhar era atraído. O vestido que usava realçava suas curvas, e a luz suave do restaurante deixava sua pele ainda mais iluminada. Ela parecia confortável ali, conversando, sorrindo, como se nada estivesse fora do lugar. Como se eu não estivesse ali. Apertei o copo na mão, sentindo os dedos ficarem tensos ao redor da superfície gelada. Eu
Cíntia não me deixava em paz. Ela me desafiava de uma maneira que ninguém mais conseguia. Eu tentei ignorá-la, tentei me distanciar. Mas, toda vez que ela falava, cada palavra dela tinha um peso que eu não sabia como carregar. A pergunta dela me pegou desprevenido, e eu sabia que eu tinha falado o que precisava ser dito, o que era mais fácil. Não somos amigos. Nunca fomos.Mas as palavras dela, a maneira como ela me encarou, me atingiram de uma forma que eu não esperava.“Eu não tenho culpa de você achar que nós poderíamos ficar juntos. Não tenho culpa, Henrique.”Fiquei parado, ouvindo. Aquilo foi mais do que eu podia processar naquele momento. Eu queria gritar, queria dizer tantas coisas, mas tudo que saiu foi aquele silêncio tenso entre nós. Eu não queria mais me envolver, não queria mais me confundir. Por que ela não podia simplesmente entender que não era mais sobre nós? Que não havia nada entre nós? Eu só queria que ela fosse embora.Fiquei com a mente turva, sem saber como reag
Depois de uma noite terrível, quase não dormi. Fiquei repassando o confronto que tive com o Henrique na cozinha, cada palavra, cada olhar frio que ele me lançou. Era como se eu estivesse falando com um estranho. Doía saber que ele sentia raiva de mim. Doía mais ainda saber que ele não queria interagir comigo. Durante o tempo que ficamos juntos, Henrique nunca foi grosseiro. Nunca foi rude. Ele sempre me tratou com paciência, com respeito, com um carinho silencioso que me fazia sentir segura. Ele era minha segurança. Minha compreensão. Meu porto seguro. E agora ele havia mudado completamente. Frio. Indiferente. Irritado comigo. Ele disse que fui embora. Jogou isso na minha cara como se fosse algo imperdoável. Mas ele não enxergava? Não entendia que ir embora foi a escolha mais difícil da minha vida? Deixá-lo para trás me partiu ao meio. Houve noites em que quase peguei o telefone para ligar. Dias em que tudo que eu queria era ouvir sua voz, sentir seu abraço, voltar para aqu
Henrique me confundia. Na noite anterior, ele havia deixado claro que não queria interagir comigo, que não era meu amigo, e agora, ali estava ele, me pegando no colo, me ajudando a voltar para a ilha. Aquele gesto parecia contradizer tudo o que ele tinha dito, e isso me deixou ainda mais perdida. A dor no pé me lembrava constantemente da realidade, mas a confusão na minha mente era mais forte. O que ele queria de mim? Por que esse comportamento tão contraditório? O silêncio entre nós aumentava a tensão. Ele não dizia nada, parecia estar concentrado em me carregar até o local seguro, mas seus olhos se fixavam no caminho à frente, como se quisesse se afastar da conversa, ou da complicação que tínhamos nos tornado. Eu queria perguntar, queria entender, mas, ao mesmo tempo, o peso das palavras de ontem ainda pesava em minha mente, me impedindo de abrir minha boca. Será que ele estava apenas sendo gentil por obrigação? Ou havia algo mais ali, algo que ele ainda não tinha dito? Eu não
Fiquei mais alguns minutos ali, observando Cíntia respirar suavemente. O silêncio do quarto era quase hipnotizante, e eu deveria simplesmente levantar e ir embora. Mas algo me mantinha preso àquela poltrona, como se sair dali significasse deixá-la para trás de novo.Passei as mãos pelo rosto e soltei um suspiro pesado. Eu estava me contradizendo o tempo inteiro. Disse a ela que tinha seguido em frente, que minha vida nunca esteve tão boa, mas estava ali, sentado ao lado dela, incapaz de ir embora.Olhei para o relógio no celular. Já estava ali há mais de uma hora. Sabrina provavelmente estava esperando que eu fosse encontrá-la, e o resto do grupo devia estar voltando da trilha.Levantei-me devagar, tentando não fazer barulho. Peguei uma garrafa de água que estava sobre a mesa e a deixei ao lado da cama, caso ela acordasse com sede. Antes de sair, dei mais uma olhada para ela.Talvez fosse o efeito do remédio, mas ela parecia ainda mais frágil ali deitada. O cabelo loiro bagunçado sobr