Ver minha mãe ali era estranho. Eu aprendi a conviver sem eles. A escolha não havia sido minha.— Aconteceu alguma coisa com o meu pai? — Perguntei instintivamente, sentindo meu coração acelerar.Por um momento, a ideia de algo grave passou pela minha mente, mas rapidamente afastei esses pensamentos. Se algo tivesse acontecido, eu saberia. Minha tia Irene me contaria. Afinal, ela e minha mãe eram irmãs, e minha tia nunca apoiou o exílio emocional que meus pais me impuseram. Mas também, não tocava nesse assunto, ela sabia que era algo que me feria. Minha mãe balançou a cabeça devagar, os olhos dela brilhando com algo que parecia culpa misturada com saudade.— Não, seu pai está bem. — A voz dela era baixa, quase hesitante. — Eu só… precisava te ver.Eu me sentia dividida. Parte de mim queria sair dali, evitar esse confronto que eu nunca havia pedido. Outra parte queria respostas, ainda que eu não soubesse se estava pronta para ouvi-las.— Anos sem notícias, sem nenhum esforço para me p
Quando sai do quarto, já havia tomado banho. Estava vestida, arrumada e recomposta. Minha mãe havia aparecido e queria fazer parte da minha agora, era dificil, ainda mais por eu já ter aprendido a conviver sem ela. Era doloroso também, mas eu não podia me debulhar em lágrimas. Então tratei de sorrir e desci as escadas encontrando todos na cozinha, a Ana e o Felipe, a Carol e o Fernando e demorei apenas alguns segundos pra ver o Felipe conversando com o Henrique também. Meu coração quase sai pela boca. O Henrique estava ali. — Cíntia. — Ele disse, caminhando em minha direção. E, sem pensar, encurtei a distância entre nós, passando os braços ao redor de seu pescoço quando ele finalmente chegou perto.— Não consigo acreditar que você está aqui. Quando chegou? — Perguntei, minha voz refletindo uma mistura de surpresa e alívio. Ele sorriu e, com um movimento suave, passou os braços ao redor de minha cintura, me puxando para um abraço apertado.— Eu cheguei mais cedo em BH, estava resolve
Quando voltei à cozinha, peguei o sal e mostrei para a Carol onde ele estava. Fernando estava ao seu lado, e lembrei que ele queria me dizer algo mais cedo na fazenda, mas eu estava tão exasperada com ele e com o Felipe discutindo sobre a reforma que não quis ouvir. — Era sobre a minha mãe que você queria me avisar, não era, Fernando? — Perguntei, tentando soar tranquila enquanto o olhava. Ele assentiu, a expressão dele mais séria. — Sim, Cindy. Eu queria te avisar que minha tia estava na cidade, mas não sabia que ela ia te procurar. Me desculpe por não ter falado antes. Eu respirei fundo, tentando processar o que ele estava dizendo. A culpa não era dele, mas me vi refletindo sobre como as coisas poderiam ter sido diferentes, talvez se eu tivesse dado mais atenção a ele. — Está tudo bem. Eu é que não quis te ouvir. Talvez, se eu tivesse prestado mais atenção, teria me preparado psicologicamente para esse reencontro. — Falei, mais para mim mesma do que para ele, enquanto tenta
— Cindy, estou precisando de uma arquiteta para auxiliar na decoração do novo escritório. — A voz de Henrique soou enquanto eu saía do banheiro, ainda enrolada no roupão. Já era manhã, mas o dia ainda começava devagar. A luz suave invadia o quarto pelas frestas da cortina, e o cheiro do café que Henrique havia pedido subia pelo ar. Eu precisava voltar para a fazenda; hoje era um dia importante para a reforma do casarão, com a chegada de materiais que eu precisava conferir. Ainda assim, a proposta dele ficou martelando na minha mente enquanto eu caminhava em direção à cama. Henrique já estava perfeitamente arrumado. Ele vestia uma camisa social azul clara, levemente ajustada, que destacava os ombros largos e a postura confiante. Era como se ele tivesse saído de uma daquelas capas de revista que eu sempre achava exageradas, mas nele fazia sentido. Ele parecia… natural. — O que foi? — perguntou, com um sorriso discreto nos lábios, percebendo meu olhar. — Nada — respondi, balançan
PrólogoA luz da manhã entrava pela janela, mas eu não conseguia sentir seu calor. Sentada na cama desfeita, o silêncio da casa parecia ecoar as palavras que eu não conseguia pronunciar. O coração ainda pulsava acelerado, e a imagem dele, a expressão de desespero e culpa, se repetia em minha mente.“Cíntia, eu nunca quis que você soubesse assim.” As palavras soavam como uma lâmina, cortando o que restava da confiança que construímos ao longo dos anos. A traição não era apenas um ato; era um golpe na alma, uma reviravolta que eu nunca poderia ter imaginado.Levantei-me e fui até a janela, observando a fazenda que agora era tudo o que eu tinha. A terra que um dia parecia um lar agora era um campo de batalha entre o que fui e o que precisava me tornar. Eu fui a esposa obediente e boazinha, mas isso não tinha me levado a lugar nenhum.Lembrei-me das promessas feitas, das risadas compartilhadas. A lembrança do meu ex-marido me enchia de raiva. Por muitas vezes, me questionei onde eu havia
A cidade de Belo Horizonte parecia mais caótica do que nunca naquela manhã. Eu dirigia, tentando ignorar os pensamentos que me atormentavam, quando um carro preto surgiu do nada, fechando meu caminho. — Que idiota! — gritei, o coração acelerado pela raiva. Olhei para o motorista, um homem com expressão confusa, e não pude deixar de me sentir insultada. A última coisa que eu precisava era de mais um estresse. Ele não me viu, mas o olhar que lancei em sua direção foi suficiente para saber que aquele cara não tinha ideia do que estava fazendo. Dirigi em frente, segurando o volante com força, tentando acalmar a tempestade dentro de mim. Um segundo depois, avistei um estacionamento e parei lá. Ao estacionar, respirei fundo e saí do carro. O ateliê da Carol estava logo à frente, e a ideia de vê-la me deixou animada. Ela também mencionara que o advogado que poderia me auxiliar na partilha dos bens chegaria hoje. Era hora de esquecer a raiva por alguns minutos. Empurrei a porta do ate
HenriqueA viagem para Belo Horizonte não era algo que eu esperava fazer tão cedo. Receber o convite da Carol para ajudar uma amiga sua foi uma surpresa, mas recusar? Isso não estava em meus planos. Eu devia isso a ela. Ao mesmo tempo, havia uma inquietação que eu não podia negar, um nó no estômago que me acompanhava desde que recebi a mensagem.Carol e eu tínhamos terminado há muito tempo, mas estar na mesma cidade que ela, sabendo que ela tinha seguido em frente, era algo que eu ainda precisava processar. Afinal, nem sempre um término é tão simples. Ainda mais quando nem houve um relacionamento de fato. Não era o que ela queria; mais tarde eu percebi que ela gostava do Fernando, e essa revelação ainda doía, mesmo que eu tentasse ignorar.Quando ela me pediu ajuda com questões legais, minha primeira reação foi hesitar. Aquelas antigas emoções ainda persistiam, como sombras que eu pensava ter deixado para trás. Talvez orgulho, ou apenas o incômodo de saber que ela estava bem e seguind
Sinto minha cabeça latejar e mal posso acreditar que isso esteja acontecendo comigo. — Saia daqui agora! — falo, tentando manter a compostura, embora minhas mãos estejam tremendo de forma incontrolável. Olho para a mulher à minha frente que exibe um sorriso cínico no rosto, mas sabia que a única coisa que ela estava fazendo era tentar me desestabilizar. Ela sabia exatamente onde atacar. — Cíntia, é egoísmo da sua parte querer ficar com uma propriedade deste tamanho quando o Alonso e eu só queremos construir nossa família juntos. E é claro que esse é o lugar mais adequado para isso. — Júlia olha ao redor, como se já pudesse visualizar tudo. — Já até imagino os filhos que teremos, frutos de muito amor, correndo por essa sala gigantesca. Meu coração parece apertar no peito. Não sabia como Júlia havia conseguido entrar dentro da propriedade, mas também não era tão difícil. Eu não possuía um sistema de proteção com seguranças como a fazenda Belmonte, mas sabia que precisaria da ajuda