Está brincando?

Rio sem humor, Vitalli não é o tipo de pessoa que faz piadas. É natural que elas sejam tão ruins. Afinal ele não pode estar querendo dizer o que eu acho que ele disse. Como você pode imaginar, o CEO do grupo Vitalli, teve múltiplas viagens internacionais de negócios nesse último um ano que estive trabalhando para ele. Porém, nunca fui levada em nenhuma delas. Na verdade, quem ocupava a função de secretária em suas viagens era Rachel, secretaria de relações internacionais.

Continuei parada encarando-o estática. Esperando o momento em que ele dira o quão tola eu era por cair em sua brincadeira.

— Ainda aqui? — pergunta olhando-me de soslaio.

—Desculpe, mas está dizendo que eu tenho que ir com você? Não é uma viagem pessoal? — questiono.

— Se fosse uma viagem pessoal não estaria solicitando a sua presença — ele disse encarando-me friamente.

— Mas e a Rachel? Ela comparece em eventos internacionais— rebato.

— Até onde sei seu contrato abrange fins de semana e viagens ao exterior — lembrou-me.

Tento dizer algo, mas nada sai. Ele está completamente correto. Teoricamente, pelo menos, está entre as minhas funções acompanhar Vittali onde quer que ele vá e atender qualquer uma de suas exigências, sem conseguir reclamar, afinal está no meu contrato, e não posso reclamar de uma virgula nele, graças ao time absurdo de advogados que a Vittali formou após o desastre do contrato com a Virgilla, uma influencer da internet metida a maquiadora, que ganhou uma indenização absurda da marca, ninguém nunca mais ganhará um centavo da Vittali em tribunais. Com isso em mente engulo o meu ódio profundo por Vittali e respondo.

 — Sim, senhor — antes de deixar a sala.

Sento-me na minha mesa como se fosse feita de chumbo. Em uma mistura contrastante de emoções. Reconheço que uma viagem de negócios para uma ilha paradisíaca não é muito bem uma maldição. Na verdade, posso até pensar nisso como um presente divino. Quer dizer, sempre quis sair do país e conhecer outros lugares, é a minha oportunidade. Não exatamente é como eu sonhei. Afinal, Vittali estará lá e fará tudo possível para que não fique um segundo relaxando. Pelo menos, não nas horas determinadas pelo contrato como horário de serviço, mas é um preço pequeno a se pagar por uma viagem grátis. Mudando completamente de humor caço meu celular na primeira gaveta da minha mesa, afinal não posso mantê-lo comigo usando a saia social lápis cinza que é quase o meu uniforme de trabalho. Assim que tenho o aparelho em mãos abro a conversa com Sofia, ignoro os diversos memes aleatórios que ela me mandou nos últimos minutos e começo a pensar em como contá-la a incrível notícia. Poderia esperar para vê-la em casa, mas estou prestes a explodir em tamanha alegria. Posso começar com uma charada ou contar diretamente. A charada.

“O que é, o que é? Que tem cinco membros e voa.” Mandei sentindo-me engraçadíssima. Confesso que vários momentos tenho a mentalidade digna da 4° serie.

“Não me diga que encontrou uma barata” ela respondeu nem um minuto depois. Essa desocupada. Sofia trabalha em home office, ou seja, tem muito tempo livre, é o trabalho dos sonhos, ela faz seu próprio horário, não tem que viver em metros lotados, e principalmente, não tem Vittali como chefe. Como disse, emprego dos sonhos.

“Tenho quase certeza que baratas tem mais que quatro pernas, não importa, errou! Te darei mais uma tentativa” digitei.

“Quem se importa com quantas pernas tem essas coisas. Poderiam ser exterminadas de uma vez. Não me diga que vai viajar a negócios” ela mandou. Meu sorriso morreu.

“Como adivinhou?” questionei frustrada.

“Está me mandando mensagem no meio do seu expediente só podia ser algo fantástico” respondeu.

“Certo, mas como sabia que era de negócios? Nunca fui em uma viagem de negócios” rebati.

“Também, nunca foi pagando. Com suas economias só se tivesse ganhado na megasena. Nesse caso a charada seria, quem tem quatro pernas e acabou de ficar milionária?” apareceu na notificação no topo da tela quase três minutos depois.

“Ei! Está insinuando que não sou criativa com charadas?” respondo indignada.

“Você é PÉSSIMA com charadas.” Ela rebate e consigo imaginar seu tom de voz arrastado na palavra péssima.

“De qualquer forma, vista algo legal, vamos comemorar” digitei.

“Pelo jeito a viagem é para um lugar legal em.....................” ela fez questão de mandar vários pontos no final.

“Digamos apenas, que finalmente este emprego me dará uma recompensa por toda essa luta diária” mando vários emojis de comemoração.

“Detalhes mais tarde, beijos” coloco rapidamente o aparelho de volta a gaveta. Automaticamente voltando os olhos para a câmera de segurança. Sei que isso me torna ainda mais suspeita, mas é quase inevitável. Outra das regras de Vittali. Uso de celulares pessoais, durante o expediente, a menos que seja de extrema emergência, é proibido.

O resto da tarde respondi diversos e-mail, dei andamento a algumas solicitações de Vittalli. Pode pensar que são coisas simples. Pelo menos deviam ser, mas fiquei duas horas no telefone, porque um grupo de incompetentes direcionou um grupo de produtos para o endereço incorreto. Estes que tem data marcada para chegar no lançamento na nova coleção a tempo. Normalmente o manejo de produtos não é uma das funções de uma secretária. Contudo, quando o CEO da marca decidiu cuidar disso pessoalmente, isso significa que bem, eu cuidarei disso. Sendo assim, o restante do meu dia voo, se quer tivesse tempo para reler o contrato, que ele me mandou refazer.

Desta vez, estava animada demais para ficar fazendo isso após o horário. Estava merecendo uma comemoração e fui a pessoa que marcou, seria péssimo furar de novo. Ouvir um sermão de uma hora sobre como estava desperdiçando minha vida no escritório, é algo que quero evitar ter que passar novamente. Sofia é maravilhosa a grande parte do tempo, mas quando o assunto é minha saúde e bem-estar, ela é pior que minha mãe. Não que precise de muito. Os meus pais sempre foram bem ausentes. Mudando de assunto.

Quando vejo no relógio do computador que meu expediente acaba em cinco minutos. Começo a guardar os meus utensílios básicos de sobrevivência no escritório: garrafa de água, óculos de descanso, espelho para retoque de maquiagem, agenda, remédio para dor de cabeça, coisas deste tipo. Assim que depositei o último item dentro da bolsa escuto um som estralado, demostrando que algo foi depositado em minha mesa.

—Espero que esteja retocando a maquiagem — a voz irônica, já me causa um arrepio de ódio.

— Desculpe? — emito confusa e percebo a pasta recém colocada — O expediente acabou — lembro-o.

— A cláusula 17 do seu contrato pontua que suas atividades empresariais só terminam quando seu superior, no caso eu, a libera de seus deveres. Como estou com uma viagem marcada preciso que isto esteja resolvido antes de amanhã — ele aponta a pasta.

Sinto o meu sangue ferver. É como se ele soubesse que tenho planos e sempre surgisse com uma tarefa.

— Algum problema? — ele pergunta completamente ciente que tinha me atingido. Cruzando os braços sob o peito e me analisando, como se desafiasse-me a proferir uma queixa. Dando-me vontade de soca-lo. Vontade que se perde ao analisar sua postura com mais atenção. Os músculos do braço dele parece ainda maiores. Sua aura esnobe, porém, máscula me atinge com força. Causando meu modo de defesa e ela, que é, me encolher e concordar. Assim ele vai embora.

Continue lendo no Buenovela
Digitalize o código para baixar o App

Capítulos relacionados

Último capítulo

Digitalize o código para ler no App