Encontros

— Algum problema? — ele pergunta completamente ciente que tinha me atingido. Cruzando os braços sob o peito e me analisando, como se desafiasse-me a proferir uma queixa. Dando-me vontade de soca-lo. Vontade que se perde ao analisar sua postura com mais atenção. Os músculos do braço dele parece ainda maiores. Sua aura esnobe, porém, máscula me atinge com força. Causando meu modo de defesa e ela, que é, me encolher e concordar. Assim ele vai embora.

—Certo, senhor! — digo pegando a pasta. Percebo a mesma reação padrão dele, de quando atinge seu objetivo, seus olhos perdem o foco e ele os desvia de mim, antes de deixar o cômodo voltando para sua sala.

Atrasada invado o pub, como de costume correndo, seguindo diretamente para nossa mesa favorita, próxima a janela lateral. É um lugar bacana, geralmente tem a quantidade perfeita de movimento, algo entre barulhento o suficiente para precisar elevar o volume da voz para ser ouvido, mas não cheio ao ponto de ser necessário cuidado para não esbarrar nas pessoas ao caminhar. A música é sofisticada e permanece apenas como um pano de fundo.  Enquanto me aproximo, identifico Sofia já sentada, há um copo de suco pela metade na sua frente. Também pediu algo para comer e já terminou, permanecendo apenas a louça branca suja. Ela não me nota, pois tem seus olhos presos ao celular. Pela sua feição, está acostumada a esperar. Deixando-me ainda mais envergonhada. É difícil pensar ela me conhece tão bem, a ponto de não se dar ao trabalho de mandar uma mensagem, mesmo que esteja mais de uma hora atrasada. Questiono-me se ela chegou a sair mais tarde de casa, já imaginado o meu atraso, ainda que tenha vindo diretamente do trabalho. Em geral a culpa não é minha, mas do Vitalli. Se digo para qualquer pessoa que tenho o pior chefe da Terra, a maioria julga-me como dramática, por sorte, Sofia me entende nesse quesito.

Quando puxo a cadeira para me sentar, ela finalmente nota a minha presença. Ela deixa o celular sob a mesa.

— O que ele te mandou fazer desta vez? — ela questiona, uma raiva velada no fundo do olhar.

— Nada demais, terminar uma pilha de contratos. Segundo o chifrudo, como tem a tal viagem, tinha que fazê-los hoje. É claro que ele estava apenas me punindo por ter feito o que a mãe dele pediu— disse, olhando rapidamente para o cardápio digital. Já sabendo o meu pedido.

— Esse cara precisa de terapia — Sofia comenta.

Concordo com a cabeça. Fechando meu pedido no App. Deixando o telefone de lado também.

— Falando na tal viagem. Agora temos tempo. Conta direito como foi? — ela pediu.

— Então...basicamente, a mãe Vitalli ligou para o chifrudo, aparentemente o meio-irmão dele vai se casar em alguma ilha nas Bahamas e ele não tinha confirmado a presença para o pai — disse.

— Espera! Está me dizendo que você vai em uma viagem super chique para as Bahamas? — Sofia tem um mini surto.

— É é — emito desanimada. Se conheço minimamente Vitalli tenho certeza de que ele encontrará uma maneira de tornar essa viagem um inferno.

— Não me diga que não está surtando. Amiga é sua chance de encontrar o amor da sua vida. Um amor riquíssimo. Bahamas é tipo o ponto de férias favorito dos bilionários. Além disso é um casamento, costumam se formar novos casais em casamentos. Talvez um primo do Vitalli — ela comenta.

— Dá família Vitalli, eu quero distância — rebato.

— Não se precipite. Não esqueça que o capeta era um anjo. Pode ser o que os primos sejam completamente diferentes — Sofia diz.

—Prefiro não manter essa esperança — disse antes de me virar para agradecer a garçonete que trouxe o meu hamburguer. Começando a comer, já meu estomago reclamava há horas.

— Você nunca mantém a esperança.

­­­­— Claro que mantenho — reclamo.

— Que tal você ir nessa viagem sem pensar tanto sobre tudo? Acho que se fizer isso já terá um GRANDE efeito — ela diz.

— Do jeito que você diz parece que sou a pessoa mais racional do mundo — rebato.

— Não diria racional, mas sistemática — ela disse rindo.

Bato no seu ombro e pedimos uma rodada de café. Sim, Café. Nunca fui de acompanhar aqueles ao meu redor. Enquanto todos aos nosso redor estavam se enchendo de álcool nos duas riamos como louca após uma xicara de café. Este que só era servido porque o garçom, Marcos, nos conhecia dês da época da escola.

[...]

A última coisa que me lembro daquela noite, é de rir até cair no sono no sofá de Sofia, depois de passarmos horas conversando sobre nossa tragicômica vida amorosa. Sofia dizia que jamais esperava ainda estar solteira com quase 30 anos. Agora, eu, a romântica, pensava estar casada aos 20 anos, contudo, meus sonhos nunca saíram muito bem como imaginado. Posso dizer que por linhas tortas e com muitas quebras de expectativas estava vivendo o sonho profissional, com uma pedra no caminho, definitivamente, uma pedra bonita e com músculos de dar inveja, mas ainda assim uma incomoda pedra, com milhões em sua conta bancária e poder para acabar com a vida de uma simples secretaria.

Se pensava que no dia seguinte, ou no restante da semana, teria minha paz restaurada, e Vitalli sentiria um mórbido prazer por ter acabado com a minha noite, e assim, seguisse sem mais torturas, estava redondamente enganada. Além da pilha de trabalho extra que o tal me obrigou a lidar, deixando claro nosso prazo apertado, ele também teve a audácia, de passar uma lista com diversas outras tarefas que não cabiam naturalmente a mim.

Quando digo isso, quero dizer, uma longa lista de afazeres bobos e banais, que deixavam nítida a sua real intensão, me punir por me meter em sua vida pessoal. Afinal se antes Vitalli me dava esporadicamente essas missões, agora ele tinha ido além de sua cota pessoal. Tive que pegar seu café favorito a semana toda, também fiquei responsável pelo seu almoço e jantar. Jantar? Sim. Fiz as reservas de cada um deles. Vitalli jantou em restaurantes chiques todas as noites, mesas para dois. Não era difícil concluir que estava fazendo jus ao estereótipo de bilionário galinha. Eu tive o desprazer de conhecer algumas de suas parceiras de uma noite, garotas diferentes em cada dia da semana. Questionei, se estivéssemos permanecido na cidade veria alguma novamente, suspeitava que não. Pelo que vi, havia apenas um padrão, nenhuma delas era loira. Tudo bem, tinha vários padrões: todas eram mulheres jovens, bonitas, ricas, bem-sucedidas, contudo, notar que nenhuma delas era loira me deixou confusa.

É por isso que ele me odeia? Porque sou loira.

Continue lendo no Buenovela
Digitalize o código para baixar o App

Capítulos relacionados

Último capítulo

Digitalize o código para ler no App