Nelly
Nove antes.
Meu estômago está embrulhado, minhas mãos suadas e estou falhando na missão de não chorar em público. Este é o meu primeiro dia no ensino médio e me esforcei para que fosse diferente dos outros anos, mas fui ingênua e estou pagando pelo meu erro. Os olhos ávidos dos meus colegas vagueiam por toda sala até chegarem em mim, eles estão sendo sutis, tomando cuidado em camuflar a maldade e preconceito em seus olhares e expressões, porém, vacilam ao não se preocuparem em disfarçar os risinhos e cochichos.
Posso ouvir cada piadinha.
Mamãe estava certa ao falar que meu cabelo seria apenas mais um atrativo para o bullying, eu deveria tê-la ouvido quando disse que ser gorda já era ruim o suficiente, eu teria que colaborar ou as pessoas teriam motivos para rir de mim. O pintei de rosa na tentativa de parecer diferente, descolada, mas me sinto com uma aberração.
Deslizo mais em meu assento, tentando me esconder dos olhares debochados. Mantenho minha cabeça abaixada, evitando contado direto com qualquer um deles, porque assim é mais seguro. Contenho a vontade de levantar e sair correndo, porém não posso fraquejar logo no início do ano, minha experiência me ensinou que ações assim só pioram a situação.
Então, engulo tudo calada.
Ouvi falar que o ensino médio era horrível por vários motivos, mas imaginei que a convivência com crianças mais velhas seria melhor pela maturidade, doce engano. Eles não ficam rindo e apontando, inventando apelidos infantis, fazem muito pior, te menosprezam apenas com o olhar.
— Olha o cabelo dela. — Uma menina fala, não se preocupando em camuflar seu tom de aversão.
Alguém rir.
— Ela parece a junção de um boto rosa com baleia. — O cometário maldoso desencadeia uma série de risadas altas, fazendo com que eu me encolha ainda mais no assento.
Meus olhos queimam para expulsar as lágrimas que se formam, mas me recuso a chorar.
Eu não vou chorar.
Eu não vou chorar.
— Eu acho que ela comeu o boto. — Um menino comenta, causando uma nova explosão de risada nos demais e travo na cadeira, sentindo minha pele queimar pela humilhação.
Levanto as vistas para observá-lo, ele está apenas duas cadeiras de mim, rindo junto do pequeno grupo de seis pessoas. Ele é alto e moreno, mas não deve ter mais de quinze anos como eu. Seu olhar vira para minha direção no momento que estou fazendo uma análise detalhada de sua aparência, um som de surpresa deixa minha boca quando as íris prateadas me encaram intimidante, para minha surpresa ele não desvia o olhar do meu, fazendo meu coração acelerar caloroso.
— Edu, você me ouviu? — A menina ao seu lado pergunta, chamando sua atenção pra ela.
Então, ele desvia, mas não antes de me dá um sorriso de lado, piscando junto. Pisco várias vezes em seguida, tentando entender o que acabou de acontecer.
— Tem alguém sentado aqui? — Uma voz feminina pergunta, então olho para o lado e vejo que está se direcionando a mim.
A olho intrigada, ela é a primeira que trocou qualquer palavra comigo até agora.
— Não... — Sussurro.
Ela sorrir simpática, parecendo agradecida, então se senta ao meu lado sem cerimônia.
— Qual o seu nome? — Pergunta, demonstrando um real interesse ao me olhar.
Me mantenho em silêncio alguns segundos, tentando decifrar o motivo pelo qual ela está falando comigo. Desço meus olhos por seu corpo magro, esguio como mamãe gostaria que o meu fosse. Os cabelos cor de mel são longos e chegam quase ao meio de sua cintura, o rosto pequeno e oval lhe traz uma imagem de nobreza. Ela é perfeita demais para falar comigo.
— Desculpe, deixa eu me apresentar primeiro, me chamo Alice. — Fala, estendendo sua mão para que eu pegue.
Crispo o cenho, ainda não entendendo sua atitude.
— Nelly... meu nome é Nelly. — Digo, pegando em sua mão.
Ela assente, sorrindo pra mim. Abre a boca para falar algo, mas sua atenção recai na direção da entrada, suas pupilas se dilatam e um burburinho começa.
Olho na mesma direção que ela olha e quase perco o fôlego quando o vejo, todo de terno e gravata, parado bem no meio da porta.
Ele parece um Deus grego de tão bonito, tirado dos meus livros favoritos.
— Bom dia, classe C. — Sua voz sai rouca, aveludada e todo mundo se silencia para observá—lo adentrar a grande sala.
Ele se encaminha sem pressa para a única mesa presente no recinto, deixando claro o que já imaginávamos, ele é o novo professor de história que a diretora informou que chegaria hoje.
Ele põe sua bolsa de lado sobre o metal da mesa sem muita formalidade, mesmo sendo observado por todos os trinta alunos presentes.
— Vamos começar as apresentações. Eu vou chamar pelo nome de vocês seguindo a ordem alfabética, na sua vez, cada um vai se apresentar e dizer o que espera das nossas aulas esse ano.
A turma faz algazarra, soltando gritinhos de protestos.
— Aqui todo mundo já se conhece. — Alguém afirma, mas o homem nos encara irredutível.
Por dentro estou me tremendo toda, odiando sua ideia. Sempre fui ruim com interações, a exposição me deixa nervosa e insegura. Sou um alvo fácil para os mais diversos comentários preconceituosos.
— Serei o primeiro. — O homem fala, seguindo para o centro do lugar.
Aproveito que todos estão distraídos e passo meus olhos sobre meus colegas, traçando seus perfis e não me surpreendo ao encontrar algumas garotas na mesma situação que eu, estupefata pela beleza madura do homem.
— Me chamo David Bragança, serei o melhor professor que vocês já tiveram o prazer de conhecer. — Suas palavras causam euforia, fazendo com uivos e assovios tomem conta do ambiente.
Então, as apresentações se iniciam. Ele vai chamando nome por nome até chegar minha vez, o constrangimento me invade quando sua boca diz meu nome repetidamente pela segunda vez e eu continuo o encarando em silêncio.
Começo a hiper ventilar, sentindo minhas mãos geladas e minha boca secar.
— Senhorita Leitão, é a sua vez. — Sua voz sai seca e direta, mas ainda atenciosa e risos explodem por toda a sala.
Meus olhos voltam a lacrimejar.
O homem encara o bando de adolescentes como se fossem habitantes de outro planeta, franzindo a testa com indignação e raiva.
— Leitão, combina com ela. — Carlota, a mesma garota que comentou sobre meu cabelo mais cedo volta a falar, rindo do seu próprio comentário.
Ameaço levantar da cadeira, sufocando com o choro preso, mas Alice me prende pelo ombro, dando a entender que não me deixará partir. Olho com desespero em sua direção, implorando para que me liberte de seu aperto e encontro suas íris pretas como carvão ressentidas, cheias de raiva.
— Não fuja, isso é tudo que eles querem. — Diz, apontando na direção do pequeno grupo na qual o tal Eduardo parece fazer parte com a cabeça.
Não saio, mas sinto a água salgada inundar minha visão.
— Contei alguma piada? — O sr. Bragança volta a falar, parecendo verdadeiramente irritado, apesar de usar um tom frio para falar.
Aos poucos os burburinhos e risos se dissipam, embora eu mantenha minha cabeça abaixada para evitar contato.
— Nelly? — A voz aveludada pronúncia meu nome, arrastando a primeira sílaba por tempo demais. Pressiono minhas unhas contra minha palma.
Não o respondo, ele insiste mais uma vez e então ergue meu rosto pelo queixo.
— Você pode se apresentar? — Pergunta baixo, olhando—me com atenção.
— Não...— Sussurro.
Ele assente, não insistindo e volta para seu lugar perto da mesa.
— Bem, quero apresentar pra vocês quem provavelmente será uma das minhas melhores alunas, Nelly Álvares Leitão. Seu currículo é impressionante, querida.
Ele pisca pra mim quando pronuncia o final.
Meu peito se enche de emoção, asas de borboletas causando reboliço no meu estômago, ele está me defendendo.
Ele me defendeu!
Nelly As aulas se passam rápido, fazendo com que o horário de ir embora chegue rápido e espero que todo mundo deixe a sala para que eu possa fazer o mesmo, ando em passos apressados pelo corredor, pedindo em minha mente que Tião já esteja lá fora me esperando.Os dias se passaram rápido e estávamos adentrando o segundo mês de aula, tenho me mantido camuflada todo esse tempo, tentando passar despercebida entre o aglomerado de alunos da escola Carmen Lúcia. Embora, Alice insista uma proximidade constantemente e eu sinta que suas intenções são verdadeiras, me mantenho afastada, não acredito que alguém como ela queira ser minha amiga de fato.Quer dizer, olha para mim?Gorda e Feia.Ninguém realmente gostaria de ser visto comigo.Apresso meus passos, apertando a alça da mochila quando passo pelo grupinho de Edu, felizmente em alguns momentos como agora eles ignoram a minha presença.Em alguns momentos.Minha felicidade dura pouco, três passos de distância e Carlota finalmente nota minha
Alguns anos depois... David Sentindo minhas mãos suarem e meu coração pesar a cada passo, rogo para ser um terrível engano, algum trote de um desalmado qualquer. A sirene da ambulância entorpece meus sentidos, dificultando um pensamento lógico e tenho que me dividir entre ignorar o barulho agoniante e continuar abrindo caminho. No entanto, o aglomerado de pessoas continua impedindo minha passagem, fazendo com que eu tome a atitude drástica e desesperada de sair empurrando até chegar o local do acidente. Caídos sobre a BR-33, que liga São Vicente à Arapuna, estão os corpos sem vida da minha mulher e filho, preciso piscar algumas vezes para acreditar no que meus olhos me mostram. Tendo a certeza de que não é um terrível pesadelo. Uma dor imensurável toma minha alma e um rugido alto deixa minha garganta, chamando a atenção dos curiosos. Ignoro os olhares penosos que começam a me dar e chego mais perto do meu filho e esposa. Descartando os avisos do policial, pego meu primogênito nos b
Dias atuais…NellyEm um único dia discuti com minha mãe, enfrentei meu maior medo de falar em público e apresentei meu trabalho de conclusão de curso, recebendo nota máxima. U-hhull!!! Finalmente jornalista. Nada poderia amargar minha felicidade, exceto, claro, ceder ao jogo de persuasão da minha progenitora e me internar em uma clínica de emagrecimento, conhecido como spa.Patético, eu sei. Como uma mulher de vinte e quatro anos pode ceder aos caprichos da mãe e jogar fora anos de amor próprio?Mas que amor próprio? É isso.Repito constantemente o quanto sou maravilhosa para meu reflexo no espelho, mas todos os minutos gastos alimentando minha autoestima caem ao chão quando encontro Kaciana, a mulher que me trouxe ao mundo e faz careta sempre que a chamo de mãe. Ela consegue com um olhar derrubar todos os muros de confiança que levei anos para construir, cada maldita vez que me sinto bem, ela vem e acaba com todas as minhas fantasias.— Queremos tudo o que temos direito, Rô. — Kacia
DAVIDEsforço-me para não contestar as ordens de Dona Hordéllis e mantenho o sorriso no rosto, agindo com gentileza cada vez que uma de suas amigas tenta uma aproximação mais íntima e intrusiva. Inferno. Falta um ano para que alcance os quarenta e estou aqui, sendo tratado como um adolescente que precisa ser disciplinado.Ela não pode exigir mais do que isso. Não pode.— Você não está sorrindo. — Reclama para que apenas eu escute e não deixo de gemer, vendo que sim, ela sempre pode exigir mais.Intercepto um garçom e pego duas taças de champanhe, virando uma atrás da outra.— O quê? — Pergunto, quando a vejo me olhar em reprovação.Ela comprime os lábios em uma linha fina e balança a cabeça em negativa, bufando baixo para não chamar atenção, mas me olhando de forma carinhosa logo depois.— Só quero a sua felicidade, meu querido. — Sorrio de forma sincera, dando-lhe um beijo no meio da testa.— Eu sei, minha vida. — Ela enxuga uma lágrima solitária e dá três tapinhas na minha mão, se a
NELLYEntro no banheiro bufando pelas narinas, permitindo que a porta bata sem nenhuma delicadeza e assustando outras convidadas da festa que revisavam suas maquiagens. Murmuro um pedido de desculpas esfarrapado e bufo sem perceber de tão irritada, seguindo direto para uma cabine privada dentro do banheiro e me tranco.— Argh! Como ele pode ser tão cretino? — Falo pra mim mesma, baixando a tampa do vaso sanitário e sentando. — Você não lembra de mim, Sr. Bragança? — Desdenho, adotando um tom debochado e três oitavos mais baixo que eu meu.Bufo.Droga, Nelly!Isso é tudo culpa sua, você aceitou vim até esse coquetel mesmo sabendo que se tratava da festa de aniversário da empresa dele.O que você esperava? Flores e beijos ardentes?Acorda!Passo as minhas duas mãos pelo rosto, percebendo que continuo o tratando de forma formal, dando a ele o poder de superioridade de anos atrás. Sr, Bragança. Pressiono meus lábios um no outro até formarem uma linha fina e passo a abanar meus rosto com
DavidObservo em expectativa o ponteiro menor encontrar o maior em cima do número nove, indicando que não há motivos para minha irritação continuar e como imaginei, ela não vem.Ela não vem...Ela não vem.Ótimo. Um sorriso repuxa meus lábios e dou adeus ao mau humor, quase me levantando para dar saltinhos de felicidade. Começando a ter uma nova perspectiva sobre a manhã infernal que estou tendo desde que acordei.— Sr. Bragança, tem uma jovem aqui querendo vê-lo. — Leila diz do outro lado do telefone assim que o atendo, não esperando sequer que eu tome a primeira fala. — Permito que entre, senhor?Pisco algumas vezes, checando meu relógio de pulso e vendo que não passou mais que um minuto desde a última vez que o chequei. — Quem é a moça, Leila? — Indago, apesar de já desconfiar de quem seja. Minha secretaria faz uma pausa em sua fala e tudo que posso ouvir são sussurros do outro lado da linha. — Leila? — Tento chamar sua atenção.— Senhorita Álvares, senhor. Ela disse que tem horár
NELLYO prédio Bragança é de longe o lugar mais luxuoso e moderno que já estive, nem mesmo a agência que eu trabalhava tinha tanta personalidade em sua arquitetura e decoração, mas isso não impede a sensação de falta de ar que estou tendo desde que saí de casa essa manhã, na boa, eu não sei o que deu em mim para aceitar essa proposta. Ficar perto dele não vai me fazer bem. Então, o que diabos estou fazendo aqui?Você é masoquista. Minha consciência tira sarro e reviro os olhos. Megera.
DAVIDA escuridão tornou-se meu abrigo, o álcool meu melhor amigo, mas o sexo, porra, este é o meu anestésico favorito.Empurro sem piedade contra a ruiva fogosa, sorrindo ao ouvir seus gemidos luxuriosos e engancho minha mão em seu cabelo, puxando até que ela fique de joelhos, encostando suas costas no meu peito. Mordo seu ombro, pescoço e bochecha. Ela empurra de volta e rosno, gostando da sua safadeza.A mulher é experiente, sabe exatamente do que um homem gosta na cama e isso me agrada.— Você não vai me falar seu nome? — Diz sedutora, me olhando através do espelho na parede. Estamos em um quarto de motel qualquer, trancados há quase três horas e a mulher acha que já somos íntimos. Deslizo meu dedo pela sua barriga até chegar em sua boceta, acaricio seu clitóris enquanto enfio cada centímetro da minha rola para dentro dela.— Meu nome não importa agora, linda. Você está tomando meu pau na sua boceta apertada e está gostando. — Ela geme em resposta, provando o meu ponto e meto com