Dias atuais…
Nelly
Em um único dia discuti com minha mãe, enfrentei meu maior medo de falar em público e apresentei meu trabalho de conclusão de curso, recebendo nota máxima. U-hhull!!! Finalmente jornalista. Nada poderia amargar minha felicidade, exceto, claro, ceder ao jogo de persuasão da minha progenitora e me internar em uma clínica de emagrecimento, conhecido como spa.
Patético, eu sei. Como uma mulher de vinte e quatro anos pode ceder aos caprichos da mãe e jogar fora anos de amor próprio?
Mas que amor próprio? É isso.
Repito constantemente o quanto sou maravilhosa para meu reflexo no espelho, mas todos os minutos gastos alimentando minha autoestima caem ao chão quando encontro Kaciana, a mulher que me trouxe ao mundo e faz careta sempre que a chamo de mãe. Ela consegue com um olhar derrubar todos os muros de confiança que levei anos para construir, cada m*****a vez que me sinto bem, ela vem e acaba com todas as minhas fantasias.
— Queremos tudo o que temos direito, Rô. — Kaciana pisca para o massagista, em uma intimidade tão exagerada que me deixa desconfiada.
— Pode deixar, bela. — O homem pisca de volta, virando para pegar um óleo aromatizante na mesinha perto da maca. O estudo agora com curiosidade, não deixando passar a maneira despreocupada com que se move.
Ele me olha dos pés a cabeça quando vira de volta, como se tivesse notado minha presença apenas agora e tenho que apertar o roupão ao meu corpo sobre seu escrutínio nenhum pouco profissional. Ele sorrir de lado, um sorriso que não me agrada em nada.
Meu celular vibra da bolsa e o pego, deixando de lado minha mãe e o massagista. Sorrio ao ler a mensagem da minha melhor amiga, única, na verdade.
Alice está fora do país tem dois meses, foi disputar uma competição de esgrima, me enchendo de orgulho por correr atrás dos seus sonhos e não se importar com todas as dificuldades que o esporte, ainda pouco falado, enfrenta diariamente. Ela não ligou quando foi a única mulher nas aulas, peitou todos os cara e os venceu um a um, embora ela venha de uma família rica, seus pais são antiquados e preferiam vê-la casada e com filhos.
"SEM CHANCE!"
Ela me responde e um sorriso brota em meus lábios, a contei que estou em um SPA com mamãe para emagrecer alguns quilos. Alice sempre detestou como Kaciana me trata, muitos vezes elas entraram em discussões fervorosas por minha causa, minha amiga sempre intervindo quando mamãe fazia algum comentário maldoso sobre meu peso, para Alice meu corpo é lindo, e desde que eu esteja me alimentando bem e saudável o resto não importa. Sempre intervim, no entanto. Apesar de tudo, Kaciana é minha mãe.
" Não é tão ruim, aqui tem sauna e massagem. "
Envio pra ela.
— Guarde o celular, Nelly. Aposto que está falando com aquela garota insuportável. — Kaciana reclama, torcendo o nariz em desdém e se deita na maca.
Outra massagista entra no cômodo e indica para que eu deite na maca desocupada, meus olhos brilham para a mulher e sorrio de forma verdadeira, agradecida por não ser o don Juan de araque o responsável por minha massagem e me deito. Ao contrário de mamãe, que não veste nada além do que a parte inferior do biquíni por baixo do robe, uso um maiô preto, com um decote generoso na parte da frente, mas que abraça e resguarda meu corpo de olhares curiosos e julgadores, não deixando nada muito descoberto.
— Preciso ficar bem relaxada, Rô. Tenho um encontro essa noite e preciso estar em meu melhor estado. — Minha progenitora comenta, usando um tom de voz meloso e pedante.
Crispo o cenho para suas palavras, apesar de já está acostumada com seus namorados relâmpagos, achei que ela ficaria comigo no SPA pela semana inteira, já que a ideia foi sua.
— Não vai ficar a semana inteira? — Deixo escapar, trazendo a atenção da mulher pra mim.
— Ah não, querida. Essa semana será sobre você, já programei toda a sua rotina e ficará tão ocupada que nem vai perceber minha ausência. Além do quê, tenho os meus próprios planos.
Mesmo após tantos anos do mesmo tratamento, meu coração ainda se ressente ao ouvir suas palavras indiferentes. Saber que a mulher que me deu à vida prefere a companhia de um homem qualquer à minha, machuca. No entanto, assumo a culpa. Sou tola por acreditar que de repente minha progenitora vai se tornar uma mulher sentimental e me priorizar.
Bufo para mim mesma.
Idiota.
Tola.
Burra.
Viro minha cabeça para o outro lado, fitando a parede branca ao invés do rosto de kaciana, ficando na mesma posição até o fim da massagem, ignorando a conversa fiada e íntima que minha progenitora travou com o tal Rô pelos longos minutos que fiquei deitada sobre a maçã, ao menos, a massagem foi boa e conseguiu me distrair em alguns momentos.
— Obrigado, Ângela. — Digo, ao ler o nome da massagista em seu uniforme e ela assente, me sorrindo de volta.
Deixo a sala sem esperar por mamãe, seguindo direto para o meu quarto ao invés da sauna como tínhamos programado. Eu posso até está agindo como uma criança mimada agora, mas estou chateada por ter concordado em ficar aqui, trancafiada como uma prisioneira por uma semana enquanto a maioria das pessoas está fazendo o que gosta, indo para lugares que apreciam.
Ok, eu sou adulta e posso ir embora se quiser. — Falo pra mim mesma, me lembrando que já não sou obrigada a ceder aos caprichos de Kaciana.
Mas...
Droga!
Conhecendo a mãe que tenho ela vai me infernizar até que eu volte, mas não por uma semana, mas um mês inteiro.
— Nelly, você não está me ouvindo chamar? — Kaciana resmunga ao me alcançar, atirando—me um olhar irritado.
Suspiro, fazendo minha melhor expressão de paisagem e paro, olhando direto para seus olhos claros como os meus.
— Não, mamãe. Eu não ouvi, a senhora deveria ter gritado.
Ela me olha incrédula, olhando para os lados para checar se alguém me ouviu.
— Damas não gritam, Nelly. — Pontua, usando sua melhor expressão de dondoca rica, rondando se não há nenhuma das suas amigas socialites por perto.
Não questiono, apesar de achar um completo absurdo sem sentido.
Acontece que, meu pai nos deixou muito bem de vida e com mamãe sempre gostou de esbanjar, leva uma vida luxuosa e sem muitas limitações, isto, junto com a educação conservadora que teve é cheia de regras para manter a boa aparência perante a sociedade. Regras preconceituosas. É sempre:
Pode isso.
Não pode aquilo.
Claro, que meu peso e aparência são um problema pra ela e a imagem que tanto tenta preservar. Ter uma filha acima do peso é como indício de sua falha como mãe.
— Você não vai para a sauna? — Volta a falar, mudando de assunto.
— Não, preciso enviar um e—mail para o escritório. — Digo e ela revira os olhos, me fazendo voltar a andar com o gesto.
— Espere. — Diz, segurando meu braço após eu ter dado um passo de distância dela.
— Eu realmente preciso ir, mamãe. — Minto, formando uma expressão séria em meu rosto.
Na verdade, não tenho e—mail algum para enviar. Meu supervisor me deu alguns dias de folga, devido ao acúmulo de trabalhos acadêmicos que preciso organizar nessa reta final do curso, mas ela não precisa saber disso.
— Você sabe que por mim largaria esse empreguinho, até mesmo essa faculdade. — Diz com voz de desdém.
Respiro, tomando longas lufadas de ar.
— Não é um empreguinho, consegui o estágio na Dalton pelo meu esforço, ela é a maior revista do país e aborda assuntos sérios, tenho sorte em trabalhar em uma de suas filiais. — Kaciana bufa, demonstrando não concordar comigo.
— Que seja. — Diz contrariada, apertando os lábios finos um contra o outro. — Você não quer saber com quem vou me encontrar hoje? — Pergunta, deixando um sorriso repuxar seus lábios para cima, formando uma expressão quase...feliz.
Franzo o cenho, não entendendo sua pergunta. Ela nunca me fala com quem vai sair ou pede qualquer opinião.
— Com quem? — Pergunto intrigada.
Deve ser alguém importante levando em consideração sua empolgação.
— David Bragança. — Diz, lambendo os lábios ao citar o nome do homem. Sorrindo maliciosa.
Meu coração erra uma batida, minhas pernas vacilam na menção do meu ex professor de história, o homem que amei secretamente por três anos.
— Ele voltou? — Forço uma voz tranquila, disfarçando a perturbação que sua revelação me trouxe.
Ela me olha, estudando minha expressão de forma minuciosa e sorrir, pegando uma das minhas mãos em uma demonstração afetiva forçada, acariciando o dorso.
— Sei que nutria sentimentos bobos por ele, querida. Não conseguia disfarçar quando falava ou ouvia algo sobre o homem. Espero que tenha deixado essa paixonite de lado.
Limpo a garganta, afastando minha mão das suas e desviando o olhar para o pequeno grupo de mulheres fazendo pilates perto da piscina.
— David Bragança foi meu professor, devo muito à ele como educador, mas é só isso. — Digo seca, voltando a olhar fundo nas íris conhecidas.
Ela sorrir, colocando uma das mechas do meu cabelo para trás.
— Que bom, querida. David é um homem sofisticado, apesar da profissão simplória que escolheu. Vem de uma família requintada e resolveu ressentimente assumir seu lugar como único herdeiro da Bragança perfumaria, precisará de ajuda.
— E você vai ajudar? — Pergunto irônica, incapaz de esconder meus sentimentos.
— Sim, eu o ajudarei. — Diz, ignorando a acidez das minhas palavras. — Tenho que ir, encontro você daqui uma semana. Por favor, não me decepcione. — Fala e sai, sem nenhum outro gesto mais íntimo ou carinhoso.
Não me decepcione.
Ela está falando sobre David ou meus quilos extras? Bufo, não querendo achar a resposta sobre isso. Volto a caminhar, indo direto para os pequenos chalés que algumas clientes tomam como seus quartos e entro no 501. Varro meus olhos como uma águia pelo cômodo, buscando pelo meu notebook ou celular, qualquer um que possa me oferecer uma pesquisa rápida sobre meu ex professor.
Ele voltou.
Ele voltou para cidade depois de dois anos fora, após o terrível acidente que tirou a vida do seu filho e esposa.
DAVIDEsforço-me para não contestar as ordens de Dona Hordéllis e mantenho o sorriso no rosto, agindo com gentileza cada vez que uma de suas amigas tenta uma aproximação mais íntima e intrusiva. Inferno. Falta um ano para que alcance os quarenta e estou aqui, sendo tratado como um adolescente que precisa ser disciplinado.Ela não pode exigir mais do que isso. Não pode.— Você não está sorrindo. — Reclama para que apenas eu escute e não deixo de gemer, vendo que sim, ela sempre pode exigir mais.Intercepto um garçom e pego duas taças de champanhe, virando uma atrás da outra.— O quê? — Pergunto, quando a vejo me olhar em reprovação.Ela comprime os lábios em uma linha fina e balança a cabeça em negativa, bufando baixo para não chamar atenção, mas me olhando de forma carinhosa logo depois.— Só quero a sua felicidade, meu querido. — Sorrio de forma sincera, dando-lhe um beijo no meio da testa.— Eu sei, minha vida. — Ela enxuga uma lágrima solitária e dá três tapinhas na minha mão, se a
NELLYEntro no banheiro bufando pelas narinas, permitindo que a porta bata sem nenhuma delicadeza e assustando outras convidadas da festa que revisavam suas maquiagens. Murmuro um pedido de desculpas esfarrapado e bufo sem perceber de tão irritada, seguindo direto para uma cabine privada dentro do banheiro e me tranco.— Argh! Como ele pode ser tão cretino? — Falo pra mim mesma, baixando a tampa do vaso sanitário e sentando. — Você não lembra de mim, Sr. Bragança? — Desdenho, adotando um tom debochado e três oitavos mais baixo que eu meu.Bufo.Droga, Nelly!Isso é tudo culpa sua, você aceitou vim até esse coquetel mesmo sabendo que se tratava da festa de aniversário da empresa dele.O que você esperava? Flores e beijos ardentes?Acorda!Passo as minhas duas mãos pelo rosto, percebendo que continuo o tratando de forma formal, dando a ele o poder de superioridade de anos atrás. Sr, Bragança. Pressiono meus lábios um no outro até formarem uma linha fina e passo a abanar meus rosto com
DavidObservo em expectativa o ponteiro menor encontrar o maior em cima do número nove, indicando que não há motivos para minha irritação continuar e como imaginei, ela não vem.Ela não vem...Ela não vem.Ótimo. Um sorriso repuxa meus lábios e dou adeus ao mau humor, quase me levantando para dar saltinhos de felicidade. Começando a ter uma nova perspectiva sobre a manhã infernal que estou tendo desde que acordei.— Sr. Bragança, tem uma jovem aqui querendo vê-lo. — Leila diz do outro lado do telefone assim que o atendo, não esperando sequer que eu tome a primeira fala. — Permito que entre, senhor?Pisco algumas vezes, checando meu relógio de pulso e vendo que não passou mais que um minuto desde a última vez que o chequei. — Quem é a moça, Leila? — Indago, apesar de já desconfiar de quem seja. Minha secretaria faz uma pausa em sua fala e tudo que posso ouvir são sussurros do outro lado da linha. — Leila? — Tento chamar sua atenção.— Senhorita Álvares, senhor. Ela disse que tem horár
NELLYO prédio Bragança é de longe o lugar mais luxuoso e moderno que já estive, nem mesmo a agência que eu trabalhava tinha tanta personalidade em sua arquitetura e decoração, mas isso não impede a sensação de falta de ar que estou tendo desde que saí de casa essa manhã, na boa, eu não sei o que deu em mim para aceitar essa proposta. Ficar perto dele não vai me fazer bem. Então, o que diabos estou fazendo aqui?Você é masoquista. Minha consciência tira sarro e reviro os olhos. Megera.
DAVIDA escuridão tornou-se meu abrigo, o álcool meu melhor amigo, mas o sexo, porra, este é o meu anestésico favorito.Empurro sem piedade contra a ruiva fogosa, sorrindo ao ouvir seus gemidos luxuriosos e engancho minha mão em seu cabelo, puxando até que ela fique de joelhos, encostando suas costas no meu peito. Mordo seu ombro, pescoço e bochecha. Ela empurra de volta e rosno, gostando da sua safadeza.A mulher é experiente, sabe exatamente do que um homem gosta na cama e isso me agrada.— Você não vai me falar seu nome? — Diz sedutora, me olhando através do espelho na parede. Estamos em um quarto de motel qualquer, trancados há quase três horas e a mulher acha que já somos íntimos. Deslizo meu dedo pela sua barriga até chegar em sua boceta, acaricio seu clitóris enquanto enfio cada centímetro da minha rola para dentro dela.— Meu nome não importa agora, linda. Você está tomando meu pau na sua boceta apertada e está gostando. — Ela geme em resposta, provando o meu ponto e meto com
NELLY HORAS ANTES. O dia começou tumultuado e precisei incorporar um espírito sensato para lidar com Kaciana, porque só Deus sabe o quanto minha progenitora pode ser insistente. Eu amo minha mãe com todas minhas forças, mas quando ela cisma com algo é tortura na certa, por isso, a evito desde o nosso último confronto. — Você engordou? — Paro a colher de mingau no meio do caminho e giro meu tronco para encontrar com os olhos azuis, altivos e tão parecidos com os meus. — Porque parece que você ganhou alguns quilos. — Completa, torcendo o rosto em desagrado enquanto me analisa e caminha até estar na minha frente. — Não. — Sussurro, afastando a tigela com o alimento pra longe, sentindo a fome passar. — Tem certeza? Seu rosto está arredondado, suas bochechas mais salientes e sua bunda mal cabe nessa cadeira. — Fecho os meus olhos, contendo as lágrimas e respiro fundo. — Preciso ir trabalhar. — Digo, virando de costas para fugir do seu campo de visão e não presenteá—la com minhas l
DAVIDO sol invade meu quarto pela janela e a claridade atrapalha meu sono, me fazendo despertar antes da hora. Irritado, levanto mal-humorado, chutando o travesseiro que cai da cama em cima do meu pé. Hoje é um péssimo dia por muitos motivos, mas o principal é que hoje deveria ser um dia de comemoração, onde minha esposa e eu faríamos dezoito anos de casados.Só que ela está morta e eu vivo, então esse dia se tornou ruim. Péssimo.
NELLYO homem parece desolado, fragilizado diante de mim, o oposto do que ele vem me mostrando ao longo desse tempo de convívio, pois a pose de "nada me abala", foi embora e deu lugar a um homem quebrado e cheio de culpa. A falta do brilho em seus olhos foi algo que percebi logo quando fomos reapresentados, pois, o cara que eu idolatrava na adolescência era cheio de vida e bom humor, não havia um dia se quer que eu não ganhasse um sorriso seu, mas julguei que isso tivesse ligação com sua posição de diretor executivo da Bragança.Eu estava enganada,